ROBERT FLOREY
outubro 31, 2023Conhecido geralmente como diretor de filmes B, durante quase um século no cinema, de 1916 a 1963, ele dirigiu 65 longas-metragens e 250 filmes de televisão na maioria dos grandes estúdios. Exibindo habilidade em vários gêneros, também ficou conhecido como um artista, ganhando fama primeiramente por seus curtas-metragens experimentais e seus filmes de maior duração se distinguiram por integrar estilos de filmagem europeus no sistema de estúdio de Hollywood.
Robert Florey (1900 – 1979), cujo nome verdadeiro era Robert Fuchs, nasceu em Paris, França. Seu pai faleceu pouco após o filho nascer. Sua mãe casou-se novamente, mas ela, também, morreu dentro de poucos anos, deixando o menino aos cuidados da família do padrasto. A imaginação do menino foi despertada quando, morando perto do Teatro do mágico Robert Houdin, ele assistiu Georges Mélìes montando suas fantasias cinematográficas primitivas. O padrasto de Florey introduziu o menino no teatro clássico e através dos anos levou-o para viajar através de boa parte da Europa, inclusive Austria, Itália, Suiça e Espanha.
Depois de concluir os estudos secundários, o jovem estava previsto para cursar Engenharia, porém seu estado de saúde exigiu uma mudança de clima e ele foi para a Suiça, matriculando-se em 1915 na École Professionelle de Genebra. Quando tinha 16 anos de idade, seu padrasto faleceu e o rapaz teve que sair da escola. Em março de 1917, conseguiu seu primeiro emprego estável na indústria de cinema, colocando legendas francesas em filmes estrangeiros para a Select Film Company de Genebra, onde conheceu Max Linder, ao qual prestou assistência brevemente. Posteriormente, Florey se uniu à Companhia de Operetas Kursaal, ajudando o gerente de palco e interpretando pequenos papéis. Permanecendo ativo no teatro e no cinema, organizou um show itinerante de peças de horror “Grand Guignol” e logo o jornalismo passou a ser uma de suas atividades, cobrindo esportes e exercendo depois a crítica teatral. Ele ainda encontrou tempo para interpretar o papel do detetive no filme de um rolo de Alfred Lind, Le Cirque de la Mort.
Em dezembro de 1918, Florey e alguns amigos formaram, com o apoio do produtor-cinegrafista- ator Leon Tombet, uma companhia de cinema e decidiram produzir um filme imitando o estilo de Charles Chaplin. Assim surgiu Isidore a la Deveine, dirigido por Tombet com o acrobata Walter Gfeller, conhecido como o “Chaplin Suiço” no papel principal. Florey forneceu o roteiro e também atuou como ator e operador de câmera. Em maio de 1919, a Tombet Films realizou Une Heureuse Intrervention, provavelmente o primeiro filme suíço de longa-metragem, no qual Florey foi novamente ator e operador de câmera; porém ele teve seu batismo como diretor, dirigindo algumas cenas, embora Tombet tivesse recebido o crédito como diretor. No mês seguinte outro falso Chaplin foi feito, Isidore sur le Lac, e desta vez Florey pôde dirigir seu próprio roteiro.
Ansioso para aprender sua profissão num estúdio importante, no início de 1920, Florey deixou Genebra e retornou à França, e arurmou emprego no estúdio da Gaumont em Nice como assistente do diretor Louis Feuillade. Enquanto trabalhava no cinema, Florey continuou sua carreira de jornalista, juntando-se ao staff da Cinemagazine, a primeira revista de cinema francesa verdadeiramente popular. O conhecimento de cinema impressionou alguns de seus entrevistados como Max Linder, que o incentivou a tentar a sorte nos Estados Unidos. Prometendo aceitar matérias sobre astros de Hollywood seu editor ajudou a financiar sua viagem para a América e, ao chegar a Nova York, rumou imediatamente para Hollywood. Chegando na Terra do Cinema, ele se dirigiu ao estúdio da Fox e, como não havia porteiros, ele simplesmente entrou de mansinho. Parando para assistir a filmagem de Monte Cristo / 1922 (com John Glbert), ele ficou tão alarmado com a imprecisão da atmosfera francesa, que se lançou para frente das duas câmeras e interrompeu a filmagem. Felizmente, o cinegrafista era outro emigrado francês, Lucien Andriot, que conseguiu persuadir o diretor, Emmet J. Flynn, de que Florey não deveria ser expulso do set, mas ser contratado como consultor técnico. Este trabalho durou algumas semanas. Quando a filmagem de Monte Cristo terminou, Florey tornou-se gag writer para as comédias Sushine de Al St. John e, por causa de sua altura (1,93m), ele era algumas vezes chamado para fazer pontas, tais como em o xerife em Straight from the Farm / 1922.
Ao mesmo tempo, fez amizade com muitas celebridades da época como Alla Nazimova, Renée Adorée e Charles Chaplin e foi contratado como diretor de publicidade no estrangeiro para Mary Pickford e Douglas Fairbanks. Nesta posição, cuidou da correspondência dos dois astros e escreveu os intertítulos franceses para Robin Hood / 1922, ficando muito amigo deles, ensinando francês para Fairbanks e aprendendo inglês com Pickford. Pouco depois, Florey cuidou também da publicidade da turnê que Rudolph Valetino e sua esposa Natacha Rambova fizeram para promover um produto de beleza, Mineralava Cold Cream. De volta para Hollywod, Florey formou a companhia Imperial Pictures, com o diretor de fotografia Paul Ivano e um revendedor de carros Pierce-Arrow, Humphrey Birge, e escreveu e dirigiu Fifty-Fifty / 1923, curta-metragem de dois rolos protagonizado pelo comediante francês Maurice de Canonge. Infelizmente eles não conseguiram distribuidor para seu filme e Florey teve que abandonar momentaneamente sua esperança de desse tornar um diretor free lancer. Neste momento, ele já havia escrito Filmland e Deux ans dans les studios américains e logo começou uma série de biografias de tais astros como Charles Chaplin, Pola Negri e Adolphe Menjou, todos escritos em francês e publicados em Paris. Florey então tornou-se assistente de diretor de Louis Gasnier no filme Vinho Capitoso / Wine / 1924, produzido pela Universal com Clara Bow no papel principal.
Após uma estadia no Canadá com o ator dramático francês Charles de Rochefort para produzir pequenas peças e esquetes, entre elas uma pantomima intitulada L´Apache que ele dirigiu, Florey voltou para o cinema como assistente de direção de Alfred Santell em Noites Parisienses / Parisian Nights na F.B. O. Lá ele conheceu outro assistente de direção, Josef von Sternberg e, pouco depois, a pedido de Alla Nazimova, interpretou o papel de um bôemio em Pecado Redentor / The Redeeming Sin / 1925. Por alguns anos seguintes ele serviu como assistente de direção (v.g. de King Vidor em O Grande Desfile / The Big Parade / 1925, La Boheme / La Boheme / 1926 e O Cavaleiro dos Amores / Bardelys the Magnificent / 1926) e consultor técnico, frequentemente combinando ambas as capacidades. Seu cuidado e atenção para o detalhe na criação de ambientes europeus, particularmente na Metro-Goldwyn-Mayer, rendeu-lhe muitos elogios. Entrementes von Sternberg fora contratado pela MGM e pediu Florey para ser seu assistente; ele trabalhou com Sternberg em Amor, Vício e Virtude / The Masked Bride / 1925. Lamentavelmente, o estúdio não gostou da abordagem de Sternberg e Christy Cabanne terminou o filme.
Com sua experiência variada, Florey se sentiu qualificado para dirigir longas-metragens e pediu uma promoção aos executivos da MGM; porém estes lhe sugeriram que começasse em uma produtora independente, garantindo-lhe uma posição na Tiffany. Chegando lá, disseram-lhe que o que eles estavam precisando não era um diretor, mas um roteirista e lhe encarregaram de terminar em curto prazo o argumento e continuidade de O Direito de Viver / That Model from Paris / 1926. Ele cumpriu a tarefa no tempo desejado e, quando o diretor Louis Gasnier caiu doente, Florey substituiu-o, mas sem receber crédito por ambos estes serviços. Bem satisfeita com seu trabalho, a Tiffany entregou-lhe a direção de Conquistado à Força / One Hour of Love/ 1927, um dos filmes principais da temporada.
Depois disto, não desejando voltar a trabalhar mais como assistente, Florey aceitou um emprego na Fox ajudando Frank Borzage a preparar o ambiente de Paris durante a Primeira Guerra Mundial para Sétimo Céu / 7th Heaven / 1927 e na Samuel Goldwyn Company para ser assistente de Henry King em A Chama do Amor /The Magic Flame / 1927. Ele também passou alguns meses na United Artists preparando um argumento para um filme envolvendo personagens históricos que seriam interpretados pelos maiores astros do estúdio: Douglas Fairbanks como D´Artagnan; Mary Pickford (Maria Stuart); Charles Chaplin (Hamlet); John Barrymore (François Villon); Gloria Swanson (Cleopatra); Norma Talmadge (Madame du Barry). Florey até sugeriu que Ernst Lubitsch interpretasse Napoleão. Porém o projeto não vingou.
A Idade Romântica / The Romantic Age / 1927, realizado para a Columbia, marcou o retorno de Florey à direção. Para se manter neste posto, aceitou dirigir em seguida, Face Value / 1927, filme do qual ele mesmo não gostou, produzido pela Sterling Pictures, companhia independente sediada na Universal, onde permaneceu prestando outras colaborações até perceber que, realizar filmes independentes, não levaria a um contrato de diretor nos grandes estúdios. De fato, não seriam estes filmes iniciais que o iniciariam no caminho do reconhecimento, mas sim os quatro shorts experimentais que fez em 1927 e 1929 (The Life and Death of 9413 – A Hollywood Extra; The Loves of Zero, Johann the Coffin Maker; Skyscraper Symphony), influenciados pelo expressionismo e pela vanguarda, os quais marcaram o começo de sua carreira como diretor com um estilo próprio. As novidades técnicas exibidas nos filmes de vanguarda de Florey chamaram a atenção dos executivos da Paramount-Famous-Lasky, que estavam pretendendo produzir seus primeiros filmes falados, reabrindo seu antigo estúdio Astoria em Long Island, Nova York. O diretor Monta Bell assumiu a supervisão do estúdio e Florey foi encarregado de dirigir dezenas de testes a fim encontrar rostos fotogênicos com boas vozes para substituirem os atores dos filmes silenciosos. Entre os que receberam seu batismo diante da câmera de Florey estavam Ethel Barrymore, Walter Huston e Edward G. Robinson. Num próximo passo, Florey filmou alguns dos artistas selecionados em filmes de um ou dois rolos em esquetes humorísticos ou musicais. Alguns desses shorts, inclusive um com Eddie Cantor e outro com Helen Morgan, seriam mais tarde incluídos no filme Glorificação da Beleza / Glorifying the American Girl / 1929. Os três primeiros longas-metragens falados de Florey foram The Hole in the Wall / 1928, Hotel da Fuzarca / The Cocoanuts / 1929 e A Batalha de Paris / The Battle of Paris / 1929, que – pela ordem – lançaram as carreiras cinematográficas, de Claudette Colbert e Edward G. Robison, os Irmãos Marx e Gertrude Lawrence.
Atendendo a um convite de um jovem produtor independente francês, Pierre Braunberger, Florey foi para a Europa onde dirigiu sucessivamente de La Route est Belle / 1929, L’ Amour Chante / 1930 e Le Blanc et le Noir / 1931; porém acabou se desentendendo com Braunberger e seu sócio Roger Richebé e voltou para Hollywood, ingressando na Universal. Após ter dado uma contribuição valiosa para o roteiro de Frankenstein / Frankenstein /1931, ele realizou Os Assassinatos na Rua Morgue / Murders in the Rue Morgue / 1932, um dos seus filmes mais dominados pelo estilo germânico tanto na sua concepção como no seu tratamento. Florey continuou na Universal durante alguns meses, colaborando em vários scripts de horror com Garrett Fort e, no início de 1932, aceitou convite de Sam Bischoff, o novo chefão da Tiffany (recentemente rebatizada de K.B.S. e depois comprada pela World Wide). Nesta companhia realizou The Man Called Back / 1932 e Those We Love / 1932 e chegou a escrever (de parceria com Reginald Owen) o roteiro de A Study in Scarlet; mas como a K.B.S. estava em péssima situação financeira, ele preferiu se desligar da empresa e atender ao chamado da Warner Bros.com a qual assinou um contrato de longo prazo. No período 1932-1935, Florey fez 13 filmes para a Warner: A Esposa Desaparecida / Girl Missing / 1933; Amante de seu Marido / Ex-Lady / 1933; Presa do Destino / The House on 56th Street / 1933; O Nome é Tudo / Bedside / 1934; Abnegação / Registered Nurse / 1934; Smarty / 1934; I Sell Anything / 1935; Ladrões Internacionais / I Am a Thief / 1935; A Mulher de Vermelho / The Woman in Red / 1935; O Punhal dos Bórgias / The Florentine Dagger / 1935; Going Highbrow / 1935; Don´t Bet on Blondes/ 1935; Liquidando Contas / The Pay-Off / 1935. O melhor foi O Punhal dos Bórgias, drama criminal de mistério baseado em romance de Ben Hetch, no qual o herói, descendente dos Bórgias, pensa ter herdado as tendências criminais de seus antepassados.
Insatisfeito com a maioria de seus projetos na Warner, Florey retornou ao seu antigo estúdio, Paramount, onde, no período 1935 – 1940, assumiu a direção de 17 filmes: Café Concerto / Ship Café / 1935; Em Pleno Espetáculo / Preview Murder Mystery / 1936; Amantes Inimigos / Till We Meet Again / 9136; Boulevard de Hollywood / Hollywood Boulevard / 1936; Vencida a Calúnia / Outcast / 1937 (Prod: Major Productions / DIst: Paramount); O Amor é como o Jogo / King of Gamblers / 1937; Mountain Music / 1937; Amor nos Bastidores / This Way Please / 1937;Tráfico Humano / Daughter of Shanghai / 1937; Verdugo de si Mesmo / Dangerous to Know / 1939; O Tirano de Alcatraz / King of Alcatraz / 1938; Eva no Tribunal / Disbarred / 1939; Hotel Imperial / Hotel Imperial / 1939; Caviar para sua Excelência / The Magnificent Fraud / 1939; Quem Matou o Campeão / Death of a Champion / 1939; Mercadores do Crime / Parole Fixer / 1940; Mulheres sem Nome / Women Without Names / 1940. Os melhores foram Em Pleno Espetáculo (drama criminal de mistério passado num estúdio de cinema, cheio de suspense criado através de composições e iluminação inusitadas) e Vencida a Calúnia (drama social poderoso e convincente, expondo a história de um médico que, perseguido porque um de seus pacientes cometeu suicídio, foge para uma cidade pequena, mas é identificado e se vê ameaçado de linchamento). Quando seu contrato com a Paramount expirou, coincindindo com o irromper da Segunda Guerra Mundial na Europa que iria afetar o faturamento da empresa no exterior, o estúdio só concordou em renovar o contrato de Florey, se ele aceitasse um corte no seu salário. Florey recusou a oferta e deixou a Paramount pela última vez.
Na década de 1940-1950 ele celebrou uma série de contratos de curto tempo com várias companhias e, após o final da guerra, se tornaria independente. Brian Taves, autor de Robert Florey, The French Expressionist (Bearmanor Media, 2014, livro magnifico do qual colhemos muita informação, expõe a filmografia do diretor na década citada nesta forma: Columbia: A Máscara de Fogo / The Face Behind the Mask / 1941; Rastro nas Trevas / Meet Boston Blackie / 1941; Alugam-se Senhoritas / Two in a Taxi / 1941. Warner Bros.: Alarme no Atlântico / Dangerously They Live / 1941; Mulher Gângster / Lady Gangster / 1942; A Canção do Deserto / The Desert Song / 1943.Twentieth Century-Fox: O Último Gangster /1944. Republic: O Homem Fenomenal / Man from Frisco / 1944. Warner Bros.: A Mão que nos Guia / God is my Co-Pilot / 1945; Sinal de Perigo / Danger Signal / 1945; Os Dedos da Morte / The Beast with Five Fingers / 1946. United Artists: Monsieur Verdoux / Monsieur Verdoux / 1947. RKO Radio: Tarzan e as Sereias / Tarzan and the Mermaids / 1948. Universal- International: Legião Sinistra / Rogue´s Regiment / 1948. United Artists – Morrocan Picture: Posto Avançado em Marrocos / Outpost in Morocco / 1949; Afrontando a Morte / The Crooked Way / 1949; Ladrão com Alma / Johnny One-Eye / 1950. Emerald-Film Classics-Monogram: The Vicious Years / 1950.
Os melhores foram A Máscara de Fogo (drama criminal focalizando um imigrante (Peter Lorre) cujo rosto foi desfigurado num incêndio que, não conseguindo arrumar emprego, usa uma máscara de borracha reproduzindo mais ou menos sua fisionomia original e começa uma vida de crime), Monsieur Verdoux , no qual Florey foi diretor associado de Charles Chaplin e Afrontando a Morte, filme noir com o tema do ex-pracinha (John Payne) que retorna da guerra com deficiência de memória e investiga sua verdadeira identidade, valorizado pela fotografia em claro-escuro de John Alton.
Entre 1951 e 1963, o infatigável diretor aderiu à televisão, comandando, como disse no início deste artigo, 250 telefilmes, entre eles episódios das famosas séries Além da Imaginação / Twilight Zone e Alfred Hitchcock Presents.