MICHAEL POWELL

dezembro 5, 2010

Notável contador de histórias e estilista visual, com tendência para o cinema fantasista e sempre voltado para a experimentação de novas técnicas ou temas inusitados, que fecunda com prodigiosa imaginação, virtuosismo profissional e um senso apurado de espetáculo, Michael Powell realizou filmes bastante pessoais e impossíveis de serem esquecidos.

Neste tributo ao grande cineasta vou abordar apenas a fase mais expressiva de sua carreira, lembrando os filmes produzidos entre The Edge of the World e A Tortura do Medo / Peeping Tom, destacando, obviamente, a sua colaboração com o roteirista Emeric Pressburger.

Michael Latham Powell (1905 – 1990) nasceu em Bekesbourne, perto de Canterbury, no Condado de Kent, Inglaterra, estudou no Dulwich College em Londres e, desde cedo, manifestou entusiasmo pelo Cinema.

Em 1921, seu pai – nessa ocasião hoteleiro em Chantilly, no Norte da França – conheceu o diretor francês Léonce Perret e lhe pediu que testasse o filho como ator. “Eu era muito tímido. Naturalmente, não sou ator, nunca fui. Não sabia nada. O estúdio, as iluminações, tudo me assombrava. Meu pai, percebendo isso, entrou em cena e representou ao meu lado. Ao terminarmos, Perret disse: ‘udo bem, cortem! Monsieur Powell pai obteve o contrato’. Meu pai caiu na gargalhada e convidou todo mundo para almoçar. Este foi o fim de minha carreira como ator”.

Em 1925, por intermédio de dois amigos de seu pai, Fred Bacos e John Daumery, produtores de Mare Nostrum / Mare Nostrum, o filme que o diretor americano Rex Ingram, estava fazendo no estúdios de La Victorine em Nice, Powell acabou conhecendo outros membros da equipe, entre eles, Harry Lachman, responsável pela fotografia de cena. Lachman contratou-o como seu assistente. Nos três anos seguintes, o jovem experimentou a maioria das funções existentes no estúdio de Ingram e aprendeu muito sobre o processo de filmagem. Entre 1927 e 1928, ele fêz o papel de um turista inglês, Cícero Baedecker Symp, em uma série de comédias curtas intitulada Riviera Ravels – Travelaughs.

De volta à Inglaterra em 1928, Powell conseguiu emprego como leitor do departamento de roteiros da British International Pictures nos estúdios de Elstree e subsequentemente o de fotógrafo de cena no filme Champagne (na TV) / Champagne de Alfred Hitchcock. Powell continuou como fotógrafo de cena de Hitchcock e colaborou no roteiro do primeiro filme falado do grande diretor, Chantagem e Confissão (na TV) / Blackmail / 1929 – Powell foi quem teve a idéia da perseguição final no Museu Britânico.

Depois de montar A Knight in London / 1928 (Dir: Lupu Pick) e escrever os scripts de Caste / 1930 (Dir: Campbell Gullan) e 77 Park Lane / 1930 (Dir: Albert de Courville), Powell finalmente teve a chance de dirigir Two Crowded Hours / 1931, o primeiro dos 23 filmes, entre quota-quickies e produções modestas, que ele realizou, principalmente em parceria com o produtor Jerome Jackson, até se unir a Joe Rock, americano oriundo do vaudeville, que se tornou produtor na Inglaterra. Powell dirigiu The Man Behind the Mask / 1936 para Joe Roc e este, em seguida, financiou um projeto do diretor: The Edge of the World.

Abro um parêntesis, para explicar que os quota quickies surgiram, quando o Cinematograph Act de 1927 impôs a produção e a distribuição de um número mínimo de filmes nacionais. As companhias americanas então abriram filiais na Inglaterra e produziram filmes de orçamento barato com artistas ingleses, mas a seu proveito. Assegurando uma quantidade de produção suficiente para o preenchimento da cota mínima, propiciavam a importação dos filmes americanos.

Edge of the World / 1937 foi o primeiro filme inteiramente pessoal de Michael Powell, inspirado no fato verídico da evacuação de St. Kilda em 1930. Um casal de turistas (Michael Powell e sua companheira na vida real, Frankie Reidy) chega de iate à ilha de Hirta ao largo da costa escocesa. Andrew Gray (Niall MacGinnis), originário do local, os acompanha e recorda o passado. No retrospecto, vemos como, sem meios de subsistência, alguns habitantes de uma família liderada por James Gray (Finlay Curie), pensam em partir enquanto outros, reunidos em torno de Peter Manson (John Laurie), permanecem ligados ao lugar e às suas tradições. Entre estes está Andrew, filho de Gray, que se opõe a Robbie (Eric Berry), filho de Manson, numa competição cujo resultado deveria determinar a escolha da população: a escalada de um penhasco durante a qual Robbie morre acidentalmente. No meio da trama, surge uma história de amor entre Andrew e Ruth (Belle Chrystall), a irmã de Robbie.

Influenciado por Man of Aran / 1934 de Robert Flaherty, o filme encanta antes de tudo pela sua beleza plástica e pelo seu frescor naturalista. Ví o filme recentemente na magnífica copia restaurada, lançada em dvd pelo BFI (British Film Institute), e fiquei encantado. A filmagem ocorreu na ilha de Foula, porque não foi permitida a filmagem em St. Kilda, mas a paisagem das duas ilhas é muito parecida: a costa inóspita, mar sempre agitado, vento constante, ausência de qualquer abrigo, rochedos íngremes, pouca vegetação, enfim, um ambiente muito fotogênico, esplendidamente fotografado por Ernest Palmer, Skeets Kelly e Monty Berman.

Todas as cenas do filme são belas, destacando-se: a morte de Robbie, quando a velha que aparece sempre impassível, se levanta; o enterro de Robbie, com a câmera baixa focalizando os enlutados que passam pelas flores sob o som de uma música encantadora, cantada por um coro feminino; a cena do pai abraçando a filha, compreendendo que ela ama Andrew e o corte para o bebê; a adoração do bebê pela mãe e pelas mulheres da ilha, com os close-ups da criança entrecortados com as velhas tricotando enquanto se ouve uma canção delicada; o baile comunitário, animado pelo instrumentos de corda, seguido da cena em que a câmera acompanha Finlay Curie segurando a lanterna e dando uns passinhos de dança; a cena que mostra os dois avós reconciliados e a silhueta de Ruth contemplando o crepúsculo; a seqüência da tempestade, na qual o mau tempo é refletido em majestosas imagens ameaçadoras da paisagem terrestre e marítima; aquele momento em que Lourie, que ficara sozinho na ilha, caminha pelas brumas com cordas na mão, seguido pelo cachorrinho, até que ele escala o rochedo e cai no mar, explicando a frase simbólica, “Gone Over”, que vemos no início do filme.

No meu julgamento, The Edge of the World é a obra-prima de Michael Powell, uma elegia pungente à morte de uma comunidade, caracterizada por uma história dramática muito bem narrada e uma contemplação mística da paisagem. Foi uma grande estréia de diretor que, em certas tomadas, nos lembra o cinema de John Ford.

Alexander Korda, dono da London Films, adorou o espetáculo e, numa primeira entrevista, disse ao jovem diretor: “Gostaria que você se juntasse a nós aqui em Denham. É um bom estúdio, um dos melhores do mundo, mas precisamos de diretores que saibam contar uma história com simplicidade e eficiência e também sejam capazes de realizar um filme dentro do orçamento previsto”. Powell respondeu que ele não havia feito outra coisa nos últimos sete anos. Korda ofereceu-lhe um contrato de um ano, estipulando o salário de 60 libras por semana.

O primeiro filme de Powell para a London Films foi O Espia Submarino / The Spy in Black / 1939, que recebeu no Brasil um outro título em português numa reprise, Submarino 29. Durante a Primeira Guerra Mundial, o comandante de um submarino alemão, Capitão Ernst Hardt (Conrad Veidt), infiltra-se na base naval inglesa em Scapa Flow, sem saber que seu contato havia sido descoberto e substituído por uma agente britânica, a professora de uma escola local (Valerie Hobson). Notabilizado por sua atmosfera sinistra e hábil combinação de humor e suspense, esse drama de espionagem, assinala o início da frutífera parceria de Michael Powell com Emeric Pressburger, roteirista húngaro refugiado da Alemanha nazista.

O Espia Submarino constituiu-se num êxito surpreendente e Korda apressou-se em reunir, não somente a dupla Powell-Pressburger como também os dois astros, Veidt e Robson, numa aventura de guerra mais atual, Nas Sombras da Noite / Contraband / 1940. O Capitão Andersen (Conrad Veidt), comandante de um navio mercante dinamarquês é acusado de contrabando. A atitude misteriosa de uma bela passageira, Mrs. Sorensen (Valerie Hobson), envolve-o numa trama, ao fim da qual eles conseguem desmantelar uma rede de espiões nazistas baseada em restaurantes e cabarés no coração de Londres.

O filme se compara aos thrillers de Hitchcock no período inglês, tanto no que diz respeito às relações cáusticas entre os dois protagonistas como no desencadeamento de achados cinematográficos como, por exemplo, a perseguição numa cidade às escuras durante o blecaute e o tiroteio final no escuro num depósito abarrotado de bustos de mármore branco de Neville Chamberlain, que são satiricamente espatifados pelas balas, ambas as seqüências iluminadas com muita competência por Freddie Young.

Ainda em 1939, Powell dividira a direção com Brian Desmond Hurst, Adrian Brunel e Alexander Korda no filme de propaganda semi-documentário e sentimental, O Leão tem Asas / The Lion has Wings, que Korda, num gesto patriótico, realizou com Merle Oberon e Ralph Richardson nos papéis principais. Por meio de tomadas de arquivo e algumas cenas filmadas com os artistas, o filme faz um paralelo entre a vida pacífica na Inglaterra e a agressividade da Alemanha nazista e o esforço da nação britânica para construir sua defesa.

Powell compartilhou novamente a direção (com Ludwig Berger, Tim Whelan) em O Ladrão de Bagdad / The Thief of Bagdad. Este conto das Mil e Uma Noites repleto de aventura e fantasia romântica, já fora levado à tela de maneira magistral em 1924 por Raoul Walsh com Douglas Fairbanks; mas a versão de Korda também é excelente, não só pelo cuidado técnico-plástico – Oscar para fotografia em cores (George Périnal), efeitos especiais (Lawrence Butler / Jack Whitney), direção de arte em cores (Vincent Korda) – como pela magnífica partitura de Miklos Rozsa e felicidade na escolha do elenco, em que se destacam John Justin (o rei destronado Ahmad), June Duprez (a Princesa), Sabu (Abu, o jovem ladrão), Conrad Veidt (o inesquecível Grão-Vizir Jaffar), Rex Ingram (o gênio negro) e Miles Maleson (o Sultão).

Devido à guerra, Korda teve que desistir da idéia de filmar exteriores no Egito e na Arábia, transportando sua equipe para os Estados Unidos, onde Zoltan Korda e William Cameron Menzies, creditados como produtores associados, dirigiram as cenas finais no Grand Canyon.

Os efeitos especiais, tais como o gênio enorme saindo de uma garrafa, a luta contra uma aranha gigantesca, o tapete voador e o cavalo alado, são tão cativantes e convincentes quanto qualquer trabalho digital contemporâneo. A atmosfera das histórias orientais é realçada pelo Technicolor, que sublinha o luxo dos figurinos, a suntuosidade dos castelos e o mundo mágico e exótico descoberto pelo ladrãozinho das ruas de Bagdad.

Todo esse esplendor visual, composto por cenários e cores incríveis, de uma beleza que pertence totalmente à estética de Michael Powell, pode ser apreciado no maravilhoso dvd da Criterion, um deleite para o público de qualquer idade.

Depois de dirigir um short de cinco minutos, An American’s Letter to His Mother / 1941 (nele se ouvia a voz de John Gieguld lendo a carta autêntica de um piloto morto em combate, publicada postumamente no jornal The Times), Powell continuou sua ligação com Pressburger em Invasão de Bárbaros / 49th Parallel / 1941, filme realizado sob os auspícios do Ministério da Informação, dentro do esquema de uma campanha diplomática para convencer os americanos a entrarem na guerra.

Um submarino alemão é afundado na costa do Canadá e a tripulação sobrevivente atravessa o país, tentando chegar na América ainda neutra. Eles se confrontam com indivíduos ou coletividades de diferentes etnias ou origens, mas todos resistentes aos argumentos nazistas propostos pelos alemães. O grupo pouco a pouco vai se desagregando e somente o fanático Tenente Hirth (Eric Portman) alcança a fronteira. Quando está chegando aos Estados Unidos, Hirth se defronta com um soldado canadense desertor (Raymond Massey), que o obriga a recuar para o território hostil à Alemanha.

Emeric Pressbuger ganhou o Oscar de Melhor Roteiro Original e o filme alcançou os seus objetivos, valorizado pela fotografia de Freddie Young (tomadas espetaculares em locação da paisagem canadense), a montagem de David Lean e a presença, nos diversos episódios, de um punhado de grandes atores como Leslie Howard, Laurence Olivier, Anton Wallbrook, Raymond Massey, Eric Portman.

No curso de uma conversa entre o nazista Hirth e o caçador franco-canadense (Laurence Olivier), na qual eles discutem suas diferentes ideologias, o caçador diz: “Eu conheço minha Bíblia. E isto é o bastante para mim”. Hirth responde, colocando sua mão sobre um exemplar de Mein Kampf de Hitler, que ele estava citando: “Esta é a Bíblia”. Como comentou Michael Powell na sua absorvente autobiografia, A Life in Movies (Faber and Faber, 2000), “a profunda sinceridade religiosa, tal como interpretada por Eric Portman nesta cena, é realmente assustadora”.

Numa outra cena, Hirth fala sobre Hitler para a comunidade pacífica dos huteritas (seita protestante de origem austríaca). Ele faz este apelo: “Irmãos! Alemães!” e no climax do seu discurso, levanta a voz para dizer ”Heil Hitler”. Seus quatro companheiros levantam-se e fazem a saudação nazista. Mas o líder da comunidade (Anton Wallbrook), começa a sua resposta, exclamando com grande emoção: “Não, nós não somos seus irmãos!”. A interpretação de Wollbrook é comovente pelo seu fervor, pela sua veemência.

Quando Hirth e seu único companheiro remanescente se encontram na floresta com o esteta e antropólogo Philip Armstrong Scott (Leslie Howard), em cuja tenda estão quadros de Picasso e Matisse, o inglês culto fala sobre a Montanha Mágica de Thomas Mann e a obra de Ernst Hemingway, mas os alemães chamam os ingleses de “completamente podres” e “degenerados”. Scott retruca, chamando os alemães de “gângsteres, arrogantes e estúpidos”. Os alemães retaliam, despedaçando os quadros de Scott. O projeto ideológico do filme é bem claro: nazismo contrastado repetidamente com democracia.

No ano seguinte, a dupla Powell / Pressburger fez outro filme de guerra, E Um Avião Não Regressou / … One of Our Aircraft is Missing. Seis aviadores britânicos caem de pára-quedas sobre o solo da Holanda e ali são socorridos pelos membros da Resistência, que os protegem dos ocupantes nazistas e os ajudam a retornar à Inglaterra. Realizado num estilo naturalista, sem nenhuma música, o filme é uma primorosa descrição da vida cotidiana sob o jugo alemão e do patriotismo do povo holandês.

Antes da história começar, a câmera apresenta cada membro da tripulação e a tarefa que lhes cabe, com o nome do ator que interpreta  tal e tal personagem, superimposto no filme: Hugh Burden, piloto e capitão da aeronave; Eric Portman, co-piloto; Hugh Williams, navegador, Emrys Jones, operador de rádio; Bernard Miles, Godfrey Tearle, artilheiros. No decorrer da trama, três mulheres corajosas têm uma participação decisiva na ajuda aos fugitivos: a professora da aldeia (Pamela Brown) que interroga impiedosamente os aviadores, desconfiada de que não são ingleses; a filha do prefeito local (Joyce Redman), que os guia na fuga; e a falsa simpatizante dos alemães (Googie Withers), que esconde os aviadores na sua casa no pequeno porto, até que possam escapar à noite.

O tema da integridade do grupo, do trabalho em conjunto, é enfatizado em várias cenas como, por exemplo, quando, quase no final do filme, o membro mais idoso da tripulação é alvejado e fica gravemente ferido. A essa altura da narrativa, deixá-lo para trás é simplesmente impensável: “Não podemos fazer isto”, diz um dos seus colegas, “Nós somos uma só equipe”.

A atenção de Powell para o detalhe contribui muito em termos de autenticidade. Os artilheiros se arrastando pela fuselagem para alcançar suas posições e a dificuldade dos homens para pular de pára-quedas no avião atingido, mostram o perigo e a excitação de voar em tempo de guerra.

Foi na ocasião da filmagem de E Um Avião Não Regressou, que Powell e Pressburger formaram sua própria companhia de produção, The Archers, e a sua “verdadeira parceria” começou, sucedendo-se 13 filmes. Neles, repartindo os encargos de direção e roteiro, os dois deram provas eloquentes de uma inventividade constante e poderosa expressão criadora.

The Archers e outras companhias produtoras independentes – Cineguild (David Lean, Anthony Havelock-Allan, Ronald Neame, John Bryan), Individual Pictures (Launder e Gilliat), Wessex Films (Ian Dalrymple) – eram financiadas pela Rank Organization, através de um consórcio, Independent Producer. A liberdade que J. Arthur Rank dava aos seus realizadores, foi responsável pelo enorme prestígio obtido pelo Cinema Inglês até a extinção do consórcio em 1948.

Em 1943, The Archers produziu The Silver Fleet (Dir: Vernon C. Sewell e Gordon Wellesley), mais uma celebração da resistência holandesa com Ralph Richardson, Goggie Withers e Esmond Knight nos papéis principais. Powell e Pressburger foram apenas produtores. Eles voltariam a atuar novamente juntos na direção e roteiro no filme The Life and Death of Colonel Blimp, inaugurando um período artisticamente fértil, que vai de 1943 a 1951.

Inspirado num personagem simbólico do caricaturista político David Low, o filme é uma sátira amável e sentimental, relatando a vida e a carreira de Clive Candy (Roger Livesey, depois de cogitado Laurence Olivier), protótipo do militar reacionário e ranzinza, sua cavalheiresca rivalidade com um oficial prussiano, Theo Kretschmar-Schuldorff (Anton Walbrook) e a sua procura do ideal feminino, ao longo dos anos, através de três mulheres – Edith / Barbara / “Johnny” (Deborah Kerr, em papel triplo em substituição a Wendy Hiller que ficou grávida e não pôde fazer o papel), estranhamente parecidas.

Certo de que o filme prejudicaria a moral do exército em tempo de guerra, pois além de ridicularizar um antiquado “soldado cavalheiro”, ele mostrava um alemão simpático, o Primeiro-Ministro Winston Churchill, tentou interromper a produção e, depois, impedir a sua exportação. No entanto, sua originalidade na estrutura narrativa; elegância formal (fotografia em Technicolor de Georges Périnal; direção de arte de Alfred Junge, iniciando proveitosa colaboração com Powell-Pressburger); e o brilhante desempenho do trio principal de atores, foram reconhecidos pelos críticos. Pressburger, sempre o considerou como o seu filme preferido.

Após The Volunteer / 1943, filme de recrutamento de 46 minutos, com Ralph Richardson no papel dele mesmo, contando como seu camareiro de teatro se tornou um bravo aviador, Powell e Pressburger ofereceram ao público um espetáculo curioso, A Canterbury Tale / 1944.

Três viajantes, o soldado americano Bob Johnson (John Sweet), que na vida civil era carpinteiro numa cidade dp Oregon; Alison Smith (Sheila Sim), a jovem mobilizada para assumir o trabalho de fazendeiros que foram convocados para a frente de batalha (Sheila Sim); e o soldado inglês Peter Gibbs (Dennis Price) que, antes de se alistar, exercia o emprego de organista de cinema, chegam à aldeia de Chillingbourne perto de Canterbury, efetivamente governada pelo magistrado local, Thomas Colpeper (Eric Portman).

Cada um dos jovens havia sofrido alguma espécie de perda. O noivo de Allison foi dado como desaparecido em combate, a namorada de Bob parou de escrever cartas para ele e Peter teve que abandonar as ambições musicais de sua juventude. Allison torna-se a vítima mais recente do “Homem da Cola”, que ataca moças jogando cola nos seus cabelos. Ao que tudo indica, Colpeper e o “Homem da Cola” são a mesma pessoa e ficamos sabendo porque ele pratica esses atos de agressão. Colpeper ensina história para os soldados estacionados nas imediações e tem receio de que as moças desviem a atenção dos rapazes, impedindo-os de apreciar suas aulas sobre o significado da Inglaterra rural, seus valores espirituais e as suas tradições, que devem ser defendidas.

Inspirado na obra de Chaucer do século quatorze, o filme é estruturado em torno da idéia da peregrinação dos três jovens a Canterbury para receber uma Graça divina. Através da intervenção sobrenatural de Colpeper, cada qual recebe a sua benção. Por exemplo, o organista realiza seu desejo de tocar música séria na Catedral de Canterbury. A cena em que Peter executa no grande órgão da catedral “Onward Christian Soldiers” na cerimônia de despedida de seu regimento e o som dos sinos abafa o hino, encerra a estranha narrativa.

Na época de seu lançamento, os críticos elogiaram a esplêndida fotografia da paisagem campestre, captada pelas lentes de Erwin Hiller, mas o espetáculo não foi bem compreendido. Somente 33 anos mais tarde, na retrospectiva Powell-Pressburger, organizada pelo British Film Institute em 1977, A Canterbury Tale foi reconhecido como um dos filmes mais originais, iconoclásticos e divertidos do Cinema Inglês.

Simples e lírico, I Know Where I’m Going / 1945 defende a tese, sempre válida, de que  amor  e paixão importam mais do que riqueza e status.

Joan Webster (Wendy Hilller), sabe para onde está indo. Ela sempre soube, desde que, ainda bebê, rastejava pelo assoalho. Agora, pensando na sua segurança, vai se casar com seu patrão, um rico industrial, viúvo, e com idade para ser seu pai. Joan parte para a remota  ilha de Kiloran, no norte da Escócia, onde o casamento vai se realizar. Durante a viagem, uma tempestade a impede de chegar ao seu destino e ela fica numa comunidade de pescadores nas proximidades. O ambiente, os costumes, os moradores do local e, sobretudo, o encontro com um jovem proprietário de terras arruinado Torquil MacNeil (Roger Livesey), sobre o qual pesa uma maldição de família, mudam os planos da jovem.

Mais importante do que os detalhes da intriga é a humanidade, os personagens cuidadosamente retratados, o amor pelo mar, pela terra e um modo de vida, e a grande beleza visual, mais uma vez providenciada por Erwin Hiller. Este talentosíssimo cinegrafista capta admiravelmente, com seu estilo Expressionista – que pode ser rastreado desde o seu começo de carreira na Alemanha – cada nuança da tormenta que se aproxima, da neblina matinal, da luz do sol batendo nas montanhas e as silhuetas rígidas dos homens contrastadas com a bruma ou as ondas agitadas do mar.

Com esse encantamento plástico e sua bela mensagem, I Know Where I’m Going é uma pérola preciosa na filmografia de Powell-Pressburger.

Feito sob encomenda do Ministério da Informação, para revitalizar as relações anglo-americanas, deterioradas no final da guerra, Neste Mundo e no Outro / A Matter of Life and Death / 1945 é outro filme estranho e invulgar da dupla Powell-Pressburger.]

O piloto da R.A.F., Peter David Carter (David Niven), num bombardeiro em chamas, grita pelo rádio suas últimas palavras de aflição e June (Kim Hunter), uma jovem americana do Corpo Militar Feminino, as ouve. Salvo miraculosamente, Peter encontra June, e os dois se apaixonam: mas, vítima de alucinações, ele tem que ser operado no cérebro. Entrementes, no Outro Mundo, as coisas se agitam. O piloto deveria ter morrido, não fosse uma falha do mensageiro encarregado de conduzi-lo ao Paraíso. Diante disso, o condutor n° 71 (Marius Goring), aristocrata francês guilhotinado no tempo da Revolução Francesa, é enviado à Terra para perto do ferido. Durante a cirurgia, Peter comparece diante de um tribunal celeste onde, por causa de seu amor por June, será acusado por Abraham Farlan (Raymond Massey) e defendido pelo seu médico Dr. Frank Reeves (Roger Livesey), que falecera. Na realidade, tudo se passa no espírito de Carter, que luta para sobreviver – uma visão subjetiva de um pesadelo.

Fantasia filosófica ou, como o descrevem seus autores, “brincadeira estratosférica”, com engenhosas invenções de mise-en-scène (os dois planos da ação, a Terra e o Céu, diferençados pela utilização da cor – as cenas terrestres em Technicolor e as celestes em camafeu azulado por um tratamento monocromático); câmera no lugar do olho do piloto na sala de operação e a mancha polimorfa para mostrar os efeitos da anestesia; congelamento da imagem no jogo de pingue-pongue; filme andando de trás para frente; fusões inesperadas; escadaria surrealista e espalhafatosa para o Paraíso; e alguns instantes pitorescos (o rádio trazendo o foxtrote para o ambiente), poéticos (a lágrima de June recolhida numa flor, para servir de prova diante do júri do Além; e satíricos (alusões à Inglaterra e aos Estados Unidos, aos seus costumes e à sua mentalidade), construídos com o auxílio de uma equipe homogênea, na qual se destacam Jack Cardiff (fotografia), Alfred Junge (direção de arte), Allan Gray (música) e Hein Heckroth (figurinos) – o filme fascina e diverte. Era o favorito de Michael Powell.

Com um argumento absorvente, baseado num romance de Rumer Godden, Narciso Negro / Black Narcisus / 1947 é a obra mais impressionante de Powell / Pressburger, sob o aspecto pictórico.

Um grupo de freiras, comandado pela irmã Clodagh (Deborah Kerr) é encarregado de instalar uma escola e um hospital no pico de uma montanha do Himalaia, no palácio Mopu – sede de um antigo harém – que lhes fôra doado pelo General local, Toda Raí (Esmond Knight). Apesar da ajuda do agente britânico local, Mr. Dean (David Farrar), logo surgem as dificuldades. O vento, a natureza, o ambiente exótico e sensual – a linda indiana Kanchi (Jean Simmons) cortejada pelo jovem Rai (Sabu), sobrinho do General – influem irresistivelmente sobre o comportamento das freiras. Após a morte de uma delas – a histérica irmã Ruth (Kathleen Byron), que manifestara um desejo obsessivo por Mr. Dean e, rejeitada, tentara matar, por ciúme, a madre superiora, as religiosas deixam o lugar, admitindo o fracasso da missão.

Disciplinando com segurança o trabalho dos técnicos – Oscar para Jack Cardiff (fotografia em cores) e Alfred Junge (direção de arte em cores) – Powell dotou esse drama psicológico sobre o velho conflito entre o sagrado e o profano de um esplendor visual empolgante e criou cenas de notável intuição cinematográfica. Assim é, por exemplo, o longo episódio do desvario da irmã Ruth, quase sem diálogos; a tentativa de matar a irmã Clodagh na torre do sino e a queda de seu corpo na folhagem, assustando os pássaros;  o desenlace, com os pingos de chuva caindo sobre as enormes folhas verdes e, pouco a pouco, aumentando de intensidade, enquanto a pequena caravana de religiosas desce a encosta, fugindo daquela atmosfera inadequada para seu objetivo.

O cenário indiano foi todo recriado nos jardins subtropicais de Leonardslee em Horsham, West Sussex e no estúdio de Pinewood. Powell achava que, neste filme, a atmosfera era tudo e ele e sua equipe técnica tinham que controlá-la inteiramente. Vento, altitude, a beleza do cenário – tudo tinha que estar sob rígido controle. Os cenários básicos – o templo / convento de Mopu e a aldeia nativa debaixo dele – foram construídos em tamanho natural, com o panorama dos vales e montanhas pintados em telas e depois fotografado por trás dos atores por meio de transparências.

Estrondoso sucesso de público e de crítica, Os Sapatinhos Vermelhos / The Red Shoes / 1948 havia sido planejado antes da guerra, quando Pressburger escreveu um roteiro a pedido de Alexander Korda com vistas ao aproveitamento de sua esposa, a atriz Merle Oberon. Arquivado o projeto, dez anos depois, Powell e Pressburger adquiriram os direitos de filmagem e resolveram reativar o projeto, usando o balé para criar uma alegoria sobre a incompatibilidade entre “vida” e “arte”.

Uma jovem bailarina ambiciosa, Victoria Page (Moira Shearer), entra para uma companhia de balé internacionalmente famosa, colocando-se sob as ordens do tirânico diretor artístico, Boris Lermontov (Anton Walbrook). Lermontov dá ao jovem compositor Julian Craster (Marius Goring) a chance de compor a música para um novo balé e oferece a Vicky o papel principal, a fim de impulsionar sua carreira. Mas quando Vicky e Julian se apaixonam e se casam, Lermontov despede Julian por deslealdade. Vicky tem que escolher entre o homem que ama e a dança – que é o seu sangue vital.

A vida imita a arte e os sapatinhos vermelhos, que não deixam a bailarina parar de dançar, espelham os conflitos interiores da bailarina e, finalmente, a sua morte. Livremente transposto de um conto de Hans Christian Andersen, o tema se renova e ganha formas insuspeitadas nesse filme revolucionário, que conjuga música, balé e cinema com alto poder de síntese e percepção fílmica.

Graças à coesão e brilhantismo de todos os setores técnicos – música, Brian Easdale; direção de arte em cores / decoração, Hein Heckroth / Arthur Lawson; fotografia, Jack Cardiff; coreografia, Robert Helpmann, as duas primeiras categorias premiadas com o Oscar -, o fantástico se une ao real num turbilhão de cores, simbolicamente aproveitadas e a paixão dos artistas por sua arte passa num clima mágico para os espectadores.

Pouco antes de Os Sapatinhos Vermelhos, Powell e Pressbuger, através de sua companhia The Archers, produziram O Fim do Rio / The End of the River / 1947, dirigido por Derek Twist com Sabu, Bibi Ferreira e Esmond Knight na frente do elenco. Era a clássica história da vida de um homem transcorrendo em sintonia com o curso do rio, no caso, o Amazonas. A nossa Bibi fazia o papel de Teresa, a mulher de Sabu no filme (em uma cena ela canta com muita graciosidade “Trepa no Coqueiro”) e Esmond Knight interpretava o vilão. Powell disse que Derek (que fôra seu montador em The Edge of the World), como diretor, fez um filme chato, embora fôsse difícil fazer um filme chato, tendo como pano de fundo o rio Amazonas.

Rodado inteiramente em preto e branco, The Small Back Room / 1949 gira em torno de Sammy Rice (David Farrar), cientista que trabalha num laboratório secreto em Londres durante a Segunda Guerra Mundial. Sammy está angustiado, porque acha que a pesquisa científica militar vem sendo mal conduzida. Seu arrogante patrão, R.B.Waring (Jack Hawkins) está mais interessado em vender uma nova arma ainda não testada do que na vida dos homens que terão de usá-las. Por outro lado, Sammy sofre dores intensas no seu pé artificial. Os remédios que lhe receitaram foram ineficazes, levando-o a recorrer ao álcool como analgésico. Sua namorada, Susan (Kathleen Byron) tenta libertá-lo de seu complexo de inferioridade e de seu comportamento auto-destrutivo, mas acaba rompendo com ele. Sammy é convocado pelo Capitão Stuart (Michael Gough) à Chesil Bank em Dorset, para desativar duas bombas, colocadas pelos nazistas como armadilhas, que não haviam explodido. Stuart tenta desativar a primeira bomba e é morto. Sammy consegue desativar a segunda. Após este ato de bravura, ele recobra a confiança em si mesmo e o amor de Susan.

Estudo psicológico de um homem em crise, narrado num estilo visual dominado por sombras e interiores claustrofóbicos, o filme tem um clima noir de pesadelo e paranóia, não faltando um delírio expressionista do herói, quando Sammy vê a garrafa de uísque aumentar de tamanho e, contorcido pelo medo, imagina que está sendo atacado por ela. O ambiente sombrio se alterna com cenários naturais desolados como aquela praia pedregosa onde Sammy, após alguns minutos de profundo suspense, consegue desativar a bomba, forjando um clímax primoroso.

The Small Back Room marcou o retorno de Powell e Pressburger para o seu antigo produtor, Alexander Korda, e o abandono do logo The Archers, que foi substituído pela frase “A Michael Powell and Emeric Pressburger Production”.

Entusiasmado com Narciso Negro e Os Sapatinhos Vermelhos, David O. Selznick quis que Powell e Pressburger trabalhassem para ele num filme com sua futura esposa, Jennifer Jones, e acertou com Korda a co-produção de Coração Indômito / Gone to Earth / 1950.   Entretanto, Selznick desentendeu-se com o diretor e emergiram em certo sentido, dois filmes: a versão original de Powell e a americana (intitulada The Wild Heart), parcialmente refilmada por Rouben Mamoulian e com uma introdução narrada por Joseph Cotten.

A jovem Hazel Woodus (Jennifer Jones) é uma “filha da natureza”, que vive em Shropshire no final do século dezenove, na companhia do pai (Esmond Knight), um cego tocador de harpa, e obcecada pelas superstições folclóricas de sua falecida mãe. Ela deixa-se seduzir por Jack Reddin (David Farrar), o dono das terras, após ter casado com o pastor, Edward Marston (Cyril Cusack). No desfecho, depois de ter sido difamada na aldeia, Hazel morre num acidente durante uma caçada, ao tentar salvar uma raposa de estimação.

Este melodrama, impregnado de um lirismo sereno, funciona bem com o apoio da magnífica fotografia em cores de Christopher Challis, doravante o colaborador mais assíduo de Powell. Challis capta com sensibilidade os vales e os ventos de Dropshire, verdadeiros personagens ao lado da heroína, interpretada por Jennifer Jones com muita convicção.

Powell classifica As Aventuras do Pimpinela Escarlate / The Elusive Pimpernel / 1950 como um “desastre”, provavelmente porque envolveu a interferência de Samuel Goldwyn, co-produtor junto com Korda. O diretor já não desejava fazer o filme por se tratar de uma refilmagem e, ao aceitar o encargo, pretendeu, em vão, transformar o romance da Baronesa D’Orczy num musical. Todavia, o resultado, data venia, não foi ruim. O filme tem mais dinamismo do que a versão de 1935 com Leslie Howard, boa utilização do Technicolor (numa cena, um personagem espirra numa caixinha de rapé aberta e a tela se enche de manchas coloridas), cenários quase sempre suntuosos (Hein Heckroth), contando ainda com um elenco irrepreensível: David Niven (Sir Percy Blakeney), Margaret Leighton (Lady Marguerite Blakeney), Cyril Cusack (Chauvelin), Jack Hawkins (Prince of Wales).

Baseado na ópera de Offenbach, Os Contos de Hoffmann / The Tales of Hoffmann / 1951 usa os mesmos bailarinos – Moira Shearer, Robert Helpmann, Ludmilla Tcherina, Leonide Massine – de Os Sapatinhos Vermelhos.

Numa taverna, Hoffmann (Robert Rousenville) narra aos estudantes três aventuras passadas, nas quais perdeu a mulher amada: a boneca Olympia (Moira Shearer), a cortesã Giuletta (Ludmilla Tcherina) e a tísica Antonia (Ann Ayars). A mesma desventura se repetirá com Stella (Moira Shearer), a bailarina por quem está atualmente apaixonado.

Para compor esses episódios (o de Antonia não veio na cópia exibida no Brasil), com as vozes dos bailarinos dubladas por verdadeiros cantores de ópera, Powell não teve tanta inspiração cinematográfica, mas imprimiu-lhes sofisticação e excentricidade, obtendo resultados assombrosos na direção de arte (Hein Heckroth) e na fotografia em cores (Christopher Challis). Numa reavaliação, alguém considerou o filme, “um casamento fantasmagórico entre o cinema e opera”.

O filme – que arrancou um elogio de Josef Von Sternberg (“É difícil esquecer o trabalho de câmera e os efeitos de Os Contos de Hoffmann”) – ganhou um prêmio no Festival de Cannes.

Depois de Os Contos de Hoffmann, Powell fez, sozinho, The Sorcerer’s Apprentice / 1955, um curta-metragem para a Fox, promovendo o CinemaScope  e, em seguida, ele e Pressburger realizaram mais três filmes convencionais, mas equilibrados: Oh … Rosalinda!! / 1955 (transposição da opereta Die Fledermaus de Johann Strauss para a Viena do após guerra com Anthony Quayle, Anton Walbrook, Dennis Price, Ludmilla Tcherina, Michael Redgrave, Mel Ferrer); A Batalha do Rio de Prata / The Battle of the River Plate / 1956 ( episódio do encouraçado alemão Graf Spee durante a Segunda Guerra Mundial com Peter Finch, Anthony Quayle, John Gregson, Ian Hunter, Bernad Lee); e Perigo nas Sombras / Ill Met by Moonlight / 1957 (seqüestro de um oficial alemão (Marius Goring) na Ilha de Creta por oficiais britânicos (Dirk Bogarde, David Oxley) e resistentes gregos)

Separado de Pressburger e sonhando talvez com o sucesso de Os Sapatinhos Vermelhos, Powell filmou, em co-produção com a Suevia Films-Cesário Gonsalez, Luna de Miel / Honeymoon / 1959, abordando um tema parecido. O filme não foi exibido no Brasil.

No curso de uma viagem de lua-de-mel na Espanha, uma célebre bailarina, Anna (Ludmilla Tcherina), sacrifica sua vocação, para salvar seu casamento com Kit (Anthony Steel), um professor australiano. Este fio condutor permite a apresentação de belas vistas turísticas e alguns balés, dois deles – El Amor Brujo de Manuel de Falla e Los Amantes de Teruel de Mikis Theodorakis – com muitos figurantes e impecáveis execuções por parte de Ludmilla e dos bailarinos espanhóis Antonio e Rosita Segovia. A produção recebeu um prêmio no Festival de Cannes.

Em 1960, quando nada mais se esperava dele, Powell surpreendeu com A Tortura do Medo / Peeping Tom, filme insólito e moderno, atacado na época do lançamento como revoltante e mórbido e hoje venerado como um culto.

No excelente roteiro freudiano de Leo Marks, um assistente de câmera que trabalha numa pequena produtora de filmes e também como fotógrafo de uma agência de notícias, Mark Lewis (Carl Bohm), traumatizado pelo pai (Michael Powel), que se servia dele quando menino para experiências psicológicas de resistência ao medo, torna-se um maníaco homicida e usa o próprio instrumento de trabalho, a câmera (ou, mais específicamente, a ponta afiada de uma das pernas do seu tripé), para assassinar mulheres, filmando ao mesmo tempo a expressão de terror estampada em seus rostos no momento do crime. Uma das mulheres assassinadas era uma figurante, Vivian (Moira Shearer), que ele atraiu à noite para o estúdio. Mark faz amizade com a inquilina de uma moradora de seu prédio, Helen (Anna Massey) e esta, colocando em funcionamento o projetor do psicopata, acaba descobrindo o seu segredo. A polícia chega a tempo de impedir mais uma morte e Mark se suicida, registrando a própria agonia, tal como fazia com as suas vítimas.

Powell reflete sobre as relações entre o voyeurismo, a perversão e o ato de fazer cinema, identificando-se com o protagonista e se compadecendo dele. Powell declarou: “Filme de horror? Não. Filme de compaixão…Um filme muito terno, quase romântico”. Mark é uma eterna vítima, cujos crimes são gritos de raiva contra seu pai e sua madrasta e, ao mesmo tempo, um ensaio patético para a sua morte.

A tensão é habilmente mantida em todo o desenvolvimento da intriga e por uma cor sombria de tonalidades que demonstram uma preocupação de originalidade. As cenas de terror são breves e a angústia latente provém mais do ambiente geral do filme, o que é, a nosso ver, uma qualidade. A fotografia esplêndida de Otto Haller, a expressiva partitura de Brian Easdale e o uso versátil do som dão uma força incontestável às elocubrações do cineasta.

Na era do vídeo, e depois do dvd, os filmes de Michael Powell continuam a serem vistos e apreciados, tendo passado pelo grande teste, que é o teste do tempo.

UMA TRADIÇÃO DE QUALIDADE

novembro 19, 2010

No meu livro, Uma Tradição de Qualidade – Cinema Clássico Francês, examino a obra dos grandes diretores e os principais filmes do cinema francês clássico (1930-1959), que legou uma herança de excelentes espetáculos populares e realizações duradouras para a cultura cinematográfica.

Em linguagem acessível, faço um resumo da situação da indústria de cinema francesa até os primeiros tempos do cinema sonoro e abordo temas como o cinema da Frente Popular, da Ocupação e do pós-guerra até o advento da Nouvelle Vague, destacando a participação de René Clair, Marcel Pagnol, Jacques Feyder, Jean Renoir, Marcel Carné, Julien Duvivier, Henri-Georges Clouzot, Christian-Jaque, Jean Grémillon, Jean Cocteau, Jacques Becker, Robert Bresson entre outros realizadores.

O presente trabalho é também uma obra de referência com sinopses e fichas técnicas complementadas por comentários de 150 filmes, contendo ainda 36 fotos de algumas realizações importantes do período.

O livro pode ser encontrado principalmente na Livraria Carga Nobre na PUC-Rio e na Contraponto Editora  (site: www.contrapontoeditora.com.br).

AS SÉRIES POLICIAIS AMERICANAS DOS ANOS 30/40

novembro 16, 2010

Graças à novidade dos filmes falados, a indústria cinematográfica americana resistiu um pouco à crise econômica de 1929, mas logo começou a sofrer o seu impacto e, em 1933, a situação se agravou.

Neste ano, havia cerca de 11 milhões de desempregados nos EUA. Quase um terço dos cinemas foi obrigado a fechar as portas. As salas remanescentes tiveram que abaixar o preço dos ingressos, para não perderem a clientela. Algumas companhias escaparam por um triz da falência.

A fim de reconquistar o público, os estúdios de Hollywood generalizaram a prática do chamado programa duplo (double bill) que consistia na exibição de um filme de orçamento modesto (“B picture”) antes do filme principal. Os filmes “B”, por causa de sua duração mais curta, tinham enredos simples, enquadrados em determinadas fórmulas e, muitas vezes, constituíam-se num grupo, chamado de série, cada qual contando uma história diferente, porém conservando sempre os mesmos personagens centrais e a ambientação geral. Mas convém esclarecer que, às vezes, uma série poderia ser constituída de filmes classe “A” como, por exemplo, a série The Thin Man.

As séries (series), distintas dos seriados (serials), dos curtas-metragens (shorts) e das continuações (sequels) abrangiam os mais variados gêneros e, às vezes, alguns atores ou atrizes chegaram a dar, aos filmes em que participaram, o caráter de “personality series” como ocorreu com alguns cowboys (vg. Roy Rogers, Charles Starrett, o Durango Kid); comediantes (vg. Judy Canova, ZaSu Pitts-Slim Summerville, Wheeler e Woolsey, Olsen e Johnson, Joe E. Brown); astros infanto-juvenís (vg. Frankie Darro, Jane Withers, Jackie Moran-Marcia Mae Jones), o mesmo ocorrendo com um produtor (Val Lewton) e um novelista (Mignon Eberhart).

Neste artigo abordaremos – em forma de dicionário – apenas as séries policiais do cinema, deixando para uma próxima oportunidade as pertencentes a outros gêneros.

BIG TOWN – Produzida pela dupla William H. Pine – William C. Thomas na Paramount e interpretada por Philip Reed e Hillary Brooks nos papéis principais do editor Steve Wilson e da repórter Lorelei Kilburne, empenhados em combater o crime numa grande cidade. A série foi oriunda de um programa de rádio, iniciado em 1937, primeiramente com Edward G. Robinson e Claire Trevor), que abria com a voz de um menino jornaleiro gritando:” Pegue o seu Illustrated Press!”  Em 1940, entrou Ona Munson  no lugar de Claire Trevor e, a partir de 1943,  J. Pawley substituiu Edgard G. Robinson.

Filmes: 1947 – ESCÂNDALO QUE MATA / Big Town; TRAMA SINISTRA / Big Town After Dark; AUDÁCIA DE MULHER / I Cover Big Town. 1948 – NOS LABIRINTOS DO CRIME / Big Town Scandal.

BOSTON BLACKIE – O ladrão de jóias que virou detetive amador está sempre às voltas com o Inspetor Farraday (Richard Lane) e acompanhado de seu melhor amigo “The Runt” (George E. Stone) e de um ricaço, Arthur Manleder (Lloyd Corrigan), disposto a ajudá-lo. O personagem criado em 1910 por Jack Boyle estreou no cinema mudo interpretado por Bert Lytell em dois filmes (A CENTELHA DO BEM / Boston Blackie’s Little Pal / 1918, REDENÇÃO / Blackie’s Redemption / 1919) e depois por vários outros atores – Sam de Grasse (LADRÃO DE LUVA DE PELICA / The Silk-Lined Burglar / 1919, David Powell (DIGNA DO MEU AMOR / Missing Millions / 1922), Lionel Barrymore (VOLÚPIA E OURO / The Face in the Fog / 1922), William Russell (O SUPLÍCIO DA ÁGUA / Boston Blackie / 1923), Thomas Carrigan (CAMINHOS TORTUOSOS / Crooked Alley / 1923), Forrest Stanley (OS TRÊS APACHES / Through the Dark / 1924), Raymond Glenn (A VITÓRIA DO BEM / The Return of Boston Blackie / 1927). Retomado pela Columbia em 1941, surgiram 14 filmes todos estrelados por Chester Morris, também o primeiro intérprete do programa de rádio iniciado em 1944, em cuja abertura o locutor exclamava: “Boston Blackie! Inimigo dos que fazem dele um inimigo; amigo dos que não têm amigos!”.

Filmes: 1941 – RASTRO NAS TREVAS / Meet Boston Blackie, O SEGREDO DA ESTÁTUA / Confessions of Boston Blackie. 1942 – VINGANÇA FRUSTRADA / Alias Boston Blackie, AVENTURA EM HOLLYWOOD / Boston Blackie Goes Hollywood. 1943 – AVENTURA À MEIA-NOITE / After Midnight with Boston Blackie, SENDAS TORTUOSAS / The Chance of a Lifetime. 1944 – O CASO DO DIAMANTE AZUL / One Mysterious Night. 1945 – SUSPEITA INJUSTA / Boston Blackie Booked on Suspicion, NOITE DE SURPRESAS / Boston Blackie’s Rendezvous. 1946 – A CHANTAGISTA / Close Call for Boston Blackie, O SEGREDO DE ANN DUNCAN / The Phantom Thief, MÁGICO AMADOR / Boston Blackie and the Law. 1948 – O TRIUNFO DE BOSTON BLACKIE / Trapped by Boston Blackie. 1949 – BOSTON BLACKIE NO BAIRRO CHINÊS / Boston Blackie’s Chinese Venture.

BULLDOG DRUMMOND – O Capitão Hugh “Bulldog Drummond” é um ex-oficial do exército britânico, que se tornou detetive particular. O personagem foi concebido em 1920 por Herman Cyril McNeille, que escrevia sob o pseudônimo de “Sapper”. Drummond chegou primeiramente nas telas em dois filmes britânicos, Bulldog Drummond / 1922 e Bulldog Drummond’s Third Round / 1925, interpretado respectivamente por Carlyle Blackwell e Jack Buchanan. No cinema americano, Ronald Colman assumiu as feições do detetive em Amante de Emoções / Bulldog Drummond / 1929 e A Volta de Bulldog Drummond / Bulldog Drummond Strikes Back / 1934, tendo sido indicado para o Oscar por seu desempenho no primeiro dos dois filmes. Houve outros Bulldog Drummond tanto no cinema inglês (Ralph Richardson, John Lodge, etc.) como no americano (Rod La Roque, Randell, Tom Conway, etc.) e até mesmo numa co-produção anglo-americana (Walter Pìdgeon); porém a série propriamente dita é a da Paramount com John Howard no papel principal (substituído apenas uma vez por Ray Milland). Nela atuam também: John Barrymore (e depois H.B. Warner) como o Inspetor Neilson da Scotland Yard; E.E. Clive, o fiel mordomo Tenny; Reginald Denny, o amigo Algy Longworth; Louise Campbell (em alternância com Heather Angel), a namorada de Drummond, Phyllis Clavering. No programa de rádio, que começou em 1941 com George Colouris, havia ainda um assistente, Denny (Everett Sloane) e, na apresentação, ouvia-se o som de buzinas de carros, passos lentos, tiros, a sirene da polícia e a voz do locutor dizendo: “Surgindo da névoa…surgindo da noite…para viver suas aventuras americanas…aí vem…Bulldog Drummond!”.

Filmes: 1937 – BULLDOG DRUMMOND REAPARECE / Bulldog Drummond Comes Back, A VINGANÇA DE BULLDOG DRUMMOND / Bulldog Drummond’s Revenge, A EVASÃO DE BULDOG DRUMMOND / Bulldog Drummond Escapes. 1938 – BULLDOG DRUMMOND EM PERIGO / Bulldog Drummond’s Peril, BULLDOG DRUMMOND NA ÁFRICA / Bulldog Drummond in Africa. 1939 – O TESOURO DE BULLDOG DRUMMOND / Bulldog’s Dummond Secret Police, O CASAMENTO DE BULLDOG DRUMMOND / Bulldog Drummond’s Bride, RENDE-TE BULLDOG DRUMMOND / Arrest Bulldog Drummond.

CHARLIE CHAN – Curiosamente, o detetive chinês da polícia de Honolulu, criado por Earl Derr Biggers em 1925 nunca foi interpretado por um ator daquela nacionalidade. Ele chegou ao Cinema, um ano depois, no seriado A Casa sem Chave / The House Without a Key, encarnado pelo ator japonês George Kuwa. Depois, Chan apareceu sob os traços de outro intérprete nipônico, Kamiyama Sojin e um britânico, E. L. Park, até surgir a famosa série da 20thCentury-Fox, inaugurada com os 16 filmes do sueco Warner Oland, geralmente considerados os melhores. Após a morte de Oland, em 1938, depois de testados Leo Carillo e Noah Beery, o americano do Missouri Sidney Toler assumiu o papel e fez 22 filmes que, a partir de 1944, passaram a ser realizados pela Monogram. Quando Toler faleceu em 1947, foi substituído por Roland Winters, nascido em Boston, nas seis produções derradeiras. Chinês, entretanto, era Kaye Luke, que personificou Lee Chan, o filho número um do detetive Chan em vários filmes. Já Victor Sen Yung, intérprete do filho número dois, Jimmy Chan, era americano. Outros descendentes de Chan foram interpretados por: Benson Fong, Layne Tom Jr., Frances Hoo, etc. Além dos sábios e deliciosos aforismas (“Um mau álibi é como peixe morto” – disse Charlie numa observação típica – “Não resiste ao teste do tempo”), a série mostrou, em filmes distintos, Rita Hayworth e Jon Hall quando ainda usavam os nomes de Rita Cansino e Charles Locher e os mestres do horror Boris Karloff e Bela Lugosi. No período Monogram, foi introduzida a figura do chofer negro de olhos esbugalhados, Birmingham Brown, interpretado por Manton Moreland. No rádio, Chan começou em 1952 com a voz de Walter Connoly (e depois Ed Begley). Biggers concebeu o personagem de Charlie Chan como uma alternativa para os estereótipos do Perigo Amarelo tipo Fu Manchu. Quando perguntaram ao ator Keye Luke o que achava da criação de Biggers, ele respondeu: “Ele era um herói chinês!”. Os filmes de Warner Oland estavam entre os maiores sucessos da Fox na época, atraindo tanto público e lucros quanto os das produções classe “A”.

Filmes: (Fase Warner Oland) 1931 – A ASTÚCIA DE CHAN / Charlie Chan Carries On, O CAMELO PRETO / The Black Camel. 1932 – A VEZ DE CHAN / Charlie’s Chan Chance. 1933 – O MAIOR CASO DE CHAN / Charlie’s Chan Greatest Case. 1934 – O MISTÉRIO DAS PÉROLAS / Charlie’s Chan Courage, CHARLIE CHAN EM LONDRES / Charlie Chan in London. 1935 – CHARLIE CHAN IN PARIS / Charlie Chan in Paris, CHARLIE CHAN NO EGITO / Charlie Chan in Egypt, CHARLIE CHAN EM SHANGHAI / Charlie Chan in Shanghai. 1936 – O SEGRÊDO DE CHARLIE CHAN / Charlie Chan’s Secret, CHARLIE CHAN NO CIRCO / Charlie Chan in the Circus, CHARLIE CHAN NO PRADO / Charlie Chan in the Race Track, CHARLIE CHAN NA OPERA / Charlie Chan at the Opera. 1937 – CHARLIE CHAN NAS OLIMPÍADAS / Charlie Chan at the Olympics, CHARLIE CHAN NA BROADWAY / Charlie Chan on Broadway, CHARLIE CHAN EM MONTE CARLO / Charlie Chan at Monte Carlo. (Fase Sidney Toler) 1938 – CHARLIE CHAN EM HONOLULU / Charlie Chan in Honolulu. 1939 – CHARLIE CHAN NO RENO / Charlie Chan in Reno, CHARLIE CHAN NA ILHA DO TESOURO / Charlie Chan at Treasure Island. CHARLIE CHAN NA CIDADE DAS TREVAS / Charlie Chan in the City of Darkness. 1940 – CHARLIE CHAN NO PANAMA / Charlie Chan in Panama, CHARLIE CHAN E O ESTRANGULADOR / Charlie Chan Murder Case, CHARLIE CHAN NO MUSEU DE CERA / Charlie Chan at the Wax Museum, UM TIRO MISTERIOSO / Murder Over New York. 1941 – MORTOS QUE MATAM / Dead Men Tell, CHARLIE CHAN NO RIO / Charlie Chan in Rio. 1942 – CASTELO NO DESERTO / Castle in the Desert. 1944 – CHARLIE CHAN NO SERVIÇO SECRETO / Charlie Chan in the Secret Service, CHARLIE CHAN EM “O GATO CHINÊS” / The Chinese Cat, CHARLIE CHAN NA MACUMBA / Black Magic. 1945 – A MÁSCARA VERDE / The Jade Mask, O MISTÉRIO DO RÁDIO / The Scarlet Clue, A COBRA DE SHANGHAI / The Shanghai Cobra, CHARLIE CHAN NO MÉXICO / The Red Dragon. 1946 – AS LUVAS JUSTICEIRAS / Dark Alibi, CHARLIE CHAN NO BAIRRO CHINÊS / Shadows Over Chinatown, DINHEIRO SINISTRO / Dangerous Money. 1947 – O SEGREDO DA CAIXA / The Trap, (Fase Roland Winters) O ANEL CHINÊS / The Chinese Ring. 1948 – O RÁDIO DA MORTE / The Docks of New Orleans, CRIME POR ALFABETO / The Shanghai Chest, O OLHO DE OURO / The Golden Eye, CHARLIE CHAN E O TESOURO AZTECA / The Feathered Serpent. 1949 – O VÕO DA MORTE / The Sky Dragon.

CRIME CLUB – No final dos anos 30, a Universal adquiriu da editôra Doubleday os direitos de filmagem das histórias de mistério, publicadas na coleção Doubleday Crime Club e deixou à produção a cargo de Irving Starr (Crime Club Productions). Três histórias – O Caso Westland, Aventura Cavalheiresca e O Último Aviso – tinham como protagonistas os detetives Bill Crane e Doc Williams, inventados por Jonathan Latimer e encarnados respectivamente por Preston Foster e Fred Jenkins. Muitos romances da coleção Crime Club foram adaptados para o rádio em 1931 no programa The Eno Crime Club, tendo sido criado um personagem especialmente para as transmissões radiofônicas: o detetive Spencer Dean, conhecido como “The Manhunter” e interpretado por Edward Reese. Dez anos depois, foi ao ar um novo programa com o personagem chamado “The Librarian” (Raymond Edward Johnson e depois Barry Thomson). O programa começava com um telefone tocando. “Alô, espero não tê-lo feito esperar. Sim, este é o Crime Club. Eu sou o bibliotecário. ‘O Assassinato aluga um Quarto?’. Sim temos esta história Crime Club para você”.

Filmes: 1937 – O CASO WESTLAND / The Westland Case. 1938 – A BONECA MISTERIOSA / The Black Doll, AVENTURA CAVALHEIRESCA / The Lady in the Morgue, PERIGO PELO RÁDIO / Danger on the Air, O ÚLTIMO AVISO / The Last Warning, The Last Express. 1939 – O CRIME DO CIRURGIÃO / Mystery of the White Room, TESTEMUNHA FORAGIDA / The Witness Vanishes.

CRIME DOCTOR – O personagem do Dr. Robert Ordway, ex-gângster que se tornou psiquiatra, infalível solucionador de casos policiais, nasceu no programa de rádio de 1940, escrito por Max Marcin, interpretado inicialmente por Ray Collins e com o prenome de Benjamin. Quase no fim de cada episódio, o locutor dizia: “O Dr. Ordway voltará exatamente daquí a 57 segundos com a solução para o caso desta noite”. A Columbia aproveitou o Dr. Ordway numa série de dez filmes com Warner Baxter, eliminando as figuras do Inspetor Ross (Walter Greaza) e do Promotor Miller (Edgar Stehli), presentes na emissão radiofônica.

Filmes: 1943 – O ORÁCULO DO CRIME / Crime Doctor, DILEMA DE MÉDICO / Crime Doctor’s Strangest Case. 1944 – SOMBRAS DA NOITE / Shadows in the Night. 1945 – MÉDICO DESTEMIDO / Crime Doctor’s Courage, O CRIME PERFEITO / Crime Doctor’s Warning. 1946 – A LUVA REVELADORA / Crime Doctor’s Man Hunt, O CASO DA AGULHA ENVENENANDA / Just Before Dawn. 1947 – MORTE EM FÉRIAS / The Millerson Case. 1948 – O ARDIL DO MÉDICO / Crime Doctor’s Gamble. 1949 – A VOZ DO MORTO / Crime Doctor’s Diary.

DEAD END KIDS – Os delinqüentes juvenís interpretados por Leo Gorcey, Huntz Hall, Billy Halop, Bobby Jordan, Bernard Punsley e Gabriel Dell fizeram tanto sucesso em Beco sem Saída / Dead End / 1937, que a Warner os colocou em mais seis melodramas criminais; porém sua carreira como o grupo Dead End Kids foi curta. Halop, Huntz, Dell e Punsley rumaram para a Universal, contratados como astros da série Little Tough Guys. Jordan e Gorcey transferiram-se para a Monogram, entrando na série East Side Kids. Depois, Huntz, Dell, David Gorcey (irmão de Leo), Benny Bartlett, Stanley Clements e Billy Benedict uniram-se a eles. Transcorrido algum tempo, a série passou a denominar-se Bowery Boys. Essas outras séries citadas descambaram para a comédia, razão pela qual deixarão de fazer parte deste dicionário.

Filmes: 1938 – NO LIMIAR DO CRIME / Crime School, ANJOS DE CARA SUJA / Angels with Dirty Faces. 1939 – TORNARAM-ME UM CRIMINOSO / They Made me a Criminal, SUCURSAL DO INFERNO / Hell’s Kitchen, OS ANJOS DE CARA LIMPA / Angels Wash Their Faces, OS ANJOS ACERTAM O PASSO / The Dead End Kids on Dress Parade.

DICK TRACY – Criado nos quadrinhos em 1931 por Chester Gould, com os mais incríveis e estranhos bandidos, o famoso detetive de rosto quadrado surgiu na tela primeiramente num quarteto de seriados da Republic – Dick Tracy, o Detetive / Dick Tracy / 1937, A Volta de Dick Tracy / Dick Tracy Returns / 1938, Novas Aventuras de Dick Tracy / Dick Tracy’s G-Men, Dick Tracy contra o Crime / Dick Tracy vs. Crime Inc. / 1941 -, interpretados por Ralph Byrd. Depois é que veio a série de quatro filmes da RKO com Morgan Conway nos dois primeiros e Byrd nos restantes, aproveitando mais os tipos grotescos dos vilões dos comics como Gruesome (Boris Karloff), Cuesome (Dick Wessell), Splitface (Mike Mazurki), etc. O programa de rádio começou em 1940 com Ned Wever emprestando a voz para Tracy. Na apresentação, o locutor dizia: “E agora…Dick Tracy!” A seguir ouvia-se o som dos sinais dde código da radiopatrulha e Tracy falava: “Aqui é Dick Tracy no caso de …Preparem-se para agir” Entrava então o ruído dos carros arrancando e o barulho das sirenes e novamente a voz de Tracy: “Vamos, homens!”, após a qual vinha a do anunciante: “Sim, é Dick Tracy. Protetor da lei e da Ordem.”

Filmes: 1945 – DICK TRACY, O AUDACIOSO / Dick Tracy. 1946 – O PUNHAL SANGRENTO / Dick Tracy vs. Cueball. 1947 – DICK TRACY EM LUTA / Dick Tracy’s Dilemma, DICK TRACY CONTRA O MONSTRO / Dick Tracy Meets Gruesome.

ELLERY QUEEN – Heterônimo usado por dois primos, Frederic Dannay e Manfred Bennington Lee (pseudônimos de Daniel Nathan e Maniord Lepofsky), para assinarem seus romances policiais e que serviu também como nome do personagem criado por eles, o escritor de histórias de mistério, filho de um inspetor de polícia, que entrava em ação, para ajudar o pai. Ou seja, Ellery Queen era um personagem que imitava os seus próprios autores. Durante muito tempo, o público acreditava que Ellery Queen seria um escritor verídico e não apenas uma heterônimo e, mais ainda, de duas pessoas.  Os romances de EQ apresentavam crimes incomuns, uma sucessão complexa de pistas e aquilo que se tornaria a parte mais famosa dos livros: “Ellery Queen’s Challenge to the Reader”, uma única página próxima do desenlace, desafiando o leitor a tentar resolver o mistério antes da leitura do restante da obra. Os dois autores eram também especialistas na pesquisa histórica do gênero policial, publicando inúmeras coleções e antologias de contos policiais Dannay e Lee criaram também a Ellery Queen’s Mystery Magazine, revista que publicou o que havia de melhor em ficção policial na época, ainda hoje considerada uma das melhores do gênero. Houve dois filmes de Ellery Queen, um produzido pela Liberty com Donald Cook (O Mistério da Capa Espanhola / The Spanish Cape Mystery / 1935) e outro pela Republic com Eddie Quillan (The Mandarin Mystery / 1937), porém a série é composta por sete filmes da Columbia, primeiramente com Ralph Bellamy até o quarto filme e depois com William Gargan. Em todos os filmes participaram a secretária de Ellery, Nikki Porter (Margaret Lindsay), criada especialmente para a série cinematográfica, o Inspetor Queen (Charley Grapewin) e o Sargento Velie (James Burke). No rádio, Ellery Queen iniciou suas aventuras em 1939, interpretado por Hugh Marlowe. Uma das atrações do espetáculo radiofônico era a presença de um convidado célebre, para tentar adivinhar a solução do mistério, antes de Ellery dar a resposta certa, uma variante do artifício usado nos livros.

Filmes: 1940 – A LINDA IMPOSTORA / Ellery Queen, Master Detective. 1941 – JÓIAS FATAIS / Ellery Queen’s Penthouse Mystery, A SOMBRA DA MORTE / Ellery Queen and the Perfect Crime, QUADRILHA DIABÓLICA / Ellery Queen and the Murder Ring. 1942 – HERDEIRA DESAPARECIDA / Close Call for Ellery Queen, ARRISCANDO COM A SORTE / Desperate Chance for Ellery Queen, CONTRABANDO DE GUERRA / Enemy Agent Meet Ellery Queen.

FALCON, THE – O personagem derivou de um conto de Michael Arlen (pseudônimo do búlgaro Dikran Kouyoumdjian) intitulado “The Gay Falcon”. A RKO fez 13 filmes: os primeiros quatro filmes, com George Sanders no papel de Gay Lawrence; nos restantes, atuou seu irmão na vida real, Tom Conway e o aristocrático detetive amador passou a se chamar Tom Lawrence. No quarto filme da série, O Irmão do Falcão, George Sanders e Tom Conway atuaram juntos como Gay e Tom. Quando Gay é ferido mortalmente, Tom promete ao irmão moribundo que vai levar adiante a sua luta contra os criminosos. Posteriormente, a Falcon Productions Inc. realizou mais três filmes com John Calvert (mudando o nome do herói para Michael Waring), distribuindo-os pela Film Classics. A série radiofônica começou em 1945 com James Meigham. O personagem do Falcão era quase uma cópia em papel-carbono do Santo (The Saint), criado por Leslie Charteris e também objeto de uma série feita pela RKO.

Filmes: 1941 – O FALCÃO ALEGRE / The Gay Falcon, UM ENCONTRO COM O FALCÃO / A Date with the Falcon. 1942 – NAS GARRAS DO FALCÃO / The Falcon Takes Over, O IRMÃO DO FALCÃO / The Falcon’s Brother. 1943 – O FALCÃO CONTRA-ATACA / The Falcon Strikes Back, O FALCÃO EM PERIGO / The Falcon in Danger, O FALCÃO E AS ESTUDANTES / The Falcon and the Co-eds. 1944 – O ANEL DA MORTE / The Falcon Out West, O MISTÉRIO DO MORTO / The Falcon in México, O FALCÃO EM HOLLYWOOD / The Falcon in Hollywood. 1945 – O FALCÃO EM SAN FRANCISCO / The Falcon in San Francisco. 1946 – O ALIBI DO FALCÃO / The Falcon’s Alibi, A AVENTURA DO FALCÃO / The Falcon’s Adventure, CARGA SINISTRA / The Devil’s Cargo. 1948 – ENCONTRO COM A MORTE / Appointment with Murder. 1949 – Search for Danger.

HANK HAYER – Detetive particular (Lynne Overman) e repórter (Roscoe Karns) se unem no combate ao crime. Produzida pela Paramount, a série, baseada nestes personagens criados por Kurt Steel, foi desativada após o segundo filme.

Filmes: 1937 – O CRIME NA UNIVERSIDADE ou MISTÉRIO NA UNIVERSIDADE / Murder Goes to College, NO MUNDO DOS ESPERTOS / Partners in Crime.

HILDEGARD WITHERS – Professora de meia idade (Edna May Oliver) que é uma detetive amadora e sempre procura resolver os casos criminais antes do Inspetor Oscar Piper (James Gleason); porém, apesar de rivais, os dois são ligados por uma genuína afeição. As marcas registradas dessa solteirona magricela são os seus chapéus pouco comuns, um guarda-chuva de algodão preto e temperamento irritadiço. Hildegard e Oscar, personagens tirados das histórias de Stuart Palmer, integram uma série de seis filmes da RKO, que vale mais pela combinação da dupla. A partir do quarto filme, Edna May Oliver foi substituída sucessivamente por Helen Broderick e ZaSu Pitts e o espetáculo perdeu muito do seu charme.

Filmes: 1932 – The Penguin Pool Murder. 1934 – SHERLOCK DE SAIAS / Murder on the Blackboard. 1935 – CRIME NA LUA-DE-MEL / Murder on a Honeymoon. 1936 – O MISTÉRIO DA FERRADURA / Murder on a Bridle Park, O ENIGMA DA PÉROLA / The Plot Thickens. 1937 – A CENA O AUTOR ou MULHER DO DELEGADO / Forty Naughty Girls.

HOOVER – Baseada no livro campeão de vendas Persons in Hiding, redigido (com a ajuda Courtney Riley Cooper), pelo célebre diretor do FBI, Edgar J. Hoover, a série, escrita por William R Lipman e Horace McCoy, compõe-se de quatro filmes sem um personagem principal fixo. Os elencos de cada filme são liderados respectivamente por: Lynne Overman, Lloyd Nolan, Robert Paige e Ralph Bellamy. O primeiro dos quatro thrillers criminais foi inspirado remotamente nas façanhas infames de Bonnie Parker e Clyde Barrow e o último descrevia a carreira de Ma Baker e seus filhos assassinos.

Filmes: 1939 – PERFUME DELATOR / Persons in Hiding, O MÉDICO CLANDESTINO / Undercover Doctor. 1940 – MERCADORES DO CRIME / Parole Fixer, MULHER DIABÓLICA / Queen of the Mob.

I LOVE A MYSTERY – Histórias de mistério originadas de um programa de rádio muito popular, no qual havia três personagens centrais – Jack Packard, Doc Long e Reggie Yorke – que começaram sendo interpretados por Michael Raffetto, Barton Yarborough e Walter Paterson em 1939. O espetáculo radiofônico relatava as aventuras de três soldados mercenários, que lutavam contra os japoneses na China. Mais tarde, eles se encontram em San Francisco, onde decidem formar uma agência de detetives. A secretária da agência, Jerry Booke, era interpretada por Gloria Blondell. Na série cinematográfica – que não passou do terceiro filme – produzida para a Columbia por Wallace MacDonald, Jim Bannon interpretava o papel de Jack, Barton Yarborough o de Doc e o personagem de Reggie foi extirpado.

Filmes: 1945 – MISTÉRIO DO ORIENTE / I Love a Mystery. 1946 – A MÁSCARA DIABÓLICA / The Devil’s Mask, TESTAMENTO MACABRO / The Unknown.

JOEL E GERDA SLOANE – Colecionador de livros raros e sua esposa e a vocação de ambos para serem detetives amadores foram vistos numa série de três filmes da MGM, cada qual interpretado por artistas diferentes (pela ordem, Melvyn Douglas / Florence Rice; Franchot Tone / Ann Sothern; Robert Montgomery / Rosalind Russell), todos com a palavra “fast” no título e personagens criados por Marco Page. Page tornar-se-ia um argumentista permanente da MGM sob o seu verdadeiro nome: Harry Kurnitz.

Filmes: 1938 – DUPLO ENIGMA / Fast Company. 1939 – UM CASAL COMO POUCOS / Fast and Furious, UM SUSTO POR MINUTO / Fast and Loose.

JOHN J. MALONE – O personagem criado pela escritora Craig Rice é um advogado – detetive de Chicago. No primeiro filme da série, Malone tem dois amigos, Helene Brand (Carole Landis), uma atraente mulher da sociedade e Jake Justus (George Murphy), um jornalista. No segundo filme, saem Helene e Justus e entram Maggie Cassidy (Claire Trevor), a secretária leal de Malone e Daniel Von Flanagan, o chefe do Departamento de Homicídios. Pat O’ Brien e Brian Donlevy fazem respectivamente os papéis de Malone. Em 1950, a MGM decidiu produzir uma nova série sobre a colaboração entre a professora Hildegard Withers e o advogado John J. Malone, como ocorria nas seis histórias curtas escritas conjuntamente por Craig Rice e Stuart Palmer. O estúdio adquiriu os direitos de duas dessas histórias e lançou a Mrs. O’Malley and Mr. Malone. O personagem do advogado John Malone foi mantido e surgiu sob as feições de James Whitmore enquanto que o da professora Hildegard Withers foi substituída por Mrs. O’ Malley, uma caipira de Montana, interpretada por Marjorie Main. Porém a nova série não teve seguimento.

Filmes: 1945 – UM CRIME MARAVILHOSO / Having Wonderful Crime. 1949 – DEUSA DO MAL / The Lucky Stiff. 1950 – O TREM DAS SURPRESAS / Mrs. O’Malley .and Mr. Malone.

KITTY O’DAY – As aventuras da telefonista detetive escritas por Victor Hammond fazem parte de uma série de três filmes da Monogram, os dois primeiros com Jean Parker na protagonista, Peter Cookson como seu parceiro Johnny Jones e Tim Ryan como o Inspetor Clancy. No terceiro filme, os dois personagens centrais passam a se chamar Peggy Rooney e Danny O’Brien, interpretados respectivamente por Marjorie Weaver e Robert Lowery, permanecendo Tim Ryan como o Inspetor Clancy.

Filmes: 1944 – DETETIVE KITTY O’DAY / Detective Kitty O’Day. 1945 – AS AVENTURAS DE KITTY O’DAY / Adventures of Kitty O’ Day, Fashion Model.

LONE WOLF, THE – O personagem criado por Joseph Louis Vance, Michel Lanyard, conhecido como O Lobo Solitário, é um ex-ladrão de jóias, que deixou de furtar, para ajudar pessoas amigas metidas em encrencas policiais. Lanyard tem um mordomo fiel, Jamison, ex-batedor de carteiras na maior parte da série, interpretado por Eric Blore. O Lobo Solitário já estava na tela desde o cinema mudo encarnado por Bert Lytell em cinco filmes (O Lobo Solitário / The Lone Wolf / 1917, A Volta do Lobo Solitário / The Lone Wolf Returns / 1926, O Lobo Solitário / Alias the Lone Wolf, A Atração do Alheio / The Lone Wolf’s Daughter / 1929, Lágrimas de Rainha / The Last of the Lone Wolf / 1930), Henry B. Walthall (Caras Falsas / The False Faces / 1919 e Jack Holt (O Lobo Social / The Lone Wolf). Na fase sonora, foi revivido por Melvyn Douglas (A Volta do Lobo Solitário / The Lone Wolf Returns / 1935 e Francis Lederer (As Jóias da Coroa / The Lone Wolf in Paris / 1938. Finalmente, em 1939, surgiu a série da Columbia com nove filmes estrelados por Warren William até 1943. Em 1946, a série voltou, desta vez com Gerald Mohr em três filmes e  Ron Randell em um .

Filmes: 1939 – ALIBI NUPCIAL / The Lone Wolf Spy Hunt, PÉROLAS FATÍDICAS / The Lone Wolf Strikes. 1941 – NOIVA DA FATALIDADE / The Lone Wolf Meets a Lady. 1941 – AS JÓIAS DO IMPERADOR / Secrets of the Lone Wolf, O LOBO ENTRE LOBOS / The Lone Wolf Keeps a Date, O LOBO SE ARRISCA / The Lone Wolf Takes a Chance. 1942 – DAMA EM PERIGO / Counter-Espionage. 1943 – UMA NOITE PERIGOSA / One Dangerous Night, PASSAPORTE PARA SUEZ / Passport to Suez. 1946 – O ROUBO DA SAFIRA INDIANA / The Notorious Lone Wolf. 1947 – O LOBO SOLITÁRIO NO MÉXICO / The Lone Wolf in México, O LOBO SOLITÁRIO EM LONDRES / The Lone Wolf in London. 1949 – NAS GARRAS DO LOBO / The Lone Wolf and His Lady.

MICHAEL SHAYNE – O personagem foi concebido em 1934 por David Dresser, usando o nome literário de Brett Halliday. Em 1940, a 20thCentury-Fox comprou os direitos de usá-lo numa série de sete filmes produzidos por Sol Wurtzel com Lloyd Nolan no papel do detetive de origem irlandesa. Somente o primeiro filme aproveitou uma história de Halliday; os demais recorreram a autores de renome como, por exemplo, Raymond Chandler, cujo romance The High Window serviu de base para Hora para Matar, um dos melhores da série. A partir de 1946, a PRC (Producers Releasing Company) passou a utilizar Shayne em mais cinco filmes produzidos por Sigmund Neufeld e interpretados por Hugh Beaumont. Michael Shayne foi ouvido pelo rádio em três programas: The Adventures of Michael Shayne (1944-47) com a voz de Wally Maher; The New Adventures of Michael Shayne (1948-50) com a voz de Jeff Chandler; e Michael Shayne Private Detective (1952-53) com a voz de Donald Curtis.

Filmes: 1940 – UM DETETIVE APAIXONADO / Michael Shayne, Private Detective. 1941 – TESTEMUNHA OCULAR / Sleeper’s West, CEIA FATAL / Dressed to Kill, DOIS TIROS SILENCIOSOS / Blue, White and Perfect. 1942 – A SEPULTURA VAZIA / The Man Who Wouldn’t Die, PUNHAL ASSASSINO / Just Off Broadway, HORA PARA MATAR / Time to Kill. 1946 – Murder is My Business, Larceny in her Heart, Blonde for a Day. 1947 – Three on a Ticket, Too Many Winners.

MR. DISTRICT ATTORNEY – O promotor público Tom F. Winton, “campeão do povo”, defensor da verdade…guardião dos nossos direitos fundamentais à vida, liberdade e à felicidade, tal como era anunciado no programa de rádio de 1939, no qual nasceu, criado por Phillips H. Lord e com a voz de Dwight West, chegou ao cinema em 1941 numa série de três filmes da Republic. Cada filme tinha um ator diferente (Stanley Ridges, Paul Harvey, Lloyd Corrigan). O promotor tinha um assistente de nome curioso, P. Cadwallader Jones, representado na tela sucessivamente por Dennis O’ Keefe, James Ellison e John Hubbard. Em 1947, o personagem foi revivido como Maurice Vaughn num filme da Columbia sob os traços de Adolphe Menjou, tendo sido mudado também o nome de seu assistente para Steve Bennett, interpretado por Dennis O’Keefe.

Filmes: 1941 – INTRIGAS DESVENDADAS / Mr. District Attorney, TESTEMUNHO DO CADÁVER / Mr. District Attorney in the Carter Case. 1943 – Secrets of the Underground. 1947 – PAIXÕES TURBULENTAS / Mr. District Attorney (nova versão).

MR. MOTO – O detective japonês Mr. Kentaro Moto, míope e mrado, mas muito eficiente ao usar uma arma e no jiu-jitsu, foi criado por John P. Marquand. Notando o sucesso de Charlie Chan, a 20thCentury-Fox adquiriu os direitos dos livros de Marquand e produziu oito filmes com Peter Lorre interpretando o detetive. No rádio, o personagem foi ao ar em 1951 na voz de James Monk. Em 1939, a Warner realizou um desenho animado, Porky’s Movie Mystery, que era uma sátira a Mr. Moto – o Gaguinho, como o detetive, acabava desmascarando o criminoso, que não era outro senão…Hugh Herbert!

Filmes: 1937 – O MISTERIOSO MR. MOTO / Think Fast, Mr. Moto, OBRIGADO MR.MOTO / Thank You, Mr. Moto. 1938 – O PALPITE DE MR. MOTO / Mr. Moto’s Gamble, MR.MOTO SE AVENTURA / Mr. Moto Takes a Chance ou Look Out Mr. Moto, A FUGA DE MR. MOTO / The Mysterious Mr. Moto. 1939 – MR. MOTO CHEGA A TEMPO / Mr. Moto’s Last Warning, MR. MOTO NA ILHA DO TERROR / Mr. Moto in Danger Island, MR. MOTO EM FÉRIAS /  Mr. Moto Takes a Vacation.

MR.WONG – Animada com o êxito de Charlie Chan e Mr. Moto na 20thCentury-Fox, a Monogram tentou repetir a façanha, realizando uma série de filmes tendo como personagem principal o detetive chinês James Lee Wong, criado por Hugh Wiley em histórias publicadas na revista Collier’s. Cinco dos seis filmes foram estrelados por Boris Karloff no papel-título e Grant Withers apareceu em todos eles como o Inspetor Sam Street. Depois que Karloff deixou a série, a Monogram fez uma tentativa para continuá-la, colocando Keye Luke no papel de um detetive bem mais moço, Jimmy Wong. Os assassinatos sempre envolviam um método de execução singular e, ocasionalmente, forçados. Os filmes tinham muitos diálogos e pouca excitação e neles a burrice do inspetor contrastava com a inteligência de Mr. Wong.

Filmers: 1938 – MR.WONG DETETIVE / Mr. Wong Detective.  1939 – O MISTERIOSO MR. WONG / The Mystery of Mr. Wong, MR.WONG NO BAIRRO CHINÊS / Mr. Wong in Chinatown. 1940 – NOITE DE TERROR / The Fatal Hour, CONDENADO À MORTE / Doomed to Die. 1941 – Phantom of Chinatown.

NANCY DREW – Edward Stratemeyer escreveu três livros de mistério sobre Nancy Drew e, após sua morte, a filha, Harriet S. Adams, sob o pseudônimo de Carolyn Keene, o substituiu, publicando mais 46 títulos, que obtiveram muito sucesso. Em 1938, a Warner produziu a série, constituída de quatro filmes, com adaptação feita por Kenneth Gamet e interpretados por Bonita Granville e Frankie Thomas, como detetives amadores adolescentes.

Filmes: 1938 – NANCY DREW: A DETETIVE / Nancy Drew, Detective. 1939 – NANCY DREW A  REPÓRTER / Nancy Drew, Reporter, NANCY DESVENDA UM CRIME /  Nancy Drew, Troubleshooter, NANCY DREW E A ESCADA SECRETA / Nancy Drew and the Hidden Staircase.

NERO WOLFE – Personagem criado por Rex Stout, o obeso gourmet e cultivador de orquídeas, solucionava seus casos no próprio domicílio. Embora fosse bastante popular entre os fãs da literatura policial, o detetive, surprendentemente, só apareceu na tela em dois filmes produzidos pela Columbia: um, interpretado por Edward Arnold; o outro, por Walter Connolly. Em ambos, Lionel Stander atuou como o assistente Archie Goodwin. O personagem surgiu no rádio em: The Adventures of Nero Wolfe (1943-1944) com a voz de J.B.Williams e depois Santos Ortega e Luis Van Rooten; The Amazong Nero Wolfe (1946) com Francis X. Bushman e The New Adventures of Nero Wolf (1951) com Sidney Geenstreet.

Filmes: 1936 – A ASTÚCIA DE NERO WOLFE / Meet Nero Wolfe. 1937 – A LIGA DOS AMEAÇADOS / The League of Frightened Men.

NICK CARTER – Inventadas por John R. Coryell em 1884, as aventuras do detetive foram depois continuadas por Frederick Van Rensselaer e outros autores. O personagem surgiu no cinema francês em 1908 na série da Éclair, Nick Carter, le Roi des Detectives, dirigida por Victorin Jasset.. No final dos anos 30, a MGM anunciou que havia comprado os direitos das histórias de Nick Carter para usá-las em filmes; porém, quando a série de três filmes começou a ser produzida em1939, todos eles foram baseados em argumentos originais. Walter Pidgeon fazia o papel do detetive e Donald Meek o do seu assistente Bartholomew, tímido e gentil criador de abelhas, espécie de Dr. Watson, injetando humor e humanidade nos espetáculos. Em 1943, o Nick Carter foi para o rádio com a voz de Lon Clark.

Filmes: 1939 – NICK CARTER, SUPERDETETIVE / Nick Carter, Master Detective. 1940 – NICK CARTER NOS TRÓPICOS / Phantom Raiders, NICK CARTER NAS NUVENS / Sky Murder.

NOVELAS DE MIGNON EBERHART – Histórias de mistério da escritora Mignon G. G. Eberhart, criadora dos personagens da enfermeira Keate e do detetive Lance O’ Leary. Foram quatro filmes com elencos diversos na frente dos quais, pela ordem, estavam: Aline MacMahon / Guy Kibbee, Jane Darwell / Sig Ruman e, nos dois últimos exemplares da série, Ann Sheridan / Dick Purcell, formando a dupla imaginada por Eberhart. O primeiro, o terceiro e o quarto filme saíram dos estúdios da 20th Century-Fox e o segundo foi produzidos pela Warner.

Filmes: 1935 – ENQUANTO A CIDADE DORME / While the City Sleeps. 1937 – Great Hospital Mystery. 1938 – A DAMA DO QUARTO NÚMERO 18 / The Patient in Room 18, A CHAVE DO MISTÉRIO / Mystery House.

PERRY MASON – O célebre personagem criado por Erle Stanley Gardner foi levado à tela pela Warner em seis filmes muito antes da conhecida série de televisão com Raymond Burr. Os quatro primeiros filmes, estrelados por Warren William, eram razoavelmente fiéis às fontes originais, mas com poucas cenas de ação, valendo mais pelas inteligentes discussões legais e pelas surpresas das tramas. No quarto e último filme, Mason se casava com a secretária Della Street, que foi sucessivamente interpretada por: Helen Trenholme, Claire Dodd, Genevieve Tobin, Claire Dodd outra vez, Junes Travis e Ann Dvorak. Nos dois derradeiros exemplares da série, o papel do advogado-detetive coube respectivamente a Ricardo Cortez e Donald Woods. O personagem de Paul Drake, o investigador particular que ajudava Mason, apareceu em alguns filmes com este nome e em outros como Spudy Drake; o promotor público Hamilton Burger só se apresentou em um filme e o Tenente Arthur Tragg, em nenhum. No rádio, Mason começou em 1943 com a voz de Bartlett Robinson, depois substituído por Santos Ortega e outros.

Filmes: 1934 – O CASO DO CÃO UIVADOR / The Case of the Howling Dog. 1935 – A NOIVA CURIOSA / The Case of the Curious Bride, O CASO DAS PERNAS BONITAS / The Case of the Lucky Legs. 1936 – GARRAS DE VELUDO / The Case of the Velvet Claws, O MISTÉRIO DO GATO PRETO / The Case of the Black Cat. 1937 – O MISTÉRIO DA DOCA / The Case of the Stuttering Bishop.

PHILO VANCE – O elegante e culto detetive amador, imaginado por S. S. Van Dine (pseudônimo de Willard Huntington Wright), começou no cinema na Paramount em O Drama de uma Noite, interpretado por William Powell enquanto E.E. Calvert fazia o papel do promotor público John F. X. Markham e Eugene Palllette o do Sargento Ernest Heath. Este ficava enciumado quando Vance resolvia os casos com brilhantes deduções científicas, porém aceitava de bom grado a sua ajuda. Um dos filmes da série The Benson Murder Case só passou no Brasil na versão espanhola El Cuerpo de Delito aquí intitulada Corpo de Delito com Ramon Pereda no lugar de William Powell. Powell fez ainda mais dois filmes na Paramount (A Casa do Crime, O Bispo Misterioso) e um terceiro (O Caso de Hilda Lake) na Warner. Porém houve vários outros filmes com o personagem, produzidos por diversas companhias e com intérpretes variados: MGM / 1930 Basil Rathbone; Warner / 1934 / Warren William; MGM / 1935 / Paul Lukas; MGM / 1936 / Edmund Lowe; Paramount / 1937 / Grant Richards; Paramount / 1939 / Warren William; Warner / 1940 / James Stephenson; PRC / 1947 / William Wright; PRC 1947 / Alan Curtis; Eagle Lion / 1947 / Alan Curtis – os títulos dos filmes vêm na filmografia nesta ordem, depois dos primeiros quatro, que são os filmes de William Powell.  A trama dos três últimos filmes da série tem pouca relação como o personagem de Philo Vance. No rádio, Jackson Beck e depois José Ferrer emprestaram suas vozes para o sofisticado investigador.

Filmes: 1929 – O DRAMA DE UMA NOITE / The Canary Murder Case. A CASA DO CRIME / The Greene Murder Case. 1930 – O Bispo Misterioso / The Bishop Murder Case, CORPO DE DELITO / The Benson Murder Case. 1933 – O CASO DE HILDA LAKE / The Kennel Murder Case. 1934 – O CRIME DO DRAGÃO / The Dragon Murder Case. 1935 – O MISTÉRIO DO CASSINO / The Casino Murder Case. 1936 – ASTÚCIA DE CRIMINOSO / The Garden Murder Case. 1937 – A Night of Mystery. 1939 – A COMÉDIA DE UM CRIME / The Gracie Allen Murder Case. 1940 – TRÊS HORAS TRÁGICAS / Calling Philo Vance. 1947 – Philo Vance Returns, Philo Vance’s Gamble, Philo Vance’s Secret Mission.

ROVING REPORTERS – Esta série, composta de apenas três filmes produzidos pela 20thCentury-Fox, apresenta um audacioso repórter, interpretado por Michael Whalen, que passa por perigosas aventuras criminais juntamente com seu fotógrafo assistente, papel representado por Chick Chandler. A séria era originariamente chamada Meridian 7-1212, que é o número de telefone da hora certa de Nova York, um título inteligente, mas que poderia confundir os espectadores do interior, razão pela qual foi mudado.

Filmes: 1938 – CONVITE AO CRIME / Time out for Murder, SOMBRAS DA NOITE / While New York Sleeps, Inside Story.

SAINT, THE – A série propriamente dita do personagem criado por Leslie Charteris (Leslie Charles Bower Lin) foi a da RKO, iniciada e terminada com Louis Hayward no papel do galante detetive Simon Templar, mas com George Sanders identificando-se mais com o herói em cinco filmes intermediários.Em 1941, Hugh Sinclair estrelou dois filmes da série, porém um deles (O Santo Enfrenta o Tigre) não chegou a ser lançado pela RKO – foi vendido para a Republic, que o exibiu em 1943. No rádio, a partir de 1944, Templar recebeu as vozes de Edgar Barrier, Brian Aherne, Vincent Price, Tom Conway e Barry Sullivan. Uma das características do Santo, além do seu cartão de visita original, era a melodia que ele assobiava, geralmente ouvida durante a projeção dos créditos do filme e a introdução de suas aventuras radiofônicas.

Filmes: 1938 – O SANTO EM NOVA YORK / The Saint in Nova York. 1939 – A VOLTA DO SANTO / The Saint Strikes Back, O SANTO EM LONDRES / The Saint in London. 1940 – O SANTO E SEU SÓSIA / The Saint’s Double Trouble, O SANTO E A MULHER / The Saint Takes Over. 1941. O SANTO NO BALNEÁRIO / The Saint in Palm Spings, AS FÉRIAS DO SANTO (TV) / The Saint’s Vacation. 1943 – O SANTO ENCONTRA O TIGRE / The Saint Meets the Tiger. 1955 – O SANTO NO CASTELO SINISTRO / The Saint’s Girl Friday.

SHADOW, THE – O personagem evoluiu de um programa de rádio de 1930, chamado The Detective Story Magazine Hour, no qual havia um narrador conhecido como O Sombra, para as páginas da The Shadow Magazine, cujas histórias eram escritas por Walter B. Gibson. O primeiro número da revista pulp, publicado em abril de 1931, vendeu imediatamente todos os exemplares e a criação de um detetive, O Sombra, foi um sucesso. Em 1937, foi ao outro programa radiofônico, desta vez com a voz de Orson Welles, a introdução da personagem Margo Lane e o estabelecimento do jovem rico e elegante Lamont Cranston como a identidade secreta do Sombra, um detalhe deixado propositadamente vago nos enredos da revista. O novo espetáculo radiofônico deu também ao personagem o poder da invisibilidade – “a fim de obscurecer as mentes dos homens, para que eles não possam vê-lo”. Após este programa de rádio, surgiu uma história em quadrinhos sobre o Sombra, desenhada por Vernon V. Greene, que havia ilustrado revistas de mistério. Aquí no Brasil, a partir do final de 1943 às 22.05 min. das terças-feiras, a Rádio Nacional transmitia “O Sombra”, programa escrito por Herrera Filho e o herói com a voz de Saint Clair Lopes. No mesmo programa atuaram como criminosos os radio-atores Floriano Faissal, Rodolfo Mayer e outros grandes artistas do microfone. Margo, a noiva de Lamont Cranston, era Ismênia dos Santos. Ficou famosa a frase de abertura: “Quem sabe o mal que se esconde nos corações humanos? O Sombra sabe!” No cinema, surgiram dois filmes na década de trinta (Mr. Sombra / The Shadow Strikes / 1937, International Crime / 1938 ), realizados por pequenas produtoras e distribuídos pela Grand National, ambos protagonizados por Rod La Roque. Nos anos quarenta, a Monogram proporcionou a série de três filmes com Kane Richmond e Barbara Reed e houve um seriado A Sombra do Terror / The Shadow / 1940 com Victor Jory.

Filmes: 1946 – O SOMBRA RETORNA / The Shadow Returns, A MÁSCARA DO SOMBRA / Behind the Mask, A DAMA DE JADE / The Missing Lady.

SHERLOCK HOLMES – Sem dúvida o mais famoso detetive de todos os tempos, criação imortal de Arthur Conan Doyle, o personagem apareceu no cinema inúmeras vezes desde 1903 e continua fornecendo assunto para filmes das mais variadas nacionalidades. As versões americanas mais conhecidas são Sherlock Holmes / Sherlock Holmes / 1922 com John Barrymore e Sherlock Holmes / Sherlock Holmes / 1932 com Clive Brook. A série é a iniciada pela 20thCentury-Fox em 1939 e que prosseguiu na Universal, mantendo-se os dois principais intérpretes, Basil Rathbone e Nigel Bruce este, como o Dr. Watson, o também célebre auxiliar, amigo e memorialista do grande investigador de Baker Street. Os dois filmes da Fox passavam-se na época Vitoriana, procurando recriar com fidelidade o ambiente dos romances de Doyle enquanto que, nos doze filmes da Universal, houve uma atualização para os anos quarenta, alguns servindo à propaganda anti-nazista. Rathbone e Bruce ainda representaram Sherlock e Watson como convidados especiais em uma comédia da dupla Ole Olse e Chic Johnson intitulada Casa de Loucos / Crazy House / 1943. No rádio, o programa baseado nas histórias de Conan Doyle entrou no ar em 1930 com as vozes de Richard Gordon e Leigh Lovel e depois Rathbone e Bruce, entre outros, sucederam-lhes como Sherlock Holmes e Dr. Watson. Por curiosidade, um dos muitos redatores do programa de rádio era Leslie Charteris, o autor de O Santo, escrevendo sob pseudônimo.

Filmes: 1939 – O CÃO DOS BASKERVILLES / The Hound of the Baskervilles, SHERLOCK HOLMES / The Adventures of Sherlock Holmes.1942 – SHERLOCK HOLMES E A VOZ DAS TREVAS / Sherlock Holmes and the Voice of Terror, SHERLOCK HOLMES E A ARMA SECRETA / Sherlock Holmes and the Secret Weapon. 1943 – SHERLOCK HOLMES EM WASHINGTON / Sherlock Holmes in Washington, SHERLOCK HOLMES ENFRENTA A MORTE / Sherlock Holmes Faces Death. 1944 – SHERLOCK HOLMES E A MULHER ARANHA / Sherlock Holmes and the Spider Woman, A GARRA ESCARLATE / The Scarlet Clue, PÉROLA NEGRA / The Pearl of Death. 1945 – A CASA DO MEDO / The House of Fear, A MULHER DE VERDE / The Woman in Green, DESFORRA EM ARGEL / Pursuit to Algiers. 1946 -NOITE TENEBROSA / Terror by Night. MELODIA FATAL / Dressed to Kill.

SOPHIE LANG – Ladra de jóias que quer levar uma vida honesta, mas se envolve sempre em aventuras policiais. A personagem, criada por Irving Anderson, aparece em três filmes da série da Paramount, encarnada por Gertrude Michael, glamourosa atriz de certo renome nos anos 30.

Filmes: 1934 – A CÉLEBRE MISS LANG / The Notorious Sophie Lang. 1936 – A VOLTA DE SOPHIE LANG / The Return of Sophie Lang. 1937 – MISS LANG EM HOLLYWOOD / Sophie Lang Goes West.

THATCHER COLT – Comissário de polícia, personagem extraído de um romance de Anthony Abbott (pseudônimo de Fulton Oursler) que se apresentou em dois filmes da Columbia, sob a aparência física do ator Adolphe Menjou. A série não foi além do segundo filme.

Filmes: 1932 – A DAMA DO CABARÉ / Night Club Lady. 1933 – Circus Queen Murder.

THIN MAN, THE – Curiosamente, tanto a série como o personagem Nick Charles, criado pelo ilustre escritor de romances policiais Dashiell Hammett, ficaram conhecidos no Cinema, no rádio e na televisão como The Thin Man, por causa do título original do primeiro filme, que não se referia a Charles, mas sim a um indivíduo magro, que era a chave do enigma. A série misturava comédia sofisticada com policial de mistério e lançou o mais charmoso casal de detetives de Hollywood, Nick e Nora Charles, saborosamente personificados por William Powell e Myrna Loy. De 1934 a 1947, o estúdio da MGM realizou seis filmes em produção classe “A”, que tinham ainda o cãozinho Asta como atração à parte. No rádio, a dupla começou em 1941 com as vozes de Leste Damon e Claudia Morgan.

Filmes: 1934 – A CEIA DOS ACUSADOS / The Thin Man. 1936 – A COMÉDIA DOS ACUSADOS / After the Thin Man. 1939 – O HOTEL DOS ACUSADOS / Another Thin Man. 1941 – A SOMBRA DOS ACUSADOS / Shadow of the Thin Man. 1944 – O REGRESSO DAQUELE HOMEM / The Thin Man Goes Home. 1947 – A CANÇÃO DOS ACUSADOS / Song of the Thin Man.

TORCHY BLANE – Personagem inventada pelos roteiristas da Warner Brothers, embora suas aventuras fossem baseadas em histórias da coleção Black Mask, escritas nos anos 30 por Frederick Nebel. Nebel havia imaginado um jornalista chamado Kennedy, que se imiscuía nos casos policiais do tenente de polícia Steve McBride. No Cinema, Kennedy foi transformado na repórter Torchy Blane, que os publicistas do estúdio anunciavam como “O Perigo de Cabelos Louros”. Garota corajosa e de língua solta, ela era sempre a primeira a chegar ao local do crime e a descobrir o assassino e levá-lo para polícia. Os nove filmes da série da Warner foram muito populares, especialmente os sete interpretados por Glenda Farrell e Barton, que tiveram ainda no elenco Tom Kennedy como o Sargento Gahagan, responsável pelos lances cômicos introduzidos nas tramas de mistério. Em Quando nos Casamos e Torchy Blane Brinca com Fogo, os personagens de Torchy e McBride foram interpretados respectivamente por Lola Lane / Paul Kelly e Jane Wyman / Allen Jenkins.

Filmes: 1936 – UMA LOURA SABIDA / Smart Blonde. 1937 – CAÇADA AÉREA / Fly-Away Baby, LOURA DO OUTRO MUNDO / The Adventurous Blonde. 1938 – FLERTANDO COM O PERIGO / Blondes at Work, QUANDO NOS CASAMOS / Torchy Blane in Panamá, CAÇANDO UM HOMEM / Torchy Gets Her Man. 1939 – VENDO A CHINA / Torchy Blane in Chinatown, Torchy Runs for Mayor, TORCHY BRINCA COM FOGO / Torchy Plays With Dynamite.

THE WHISTLER –  Personagem conhecido apenas como The Whistler  ( voz de Otto Forrest) é o apresentador e narrador desta série oriunda do rádio. Filmes: 1944 – ESTA NOITE MORRERÁS / The Whistler, LEGADO PERIGOSO / The Mark of the Whistler. 1945 – O CRIME DO FAROL APAGADO / The Voice of the Whistler, ALMA SATÃNICA / The Power of the Whistler. 1946 – O INTRUSO MISTERIOSO / Mysterious Intruder. 1947 – A PÁGINA DENUNCIADORA / The Secret of the Whistler, ASSALTO NAS TREVAS / The Thirteenth Hour. 1948 – A CONSCIÊNCIA  ACUSA / The Return of the Whistler.

WHISTLING – Nesta série, que combina mistério e comédia, Red Skelton é Wally Benton, o astro de um programa de rádio semanal, no qual ele interpreta o papel de “The Fox”, um detetive. Os outros dois personagens fixos da série são a namorada de Wally, Carol Lambert (Ann Rutherford) e Sylvester, um criminoso meio-abobalhado (Rags Ragland). Sylvester fez tanto sucesso, que Ragland repetiu o papel no segundo filme da série  juntamente com o do seu irmão gêmeo, Chester, e este, por sua vez, foi levado para o terceiro filme.

Filmes: 1941 – HERDEIRO EM APUROS / Whistling in the Dark. 1942 – O SHERLOQUE NO AR / Whistling in Dixie. 1943 – SHERLOQUE ASSUSTADO / Whistling in Brooklyn.

JOHNNY WEISSMULLER-O TARZAN MAIS QUERIDO DO CINEMA

novembro 13, 2010

De todos os Tarzans da tela, Johnny Weissmuller foi o que mais se identificou com o papel, permanecendo como um símbolo do próprio herói, e será eternamente lembrado pelos fãs.

Janos (Johann) Weiszmueller, filho de Petrus Weiszmueller e Ersebert (Elisabetha) Kersch nasceu em 2 de junho de 1904 na cidade de Szabadfalu, na região de Banat, cuja população era uma mistura de rumenos, austríacos, sérvios, húngaros, com os austríacos que falavam a língua alemã perfazendo vinte e três por cento do total. A família Weissmueller (originariamente Weiszmueller e depois Weissmüller) era de etnia austríaca. Após a Primeira Guerra Mundial, foram feitas mudanças nas fronteiras e a área de Banat da Hungria tornou-se parte da Rumenia e da Yugoslavia. Nesta ocasião, a cidade de Szabadfalu passou a se chamar Freidorf. Em 1905, os Weiszmueller tiveram outro filho, Petrus, que nasceu em Windber, Pennsylvania nos Estados Unidos, para onde a família se emigrara.

Aos doze anos de idade, Johnny saiu da escola pública e, para ajudar nas despesas da família, trabalhou como mensageiro de hotel e depois como ascensorista, freqüentando, nas horas vagas, uma escola de natação. Em 1916, ele entrou para a equipe de natação da YMCA (Young Men’s Christian Association). Pouco tempo depois, encontrou o homem que mudaria sua vida: o técnico “Big Bill” Bachrach, principal treinador do Illinois Athletic Club de Chicago. Johnny começou seu treinamento sob as ordens de Bachrach em outubro de 1920, mas aprendeu também observando o estilo de seus colegas Norman Ross, Perry McGillivray e Harry Hebner. Johnny incorporou o melhor de cada um desses estilos e se preparou para a Olimpíada.

Como Johnny Weismuller Jr., recorda no seu excelente livro, Tarzan My Father (ECW Press, 2002) – do qual extraímos quase todas as informações para este artigo -, durante alguns mêses de 1922 e de todo o ano de 1923, Johnny venceu prova após prova. Ele estava em ótima forma, porém sua grande preocupação era com a Olimpíada, que se realizaria em Paris. Havia um sério problema. Para integrar a equipe olímpica dos Estados Unidos seria preciso comprovar a cidadania americana, apresentando uma certidão de nascimento válida. Johnny não possuía tal documento.

Então ele e sua mãe, com a conivência do irmão Peter, armaram um plano: os dois irmãos trocariam suas identidades, mediante uma falsificação. Dessarte, Peter passou a ser o estrangeiro e, por necessidade, o irmão mais velho de Johnny.

Na Olimpíada de 1924, Johnny Weissmuller ganhou medalhas de ouro nos 100 e 400 metros em estilo livre, e uma terceira medalha de ouro integrando a equipe de revezamento para os 800 metros. O Presidente da França ofertou-lhe uma medalha especial como reconhecimento pela sua incomparável performance. Johnny ficou muito feliz e orgulhoso, mas também muito nervoso, atormentado por pensamentos sobre as possíveis conseqüências do ato ilícito que ele e sua mãe cometeram.

No seu retorno aos Estados Unidos, Johnny. descobriu que havia se tornado uma celebridade. Ele foi convidado para ir à Casa Branca receber as congratulações do Presidente Calvin Coolidge e as pessoas mais importantes do país queriam conhecê-lo pessoalmente. Seu treinador vetou a maioria dos convites, mas como era fã de Douglas Fairbanks, aprovou uma visita ao estúdio da MGM, onde o famoso ator estava trabalhando num filme intitulado O Pirata Negro / The Black Pirate. / 1926. Conforme nos conta Johnny Weissmuller Jr., durante o almoço, Johnny foi apresentado a um homem chamado Sol Lesser, que o ignorou completamente. Lesser estava tentando convencer Fairbanks a realizar um projeto de filme baseado em Tarzan of the Jungle de Edgar Rice Burroughs porém,. Fairbanks não estava interessado. De repente, Fairbanks olhou para Johnny e disse: “E este rapaz? Seu nome é Johnny Weissmuller, ele é um ídolo nacional da natação, e até que se parece com Tarzan, você não acha?”.Lesser se virou e olhou realmente para Johnny pela primeira vez. “Acho que não”, respondeu Lesser. “O que precisamos para este papel é de um astro!”. Assunto encerrado. Seis anos mais tarde, a MGM implorou a Johnny Weissmuller para assinar um contrato para interpretar o papel principal de Tarzan, o Filho das Selvas, mas ele recusou.

Na Olimpíada de 1928, em Amsterdam, Johnny ganhou mais duas medalhas de ouro para a equipe dos Estados Unidos e foi recebido com todas as honras em Nova York. O prefeito Jimmy Smith lhe entregou as chaves da cidade, mas ele não teve tempo de passear por Manhattan como desejava, porque o treinador Bachrach levou-o logo para o Japão, a fim de competir com os japoneses. Poucos dias antes do evento, Bachrach ficou sabendo de que os japonêses treinavam na água fria e assim planejavam aumentar suas chances de vitória enchendo a piscina com água gelada. Bachrach  tornou essa ameaça inofensiva, obrigando Johnny a sentar numa banheira de água gelada, até se acostumar com a baixa temperatura. Ele venceu todas as provas.

Os treinadores japoneses ficaram muito impressionados com o jovem nadador americano e lhe ofereceram um emprego como treinador de seus estudantes para a próxima Olimpíada, que se realizaria no Japão. Johnny recusou e os japoneses lhe disseram que ele iria se arrepender. Johnny deu uma risada e disse: “Veremos, meu amigo Buster Crabbe também estará competindo e eu estou apostando nele”. Na Olimpíada de 1932, Crabbe ganhou uma medalha de ouro, vencendo por apenas um décimo de segundo o campeão francês Jean Taris. Crabbe comentaria mais tarde que aquele um décimo de segundo mudou sua vida. A Paramount lhe ofereceu um contrato de 200 dólares por semana.

Johnny deixou a natação competitiva em 1929 e passou a fazer exibições ou a dar aulas em hotéis da Florida em troca de hospedagem e refeição. Ele participou – ao lado de outros atletas das piscinas – de um curta-metragem de onze minutos, Crystal Champions (Dir: Jack Eaton), produzido por Grantland Rice. Posteriormente assinou, por intermédio de Bachrach, um contrato com a BVD (Bradley, Voohries, and Day), uma firma que vendia maiôs. Johnny funcionou como representante dessa firma, atuando em espetáculos de natação, comparecendo a programas de entrevistas no rádio, dando autógrafos, e distribuindo folhetos de promoção dos produtos. Johnny escreveu um pequeno livro autobiográfico com Clarence A. Bush, Swimming the American Crawl, e dedicou a obra para William Bachrach e os membros do Illinois Athletic Club. Ele trabalhou para BVD por cerca de dois anos e nunca imaginou que pudesse ganhar tanto dinheiro.

Entretanto, quase perdeu o emprego, por ter feito uma breve aparição num filme da Paramount chamado A Glorificação da Beleza / Glorifying the American Girl / 1929 (Dir: Millard Webb), supervisionado por Florenz Ziegfeld com vários convidados especiais (Eddie Cantor, Adolph Zukor, Helen Morgan, Rudy Vallee, Noah Beery, Texas Guinan, etc.). Johnny surgia numa cena sobre grandes amantes, a começar por Adão e Eva. Ele fazia o papel de Adão e juntamente com a estrela, Mary Eaton, tinha o corpo coberto somente por uma folha de figueira. Preocupada com o fato de que aquela imagem de seu empregado pudesse prejudicar as vendas de sua mercadoria, a BVD obrigou a Paramount a tirar o nome de Johnny dos créditos e a cortar quase toda a cena, deixando somente os planos mais afastados.  Segundo consta, Weissmuller participou também dos shorts esportivos: Big Splash, Swim or Sink, Water Bugs, The Human Fish, etc., mas Johnny Weismuller, Jr. não os menciona no seu livro.

No começo de 1931, a MGM não sabia o que fazer com as tomadas que haviam sobrado de sua produção Trader Horn / Trader Horn sobre uma deusa branca nas selvas africanas com Edwina Booth, Harry Carey e Duncan Renaldo nos papéis principais, quando surgiu a idéia de aproveitá-las em filmes de Tarzan.

Escolhido para dirigir Tarzan, o Filho das Selvas, W. S. Van Dyke, que havia firmado sua reputação com Trader Horn, começou a procurar o ator ideal para o Rei das Selvas. Depois de rejeitados, entre outros, Clark Gable, Charles Bickford, Johnny Mac Brown e Tom Tyler, o roteirista Cyril Hume “descobriu” o novo Tarzan. Vendo Johnny Weissmuller nadar na piscina do hotel onde estava hospedado, ele se apresentou e o convidou para fazer um teste nos estúdios da MGM. Hume explicou a Johnny que havia acabado de ser designado para escrever um roteiro baseado no personagem Tarzan de Edgar Rice Burroughs. Johnny respondeu:”E o que isto tem a ver comigo?”. “Estou lhe oferecendo a chance de trabalhar no cinema, Mr. Weissmuller”. “Ah, é? Eu vou encontrar Jean Harlow?”. No dia seguinte, Hume levou sua descoberta para almoçar no restaurante do estúdio e Johnny de fato viu Jean Harlow – assim como Joan Crawford, Norma Shearer, Clark Gable, Wallace Beery, Marie Dressler, Jackie Cooper e até Greta Garbo. Ele ficou fascinado.

Depois, Hume levou Johnny para conhecer Bernard Hyman, o produtor do filme sobre Tarzan e Woody Van Dyke, o diretor. A carreira de Weissmuller quase acabou ali mesmo. Hyman pediu-lhe que tirasse sua camisa, para que pudessem ver seus músculos. Hyman e Van Dyke beliscaram e apalparam Johnny e então Hyman perguntou qual era o seu nome. Quando Johnny respondeu, Hyman lhe disse, “Weissmuller? Não podemos usá-lo. Muito longo para uma marquise. Não importa. Podemos achar um nome menor”. A esta altura, Hume percebeu que Johnny estava ficando nervoso e, para acalmá-lo, falou: “Mr. Hyman, o senhor não sabe quem ele é? Este é Johnny Weissmuller, o campeão mundial de natação! O homem é famoso! O senhor não pode mudar o seu nome!” Hyman replicou que nunca havia visto o nome “Weissmuller” no Variety, de modo que o rapaz não deveria ser tão importante. Hume sugeriu que eles autorizassem um teste cinematográfico e Van Dyke achou que isto não era necessário: “Este é o cara que eu quero para o papel de Tarzan. Ele tem o físico ideal para o personagem e, na verdade, não vai precisar interpretar muito. Só vai ter que cumprir ordens”.

Após Hyman e Van Dyke terem discutido a sós por alguns minutos, eles ofereceram a Johnny um contrato opcional de sete anos e um salário inicial de 175 dólares semanais. Johnny delicadamente não aceitou. Hyman e Van Dyke lhe perguntaram a razão da recusa. Johnny lhes disse que a BVD já estava lhe pagando 500 dólares por semana e que ele ainda tinha de cumprir três anos desse contrato. Além disso, não tinha certeza de que tinha qualificações para ser ator e preferia não trocar o certo pelo duvidoso. Depois de mais um pouco de discussão, Johnny simplesmente se retirou.   Nunca ninguém havia rejeitado uma oferta da MGM e a ordem dos chefões do estúdio foi: “Tragam-no de volta! Tragam Weissmuller!”. Não foi fácil, mas finalmente a BVD entrou em acordo com a MGM. A BVD abriria mão de Weissmuller desde que a MGM permitisse que todos os seus artistas contratados fossem fotografados em trajes de banho, inclusive Garbo, Crawford e Harlow.

Johnny foi chamado pela MGM para assinar um contrato de sete anos com o salário inicial de 250 dólares semanais com promessa de aumento, que iria chegar a mais de dois mil dólares por semana. Ele estava prestes a pôr sua assinatura no contrato quando um dos executivos disse: “Ah, há uma  pequena condição da qual você deve estar ciente”. “E qual é esta condição?”. “Você deve se livrar de sua mulher. Não podemos ter um homem casado no papel de Tarzan. Aceita ou não aceita?”. Para surpresa dos executivos, Johnny foi embora de novo. No dia seguinte, ele foi chamado ao estúdio e assinou o contrato. Ainda estava casado.

Todavia, o estúdio continuou pressionando, não somente Johnny, mas também sua esposa, Bobbe Arnst, propondo gastar dez mil dólares, para ajudá-la na sua carreira de cantora, se deixasse o marido livre. Johnny foi fazer Tarzan, o Filho das Selvas e, em abril de 1932, rumou para Nova York para a pré-éstréia, deixando Bobbe em Hollywood. Quando voltou, ela lhe propôs o divórcio.

A próxima esposa “oficial” de Johnny Weissmuller – e a mais famosa – foi Lupe Vélez. Ele teria mais três esposas (Beryl Scott, Allene Gates, Maria Bauman), mas seu filho desconfiava que teria havido ainda outras, além das que foram reconhecidas como tal. Lupe atingiu o estrelato ao lado de Douglas Fairbanks em O Gaúcho / The Gaucho / 1927 e, no cinema sonoro, notabilizou-se como a temperamental Carmencita na série Mexican Spitfire da RKO ao lado de Leon Errol. Lupe enfernizou a vida de Johnny, até que se divorciaram em 1938. Em 20 de agosto de 1939, ele se casou com Beryl Scott, mãe de seus filhos Johnny Jr., Wendy e Heidi.

Johnny não gostou de Van Dyke, quando foi apresentado a ele no escritório de Bernard Hyman; porém depois reconheceu sua capacidade como diretor. Ele declarou: “Woody era duro, mas justo, e ele realmente sabia como filmar cenas de ação. Aprendí tudo sobre disciplina e como seguir as regras com Bachrach, de modo que não tive muitos problemas de relacionamento com Woody. Nunca nos tornamos amigos, mas sempre trabalhamos bem juntos, desde que eu fizesse o que ele me pedia”.

Tarzan, o Filho das Selvas (na reprise, Tarzan, o Homem-Macaco) / Tarzan, the Ape Man (Dir: W.S.Van Dyke) foi rodado nos estúdios da MGM com todos os requisitos das produções classe “A”, tendo o departamento de som providenciado o célebre berro, os roteiristas um dialeto tarzânico e, para as cenas mais arriscadas nos cipós, haviam os trapezistas The Flying Codonas (Alfredo e Tony Codona). O roteiro de Hume guardava pouca semelhança com o Tarzan de Burroughs e omitia todas as referências à origem do Homem-Macaco, concentrando-se  primordialmente nas relações românticas entre ele e a jovem inglesa Jane Parker, interpretada por Maureen O’ Sullivan, hoje mais conhecida como a mãe de Mia Farrow. Jane Parker penetra na selva africana num safári juntamente com seu pai e dois caçadores em busca de um misterioso cemitério de elefantes. Tarzan rapta Jane e o safári é capturado por uma tribo de pigmeus. Tarzan vai resgatá-los – com a ajuda de uma manada de elefantes num final excitante. A combinação de Johnny Weissmuller e Maureen O’ Sullivan foi uma mágica da tela absoluta. “Me Tarzan, You Jane” subitamente tornou-se uma expressão conhecida em todo o mundo, (embora a verdadeira frase dita por eles tivesse sido “Tarzan, Jane”).

O segundo exemplar da série Tarzan feito na MGM, A Companheira de Tarzan / Tarzan and His Mate / 1934 (Dir: Cedric Gibbons) tinha a campeã olímpica Jacqueline McKim dublando Maureen nas cenas subaquáticas de nudismo – desaprovadas por Joseph I. Breen – e um desenlace sensacional com Tarzan provocando uma debandada de elefantes para salvar Jane. Este filme é considerado o melhor da série, não só pelo cuidado com a produção como pelo teor erótico dos encontros entre Tarzan e Jane.

No terceiro espetáculo, A Fuga de Tarzan / Tarzan Escapes /1936 (Dir: Richard Thorpe) estreou a macaca Cheeta (Chita), responsável pela parte humorística. Jane é procurada na selva por seus primos que irão informá-la sobre uma fortuna herdada de seus falecidos tios Ela terá direito à herança desde que abandone Tarzan e retorne à civilização. O filme teve uma primeira versão intitulada The Capture of Tarzan, que a MGM reputou demasiado violenta e, visando o público juvenil, submeteu-o a uma reedição com a filmagem de cenas adicionais.

Na aventura seguinte, O Filho de Tarzan / Tarzan finds a Son / 1939 (Dir: Richard Thorpe), surgiu Boy (Johnny Sheffield), o garotinho recém-nascido, único sobrevivente de um desastre aéreo, adotado por Tarzan e sua companheira. A Legião da Decência vinha protestando contra o fato de Taran e Jane nunca terem se casado oficialmente na tela e, para evitar críticas, a MGM resolveu realizar este filme, dando a Tarzan um filho adotivo e fazendo subntender que o Rei das Selvas levava com Jane uma vida casta.

O quinto filme, O Tesouro de Tarzan / Tarzan’s Secret Treasure / 1941 (Richard Thorpe), foi o mais caro e laborioso dos seis filmes de Tarzan produzidos pela MGM, tendo consumido dois anos de filmagem. Depois de salvarem Boy das garras dos nativos que pretendiam torturá-lo, os membros de uma expedição científica explicam a Tarzan que estão no encalço de certo rio, mas o Homem-Macaco descobre que, na verdade, eles cobiçavam o ouro da região.

No último filme da série, Tarzan contra o Mundo / Tarzan’s New York Adventure / 1942 (Dir: Richard Thorpe), três caçadores invadem os domínios de Tarzan, a fim de capturar leões para um circo. São repelidos por Tarzan que, a seguir, tenta salvá-los da tribo Swahili, mas cai de um cipó em companhia de Jane. Os dois ficam desacordados. Supondo que estão mortos, os forasteiros seqüestram Boy e o levam para Nova York, com o propósito de explorar num circo a habilidade do menino em domar animais selvagens. Ao descobrirem o rapto, Tarzan, Jane e Chita partem para a grande metrópole.  A mudança de cenário, colocando Tarzan na selva do asfalto, proporciona curiosidade extra à aventura, uma das mais saborosas e inventivas da série.

Em 1939, o salário de Johnny na MGM havia atingido a soma de 2.500 dólares por semana. Os filmes de Tarzan estavam sendo realizados em intervalos cada vez maiores . Os executivos do estúdio acharam que isso era uma extravagância e “alugaram” Tarzan para Billy Rose por 5.000 dólares semanais, para que ele se exibisse no seu Aquacade na New York World’s Fair. Tarzan continuou a receber seu salário normalmente e a MGM embolsou a diferença. A companheira de Johnny no espetáculo era a campeã olímpica Eleanor Holm. Por causa de problemas com uma infecção no ouvido, Johnny não pôde continuar no Aquacade e foi substituído por Buster Crabbe. Depois, Eleanor saiu e entrou uma jovem e promissora Esther Williams no seu lugar.

Quando a MGM se desinteressou pela série de Tarzan, Sol Lesser ofereceu um lance pelo contrato de Weissmluller e o levou (juntamente com Johnny Sheffield) para a RKO. Maureen O’ Sullivan não aceitou a proposta, forçando Lesser a omitir Jane nos dois primeiros filmes da nova produtora. No filme inicial, Tarzan, o Vingador / Tarzan Triumphs / 1943 (Dir: William Thiele), Tarzan e Boy enfrentam os nazistas e no elenco estava Frances Gifford, a linda Nyoka do seriado A Filha das Selvas / Jungle Girl. Como era tempo de guerra, o público delirou quando Tarzan diz a frase: “Now Tarzan Makes War!”. A última cena ninguém esquece: os alemães escutam os guinchos de Chita pelo rádio e pensam que é o seu Führer dando as ordens. No segundo filme, Tarzan e o Terror do Deserto / Tarzan’s Desert Mystery / 1943 (Dir: Kurt Neumann), Tarzan e Boy voltam a lutar contra o Reich.  Na terceira aventura, Tarzan e as Amazonas / Tarzan and the Amazons / 1945, com a nova Jane (Brenda Joyce), recompunha-se o trio familiar da jungle. Na subseqüente, Tarzan e a Mulher Leopardo / Tarzan and the Leopard Woman / 1946 (Dir: Kurt Neumann), a exótica Acquanetta liderava uma tribo de “homens-leopardos”.

Captura de Tela 2015-08-02 às 16.44.22Nessa ocasião, cumprindo um contrato sem exclusividade que Lesser o deixara celebrar com a Pine-Thomas Productions, Johnny acertou a filmagem de Chamas de Ódio / Swamp Fire / 1946 (Dir: William H. Pine). Ele era Johnny Duval, piloto da Marinha, dispensado em virtude de uma crise nervosa, que ia trabalhar num cargueiro fluvial. A seu lado, no filme, Virginia Grey e o velho companheiro de piscina, Buster Crabbe.

Retomando a série Tarzan da RKO em Tarzan e a Caçadora / Tarzan and the Huntress / 1947 (Dir: Kurt Neumann), o Rei das Selvas viu-se de novo envolvido com caçadores de animais para o Jardim Zoológico. A derradeira personificação do herói de Burroughs deu-se em Tarzan e as Sereias / Tarzan and the Mermaids / 1948 (Dir: Robert Florey), sem Boy (que em breve se tornaria Bomba, na Monogram), mas com a belíssima Linda Christian e música de Dimitri Tiomkin. A história segundo a qual o dublé de Johnny, Angel Garcia, morreu ao cair dos altos rochedos junto ao mar em Acapulco, foi pura invenção dos publicistas. Aliás, o nome do dublé não era Angel e sim Raúl Garcia. Durante os entendimentos a respeito de novos filmes, Johnny pressionou Lesser para receber uma participação nos lucros e o produtor  preferiu não renovar o contrato do ator, declarando  à imprensa que ele estava sem forma física para o papel.

Então Sam Katzman, produtor da Columbia, ofereceu a Johnny uma percentagem nas rendas, para interpretar Jim das Selvas, personagem dos quadrinhos criado por Alex Raymond, o talentoso desenhista de Flash Gordon. Entre 1948 e 1956, Weissmuller  apareceu em 16 filmes de média-metragem. Os enredos eram geralmente absurdos, as caracterizações inverossímeis, o ambiente africano falso, a estupidez dos bandidos implausível e Jim gostava de se arriscar à toa.

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Em 1955, Jungle Jim foi para a televisão em 26 episódios de meia hora de duração. À frente do elenco Johnny, envelhecido e pesadão, encarava melancolicamente seu final de carreira, só voltando diante das câmeras em “pontas” nos filmes Conjunto de Espiões / The Phynx / 1970 e Won Ton Ton, o Cachorro Que Salvou Hollywood / Won Ton Ton, The Dog That Saved Hollywood / 1976.

No dia 21 de janeiro de 1984, aos 79 anos, ele veio a falecer no México, vitimado por um edema pulmonar. Sua morte emocionou os fãs do mundo inteiro, pois estes sabiam que jamais haveria outro Tarzan igual a Johnny Weissmuller.

Para não encerrar este artigo com uma notícia triste, reproduzimos uma história engraçada, contada por Johnny Weissmuller Jr. Numa viagem à Florida, no Biltmore Hotel em Coral Gales, Johnny passava muito tempo na piscina do hotel, onde conheceu um menino que tinha uma fisionomia muito triste Ficou amigo dele e o ensinou a nadar. O menino parecia solitário, mas nunca estava só. Dois grandalhões vestindo roupas espalhafatosas, sempre o acompanhavam. Johnny ficou intrigado, mas não perguntou nada. Isto continuou por algum tempo, Johnny pacientemente lhe ensinava a nadar. Os dois guarda-costas sempre observando. Um dia, o menino foi embora e nunca mais voltou. Pouco depois, Johnny recebeu um embrulho, entregue no seu quarto, que continha um magnífico relógio de ouro. Junto com ele veio um bilhete que dizia: “Obrigado por ter cuidado de meu filho” – Al Capone.

HOLLYWOOD NA GUERRA – AS MULHERES NA FRENTE DOMÉSTICA

novembro 3, 2010

Após o ataque japonês a Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941 e a entrada oficial dos Estados Unidos na guerra então em curso contra o Japão, Alemanha e Itália, começaram as advertências para as mulheres americanas jovens por parte dos pais, do clero, no rádio, jornais e revistas. Algo como: “Tomem cuidado com o romance do tempo de guerra. Casamentos apressados nesta época estão fadados ao fracasso. Não se comprometam com um futuro incerto. O verdadeiro amor pode esperar”. Parece que ninguém ouviu esses conselhos, porque 1.8 milhões de casais contraíram matrimônio em 1942, um aumento enorme comparado com o ano anterior.

Então os casais se casaram às pressas. Provavelmente não se conheciam bem nem estavam apaixonados ou talvez a mulher cobiçasse o cheque mensal no valor de cinqüenta dólares que receberia como esposa de pracinha e aguardava com interesse a indenização de 10.000 dólares do seu seguro de vida, que ganharia como viúva. Cinqüenta dólares por mês era pouco, mas um soldado na frente de batalha, sem nada para gastar, normalmente mandava parte de seu soldo para casa. Com a renda de 50 dólares mensais e mais esta parte do soldo uma garota ambiciosa poderia almejar quatro, cinco, seis ou mais maridos, para levar uma vida bem confortável.

Imediatamente ao pós-guerra, Esposas Errantes / Allotment Wives / 1945 (Dir: William Nigh) descrevia uma espécie diferente de delito, tendo como vítima os pracinhas. O Major Pete Martin (Paul Kelly) é convocado pelo Office of Dependence Benefits, para investigar mulheres que se casaram com vários soldados, para receber os cheques mensais do Departamento do Tesouro e a indenização do seu seguro de vida, caso os pracinhas viessem a ser mortos. Em vez de umas poucas mulheres inescrupulosas, Pete descobre uma organização criminal largamente expandida, que controlava suas empregadas como rufiões fazem com prostitutas.

Com a declaração de guerra contra as potências do Eixo, não somente as jovens noivas, mas também mulheres que já eram casadas há algum tempo e tinham filhos, viram seus maridos partirem para o além-mar. A princípio, somente homens que tinham família ficavam isentos do sorteio militar. Porém, quando a guerra se incrementou, entre 1942 e 1943, a maioria dos homens aptos entre 18 e 35 anos foram convocados ou se alistaram voluntariamente.

Muitas mulheres não se conformaram com a idéia de que tinham que se separar de seus maridos e decidiram permanecer ao lado deles o maior tempo possível enquanto eles ainda estivessem nos Estados Unidos. Essas mulheres eram frequentemente chamadas de “camp followers”, porque seguiam seus maridos de uma base militar para outra através do país.

Elas encontravam moradia o mais perto possível deles e passavam grande parte do tempo a seu lado. Entretanto, sua presença era quase sempre mal acolhida nos trens já superlotados, em cidades que não eram as suas e até em longas filas nas mercearias, quando o racionamento de comida foi implementado. Muitas pessoas achavam que, em vez delas passearem pelo país, ocupando um espaço e recursos valiosos, essas mulheres deviam ficar nos seus lares e fazer alguma coisa mais útil, menos egoísta, para o esforço de guerra. Porém quando os homens embarcaram para a frente de batalha, as mulheres voltaram para suas casas.

Não existe um número exato de quantas mulheres se tornaram “camp followers” durante a guerra, porque não havia nenhuma agência que tivesse uma informação coordenada a respeito. Somente quando as mulheres passavam por alguma dificuldade, agências como a Traveler’s Aid entravam em contato com elas. A Traveler’s Aid relatou 885.000 casos em 1942, cerca de seis vezes o total de 1941. Nos primeiros seis meses de 1943 o total aumentou para 1.250.000 casos..

Essas “camp followers” não se confudiam com as chamadas “V (for Victory) girls”, que eram adolescentes que ficavam à toa em torno das estações de ônibus e trens, drugstores ou em quaisquer lugares onde soldados ou marujos de licença podiam se reunir, flertando com eles e os convidando para um programa. Elas eram amadoras na sua maioria. O preço de seus favores era uma ida ao cinema, ou a um lugar onde pudessem dançar, um refrigerante ou uma bebida mais forte. As “V-girls” podiam ser facilmente reconhecíveis pelos seus suéteres usados, meias curtas, fitas no cabelo, muita maquilagem e lábios pintados de vermelho cor de sangue, tentando parecerem mais velhas. Elas estavam a um passo da prostituição, mas ofereciam aos pracinhas solitários uma diversão transitória despida daquela indiferença profissional do lenocínio. Podiam também, é claro, oferecer-lhes uma doença venérea, cuja incidência era maior entre as amadoras do que entre as profissionais.

A mulher do tempo da guerra teve que resolver as perplexidades e os problemas do seu mundo novo e estranho sem marido. Muitas mulheres procuraram ajuda de suas próprias mães ou foram morar com outros membros da família. Porém o maior impacto na vida das mulheres encarregadas de sustentar o lar dizia respeito à sua rotina diária. Mudar a atitude dos americanos com relação ao consumo não era uma tarefa fácil.

Tudo o que era produzido, tinha que ir primeiramente para o esforço de guerra. As fábricas e as fazendas estavam em plena atividade, mas os cidadãos estavam sendo intimados a reduzir o seu consumo. As invasões de áreas de produção de borracha pelos japoneses afetaram o suprimento desta matéria prima para os Estados Unidos. A solução encontrada pelo governo americano foi racionar não somente pneus, mas também a gasolina e depois roupas e sapatos. O primeiro alimento a sofrer restrição foi o açúcar, ocorrendo o mesmo pouco tempo depois com o café. No final de 1942, o governo ordenou o racionamento da carne vermelha. Embora a manteiga, o leite e os ovos nunca tivessem sido racionados, eles estavam escassos em alguns lugares. As pessoas também foram encorajadas a plantar frutas e verduras em qualquer pequeno espaço de terra excedente. Esses espaços ficaram conhecidos como Victory Gardens (Jardins da Vitória).

Rationing / 1944 (Dir: Willis Golbeck) – filme não exibido no Brasil – zombava do racionamento (e a concomitante burocracia do governo) mas, ao mesmo tempo, justificava a sua existência por meio de um discurso patriótico. Tem uma cena na qual o açougueiro Ben Barton, interpretado por Wallace Beery, responde a uma mulher que quer saber como ela e seu marido podiam ter um “bom jantar”, apesar das restrições impostas pelo governo. Ele diz: “Primeiro você tira um bife de um fuzileiro em Guadalcanal e cozinha ele com batatas, que deveriam ser para um dos Guardas Costeiros nas ilhas Aleutas; depois você adiciona algumas verduras da comida de nossas tropas lá no Norte da África e põe ainda algumas gramas de manteiga, que você ia enviar para alguns marujos num submarino, e duas chícaras de café, que pertencem a um aviador no Pacífico Sul”.

Em certas partes dos Estados Unidos houve falta de moradia devido ao incremento da produção de guerra. Vários filmes ridicularizavam esta situação na capital do país, destacando-se, entre eles, Original Pecado / The More The Merrier / 1943 (Dir: George Stevens) e Esposas Solteiras / The Doughgirls / 1944 (Dir: James V. Kern). Em Original Pecado, no auge da crise de habitação, a funcionária do governo Constance “Connie” Milligan (Jean Arthur) subloca um dos dois quartos de seu apartamento para Mr. Dingle (Charles Coburn) que, por sua vez, o divide com o jovem Joe Carter (Joel McCrea), criando uma situação muito apropriada para uma comédia-romântica. Em Esposas Solteiras, Arthur (Jack Carson) e Vivian (Jane Wyman) acabam de se casar. Arthur vai se encontrar com seu novo chefe (Charles Ruggles) e, quando retorna ao hotel, encontra três garotas na suíte nupcial: Edna (Ann Sheridan), Nan (Alexis Smith) e Natalia Moskorof, uma franco-atiradora russa). Ele manda Vivian se livrar delas, mas elas são amigas de Vivian.  Enquanto as moças não forem embora, Arthur não vai ficar ali e não haverá lua-de-mel. O cômodo também fôra prometido a um pomposo comentarista do rádio (Alan Mowbray), gerando mais confusão.

Durante a guerra, as revistas femininas desempenharam um papel fundamental, refletindo e influenciando a vida das mulheres. Artigos e anúncios ofereciam informações sobre o racionamento, sugestões para manter a família saudável e economizar nas compras, recomendações com relação aos cuidados maternais e conselhos para que as mulheres tivessem sempre uma boa aparência, apesar de todas as vicissitudes. Os jornais, o rádio e os cartazes em lugares públicos eram outros meios de comunicação, que alcançavam uma vasta audiência. Mas quando o governo precisava transmitir mensagens para a mulher americana, ele recorria em primeiro lugar às revistas femininas, enviando um Magazine War Guide para centenas de editores dessa área jornalística, ensinando como os seus artigos e fotografias podiam sustentar o esforço de guerra.

Um dos primeiros filmes, que trazia uma mensagem contundente relacionada com as obrigações das mulheres e dos homens em tempos tão difíceis, foi Rosa de Esperança / Mrs. Miniver, estreado em junho de 1942. Dirigido por William Wyler, o espetáculo era estrelado por Greer Garson como a dona-de-casa inglêsa, que passava por apuros durante o bombardeio contínuo dos alemães sobre a Grã Bretanha.  Na cena final, numa igreja semi-destruida, o vigário profere um sermão depois das mortes de um menino do coro, do chefe de estação ferroviária e da nora de Mrs. Miniver. Ele diz: “Esta não é uma guerra de soldados de uniforme. É uma guerra do povo – de todo o povo – e deve ser lutada não somente no campo de batalha, mas nas cidades e aldeias, nas fábricas, nas fazendas e nos lares, e no coração de cada homem, mulher e criança que ama a liberdade”. Winston Churchill mandou um telegrama para Louis B. Mayer, nestes termos: “Mrs. Miniver é propaganda que vale cem encouraçados”. O filme arrebatou seis Oscar da Academia.

O maior sofrimento para as mulheres que ficavam na frente doméstica era, naturalmente, a ansiedade constante por aqueles que elas amavam e a preocupação de como elas poderiam se ajustar à ausência dos homens em suas vidas.

Dois filmes principais cuidaram desse tema: Mulheres de Ninguém / Tender Comrade / 1943 (Dir: Edward Dmytryk) e Desde que Partiste / Since You Went Way / 1944 (Dir:John Cromwell). Mulheres de Ninguém mostrava quatro mulheres, operárias da fábrica da Douglas Aircraft  no Sul da Califórnia, que decidem fazer uma vaquinha e alugar uma casa juntas. Jo (Ginger Rogers) acabou de ver o marido, Chris (Robert Ryan), seguir para um posto deconhecido no exterior. Helen (Patrícia Collinge), tem um marido e um filho servindo no exército. Doris (Kim Hunter) casou-se com um pracinha poucos momentos antes dele partir com sua unidade. Barbara (Ruth Hussey) é casada com um marujo do Yorktown. O filme se tornou notório durante as investigações da HUAC no pós-guerra, quando a mãe de Ginger Rogers, uma das testemunhas “amigáveis” da Comissão do Senado Americano, apontou a sua suposta mensagem “comunista” (isto é, mulheres dividindo recursos em uma casa habitada por um grupo). No final do filme chega a notícia de que Chris foi morto em ação e Jô diz ao filho que o sacrifício do pai foi importante para a criação de um novo mundo. Porém fica bem claro que sua presença não seria necessária. No novo mundo que está sendo criado por Jô e pelas outras, as mulheres poderão tomar suas próprias decisões e viver independentemente dos homens.

Com quase três horas de duração, Desde que Partiste conta “a história de uma fortaleza inconquistável: o lar americano”. O marido de Mrs. Anne Hilton, (Claudette Colbert) alista-se nas forças armadas, apesar de ser um pai de meia idade com duas filhas Jane (Jennifer Jones) e Bridget (Shirley Temple). A partida do homem que sustenta a família causa algumas privações nesta casa da classe-média: sua criada negra, Fidelia (Hattie McDaniel), tem que se despedida (ela depois volta, dizendo que não gostou de trabalhar para uma família “da parte rica da cidade”). Para reforçar o orçamento doméstico, Mrs. Hilton decide aceitar como inquilino um coronel reformado, William G. Smollett (Monty Woolley), cujo neto, “Bill” (Robert Walker), torna-se namorado de Jane. Joseph Cotten é Tony Willett, um oficial da Marinha amigo da família, mas que talvez gostaria de fazer algo mais para Mrs. Hilton. Jane arruma emprego como ajudante de enfermeira, adiando seu ingresso na universidade. Mrs. Hilton vai trabalhar como soldadora num estaleiro. O filme termina no Natal, que é uma época doce-amarga para toda a família, até que vem a notícia de que o marido de Mrs. Hilton foi localizado e está passando bem.

Uma organização chamada Gold Star Mothers of América foi formada durante a Segunda Guerra Mundial. O nome tinha a ver com a prática de pendurar estrelas nas janelas das famílias cujos homens serviam nas Forças Armadas. Quem tinha um membro da família nestas condições, pendurava uma estrela azul na sua janela. Se ele morresse, pendurava-se uma estrela de ouro. Depois da guerra, as viúvas criaram uma nova organização intitulada Gold Star Wives of América.

Possivelmente, a família de luto mais conhecida durante a Segunda Guerra Mundial foram os Sullivan de Waterloo, Iowa. Todos os cinco filhos de Thomas e Alleta Sullivan morreram juntos em 1942, quando o USS Juneau, o navio no qual os irmãos estavam servindo, afundou no Pacífico logo após a Batalha de Guadalcanal. Depois disto, Mrs. Sullivan, seu esposo e sua única filha, Genevieve, foram recrutados pela Marinha para visitar fábricas de defesa e pedir por mais produção de guerra. Em 1943, Genevieve alistou-se na U.S. Naval Reserve.

Em 1944, foi realizado um filme de ficção de longa-metragem, Eram Cinco Irmãos / The Fighting Sullivans (Dir: Lloyd Bacon). O enredo mostra mais os irmãos crescendo muito unidos no seio de sua família irlandesa-americana do interior do que sua atuação na guerra. Quando se torna adulto, um dos irmãos, Albert (Edward Ryan) se casa. Diante do ataque a Pearl Harbor os outros quatro irmãos (James Cardwell, George Offerman Jr, John Campbell, John Alvin) decidem se alistar na Marinha. Com o consentimento da esposa Katherine Mary (Anne Baxter), o irmão casado se junta aos quatro e, por sua insistência, são designados para o mesmo navio, onde todos perecem. Este incidente trágico é pressagiado no começo do filme, quando os rapazes constroem um barco que afunda. O espetáculo é um tributo a um casal (Thomas Mitchell, Selena Royle) de uma pequena cidade dos Estados Unidos e aos cinco filhos que eles perderam e também uma descrição calorosa dos valores familiares e do americanismo provinciano, concluindo que o sacrifício dos Sullivans não foi em vão. No ínicio da narrativa, vemos uma montagem do batismo dos cinco irmãos e no final Mrs. Sullivan “batizando” o navio com o nome dos filhos. O papel da filha dos Sullivan, Genevieve, foi interpretado por Trudy Marshall.

A simples necessidade induziu mais de 60 milhões de mulheres para a força de trabalho da América durante os anos de guerra, abrindo oportunidades de emprego para mulheres em muitos lugares predominantemente ocupados por homens como fábricas, estaleiros e usinas siderúrgicas. Os homens americanos estavam partindo para a guerra justamente quando a indústria americana estava assinando contratos lucrativos com o governo para produzir um número expressivo de bombas, armas, navios e aviões. De repente, a idéia corrente de ver as mulheres como criaturas frágeis, inadequadas para o trabalho fora de casa, e muito menos para o trabalho duro, parecia um luxo dos tempos de paz. Mais do que nunca, a América pedia às mulheres que vestissem uniforme, para se juntarem à produção da maquinaria vital de guerra.

Foi uma mudança profunda em relação ao que ocorria antes. Durante a Depressão dos anos 30, quando os empregos eram escassos, as mulheres foram desencorajadas a trabalhar fora de casa. Em 1936, uma pesquisa de opinião apurou que 82 por cento dos americanos achavam que as mulheres não deveriam trabalhar se os seus maridos estivessem empregados. As mulheres foram informadas de que não tinham o direito de tirar os empregos dos homens que realmente precisavam deles para sustentar a família. A Segunda Guerra Mundial começou a mudar isso. Então, começam a aparecer anúncios oferecendo empregos para as mulheres.

Mais do que qualquer outra guerra na História,  o Segundo Conflito Mundial foi uma batalha de produção. Os alemães e os japoneses tinham uma vantagem inicial de dez anos acumulando armas e, além disso, os aliados haviam sofrido perdas materiais consideráveis em Dunquerque e Pearl Harbor.  Evidentemente que o lado com maior número de bombas, aviões e armamento seria aquele que ganharia a guerra. A produção era essencial para a vitória e as mulheres indispensáveis para a produção.

As primeiras mulheres a responder ao apelo das fábricas já integravam a força de trabalho em 1940. Muitas eram mães casadas que sempre precisavam trabalhar, para ajudar o marido. A maioria eram trabalhadoras em funções tradicionalmente de baixo salário tais como, por exemplo, empregadas domésticas. Aproximadamente 500.000 mulheres deixaram os serviços domésticos durante a guerra, a maioria delas mulheres negras, que finalmente encontraram melhores oportunidades. Elas ficaram compreensivelmente contentes com a oportunidade de arrumar uma ocupação industrial.

Em 1943, emergiu uma figura que personificava a mulher operária solteira ideal. Seu nome era Rosie the Riveter. Ela tinha tudo o que o governo queria numa operária de guerra. Era leal, eficiente, patriótica, submissa, até bonita. O seu mito nasceu numa canção interpretada por um quarteto masculino chamado os Four Vagabonds. Na canção, o namorado de Rosie, Charlie, estava no exterior lutando na guerra e ela trabalhava patrioticamente, a fim de que o conflito acabasse logo, ele voltasse para casa e eles pudessem se casar. Então, presumivelmente, ela teria que abandonar o trabalho, para criar uma família. O ícone de Rosie decolou. Depois da canção, apareceu o pôster de Norman Rockwell na capa do Saturday Evening Post em 29 de maio de 1943. Sua operária de guerra robusta está de macacão e lenço no cabelo, segurando um suculento sanduíche. Ela repousa um de seus braços musculosos sobre uma lancheira e mantém um rebite no seu colo.  Seus pés pisam em cima de um exemplar do Mein Kampf de Adolph Hitler.

Poucos meses depois, surgiu uma versão mais suave de Rosie toda maquilada e um grande lenço vermelho com bolinhas brancas no cabelo. Neste pôster, encomendado pelo governo, Rosie arregaça a manga de seu uniforme para mostrar o seu bíceps e em cima da imagem vêm as palavras “We Can Do It”.(“Nós podemos”).

Em 1944, foi feito um musical, intitulado Rosie, the Riveter (Dir: Joseph Santley) – não exibido no Brasil -, que tinha como personagens duas trabalhadoras de fábricas de defesa. Durante o dia, Rosalind “Rosie” Warren (Jane Frazee) e sua amiga, Vera Watson (Vera Vague), dividiam com dois colegas do turno da noite, Charlie (Frank Albertson) e Kelly (Frank Jenks), o único quarto restante da cidade. Entre as desventuras cômicas que esta situação provocava, os dois casais acabam se apaixonando. No clímax, acontecia uma festa em homenagem ao prêmio concedido à fábrica pela excelência na produção de materiais de guerra.

Quando a escassez de mão de obra chegou ao auge, o Office of War Information, uma agência formada em maio de 1942 para administrar o fluxo de noticias e de propaganda, promoveu campanhas, estimulando os empregadores a contratar mulheres e as mulheres a se tornarem “soldados da produção”.

Recrutar donas de casa para o trabalho de guerra era sem dúvida uma tarefa delicada. Mesmo as mulheres que gostariam de trabalhar tiveram que discutir com os maridos. No início de 1943, o instituto Gallup revelou que somente 30 por cento dos maridos deram apoio irrestrito à idéia de suas mulheres trabalharem nas fábricas. Embora persista a noção de que a maioria das mulheres que trabalhavam durante a guerra eram casadas com soldados, na verdade, apenas uma entre dez novas operárias estavam nessas condições. E apenas oito por cento de todas as mulheres tinha maridos no serviço militar. Num outro poster, apareciam três operárias de guerra sob o slogan “Soldados sem armas”. As campanhas de propaganda glamourizavam o trabalho de guerra, sempre mostrando que as mulheres podiam manter a sua feminilidade, sendo úteis.

Embora o patriotismo tivesse alguma influência no recrutamento, eram ainda os incentivos econômicos que atraíam muitas donas de casa. Para muitas mulheres casadas o trabalho proporcionava aquele primeiro gosto de liberdade financeira. Elas puderam ganhar mais dinheiro do que imaginavam antes da guerra, e o dinheiro era delas. Uma exclamou: “Posso abrir também a minha primeira conta bancária e é um grande e glorioso sentimento assinar um cheque só meu”. Quase cinquenta por cento de todas as mulheres adultas foram empregadas durante o auge da produção de guerra em 1943 e início de 1944, a maior percentagem até então.

Uma grande mudança ocorreu no número de mulheres que trabalhavam para o governo. Em junho de 1940 havia 186.210 mulheres trabalhando no Poder Executivo. Um ano depois havia 266.407 mulheres, um aumento de 43% em um ano. Nos Departamentos de Guerra e da Marinha, mais de 60.000 mulheres foram contratadas nesse período de um ano. Depois de Pearl Harbor, 2.000 mulheres jovens chegavam a Washington a cada mês, atendendo à propaganda feita através de todo o país em busca de escriturárias e datilógrafas. Essas “government girls” estavam quebrando a tradição de que os empregos federais eram reservados apenas para os homens.

Porém a cada momento havia um lembrete de que esses empregos eram oferecidos às mulheres apenas temporariamente.  Quando os homens voltassem da guerra, Rosie tinha que sair de cena.

Muitas foram as atividades servidas pelo trabalho feminino, destacando-se a fabricação de bombas e munição, de aviões e navios; mas nem todas estavam relacionadas com a produção de defesa. Das mais de seis milhões de mulheres que se integraram na produção de defesa de 1940 a 1945,  mais de dois milhões de mulheres encaminharam-se para empregos em escritórios. De fato, um pôster revelador mostrando três empregadas de escritório sorridentes tinha a legenda “Secretaries of War” (Secretárias de Guerra). Ainda assim a maior percentagem de mulheres trabalhadoras numa ocupação foi no trabalho agrícola, onde havia oito por cento de mulheres em 1940 e 22.4 por cento em 1945, um aumento de 14.4 por cento.

Houve também um grande esforço para preencher o que eram chamados de “empregos civís essenciais”, que haviam perdido trabalhadores, tanto masculinos quanto femininos, para empregos mais bem pagos e de maior status na indústria de defesa ou para os militares. As mulheres responderam prontamente ao chamado das empresas, assumindo tarefas de barbeiro, açougueiro, chofer de táxi, trabalhador de matadouro, bombeiro, etc.

Durante a Guerra deu-se uma nova ênfase na construção de aviões. Em 1940, toda a indústria aeronáutica havia produzido um total de apenas 13.000 aviões. Em 1942, o Presidente Roosevelt pediu a construção de 60.000 aviões. A Douglas Aircraft era uma das maiores fábricas nos Estados Unidos no começo dos anos 40. Ela empregou 22.000 mulheres durante a guerra para ajudar a construir muitos bombardeiros e aviões de transporte usados na Europa e no Pacífico. A maioria das mulheres nunca havia visto o interior de um avião; não conseguia distinguir uma fuselagem de um trem de aterrissagem, mas elas deixaram suas cozinhas para ir trabalhar nessas indústrias, aprenderam rapidamente e foram maravilhosamente bem sucedidas.

Elas eram geralmente aceitas com pouca desavença por parte dos trabalhadores masculinos, porém houve exceções. A construção de navio, em contraste com a fabricação de aviões, era uma atividade industrial antiga. Há muito tempo acostumados com uma mão-de-obra totalmente masculina, os estaleiros custaram a aceitar as mulheres, apesar do encorajamento do governo para que fizessem isso. A tremenda expansão necessária para substituir os navios afundados em Pearl Harbor, e depois os desastres no Pacífico, logo mostraram essa necessidade. Em 1939, quando irrompeu a guerra na Europa, havia 36 mulheres empregadas nos estaleiros. Em março de 1943, pelo menos 23.000 mulheres estavam trabalhando neles, com previsões de que, no final 1944, este número teria que subir para 225.000. A tarefa mais comum exercida pelas mulheres nos estaleiros era a de soldador, porém elas também operavam máquinas de furar e tornos mecânicos, atuavam como despachantes e dirigiam caminhões, eram encontradas em oficinas de metalurgia ou de instalações elétricas, almoxarifados, etc.

Os chefes de turmas nas fábricas eram praticamente unânimes ao afirmarem que, em tudo, o trabalho produzido pelas mulheres podia ser considerado igual ao dos homens. As mulheres aprendiam mais facilmente do que os homens e demonstravam maior interesse do que eles, para saber o “Porquê” e o “Como”.

Enquanto que o sucesso industrial das mulheres foi uma surpresa para os construtores de navios, a indústria de munição havia percebido, desde longa data, que as mulheres eram excelentes empregadas. Neste trabalho literalmente explosivo, as tradições femininas de cautela, precisão e consciência da necessidade de segurança eram imensamente valiosas. Já em 1941, antes da América se envolver na guerra, pelo menos 30.000 mulheres trabalhavam com carregamento de cartuchos de balas, pequenos armamentos e detonadores. Quando a luta na Europa piorou, as mulheres entraram em áreas de fabricação de munições previamente interditadas para elas – e fizeram isso com muito êxito, sem treinamento prévio.

A maioria das fábricas ditava regras de como as mulheres deveriam se vestir. O objetivo era não somente o de protegê-las como também os homens que trabalhavam com elas. Uma mulher usando um suéter apertado, por exemplo, distraia a atenção dos rapazes, que assobiavam quando elas passavam. Calças compridas e sapatos de salto baixo eram obrigatórios. Cabelos longos e soltos estavam terminantemente proibidos e se os seus cabelos não fossem tão curtos quanto o dos homens, elas tinham que prendê-los sob um turbante. Esta era uma proteção contra acidentes – uma operária poderia ser escalpelada se o seu cabelo ficasse preso numa das máquinas.  Outro problema eram as brincadeiras de mau gosto que elas sofriam por parte dos homens. A resposta da administração das fábricas foi segregá-las em tarefas nas quais elas trabalhavam separadas dos seus colegas masculinos.

Quanto ao assédio sexual, a solução foi desenhar uniformes que tornassem as mulheres indistinguíveis dos homens e contratar uma “dama de companhia de cabelos grisalhos” para “flagrar” aquelas distraídas no lavatório feminino e aconselhá-las a disfarçar sua aparência. Entretanto, as próprias mulheres imaginaram o melhor meio de se defenderem da excessiva atenção por parte do sexo oposto. Quando os homens passaram a se defrontar com assobios e com a agressão sexual das mulheres, seu comportamento mudou.

Foi nesse clima que talvez o “soldado de produção” feminina mais famosa de todas foi localizada no verão de 1944 por um fotógrafo da primeira Unidade Cinematográfica do Exército. A operária de guerra Norma Jeane Dougherty logo se transformaria na personalização de um ideal masculino de feminilidade. Mas quando o fotógrafo a descobriu, ela era apenas mais uma operária de guerra, empacotando pára-quedas em uma fábrica de guerra em Burbank na Califórnia. A equipe de fotógrafos do Exército chegou sob as ordens de seu comandante, Ronald Reagan, para documentar o papel da mulher no esforço de guerra, fotografando as mulheres mais bonitas da linha de montagem, trabalhando patrioticamente nos seus empregos de guerra. Norma Jeane Dougherty, então com 18 anos, se destacava. Ela era uma esposa de guerra típica, que começou trabalhando na Radio-plane Company em abril de 1944, depois que seu marido, Jim Dougherty, alistou-se na Marinha Mercante. Norma estava vivendo com a família de seu esposo no Sul da Califórnia e tinha arrumado um emprego na mesma fábrica de guerra, onde sua sogra, Ethel Doughery, trabalhava.

Segundo consta, o fotógrafo David Conover disse a Norma Jeane: “Eu vou tirar sua foto para manter a moral dos rapazes do Exército alta”. Conover telefonou para Norma alguns dias depois, para lhe dizer que as fotos tinham saído maravilhosamente bem e convidou-a para trabalhar como modelo. Ele disse que queria tirar mais algumas fotos e que a colocaria em contato com alguns de seus conhecidos, para lhe arranjar outros trabalhos. Uma das fotos tiradas por Conover apareceu em 26 de junho de 1945 na capa da revista do Exército chamada Yank e, em junho de 1946, a ainda morena Norma Jeane havia aparecido na capa de 13 revistas populares inclusive Laff, Stars and Stripes e Family Circle. Em agosto de 1946, ela assinou contrato com a 20th Century Fox e, em setembro de 1946, se divorciou de Jim Dougherty. Depois, Norma Jeane tingiu seu cabelo de loura e mudou seu nome para Marilyn Monroe.

De 1940 a 1945, a proporção de mulheres na força de trabalho americana aumentou de 25 por cento para 36 por cento. Em 1945, quase 20 milhões de mulheres estavam na força de trabalho, um grande aumento em comparação com os 11.5 milhões em 1940.

Quando as milhares de mulheres ingressaram nas fábricas, não havia lugar para deixarem seus filhos. A WPA (Work Progress Administration), um vestígio burocrático do tempo da Grande Depressão, redirecionou as creches que havia criado para cuidar das crianças muito pobres. Havia 1.500 creches (pelo menos uma em cada estado), mas elas não eram suficientes para atender a demanda. A assistência privada à infância não era prioridade de tempo de guerra e os programas públicos constituíam-se mais de palavras do que de ação.

Muitas mulheres não teriam a opção de continuar trabalhando quando a guerra acabou. A promessa feita no príncipio da guerra de que aqueles empregos para as mulheres seriam apenas temporários até que os homens voltassem da frente de batalha, foi cumprida. As mulheres foram convidadas a sair do caminho e retornarem ao seu devido lugar no lar, com suas famílias. Tão rapidamente quanto Rosie the Riveter foi criada, uma campanha igualmente eficiente foi lançada para afastá-la.

Os homens que haviam partido para lutar na Segunda Guerra Mundial a fim de preservar o American Way of Life, voltariam para o lugar onde, para muitas mulheres, aquele modo de vida havia sido transformado. Um grande número de mulheres americanas das classes baixa e média havia experimentado uma espécie de liberdade que elas nunca haviam conhecido antes. As mulheres haviam provado o sabor de ganhar o seu próprio dinheiro e viverem a sua própria vida fora de casa, e muitas gostaram disso.

Embora a sociedade em geral não pudesse perceber isso imediatamente, estava claro – como disse Emily Yellin no seu magnífico livro, Our Mothers War (Free Pres, 2004), de onde extraímos, muitas informações para este artigo – que o gênio havia saído da lâmpada e, por mais que tentassem dissuadí-lo, não iria voltar para dentro. Uma revolução começava na vida do trabalho e do lar na América.

AKIRA KUROSAWA

setembro 30, 2010

Clássico na forma e romântico na essência, Akira Kurosawa (1910 – 1998) é um cineasta eclético, passando dos dramas históricos de samurais às adaptações da literatura ou à crítica da sociedade contemporânea, sem que isto, no entanto, signifique ausência de uma temática constante. “Todos os meus filmes têm uma coisa em comum: por que os homens não podem mais serem felizes juntos?”.

Na sua obra densa, onde se conjugam a alma japonesa e os valores universais, o ideal humanista está subordinado à Beleza que jorra em imagens esplêndidas, criadas com notável senso plástico, exímia e espantosamente simples mise-en-scène, noção rigorosa de montagem e a audácia de um sábio contador de histórias.

Akira Kurosawa nasceu em Tóquio, filho de um militar que logo se desligou do Exército, tornando-se professor de educação física. Durante o curso primário, foi aluno de Tachikawa, pioneiro no ensino de arte para crianças, e começou a se interessar pela pintura. Ao completar os estudos secundários, matriculou-se na Escola Doshusha de Belas-Artes, orientada por padrões ocidentais. Embora demonstrando seu talento, teve que trabalhar para se sustentar, ilustrando revistas femininas.

Depois de Tachikawa, Kurosawa sofreu influência do irmão, Heigo, que exercia a função de benshi, narrador-comentarista usado habitualmente nos cinemas japoneses durante a época da cena muda. Heigo levava o irmão mais moço para ver filmes e conversava muito com ele sobre literatura. Em 1935, Heigo suicidou-se por motivos ignorados.

Um ano depois, Kurosawa respondeu a um anúncio da Photo Chemical Laboratories (PCL), que desejava testar candidatos para assistência de direção. “O anúncio pedia que os candidatos enviassem um ensaio por escrito, apontando os defeitos básicos dos filmes japoneses e como poderiam ser corrigidos. Pensei com os meus botões: se o defeito é básico, como corrigi-lo? Mas escrevi algo, e remetí ao estúdio. Cerca de quinhentas pessoas compareceram. Mostraram-nos um recorte de jornal sobre um operário que se apaixonara por uma dançarina e nos mandaram fazer um tratamento cinematográfico do fato”.

Recomendado pelo consagrado diretor Kajiro Yamamoto, seu examinador nas provas orais, Kurosawa foi admitido na PCL e ali, com ele, aprendeu o oficio de cineasta. “Nas várias crises da minha vida, havia sempre alguém – Tachikawa, meu irmão, Yamamoto -para me ajudar, me ensinar, me empurrar para a frente”. Além de servir como assistente de direção de Yamamoto, Kurosawa escreveu roteiros para outros diretores e, finalmente, em 1943, passou à direção, realizando seu primeiro filme, Sanshiro Sugata.

Nesta homenagem ao grande cineasta, com a devida vênia, vou lembrar apenas 12 filmes dele, que são os meus preferidos.

O primeiro filme que quero destacar é uma produção de 1949, Cão Danado / Nora- Inu, cuja história se baseia num fato que realmente aconteceu. Kurosawa escreveu um romance a respeito (“Gosto muito de Georges Simenon e queria fazer algo à sua maneira”) e depois adaptou-o para a tela.

Num dia de calor intenso, o jovem policial, Murakami (Toshiro Mifune), ao descer de um bonde superlotado, percebe que seu revolver foi furtado. Ele pede demissão, mas seu superior lhe dá a chance de recuperar a arma. Murakami sai à procura do ladrão pelo submundo de Tóquio, ajudado pelo seu colega mais velho, Comissário Sato (Takashi Shimura). Eles suspeitam de uma mulher que estava no bonde, a dançarina Harumi (Keiko  Awaji). Ela nega a autoria do furto, porém lhes dá uma pista para identificar o criminoso, que foge, depois de ter ferido Sato. Inebriado pelo desejo de vingança, Murakami chega finalmente ao esconderijo do malfeitor, Yusa (Isao (Ko) Kimura) e, embora ferido, após uma perseguição pelos pântanos, consegue algemá-lo. Yusa é um pobre homem, lastimável, que se parece com Murakami, mas não teve a mesma oportunidade que ele na vida. Neste momento o policial descobre que o bandido não é um monstro, mas um ser humano, um irmão.

A confusão proposital entre o policial e o ladrão enriquece o filme. Murakami confessa um dia a Sato que ele compreende o gesto do ladrão: ser policial ou fora-da-lei, tudo é uma questão de meio, de destino. Ele diz para Sato: “Não há gente má no mundo. Apenas ambientes maus”. Murakami compreende que Yusa é, como ele, uma vítima da guerra e da derrota.Yuza caiu numa espiral de violência (“Cão perdido torna-se cão danado”, diz o comissário Sato a propósito do ladrão). Na excelente perseguição final em plena natureza, os dois homens lutam num campo florido. O policial consegue colocar as algemas no assassino e os dois homens caem extenuados na relva, numa atitude perfeitamente simétrica.

O filme pode ser lido como uma descida ao inferno de um homem à procura de seu alter ego “mau”. Quando Murakami perde a pistola, ele perde a sua identidade. Sem a arma, fica sem nada, perde sua posição, seu lugar na sociedade. Passa a ser um cão perdido. Depois que um primeiro assassinato é cometido com sua arma, sua busca passa a ser uma obsessão e ele se transforma, tal como o ladrão, num cão danado.

Entretanto, Cão Danado é mais do que um filme policial. Ele é um filme neo-realista, totalmente em sintonia com a sua época e com a situação do Japão no pós-guerra, quando ocorreu a adoção de novos costumes (as mulheres se vestem à moda européia e dançam ao som do boogie-woogie, as partidas de basebal causam furor) e a formação de uma nova sociedade (a juventude desencaminhada, confundindo o Bem com o Mal, entregando-se ao pessimismo).

A investigação de Murakami o obriga a penetrar nos bairros mais pobres, onde se alastra o mercado negro e os pequenos tráficos, que permitem a sobrevivência de um grande número de miseráveis. Este ambiente é retratado num estilo semi-documentário parecido com o de Cidade Nua / Naked City / 1948 de Jules Dassin, (que teria servido de modelo para o diretor) e, como não podia deixar de ser num filme de Kurosawa, .impregnado de um profundo humanismo.

Premiado com o Leão de Ouro no Festival de Veneza de 1951 e com o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, Rashomon /Rashomon / 1950 projetou o cinema japonês para o mundo, revelando internacionalmente o talento de seu diretor.

No século XI, em Kyoto, três homens – um sacerdote budista (Minoru Chiari), um lenhador (Takashi Shimura) e um servo (Kichijiro Udea) – se abrigam da chuva torrencial sob o pórtico de um templo em ruínas. Ao servo, cínico e perspicaz, os outros dois narram uma história de um crime ocorrido três dias antes na floresta próxima, envolvendo o samurai Takehiro (Masayauki Mori), sua mulher, Masago (Machiko Kyo) e o bandido Tajomaru (Toshiro Mifune). Os retrospectos evocam os quatro depoimentos, o do bandido, o da mulher, o do marido morto (por meio de um médium) e o do lenhador, testemunha ocular do fato, prestados diante de um tribunal, que jamais é visto. As quatro versões são diferentes umas das outras, e a verdade não vem a tona.

Ao findar o relato, o sacerdote sente sua fé abalada por acontecimentos tão cruéis e pela acumulação de tantas mentiras, e vê com aflição um gesto de cupidez por parte do servo, que se apodera dos agasalhos de uma criança abandonada. Somente o remorso do lenhador – por ter cometido um furto no momento do crime – e sua decisão de adotar a criança, salvam o sacerdote do desespêro total, e fazem com que ele se reconcilie com a humanidade.

O título mesmo de Rashomon (“A Porta dos Demônios”), nos indica a verdadeira intenção do autor do filme: o drama essencial se passa sob o Pórtico, onde se confrontam o sacerdote, o lenhador e o servo, a fé e o espírito de negação. O drama da floresta não é senão a ilustração ou o pretexto deste debate, no qual um fala em nome da humanidade e o outro faz uma escolha definitiva contra ela.

Partindo de dois contos do escritor Ryunosuke Akutagawa, Kurosawa criou sua primeira obra-prima. O tema, segundo o diretor, é a incapacidade do ser humano de falar sobre si mesmo com total honestidade. O roteiro retrata aqueles que não podem sobreviver sem mentiras, para fazê-los sentir que são pessoas melhores do que realmente são. As mentiras de cada um nascem da recusa de se aceitar a si mesmo, com suas covardias e mesquinharias, sobretudo no que concerne à mulher – de um desejo inconfessado, mais ou menos consciente, de autopunição. A grande particularidade de Rashomon foi revelar a personalidade de seus protagonistas, não pelas suas ações, mas pelas suas mentiras.

Meditação patética, tensa e vertiginosa sobre esses estranhos impulsos do coração humano, expressa através de um jogo elaborado de luz e sombras e de um arsenal simbólico, o filme é plasticamente excepcional. O estilo visual – com suas brilhantes composições triangulares – inspirou-se na técnica do cinema silencioso. Numa entrevista o cineasta explicou: “Gosto dos filmes mudos, sempre gostei. Eles geralmente são mais belos do que os falados…Tentei restaurar um pouco dessa beleza”.

O Idiota / Hakuchi / 1952 é uma adaptação modernizada do romance de Dostoievsky, transferindo o ambiente de São Petersburgo do século XIX para a ilha de Hokkaido no norte do Japão no século XX.

O Príncipe Myshkin do romance é transformado num ex-soldado da Segunda Guerra Mundial de nome Kameda (Masayuki Mori), sujeito a crises de epilepsia, que escapou de ser fuzilado e passa a ter como filosofia de vida a bondade e a compaixão, dedicando-se à salvação da pecadora Taeko (Nastasyia Filippovna / Setsuko Hara), que é amada pelo bruto e obsessivo Akama (Rogozhin / Toshiro Mifune). Desvairado pelo ciúme, Akama mata Taeko e, num desenlace diferente do livro, ele e Kameda ficam loucos.

Kurosawa declarou: “Desde a juventude tinha o gosto pela literatura russa, especialmente por esse romance. Sempre pensei que daria um filme maravilhoso. Dostoievsky ainda é meu autor predileto e quem escreve mais honestamente sobre a existência humana …Acho que fui bem sucedido ao fazer o que eu queria. Distorcí o romance certamente, mas creio que coloquei mais de mim neste filme do que em qualquer outro”. A nosso ver, apesar das modificações e dos cortes sofridos (o filme tinha 4.25hs. e foi reduzido a 2.46hs.), Kurosawa manteve o espírito do romance do célebre escritor russo.

O filme de Kurosawa acrescentou um elemento visual à obra de Dostoievksy: a paisagem. O elemento exterior é o reflexo da alma dos personagens. A neve, por exemplo, não somente dá ao espetáculo uma tonalidade estranha, quase irreal, oscilando entre onirismo e realidade, como também revela o estado d’alma daquelas criaturas atormentadas. Porém o estilo fotográfico empregado pelo diretor é discreto (branco e cinza e uma luz suave e difusa), nada parecido com a maneira turbulenta, mais estilizada (com seus contrastes de branco e preto e luz solar brilhante) de seus trabalhos anteriores Cão Danado e Rashomon.

Masayuki Mori fez bem o papel do “idiota” mas, na minha opinião, não sobrepujou a magnífica atuação de Gerard Philipe na versão de Georges Lampin, realizada cinco anos antes, assim como o desempenho de Setsuko Hara não pode ser comparado com o da eletrizante Filippovna de Edwige Feuillère. Interpretações do mesmo nível são as de Toshiro Mifune e Lucien Coëdel, o Rogozhin do filme francês.

Em Viver / Ikiru / 1952, Kanji Watanabe (Takashi Shimura), velho burocrata, chefe do Departamento de Assistência Social da prefeitura de uma cidade do interior, fica sabendo que está com câncer e tem apenas alguns meses de vida. Viúvo e morando com o filho casado, que o trata com frieza, ele de repente toma consciência de sua solidão e da inutilidade de sua existência.  No começo, falta ao emprego, entrega-se à bebida e aos prazeres mundanos. Depois, animado por uma jovem colega de repartição (Miki Odagiri), que abandonara a papelada inútil para trabalhar numa fábrica de brinquedos, retorna à seção para realizar algo de útil. Remexendo papéis, encontra um requerimento pedindo a construção de um parque infantil em um local insalubre. Superando todos os empecilhos, consegue completar o projeto e morre no dia da inauguração.

O filme se divide em duas partes: na primeira, um narrador explica que o protagonista foi vitimado pela doença e em seguida vemos o desenrolar dos acontecimentos até a decisão de Watanabe de consagrar seus últimos dias, especialmente às crianças, utilizando enfim o seu cargo para realizar alguma coisa. A segunda parte continua cinco anos mais tarde, após a morte de Watanabe, por ocasião da cerimônia fúnebre que reúne sua família e seus colegas. No curso de retrospectos sucessivos, as circunstâncias de sua morte e os detalhes de seu último combate contra o imobilismo da administração e as lutas entre os diversos serviços do município são revelados. Agora, completamente a par das motivações de Watanabe – a proximidade de sua morte, suas frustrações e a futilidade de sua vida -, nós podemos ver como sua ação é mal interpretada por quase todos que viviam em torno dele.

Kurosawa faz uma penetrante crítica social e um perfeito estudo da inquietude humana. É uma denúncia da hipocrisia no Japão do pós-guerra e sua burocracia e conclui mostrando como um ato significativo pode superar o vazio de uma existência.

A cena que mais me impressionou foi quando Watanabe (interpretado magnificamente por Takashi Shimura) senta num balanço e, debaixo da neve que cai, contempla amorosamente o parque recentemente construído. Em paz consigo mesmo e com o mundo, ele começa a entoar uma canção. É um momento tocante, difícil de conter as lágrimas mesmo sabendo que o personagem está feliz.

Os Sete Samurais / Schinin no Samurai / 1954 é incontestavelmente o filme mais conhecido de Kurosawa, sucesso comercial e de crítica, tendo inclusive causado uma refilmagem americana, Sete Homens e um Destino / The Magnificent Seven em 1960, dirigida por John Sturges.

No Japão do século XVI, época bem tormentosa da história desse país, bandidos pilham e dizimam aldeias. Cansados dessa devastação e seguindo o conselho de seu patriarca, os habitantes de uma pequena vila resolvem enviar emissários à cidade, a fim de contratarem samurais para a defesa. Momentaneamente sem recursos, seis samurais aceitam a missão, em troca de alimentação e hospedagem: Kambei (Takashi Shimura), Kyuzo (Seiji Miyaguchi), Heihachi (Minoru Chiaki), Gorobei (Yoshio Inaba), Katsushiro (Ko Kimura), e Shiichiroji (Daisuke Kato). A eles se junta o impetuoso Kikuchiyo (Toshiro Mifune), um camponês meio maluquinho, cuja família fora exterminada e por isso deseja se vingar.  Ele se torna o sétimo samurai da milícia. Após vários ataques, os bandidos são derrotados e enquanto se reinicia a colheita do arroz os três samurais sobreviventes partem com um certo amargor com relação ao seu destino de cavaleiros andantes e um pouco de nostalgia por aquela vida sedentária e pacífica. “Os samurais passam sobre a terra como o vento, mas a terra permanece e os lavradores trabalharão nela para sempre”.

É uma crônica histórica, animada por um sopro épico e um compasso nervoso. A ação, pontuada de gritos agudos e de golpes de sabre, não fica devendo nada ao ritmo dos westerns americanos (Kurosawa adorava John Ford, sua primordial influência como realizador de filmes) e, através dela, o cineasta envia uma mensagem moral e traça o caráter psicológico dos homens.

O espetáculo faz igualmente uma análise sutil das classes sociais. Desde a chegada dos samurais à aldeia, surge um paradoxo: os camponeses têm uma admiração, uma gratidão e um respeito profundos pelos guerreiros: porém eles não podem deixar de desconfiar deles.

Tem uma cena na qual os samurais estão refletindo sobre a melhor maneira de preparar a defesa da aldeia, quando chegam alguns camponeses, oferecendo-lhes armas. A gente percebe logo que elas foram roubadas de samurais mortos. “E nós que estamos aqui para defender esses assassinos! Seria melhor matá-los!”, exclama um samurai. Kikichyo toma a palavra e faz um discurso em favor dos camponeses: “Quando eles sentem que vai haver uma batalha, esses animais velhacos e desleais se põem a caçar os feridos e os vencidos!… Mas quem os transformou em animais? Vocês todos, malditos samurais! Cada vez que vocês combatem, vocês queimam as aldeias, destroem as colheitas, levam os alimentos, violam as mulheres e fazem dos homens seus escravos!”    Para salvar a aldeia é preciso superar esta “incompatibilidade social”. Por força das  circunstâncias ocorre uma aproximação. Os camponeses aprendem a conhecer melhor os samurais e estes começam a medir todo o peso do sofrimento contido em cada grão de arroz.  As cenas finais de combate na chuva e na lama, filmadas simultaneamente por diversas câmeras, estão entre as mais sensacionais da História do Cinema.

Em Trono Manchado de Sangue / Kumonosu-jo / 1957 Kurosawa faz uma transposição da peça Macbeth de Shakespeare para o Japão da Idade Média com algumas alterações do original.  Macbeth se transforma no General Washizu (Toshiro Mifune). Este, voltando vitorioso de um combate com seu companheiro de armas Miki (o Banquo de Shakespeare encarnado por Minoru Chiaki), perdem-se na floresta. Ali encontram um espírito feminino espectral, que profetiza para Washizu uma ascenção rápida ao poder e a Miki, uma glória mais lenta, porém mais durável: seus filhos prevalecerão no trono. Instigado pela mulher, Asaji (Isuzu Yamada), a quem contou a predição, Washizu assassina o soberano e ocupa seu lugar. Miki, será a segunda vítima e, numa segunda visita à feiticeira, esta diz a Washizu que ele será invencível enquanto a floresta não se mover. O filho de Miki ataca o castelo, camuflando os guerreiros com pedaços de árvores da floresta e Washizu e Asaji perdem suas vidas.

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Realizado nos moldes do teatro japonês clássico, com despojamento cenográfico e interpretações grandiloquentes, o filme nos faz descobrir Macbeth como qualquer coisa de novo. Em vez da lenta desintegração de um homem e uma mulher pelo remorso temos um conto filosófico sobre o Destino, tema que Kurosawa valoriza por meio de imagens admiráveis como, por exemplo, a vertiginosa corrida a cavalo na floresta, transformada em labirinto; as cenas de batalha; a cena do entêrro imponente do soberano e a morte de Washizu crivado de flechas.

O discurso do fantasma da floresta na seqüência de abertura, indica claramente a mensagem poética de Kurosawa. “A vida das flores é curta: só dura um instante. Elas acabam por murchar e morrer e depois apodrecem sobre a terra. Porém os homens refutam esta condição. Desde o seu nascimento, eles são prisioneiros de suas paixões, eles queimam sua vida imoderadamente nas chamas dos cinco Desejos. Eles acumulam seus pecados, aumentando seus sofrimentos. E quando eles morrem o seu corpo apodrece. E sobre esta podridão vão crescer as flores. É assim que o odor da podridão se transforma em delicada fragrância”.

Transferindo o ambiente da peça de Gorki da Rússia Imperial para o Japão (então chamado Edo) nos meados do século XIX, Kurosawa nos dá em Ralé / Donzoko / 1957, uma versão mais claustrofóbica do que a de Jean Renoir (Basfonds / Les Basfond / 1936) e, com realismo cruel, explora os desejos e motivações do ser humano numa patética descida aos infernos.

Num imenso e sujo galpão de madeira, de propriedade de um casal de cínicos usurários Rokubei e Osugi (Ganjiro Nakamura, Isuzu Yamada), amontoa-se um pequeno grupo de marginalizados, entre eles: um jogador amoral, Yoshisaburo (Koji Mitsui); um ladrão, Sutekichi (Toshiro Mifune), que é amante de Osugi e apaixonado pela irmã desta, Okayo (Kyoko Kagawa); uma prostituta, Osen (Akemi Negishi); um ator alcoólatra (Kamatari Fujiwara); um pretenso samurai (Minoru Chiaki); um artesão desempregado (Eijiro Tono) e uma velha moribunda (Eiko Miyoshi). No meio dessas “criaturas que uma vez já foram homens”, surge um suposto peregrino, Kahei (Bokuzen Hidari), que irradia a sabedoria e a bondade e depois parte misteriosamente, tal como chegara.

O filme de Kurosawa é uma adaptação bastante fiel da peça de Maximo Gorki. O texto original é respeitado na maior parte do tempo, com pequenas abreviações para evitar uma duração muito longa do espetáculo. O filme mantém inclusive a estrutura de quatro atos da peça com escurecimentos usados para marcar o final de cada ato. O diretor preservou o espaço cênico restrito do albergue mas com inventividade cinematográfica conseguiu evitar o teatro filmado e espelhar a face trágica da miséria. Há uma grande variedade técnica no uso dos enquadramentos, angulações, composições e cortes rápidos bem como um admirável jôgo de luz e sombra na soberba fotografia em preto e branco.

Os personagens passam o seu tempo ansiando por uma fuga – por uma indefinida, distante “vida melhor” – ou então, zombando dessa fuga como sendo fútil e ilusória. Os únicos meios de escapar daquele buraco sórdido são a morte (por doença, assassinato ou suicídio) ou pelo crime (que leva a um outro confinamento na prisão). As principais vias de fuga da realidade brutal de suas vidas são o álcool e a diversão.

A última cena, na qual os inquilinos bebem saquê e cantam fazendo um coro cômico (muito popular no período Edo chamado de bakabayashi – literalmente, orquestra de “loucos”), termina abruptamente com a notícia do suicídio do ator. “Idiota”, resmunga o jogador num aparte para a platéia. “Ele fez isso para estragar nosso prazer”.

A Fortaleza Escondida / Kakushi No Toride San-Akunin / 1958 é um belo filme de aventuras picaresco, abordando um tema popular como se fosse um western oriental.

Durante uma guerra civil na Idade Média, a família do Príncipe Akizuki é quase inteiramente exterminada. A dedicação do General Rokurota (Toshiro Mifune) salva a jovem Princesa Yukihime (Misa Uehara), levando-a, juntamente com um punhado de ouro, para uma fortaleza escondida em uma região de difícil acesso. Dois vagabundos (Minoru Chiaki, Kamatari Fujiwara) encontram na estrada indícios da passagem da Princesa e a cobiça pelo prêmio da captura faz com que eles se juntem aos fugitivos.

Todo o filme consiste afinal em uma prova de iniciação diante da tarefa de salvar o tesouro dos Akizuki. A odisséia da princesa tem duas motivações: sobreviver e forjar um caráter de soberana, para refundir o clã. Após as várias peripécias pelas quais passou e prestes a ser executada pelos inimigos, a jovem Yukihime, desabafa: “Eu estou muito feliz. Uma felicidade que nunca tive no palácio. Eu vi o povo tal como ele é. Ví sua beleza e sua feiúra com meus próprios olhos”. É o tema – eminentemente Kurosawaniano – da sabedoria adquirida pela experiência.

As proezas formais de Kurosawa evidenciam-se desde os primeiros momentos do filme, quando assistimos a uma extraordinária cena de multidão. O diretor faz o espectador mergulhar numa coreografia assustadora, na qual os corpos são reduzidos a simples formigas enlouquecidas, atropelando tudo após sua passagem, para depois morrerem alguns metros adiante. A força visual do filme é reforçada pela utilização inspirada do CinemaScope (na versão japonesa Tohoscope), um processo ainda revolucionário na época.

No desenrolar da trama, encontramos em contraponto ao heroísmo guerreiro de Rokurota a delicadeza selvagem da princesa e a tolice divertida dos dois vagabundos, que serviram de modelo para George Lucas na criação de seus dois simpáticos robôs de Guerra nas Estrelas.

Com sua evidente riqueza plástica e ludismo, A Fortaleza Escondida é um entretenimento leve e acessível a qualquer público, que se insinuou entre os seus outros filmes mais sombrios e sofisticados.  Como disse o cineasta numa entrevista: “Nada de teorias complicadas; só quis fazer um filme que fosse cem por cento divertido com suspense e humor… O relato foi se estruturando assim: cada manhã eu propunha uma situação que deixava o samurai e a princesa sem saída.  Então, os outros três roteiristas faziam esforços desesperados para encontrarem uma saída para essa situação, como se fossem eles mesmos que deveriam escapar”.

Para inaugurar sua própria companhia produtora, Kurosawa quis fazer um filme que tivesse signficação social e escolheu como tema a corrupção nas altas camadas da sociedade japonesa. Embora nunca tivesse admitido isso, alguns críticos vislumbram em Homem Mau Dorme Bem / Warui Yatsu Hodo Yoku Nemuru / 1960, paralelos entre certos personagens do espetáculo cinematográfico e os da tragédia Hamlet de Shakespeare.

Pretendendo vingar a morte do pai, o jovem Koichi Nishi (Toshiro Mifune) assume outra identidade e se emprega numa poderosa empresa pública do setor da habitação, terminando por casar-se com Kieko (Kyoko Kagawa), filha aleijada de Iwabuchi (Masayauki Mori), o presidente da firma, responsável direto pelo crime. Enquanto isso, está em andamento um inquérito policial sobre corrupção, envolvendo uma construtora e a organização do governo. Os executivos ficam preocupados e um deles é forçado a cometer suicídio por seus superiores. Com o fim de reunir provas contra os criminosos, Nishi salva o contador Wada (Kamatari Fujiwara) e rapta o vice-presidente Moriyama (Takashi Shimura). Porém o sogro providencia seu assassínio e o de Wada, depois de convencer a filha de sua dignidade.

A muito celebrada cena de abertura do filme é a de um casamento, que pressagia os acontecimentos que vão se desenrolar. O enorme bolo nupcial chega e provoca exclamações de horror: é uma réplica de um prédio de escritórios, igual ao da corporação cujo presidente é o pai da noiva, mas tem uma flor vermelha, dependurada para fora da janela do sétimo andar, referência repulsiva a um empregado que se jogou dali.  Não há dúvida de que esta cena nos faz lembrar da pantomima encomendada por Hamlet aos atores na cena II, Ato III da tragédia Shakespereana. Nishi está por trás do macabro bolo de noiva, um dos passos no seu plano para se infiltrar e destruir a corporação, que fizera seu pai se suicidar, pulando pela janela.

O filme segue seus esforços metódicos e o retrata como uma espécie de modelo irônico do estereotipado, super eficiente e devotado trabalhador japonês. O motivo ostensivo do noivo é a vingança pessoal, porém Kurosawa lhe dá um propósito social mais amplo, mostrando que ele quer também punir os homens que espoliam e esmagam as pessoas incapazes de resistir. Entretanto, Nishi está realmente apaixonado pela filha de seu inimigo e, por outro lado, não consegue chegar aos extremos de imoralidade que Kurosawa aponta como o modus operandi da corporação. Embora tivesse sido capaz de transformar um elemento importante da organização em um fantasma ambulante, Nishi hesita em cometer a violência de empurrar um outro pela janela. “Eu não odeio o suficiente”, ele lamenta.

No enredo de Céu e Inferno / Tengoku to Jigoku / 1963, Kingo Gondo (Toshiro Mifune), está prestes a dar um lance para obter o controle da fábrica de sapatos onde trabalha desde os dezesseis anos, quando recebe a noticia de que seu filho foi seqüestrado. O criminoso exige uma quantia exorbitante. Pouco depois, o menino aparece; o filho do motorista de Gondo é quem realmente fora seqüestrado. Gondo fica num dilema angustioso: atender a exigência pedida e perder a chance de realizar o seu sonho ou viver em paz com a sua consciência. Gondo decide pagar o resgate que deverá ser jogado pela janela de um trem super-rápido japonês. Depois disso, o Inspetor Tokuro (Tatsuya Nakadai) segue a pista do sequestrador. No final, descobre que ele é o estudante de medicina Ginji Takeuchi (Tsutomu Yamazaki). Na prisão, Genji fica frente a frente com Gondo e explode de cólera, de ódio, de impotência e denuncia a riqueza insultante do industrial. Gondo pergunta a Ginji: “Por que devemos nos odiar tanto?”. E vem a resposta: “Meu quarto era tão frio no inverno e tão quente no verão, eu não conseguia dormir. Daquele quarto minúsculo tua casa parecia um Paraíso. No momento em que olhei para ela, comecei a te odiar”.

Partindo de uma novela policial do norte-americano Ed McBain, Kurosawa procura analisar o mundo capitalista japonês e as diferenças sociais, o contraste entre a vida da alta burguesia (o “céu”, a mansão do próspero industrial) e a da favela (o “inferno”, onde mora o sequestrador), fazendo o seu julgamento moral; mas sem desprezar o dinamismo do thriller.

Podemos dividir o filme claramente em dois blocos distintos. Um primeiro segmento situado inteiramente entre quatro paredes da casa luxuosa de Gondo no alto de uma colina e o segundo, mais ambulante, mais nervoso, quando Kurosawa se consagra à descrição metódica da investigação conduzida pelos policiais no submundo de Yokohama.  Ligando as duas partes, ocorre o episódio tenso e frenético no trem, filmado com câmera na mão e em tempo real, a seqüência mais fascinante do espetáculo.

Depois dos momentos difíceis que Kurosawa enfrentou após o fracasso comercial de Dodesukaden / Dodesukaden / 1970 (incluindo uma tentativa de suicido), ele aceitou o convite de Serguei Guerassimov para rodar na União Soviética o seu novo filme, Dersu Uzala / Derusu Usara / 1975, baseado em dois livros de viagem de Vladimir Arseniev, militar e geógrafo do exército do Tsar.

No curso de uma investigação topográfica nos confins entre a Sibéria e a China em 1902, um destacamento comandado pelo Capitão Arseniev (Yuri Solomin) encontra um velho caçador mongol, Dersu Uzala (Maksin Munzuk), que concorda em servir como guia da expedição. A curiosidade dos brancos transforma-se gradativamente em respeito pelo velho, que estabelece profunda relação de amizade com o capitão, mas recusa acompanhá-lo quando o destacamento deixa a floresta. Cinco anos depois, Arseniev retorna com outro destacamento e é com grande alegria que reencontra Dersu. Fica apreensivo ao descobrir que o amigo já não dispõe da mesma agilidade e consegue levá-lo para sua casa ao término da investigação. A tristeza do velho faz com que Arseniev o devolva à sua floresta, vindo a saber mais tarde que Dersu foi morto por um bandido que queria se apossar de sua arma.

Neste filme profundamente humanista, Kurosawa manifesta seu amor pelo homem e pela natureza. É um filme “ecológico”, que nos alerta contra a destruição de nosso meio natural. O diretor declarou: “A relação entre o ser humano e a natureza vai de mal a pior…Eu gostaria que o mundo inteiro conhecesse esse personagem russo- asiático que vive em harmonia com a natureza …Temos muito que aprender com Dersu”.

Com a ajuda da tela larga, da cor e de seu cinegrafista A. Nakai, o grande cineasta filmou paisagens admiráveis das estepes e das florestas, colocando um olhar cheio de sincera emoção sobre uma natureza ainda virgem, envolvida por radiante beleza.

Um crítico da revista Télérama, Xavier Lacavakerie, concluiu de maneira exemplar: “Após uma longa crise existencial, Kurosawa encontrou nesta fábula iniciática (autêntica) um exutório – e sem dúvida uma resposta para as suas próprias angústias. Uma grande serenidade neste filme-rio majestoso, no qual o homem parece ter encontrado um lugar correto na natureza e se ajusta aos elementos – mesmo quando eles são hostís e enfurecidos (a cena extraordinária da tempestade). Em plena conivência com a água que corre, com a relva que se dobra sob o vento e a neve imaculada atapetando o sol, o personagem de Dersu Uzala, encarnação da sabedoria e da fraternidade humana, é inesquecível”.

Lento, lírico, clássico, simples e tranqüilo, Dersu Uzala conquistou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 1976.

Tal como aconteceu com Dersu Uzala e Kagemusha (financiado pela Twentieth Century Fox e pela Toho graças à intervenção de George Lucas e Francis Ford Coppola), Kurosawa precisou contar com investimentos estrangeiros e, desta vez, foi Serge Silberman que, dando força para um projeto engavetado há oito anos, conseguiu interessar uma firma japonesa para dividir com sua produtora o vultoso orçamento de Ran / Ran / 1985.

O senhor feudal Hidetora Ichimonji (Tatsuya Nakadai), responsável por muitas maldades, envelhecido e cansado de contínuas batalhas, decide ceder o poder aos três filhos: Taro (Akira Terao), o primogênito, que tem direito às terras e força o pai a assinar um documento transmitindo-lhe toda a autoridade; Jiro (Jinpachi Nezu, que manda assassinar o irmão mais velho durante uma batalha e se apodera do feudo e Saburo (Ryu Daisuke) que, por sua franqueza na condenação das ações do pai, é banido para um domínio vizinho, juntamente com seu amigo Tongo (Masayuki Yui), fiel vassalo de Hidetora. Engendrando a luta pelo poder dentro da família, está a mulher de Taro, a vingativa e ambiciosa Kaeda (Mieko Harada) que, primeiro, instiga o marido a tomar a autoridade do pai e depois, quando Taro é morto, seduz Jiro para manter sua posição. Tanto a família de Kaeda quanto a de Sué (Yoshiko Miyazaki), esposa de Jiro, haviam sido exterminadas por Hidetaro. Mas Sue, ao contrário de Kaeda, de acordo com os princípios do budismo, havia perdoado Hidetora. O bobo da corte, Kyoma (interpretado pelo travesti Peter), Saburo e Tongo são os únicos que se mantêm fiéis ao velho; mas inutilmente. Enlouquecido pela fúria e carnificina que sua decisão gerou, Hidetora peregrina pelos campos destruídos de seu domínio.

Kurosawa localiza a ação no Japão do século XVI. Em vez de filhas, o senhor feudal tem filhos. Estes são codificados pelas cores: Taro é amarelo, Jiro é vermelho e Saburo é azul. Hidetaro divide seu reino entre eles e daí nasce uma intriga bastante complexa, feita de complôs, de traições, de mentiras e outros subterfúgios na linha das tragédias de Shakespeare; porém o diretor nos oferece uma visão pessoal e inédita da obra original.

Inspirando-se livremente no Rei Lear, com um notável desenho de produção feito em telas a óleo, locações na ilha de Kyushu, ao pé do monte Fuji, requisitados os castelos autênticos de Himeji e Humamoto, considerados tesouros nacionais do Japão, assistência de direção do veterano Inoshiro Honda, utilização magistral do som na seqüência do massacre, no qual Hidetora perde a razão, substituição da teleobjetiva, da lente zoom e da intensa movimentação de câmera por planos mais estáticos com maior profundidade de campo, o cineasta pintou, com uma orgia de cores espantosa, um afresco límpido e grandioso sobre a estupidez humana.

Kurosawa levou cinco anos pintando as story boards para Ran. E, perfeccionista como era, o filme apresenta acuradamente a sua visão. Ele nos apresenta cenas memoráveis salientando-se o ataque (parcialmente filmado sem os ruídos, ouvindo-se somente a música) ao Terceiro Castelo, com os tiros passando rente a Hidetora e ele depois saindo vagarosamente do castelo em chamas, a confrontação entre Kaeda e Jiro depois do assassinato de Taro, a reconciliação entre pai e filho e depois a morte de ambos.

A loucura é muito explorada em Ran através dos personagens, inclusive o bufão do rei que, ao longo da história, parodia por meio de canções os acontecimentos que assiste. Mas a gente percebe logo que, de fato, o bobo é o menos louco de todos. “O homem nasceu chorando”, diz ele. “Depois que ele chorar bastante ele morre”.

No final do filme, Kurosawa manda o seu recado, enunciado por um diálogo entre Kyoma e Tongo. Diante dos cadáveres de Hidetaro e Saburo, o bobo exclama, olhando para o Céu: “Existe algum Deus, algum Buda? Se você existir, ouça-me! Você é mau e cruel! Você está tão chateado aí em cima e tem que nos esmagar como formigas? Será que é divertido ver os homens chorarem?” Tongo grita para Kyoma: “Chega ! Não blasfeme. São os deuses que choram. Eles nos vêem matando uns aos outros, mais e mais desde que o mundo surgiu. Eles não podem nos salvar de nós mesmos”. Kyoma começa a chorar e Tongo continua: “Não chore! É assim que o mundo funciona. Os homens preferem tristeza em vez de alegria, sofrimento em vez da paz”.

Na cena derradeira, o jovem irmão de Sué, Tsurumaru (Takeshi Nimura), que Hidetora mandara cegar quando criança, fica sozinho no alto de uma montanha à beira de um abismo, tendo perdido o seu pergaminho com a efígie do Buda, uma espécie de amuleto protetor. Este símbolo do derradeiro abandono dos homens pelos Deuses, visto à distância sob a luz do crepúsculo, é a imagem mais desoladora do espetáculo.

A ÉPOCA CLÁSSICA DO DESENHO ANIMADO AMERICANO

setembro 24, 2010

Neste artigo vou recordar os principais desenhos animados americanos da época clássica, mas sem a pretensão de esgotar o assunto.

O primeiro desenho animado americano, Humorous Phases of Funny Faces, surgiu em 1906, apresentado pela Vitagraph e realizado por James Stuart Blackton, um dos co-fundadores desta companhia.

Pelos padrões atuais de animação, o desenho de Blackton era muito rudimentar.          Compunha-se de uma série de rostos, desenhados por uma mão “invisível”.Porém, tendo em vista a época em que foi feito, esse desenho simples de um rolo, foi um passo importante.

Winsor McCay demonstrou um nível técnico mais elevado e descobriu como dar personalidade às suas criações, idealizando aquele que muitos historiadores consideram como o primeiro astro genuíno do cartum americano, Gertie, the Dinosaur (1914). Antes de Gertie, porém, em 1911, McCay fez seu primeiro desenho animado, Little Nemo, baseado nos seus quadrinhos Nemo no País dos Sonhos / Little Nemo in Slumberland, no qual, numa introdução ao vivo, McCay mostrava seu talento, desenhando seus personagens rapidamente diante de um grupo de amigos, que incluia o comediante John Bunny, o desenhista de quadrinhos George MacManus e vários executivos da Vitagraph. McCay usou 4.000 desenhos para animar cinco minutos de filme. No seu segundo cartum, The Story of a Mosquito ou How a Mosquito Operates (relançado como His Jersey Skeeters) ele usou 6.000 desenhos.

Gertie, the Dinosaur começa, como Little Nemo, com uma introdução ao vivo. Desta vez, McCay e seus colegas vão ao Museu de História Natural em Nova York para ver a exibição de um dinosauro. McCay aposta que pode dar vida ao animal pré-histórico. A cena seguinte leva-nos para um outro cenário, onde McCay desenha Gertie num grande cavalete de pintor. Gertie então começa a andar sobre o papel. Ele é travesso e nem sempre obedece ao comando de McCay. Suas ações proporcionam boa parte do humor da animação. Gertie briga com um mamute e bebe toda a água de um lago. McCay utilizou mais de 10.000 desenhos, incluindo fundos, traçados com tinta preta num papel de arroz branco.

Algum tempo depois da realização de Gertie, McCay descobriu os benefícios do método de animação por célula – patenteado, como veremos adiante, por J. R. Bray e Earl Hudd -, na realização de The Sinking of The Lusitânia (1918), a primeira reencenação de um acontecimento histórico.

Em 1921, com a ajuda de seu filho, Robert McCay, ele produziu e animou uma série de desenhos animados, baseada na sua história em quadrinhos Dream of a Rarebit Fiend e mais seis cartuns (The Pet, The Flying, House Bug Vaudeville, The Centaurs, Flip’s Circus e Gertie on Tour, antes de realizar seu último trabalho, The Midsummer’s Nightmare (1922).

Um outro pioneiro responsável pelo melhoramento da animação foi John Randolph (J. R.) Bray. O desenho animado de Bray, The Artist’s Dream ou The Dacshund and the Sausage, lançado em 1913, foi o primeiro filme de animação distribuído comercialmente nos cinemas. Nele vemos um desenhista que interrompe seu trabalho deixando um cartum quase pronto no papel. Na sua ausência, o cachorro que ele estava desenhando, ganha vida e come seu prato de salsichas. O segundo cartum de Bray, Colonel Heeza Liar in Africa, inspirado nas aventuras do Barão de Munchausen, era, na realidade, uma sátira ao então presidente Teddy Roosevelt. O personagem fez grande sucesso e originou outras séries como Boppy Bumps (1915), Otto Luck (1915), Police Dog (1915) e Quacky Doodles (1917). Mais tarde, Bray produziu e dirigiu o primeiro cartum em cores, The Debut of Thomas the Cat, usando o processo bicolor Brewster.

Em 1914, Bray registrou a patente de um novo método de animação pelo qual o fundo permaneceria fixo e os objetos a serem animados seriam desenhados sobre folhas de celulóide transparente chamado célula (cel., abreviatura de celluloid), eliminando-se assim a necessidade de redesenhar o fundo de cada quadro. No ano seguinte, seu colega Earl Hudd aperfeiçoou o método de Bray. Em 1917, Bray e Hurd combinaram suas patentes e formaram a Bray-Hurd Process Company. Durante muitos anos, eles emitiram certificados de licença para quem quizesse fazer desenhos animados usando o método de animação por célula, que eles desenvolveram.

Bray organizou um estúdio capaz de produzir desenhos animados em grande quantidade e deu emprego a vários jovens artistas, que aprenderam ali as noções elementares da arte da animação: Max Fleischer, Paul Terry. Walter Lantz, etc.

Entretanto, durante os anos 10, Bray não foi o único produtor de desenhos animados. Havia mais dois estúdios: o Barré-Nolan e o Hearst International.

Antigos colegas no Edison Studios, Raoul Barré e Bill Nolan sentiram-se preparados para fundar seu próprio estúdio, dedicado cem por cento à animação. Concentrando suas energias, eles produziram a série de animação Animated Grouch Chasers (1915-1916), distribuida por Edison. O maior êxito de Barré foi com a série Mutt and Jeff (1918), baseada nos personagens dos quadrinhos muito populares de Bud Fisher. Fisher procurou o animador independente Charles Bowers para transformar seus quadrinhos em cartuns. Os dois formaram uma parceria e Mutt e Jeff tornou-se um grande êxito de bilheteria. Para garantir a qualidade da animação de seus filmes, Barré investiu em aulas de arte para seus animadores, em antecipação a Walt Disney nos anos 30.

Em 1915, o magnata da imprensa William Randolph Hearst percebeu o valor comercial da animação, abrindo seu próprio estúdio, International Film Service. Hearst conseguiu atrair animadores talentosos como Gregory La Cava (futuro cineasta), Frank Moser, Bill Nolan e Walter Lantz, com o propósito de transportar as histórias em quadrinhos de seus jornais para a tela, acrescentando os cartuns na parte final de seus newsreels. Rapidamente, a companhia de Hearst produziu versões animadas de quadrinhos favoritos do público como Phables (1915-1916), Krazy Kat (1916-1917), Bringing Up Father (1916-1917), Jerry on the Job (1916-1917), Katzenjammer Kids (1916-1918), Happy Hooligan (1916-1919), etc. Em 1938, a MGM produziu uma versão sonora dos Katzenjammer Kids com o título de Captain and the Kids, mantendo os mesmos personagens dos quadrinhos de Rudolf Dirks.

Paul Terry, que começou a trabalhar no J. R. Bray Studios, dirigindo e produzindo a série de cartuns Farmer Al Falfa, também se tornou uma figura importante no campo da animação cinematográfica. Em 1917, ele fundou seu próprio estúdio, Paul Terry Productions. Após lutar pela pátria na Primeira Guerra Mundial, Terry fez uma parceria com Amadee J. Van Beuren e montou um novo estúdio, Fables Studios.

Nesta ocasião, começou a produzir a série Aesops Fables assim como novos filmes com o fazendeiro Al Falfa. Em 1928, ele experimentou o processo sonoro num Fable Cartoon intitulado Dinner Time, alguns meses antes do Steamboat Billie de Walt Disney. A união entre Terry e Van Beuren durou até 1929, quando eles se desentenderam a respeito da adesão ao cinema sonoro. Terry e uma parte de sua equipe abriram o Terrytoons Studio na suburbana New Rochelle em Nova York. Van Beuren ficou com o Fables Studios e rebatizou-o como Van Beuren Studios. O Terrytoons Studios produziu inúmeros cartuns entre os quais Gandy Goose, Mighty Mouse, Heckle and Jeckle e outros menos conhecidos, que foram primeiramente distribuídos pela Educational Pictures e depois pela 20th Century Fox.

Combinando o poder do Superman e o corpo do Mickey Mouse, o Mighty Mouse foi o desenho animado mais popular de Paul Terry. Por mais de 15 anos, o personagem defendeu os direitos dos ratos, que precisavam de sua superforça para prevenir os seus transtornos e impor a ordem. Um escritor de histórias empregado de Terry, Isadore Klein, teve a idéia do personagem do Mighty Mouse por volta de 1940, mas esboçou-o sob a forma de uma “super mosca” com uma capa vermelha igual à do Superman. Terry mudou a mosca de Klein para um rato e batizou-o de “Super Mouse” em quatro cartuns, que foram apresentados em 1942 a partir do desenho The Mouse of Tomorrow. Depois, Terry mudou o nome do personagem para Mighty Mouse que, no Brasil, ganhou o nome de Possante. Se não me falha a memória, Heckel and Jeckle chamavam-se, nos cinemas, Cari e Oca e não Faísca e Fumaça, como comumente são designados, que são os nomes que receberam na TV.

Um personagem muito conhecido no desenho animado silencioso foi Felix the Cat, um gato preto de olhos azuis e sorriso largo, sempre metido em situações surrealistas. O cartunista australiano, Pat Sullivan, reivindicou durante toda a sua vida a criação desse personagem, porém muitos historiadores (entre eles Michael Barrier, autor de um livro admirável, Hollywood Cartoons: American Animation in its Golden Age (Oxford University, 1999), argumentam que o principal animador do estúdio de Sullivan, Otto Messmer, era o verdadeiro criador do Gato Felix. O certo é que, em novembro de 1919, Master Tom, um protótipo de Felix, estreou num cartum intitulado Feline Folllies, produzido pelo estúdio de Pat Sullivan. Sullivan era o dono do estúdio e tinha os direitos autorais de qualquer trabalho criativo de seus empregados.

Em 1927, após o advento do cinema sonoro, a Educational Picutres, que distribuía os desenhos de Felix na época, pediu a Sullivan que fizesse desenhos “falados”. Ele, de início, recusou a proposta e, depois, outras disputas levaram ao rompimento com a Educational. Posteriormente, Sullivan percebeu as possibilidades do som. Ele conseguiu assinar um contrato com a First National, para distribuir os seus desenhos falados, mas, por razões desconhecidas, a parceria se desfez e Sullivan então distribuiu seus cartuns silenciosos com uma trilha sonora através da Copley Pictures. Infelizmente, a transição de Sullivan para o cinema sonoro foi desastrosa e a Copley cancelou o contrato com Sullivan.

Outros artistas estabeleceram novos padrões para a indústria da animação como Max e Dave Fleischer, Walter Lantz e Walt Disney.

Max Fleischer produziu a série Out of the Inkwell – que tinha como personagem principal Koko, the Clown (depois Ko-Ko, com o hífen), um pequeno palhaço que saía de um tinteiro – para o estúdio de J. R. Bray até 1921, quando ele e seu irmão Dave formaram o Fleischer Studios. Outros dois irmãos, Lou e Joe Fleischer, trabalharam na firma e o companheiro de Koko na série era o cachorrinho branco Fitz.

A série Out of the Inkwell (denominada Inkwell Imps, a partir de 1927) foi uma das primeiras a conjugar ação ao vivo com animação, por meio de um processo chamado Rotoscope (Rotoscópio), que Max e Dave desenvolveram. Esta técnica consistia simplesmente numa prancha de desenho e um projetor de filmes combinados, possibilitando aos animadores, redesenharem quadro por quadro, imagens projetadas de figuras humanas. Koko (conhecido no Brasil como Tony Tinta) era, na realidade, Dave Fleischer vestido de palhaço. Ele dava cambalhotas e fazia outras acrobacias diante da câmera e depois exagerava-as na animação final. Primeiramente, os Fleischer distribuíram eles mesmos a série na base do state’s rights; depois, em algum momento de 1922, eles entregaram a distribuição para Margaret Winkler, uma ex-secretária da Warner Bros, que resolvera se tornar distribuidora por conta própria. Em 1923, Max Fleischer parou de animar a série e seu irmão Dave assumiu este encargo.

Os primeiros cinemas nos Estados Unidos costumavam mostrar no palco slides com letras de músicas populares para estimular o público a acompanhar o cantor que as interpretava no palco. Em 1924, os Fleischer tiveram a idéia usar cartuns, nos quais as letras das canções eram animadas numa tela e uma bolinha saltitante (bouncing ball), servia de guia para que os espectadores cantassem. Esses cartuns chamavam-se, de início, Song Car-Tunes e depois Koko Songs, pois os personagens de Koko e Fitz eram usados na animação. Alguns desses sing-a-long cartoons foram sincronizados pelo processo de som ótico Phonofilm de Lee De Forest.

Anunciada como “verdadeiros filmes falados”, a série Talkartoons representou a entrada do Fleischer Studios no cinema de animação sonoro. No sexto desenho da série, Dizzy Dishes, produzido em 1930, o estúdio introduziu a personagem Betty Boop, criada e desenhada por Grim Natwick. Betty parecia mais uma cadelinha e somente algum tempo depois adquiriu personalidade humana, transformando-se naquela boneca com um rosto redondo desproporcional ao seu corpinho, lindas bochechas, olhos grandes e cintilantes e voz de criança. Betty não tinha nome até sua aparição em Stopping the Show, realizado em 1932, que se tornou o primeiro desenho oficial de Betty Boop. No mesmo ano, a partir do desenho Minnie the Mocher, Betty tornou-se aquela figurinha sensual de saia curta, liga numa das pernas, vestida à moda flapper e dizendo aquele seu slogan atrevido, “Boop-Boop-a-Do!”. Natwick modelou Betty inspirando-se na cantora Helen Kane, por coincidência, atriz contratada da Paramount, que distribuía os desenhos animados da graciosa criatura. A similaridade vocal e visual com Helen Kane provocou um processo judicial de Helen contra a Paramount e o Fleischer Studios, mas ela perdeu a ação, principalmente porque a defesa demonstrou que a própria Helen havia se apropriado de alguns maneirismos de outras cantoras. Como coadjuvante de Betty Boop na série, além de Koko, havia um personagem identificado como Bimbo, que algumas vezes parecia o cachorrinho branco Fitz, companheiro do palhacinho na série Out of the Inkwell e, em outras vezes, aparecia como um cachorrinho preto com uma máscara branca.

A popularidade de Betty Boop foi irreparavelmente prejudicada pelo Código Hays de 1934. Sua sexualidade evidente foi atenuada, suas saias ficaram menos curtas e seu decote mais discreto, o conteúdo de suas histórias tornou-se mais juvenil. Em conseqüência, Betty perdeu muito da sua popularidade.

Os Fleischer, com exceção talvez de Betty Boop, nunca conseguiram criar personagens fortes e então eles foram buscar um em outro lugar. Em 1932, o Fleischer Studio celebrou contrato com o King Features Syndicate, para produzir os desenhos animados do Popeye. O personagem surgiu no mundo das histórias em quadrinhos em 1919, quando Elzie Crisler Segar concebeu o marinheiro musculoso, originalmente conhecido como Ham Gravy na tira clássica, Thimble Theatre. Gravy aparecia ao lado da sua namorada magricela, Olive Oyl (Olívia Palito). Em 1929, Segar, aproveitando a popularidade de Gravy, mudou seu nome para Popeye. Já nesta época o personagem exibia os mesmos traços que os espectadores se acostumariam a ver depois: um marujo brigão e piadista, cuja principal fonte de energia era a sua lata de espinafre.

A estréia de Popeye se deu num desenho da Betty Boop, Marinheiro Matamouro / Popeye, the Sailor (1933), porque os Fleischer queriam avaliar a reação do público, antes de colocá-lo como astro de um cartum. William Costello, cantor de boate, foi o primeiro a interpretar Popeye; porém foi despedido, depois que “o sucesso lhe subiu à cabeça”. Quando Dave estava andando pelo departamento de animação do estúdio ele ouviu Jack Mercer, um animador novato cantando a canção tema de Popeye e o contratou na hora. Mercer continuou fazendo a voz de Popeye por mais de 45 anos, incluindo os desenhos depois produzidos para a televisão. Mae Questel, que fazia também a voz de Betty Boop, interpretava Olive Oyl. Mae demonstrou sua versatilidade durante o decorrer da série, tendo inclusive feito a voz do Popeye em vários desenhos, quando Mercer foi mandado para além-mar na Segunda Guerra Mundial.

O Fleischer Studios funcionava em Nova York com o apoio financeiro da Paramount. Mas, como recipiente do dinheiro da Paramount, os Fleischer também estavam à mercê da administração desta grande companhia de Hollywood. Durante a Grande Depressão, a Paramount passou por várias mudanças e reorganizações, que afetaram os orçamentos para as produções e criaram obstáculos para o desenvolvimento do estúdio dos Fleischers.

Quando o processo Technicolor de três cores se tornou disponível, a Paramount vetou-o, preocupada com seu equilíbrio econômico, dando a Walt Disney a oportunidade de adquirir uma exclusividade para usar o processo por quatro anos. Dois anos depois, a Paramount aprovou a produção em cores para os Fleischer, porém apenas num processo inferior de duas cores. A série Color Classics foi introduzida em 1934 como uma resposta dos Fleischer para as Sinfonias Singulares / Silly Symphonies de Disney. Estes cartuns coloridos foram enriquecidos com um efeito de fundo tri-dimensional, chamado “Processo Estereótico”, um precursor da câmera multiplana de Disney. Esta técnica foi utilizada nos desenhos de Popeye de maior formato como, por exemplo, O Marinheiro Popeye contra Sinbad o Marujo / Popeye the Sailor Meets Sinbad the Sailor (1936) e Popeye o Marinheiro contra os 40 Ladrões de Ali Baba / Popeye the Sailor Meets Ali Baba’s Forty Thieves (1937). Esta série de cartuns de dois rolos expressava o desejo dos Fleischer de produzir desenhos animados de longa-metragem.

Em 1937, a produção no Fleischer Studios foi afetada por uma greve, que deixou seus cartuns fora das telas. Após cinco meses, a Paramount persuadiu os Fleischer a chegarem a um acordo com os grevistas. Então, em março de 1938, o Fleischer Studios mudou-se para Miami, Flórida, não só para se afastar da agitação sindicalista, mas também porque ele precisava de mais espaço para a produção de longas-metragens. Coincidentemente, com a mudança, o relacionamento entre os irmãos Dave e Max começou a se deteriorar, porque Dave iniciou um romance adulterino com a sua secretária e a situação foi agravada por outras disputas pessoais e profissionais.

Na onda do êxito indiscutível de Disney com Branca de Neve e os Sete Anões / Snow White and the Seven Dwarfs em 1937, os executivos da Paramount atenderam finalmente aos constantes pedidos dos Fleischer para produzir desenhos animados de longa-metragem.  A fim de financiar o novo projeto os Fleischer negociaram um empréstimo com a Paramount, dando como garantia os ativos do estúdio pelo prazo do empréstimo.

Embora As Aventuras de Gulliver / Gulliver’s Travels (1939) tivesse tido uma bilheteria razoável, ela não recuperou todos os custos da produção. O golpe final veio com o infortunado lançamento de seu segundo longa-metragem, No Mundo da Carochinha / Mr. Bug Comes to Town (1941), dois dias antes do ataque japonês a Pearl Harbor. Em maio de 1941 a Paramount iniciou a tomada de posse do Fleischer Studios. Max permaneceu nominalmente como diretor, mas sua briga com Dave complicava a situação. Logo depois da estréia de No Mundo da Carochinha, Dave partiu para a Califórnia, a fim de chefiar a unidade de produção de desenhos animados da Screen Gems, pertencente à Columbia Pictures. Este passo constituiu uma infração contratual de Dave, por ter aceitado uma posição num estúdio concorrente, enquanto ainda estava contratado pela Paramount. Esta ruptura de contrato, juntamente com o aumento substancial da dívida dos Fleischer para com a Paramount, permitiu que o estúdio maior assumisse o controle do estúdio menor, obrigando Max a pedir demissão. A Paramount nomeou novos administradores, entre eles o genro de Max, Seymour Kneitel. Em maio de 1942, o estúdio recebeu um novo nome, Famous Studios, e dentro de oito meses transferiu suas instalações de volta para Nova York.

Em 1941, os primeiros nove (de um total de 17) cartuns do Superman em Technicolor –  baseados nas histórias em quadrinhos de Jerry Siegel e Joe Shuster -, conhecidos como Fleischer Superman Cartoons, começaram a ser produzidos pelo Fleischer Studios. Os oito restantes foram feitos pelo Famous Studios, após a reorganização. Pelo seu aspecto Art Deco e técnica sofisticada, a série Superman é considerada hoje o triunfo final do Fleischer Studio.

Em 1944, Max Fleischer acrescentou a série Little Lulu, baseada na personagem dos quadrinhos de Marjorie H. Bell, ao elenco de astros do desenho animado do Famous Studio. Em 1948, o produtor Joseph Oriolo criou, com a ajuda do animador Seymour Wright, mais uma série de cartuns para o Famous Studio: Casper, The Friendly Ghost. Este último personagem, conhecido no Brasil como Gasparzinho, fazia muita criança chorar, quando dizia que desejava ter “alguém para brincar comigo”.

Walter Lantz aprendeu a arte da animação no J. R. Bray Studios e depois no Hearst International. Em 1924, Lantz começou a ganhar importância com sua primeira série de desenhos animados, Dinky Doodle. Em 1927, mudou-se para Hollywood, onde trabalhou com Frank Capra e como gagman para Mack Sennett.

No mesmo ano, Charles Mintz, marido de Margaret Winkler, dona de uma pequena distribuidora, Winkler Pictures, pediu a Disney para criar um personagem de coelho e assinou um contrato com uma organização maior, a Universal, para a distribuição de uma série de 26 cartuns, estrelados, conforme especificação da companhia de Carl Laemmle, pelo novo personagem chamado Oswald the Lucky Rabbit. Walt começou a produzir os filmes de Oswald, mas nem Mintz nem a Universal ficaram satisfeitos. Em fevereiro de 1928, Mintz celebrou novo contrato com a Universal para produzir Oswald; porém, ao concluir o negócio, não concedeu a Walt os direitos sobre o personagem, que ele havia criado. Mintz então contratou Walter Lantz para dirigir a série Oswald. Lantz apostou com Laemmle que, se conseguisse vencê-lo num jogo de pôquer, Oswald seria seu. Lantz ganhou a aposta e se tornou o dono do personagem. Lantz formou uma equipe com ex-animadores de Disney, tais como Hugh Harman, Rudolf Ising, etc. e mudou um pouco o personagem tornando-o mais gracioso. Por curiosidade, Mickey Rooney, com nove anos de idade, foi o primeiro a emprestar sua voz para Oswald, quando Lantz adicionou o som aos cartuns. Lantz e Bill Nolan dirigiram a maioria dos desenhos animados da série. Em 1933, Lantz dirigiu o único cartum da série indicado para o Oscar, Fama e Fortuna / The Merry Old Soul e animou um seqüência em Technicolor de duas cores para o musical-revista O Rei do Jazz / The King of Jazz , no qual aparece Oswald e o chefe de orquestra Paul Whiteman.

Em 1935, Nolan separou-se de Lantz e este se tornou produtor independente, fornecendo cartuns para a Universal em vez de meramente supervisionar o departamento de animação deste estúdio. Oswald foi perdendo a popularidade e Lantz criou um novo astro, Andy Panda. Mas a inspiração para o seu melhor personagem surgiu – segundo a lenda – na sua lua-de-mel, quando ele e a esposa Grace Stafford, ouviram o barulho de um picapau fazendo furos no telhado da cabana, onde estavam hospedados. Na verdade, esta história foi inventada por um publicista de Hollywood: a lua-de-mel dos Lantz ocorreu um ano após a estréia do primeiro desenho do Pica-Pau. Lantz introduziu Woody Woodpecker num desenho de Andy Panda, Knock Knock (1941), e o novo personagem aprovou.

Mel Blanc fêz a voz para Woody nos primeiros quatro ou cinco cartuns. Ben “Bugs” Hardaway, escritor de histórias para os desenhos de Lantz, emprestou seu talento vocal para o personagem após a saída de Blanc, mas não exerceu este encargo por muito tempo. Lantz sentiu que precisava fazer uma mudança e testou 50 candidatos para a “nova” voz de Woody. Lantz não estava presente nos testes, mas foi o responsável pela escolha final. Ouvindo as gravações dos testes, ele selecionou Grace, sua esposa, que tinha se candidatado para as entrevistas, sem informar o marido. Grace começou sua função no desenho Banquet Busters (1948) e continuou sendo a voz de Woody até o final da série, 24 anos depois, em 1952. A seu pedido, ela não recebeu crédito pela voz de Woody, porque receava que as crianças ficassem desiludidas, se soubessem que uma mulher fazia a voz do famoso picapau.

Woody Woodpecker teve vários coadjuvantes: Wally Walrus, Buzz Buzzard, Gabby Gator, Wolfie Wolf e Finx Fox. Buzz Buzzard apareceu pela primeira vez ao lado de Woody em Wet Blanket Policy, que foi o primeiro cartum a incluir uma canção sensacional, “The Woody Woodpecker Song”, interpretada por Gloria Wood e Harry Babbitt. Foi o único desenho curto indicado para o Oscar de Melhor Canção. Lantz criou ainda, entre outros, um personagem muito conhecido: o pingüim Chilly Willy (Picolino), que estreou na tela em 1953.

Vou deixar para falar sobre Walt Disney em outra oportunidade, pois ele merece um artigo inteiro, mas peço licença para mencionar desde logo o nome daquele que foi um grande amigo do criador do camundongo Mickey: Ub Iwerks.

Depois de ter passado a maior parte de sua carreira como colaborador de Disney, Iwerks aceitou uma proposta de Pat Powers de abrir um estúdio com seu próprio nome. Apesar de ter um contrato com a MGM para distribuir seus cartuns, e de ter introduzido um personagem novo chamado Flip the Frog, e depois outro, Willie Whopper, o estúdio de Iwerks nunca obteve um grande sucesso comercial e nem chegou a se constituir um rival para Disney ou para o Fleischer Studios.

De 1933 a 1936, Iwerks produziu uma série de desenhos animados (distribuídos independentemente e não pela MGM) em Cinecolor, intitulada ComiColor Cartoons. A série incluía o personagem de um negrinho que surgiu em Sambo, o Negrinho / Little Black Sambo, um cartum estereotipado racialmente que veio a ser banido nos Estados Unidos (mas foi exibido no Brasil em 1938). Em 1936, os patrocinadores retiraram o apoio financeiro para o Iwerks Studio e este logo encerrou suas atividades. Alguns desenhos da série ComiColor foram exibidos nos cinemas brasileiros como Historietas Eucalol, título em português certamente inspirado na estampas que vinham junto com o sabonete fabricado pela Perfumaria Myrta. S/A. Colhemos estes títulos, todos exibidos em 1938 -1939: Aladin e a Lâmpada Maravilhosa / Aladin and the Wonderful Lamp; Sinbad, o Marujo / Sinbad, the Sailor; Simão, o Simplório / Simple Simon; João e o Pé de Feijão / Jack and the Beanstalk; O Pequeno Polegar / Tom Thumb, O Gato de Botas / Puss in Boots; O Rapazinho de Azul / Little Boy Blue; Dias Felizes / Happy Days. Em 1934, a Columbia e a Paramount Pictures distribuíram duas outras séries de contos-de-fadas, intituladas respectivamente, Color Rhapsodies e Color Classics.

Os desenhos animados do personagem Bosko, criado por Hugh Harman e Rudolf “Rudy” Ising foram, juntamente com os de Betty Boop e Mickey Mouse, os mais exibidos nos cinemas do Brasil nos anos trinta. Harman e Ising haviam trabalhado com Disney e Lantz e finalmente criaram o desenho animado Bosko, the Talk-in Kid, que ficou famoso por ter sido o primeiro cartum sonoro com diálogo. Este desenho animado, que mostrava Bosko em desacordo com o seu animador – retratado em ação ao vivo por Ising – impressionou Leon Schlesinger, que aproximou a Harman-Ising Pictures da Warner Bros. Schlesinger queria Bosko como astro de uma nova série de cartuns “falados”, que ele denominou de Looney Toones.

Desde 1929 a Warner estava interessada em desenvolver uma série de desenhos animados musicais para promover a venda de suas partituras e discos (ela havia adquirido a Brunswick Records e quatro editoras de partituras). A dupla Harman-Ising fez Sinkin’ in the Bathtub em 1930 e o cartum aprovou. Harman assumiu a direção da Looney Tunes e Ising encarregou-se de uma série semelhante, Merry Melodies.

Os dois animadores romperam os laços com Schlesinger em 1933 por questão de dinheiro e, depois de uma estadia no estúdio de Van Beuren, onde produziram a série Cubby Bear, foram para MGM. Eles ficaram com os direitos de explorar o personagem Bosko e, a partir de 1934, estrearam com ele uma nova série para a “Marca do Leão”, intitulada Happy Harmonies. Bosko usava calças compridas e um chapéuzinho e tinha uma namorada chamada Honey e um cãozinho, que atendia pelo nome de Bruno. Embora Harman e Ising tivessem se inspirado nos traços do Gato Felix, Bosko ganhou sua personalidade dos personagens de cara pintada de preto dos espetáculos de menestréis e de vaudeville muito populares nos anos trinta. Harman e Ising fizeram de Bosko, um garoto negro genuíno. Seus cartuns eram marcados pela fraqueza dos diálogos e abundância de música, canto e dança; mas, em termos de animação, eles se igualavam aos desenhos animados de Disney no mesmo período.

Schlesinger, por sua vez, continuou produzindo as séries Merry Melodies e Looney Tunes para a Warner, introduzindo um substituto para Bosko, chamado Buddy, cujos desenhos animados também passaram no Brasil. Porém o maior astro da série, Porky Pig (Gaguinho) surgiu, juntamente como outro personagem, Beans the Cat, no desenho Haven’t Got a Hat, da série Merry Melodies, dirigido por Fritz Freleng. Beans the Cat depois desapareceu por causa da sua decrescente popularidade e Porky se firmou como a maior atração da série. Posteriormente, apareceram: Daffy Duck (Patolino), Elmer Fudd (Hortelino Troca-Letra), Sylvester (Frajola), Tweety (Piu-Piu), Marvin (Marvin, o Marciano), Coyote (Coyote), Road Runner (Papa-Léguas), Foghorn Leghorn (Frangolino) Speedy Gonzales (Ligeirinho), Taz (O Demônio da Tasmânia), Yosemite Sam (Eufrasino Puxa-Briga) etc. e o mais célebre da série Looney Tunes: Bugs Bunny, o Coelho Pernalonga. Estes títulos em português dos personagens correspondem à exibição na TV. Nos cinemas, se não me engano, os nomes vinham no original em inglês.

Buggs Bunny foi, sem dúvida, um dos personagens de cartum mais populares da História da Animação. O coelho sorridente de orelhas compridas, que vivia mastigando cenouras ruidosamente e pronunciava, com sotaque do Brooklyn, a frase famosa “What’s up, Doc”, estrelou 150 desenhos animados durante os seus 25 anos de existência nas telas. Bugs apareceu pela primeira vez como um “coelho sem nome” em Porky’s Hare Hunt (1938). Tex Avery dirigiu o primeiro desenho animado oficial de Bugs Bunny, A Wild Hare. Mel Blanc ajudou a imortalizar, com sua voz, o célebre personagem. Apelidado de “O Homem das Mil Vozes”, ele se notabilizou por ter feito a voz de vários personagens dos cartuns além do Pica-Pau e do Pernalonga. Os dubladores não eram creditados nos letreiros de apresentação do filme, mas Blanc foi uma exceção: seu contrato estipulava que deveria sair na tela um crédito dizendo: “Voice characterization by Mel Blanc”.

Um outro personagem cujos cartoons tiveram boa acolhida no Brasil nos anos 30 foi Scrappy, produzido pela Columbia. O desenhista Dick Huemer criou este menino com olhos de botão e seu cãozinho fiel, Yippy. Quando Huemer deixou de fazer a série em 1933, para ingressar no Walt Disney Stuidos, Art Davis e Sid Marcus, que escreviam a maioria das histórias, continuaram a produção. Aqui entre nós, Scrappy era chamado de Chiquinho.

Não podemos esquecer de Tex Avery, que prestou relevantes serviços para a Warner Bros. e para a MGM. Avery começou sua carreira no estúdio de Walter Lantz, trabalhando na maioria dos cartuns de Oswald the Lucky Rabbitt de 1931 a 1935. Durante uma brincadeira no estúdio um clipe para papel voou para o olho esquerdo de Avery, cegando-o.

Avery emigrou para o estúdio de Leon Schlesinger em 1935 e o convenceu a lhe entregar a chefia de sua própria unidade de produção com a liberdade de criar cartuns como ele queria que fossem feitos. Avery e seus colaboradores Bob Clampett e Chuck Jones, instalaram-se num bangalô da Warner em Sunset Boulevard, que foi apelidado de “Termite Terrace”, devido a existência no local de uma significativa população de cupins. Avery, com a colaboração de Clampett, Jones e um novo animador, Frank Tashlin, lançaram as bases de um estilo de animação que destronou o estúdio de Walt Disney como os reis do desenho animado e criou uma legião de astros do cartum, cujos nomes brilham em todas as telas do mundo até hoje.

Em 1942, Avery estava empregado na MGM, trabalhando na sua divisão de animação sob a supervisão de Fred Quimby. Avery achava que Schlesinger o sufocava. Na MGM a criatividade de Avery atingiu o auge. Seus desenhos animados tornaram-se conhecidos por sua loucura total, ritmo frenético e um pendor para brincar com o meio da animação e do filme em geral. A MGM ofereceu-lhe orçamentos mais generosos e uma qualidade de produção mais alta que o estúdio da Warner. O personagem mais famoso que Avery criou para a MGM foi Droopy, um cachorrinho calmo que se movia lentamente e sempre saia ganhando no final. Avery criou também uma série de cartuns maliciosos como A Sedutora Menina do Chapeuzinho Vermelho / Red Hot Riding Hood, estrelado por uma personagem feminina bastante sensual e outros personagens como o Screwy Squirrell e aqueles outros dois, inspirados na dupla da novela de John Steinbeck, Of Mice and Men, George e Junior.

Vou terminar esse breve retrospecto dos grandes desenhos animados da era clássica, lembrando a série de desenhos animados de Tom e Jerry, criada pela dupla William Hanna- Joseph Barbera para a MGM. O cartum focalizava a rivalidade interminável entre um gato (Tom) e um rato (Jerry), mostrando gags violentos comicamente. As tramas se baseavam nas tentativas frustradas de Tom capturar Jerry, utilizando diversas armadilhas e truques, que eram frustrados pela esperteza do ratinho, por sua própria estupidez ou pela intervenção inesperada do buldogue Spike ou de Butch, o gato preto rival de Tom.

A dupla felino-roedora, se é que podemos denominá-la assim, surgiu em Um Bichano em Maus Lençóis / Puss Gets the Boot de 1940. Neste cartum, Tom chamava-se Jasper e Jerry era Jinks. A música desempenhava um papel importante nas aventuras de Tom e Jerry, enfatizando a ação, proporcionando efeitos sonoros e dando emoção às cenas. O diretor musical Scott Bradley criou scores combinando elementos de jazz, música clássica e popular.

O produtor Fred Quimby, responsável pelos cartuns da MGM, ganhou sete Oscar de Melhor Desenho Animado Curto: Rato Patriota / Yankee Doodle Mouse / 1943; Caça ao Rato / Mouse Trouble / 1944; Silêncio! / Quiet Please / 1945; O Concerto do Gato ou Concertista Desconcertado / The Cat Concert / 1946; Os Dois Mosqueteiros / Two Mouseketeers / 1951; Ratinho Valsante / Johann Mouse / 1952. Hannah e Barbera escreveram e dirigiram 114 desenhos animados de Tom e Jerry entre 1940 e 1958 e Quimby se aposentou em 1955; daí em diante até 1967, eles foram produzidos, sob os auspícios da MGM, por Gene Deitch no seu estúdio Rembrandt Films e depois por Chuck Jones na Sib Tower 12 Productions.

Além de participar nos desenhos animados curtos, Tom e Jerry apareceram em seqüências de ação ao vivo em dois musicais da MGM: Marujos do Amor / Anchors Aweigh / 1944 (somente Jerry, dançando com Gene Kelly) e Salve a Campeã / Dangerous When Wet / 1953 (ambos nadando com Esther Williams). Antes da série de Hannah-Barbera, houve uma outra, com o mesmo título, Tom and Jerry, produzida por Van Beuren e desenvolvida por John Foster, totalizando 27 filmes distribuídos pela RKO Radio Pictures, mas que não tinha nenhuma relação com os personagens inesquecíveis da MGM.

LEMBRANDO GRANDES SERIADOS

setembro 17, 2010

No final dos anos quarenta e início dos anos cinquenta, pude ver, no Cinema Pirajá em Ipanema – Rio de Janeiro e no Cineac-Trianon no centro da mesma cidade, alguns seriados como A Deusa de Joba, Capitão América, O Maravilhoso Mascarado, Dick Tracy, o Detetive, O Fantasma Voador, etc. Porém, a maioria dos 231 serials sonoros produzidos em Hollywood entre 1929 e 1956, só fui conhecer após o advento do vídeo e do dvd. Vou recordar os grandes seriados que ví e sobre os quais ainda não falei.

Os primeiros seriados que mais me impressionaram, A Deusa de Joba e O Império Submarino, foram produzidos pela Republic Pictures em 1936.

Embora tivesse sido lançado pela Republic como seu primeiro seriado, A Deusa de Joba foi produzido pessoalmente por Nat Levine na Mascot, e estava praticamente pronto, quando houve o processo de fusão da Consolidated Film Laboratories de Herbert Yates com a Mascot e mais três firmas, que tinham elevados débitos com os laboratórios de Yates: a Monogram, a Liberty e a Majestic.

No enredo, Clyde Beatty, o famoso caçador de leões, encontra nas selvas um menino, Baru (Manuel King), que procura auxílio para resgatar sua irmã Valerie (Elaine Shepard), a Deusa de Joba, uma cidade perdida num recanto inexplorado da África. Beatty concorda em ajudar Baru e organiza um safári. Acompanhados por Bongo (Ray “Crash” Corrigan, embora nos créditos saia o nome de Naba), que é o protetor de Baru, eles conseguem chegar a Joba, depois de enfrentar nativos hostís, leões, tigres e um grupo de guerreiros alados, chamados de Homens-Morcego. Em Joba, eles conhecem Dagna (Lucien Prival), o sumo sacerdote, que depende da influência de Valerie sobre o povo, para ajudá-lo a manter o poder. Valerie e Baru eram filhos de um missionário e, após a morte deste, Dagna criou-os, com a intenção de fazer Valerie passar por deusa. Dagna tenta impedí-los de sair de Joba. Colaborando com Dagna estão Durkin (Wheeler Oakman) e Craddock (Edmund Cbb), dois traficantes de animais, que seguiram o safári de Beatty, porque acreditam que existe uma fortuna na cidade perdida.

Dirigido por B. Reeves Eason e Joseph Kane, Clyde Beatty – na vida real, um célebre treinador de animais – vê-se envolvido em muitas das mesmas situações de um seriado anteriormente produzido pela Mascot, O Sertão Desaparecido / The Lost Jungle / 1934, no qual ele interpretava também o papel de si mesmo. Há também outra cidade, desta vez habitada, não por um gorila solitário, mas por uma raça de homens brancos, que parecem pertencer a uma outra era da civilização, e sua tropa de guerreiros alados, os Homens-Morcego.

Foram esses estranhos personagens, voando com seus vistosos capacetes de metal, que mais me encantaram pois, graças aos efeitos especiais de Howard e Theodore Lidecker, eles eram totalmente convincentes, muito superiores aos daqueles minúsculos Homens Falcão do seriado Flash Gordon da Universal, lançado no mesmo ano.

Porém a cena que me deixava imaginando se não haveria mesmo possibilidade de escapar, ocorria no capítulo quatorze, intitulado “O Divino Sacrifício”: O dito sacrifício era o de Valerie que, para salvar Clyde e seu irmão Baru, concordava com o pedido de Dagna, de saltar para a morte do alto de um penhasco. No final do capítulo, nós víamos uma figura vestida de branco mergulhar da beira do penhasco e se espatifar entre as rochas lá embaixo. Quando se iniciava o décimo quinto e último episódio, ficávamos aliviados ao ver que Gorn (Edward McWade), o velho Guardião dos Livros da Lei da Cidade Perdida de Joba, impedira Valerie de saltar e pulara em seu lugar vestido com as roupas dela. Depois, como acontece com todas as cidades perdidas dos seriads, a natureza se encarregava de destruir Joba e, naturalmente, somente Clyde e seus amigos escapavam da erupção de um vulcão.

Em O Império Submarino, o submarino que transporta o professor Norton (C. Montague Shaw), seu filho Billy (Lee Van Atta), o oficial da Marinha e superatleta Crash Corrigan (Ray Corrigan), a repórter Diana Compton (Lois Wilde) e mais dois marujos, Briny (Smiley Burnette) e Salty (Frankie Marvin) é atraído para o Continente Perdido de Atlantis, situado no fundo do mar. Ali, os seguidores de Sharad (William Farnum), sumo sacerdote dos verdadeiros atlantianos vivem em luta contra Unga Khan (Monte Blue), o líder dos Guardas Negros, que pretende conquistar o mundo da superfície, usando o seu poderoso Raio Desintegrador, uma máquina capaz de provocar terremotos num alvo preciso.

Este segundo seriado da Republic, também dirigido por B. Reeves Eason e Joseph Kane, mostra inventos futurísticos como raios da morte, robôs (chamados “Volkitas”), veículos blindados, videofone, etc. contrastando com lutas de espada, catapultas, corridas de biga e as vestimentas da antiga Roma ou Grécia. O espetáculo tem cenas muito animadas e talvez o mocinho mais parrudo dos seriados. Corrigan mostra sua grande capacidade atlética na cena em que desce pelo cabo de um elevador, derruba vários guardas e depois monta num cavalo e galopa em direção ao palácio de Sharad.

Em outras ocasiões, o herói enfrenta o exército do comandante dos Guardas Negros, Capitão Hakur (Lon Chaney Jr.), robôs, gladiadores no estilo romano e, no Capítulo Oitavo, encontra-se numa situação bastante difícil. O Capitão Hakur amarra Corrigan na frente do Juggernaut, um ultra-tanque armado, e faz este veículo correr velozmente de encontro aos portões da cidade. Felizmente, no episódio seguinte, alguém grita: “Abram os portões!” e o Juggernaut passa, ainda com Corrigan amarrado na sua parte dianteira, mas incólume.

O famoso detetive de rosto quadrado, chapéu de feltro e rádio transmissor-receptor no pulso, criado nos quadrinhos por Chester Gould em 1931, surgiu na tela em quatro seriados (Dick Tracy, o Detetive / Dick Tracy / 1937, A Volta de Dick Tracy / Dick Tracy Returns / 1938, Novas Aventuras de Dick Tracy / Dick Tracy’s G-Men / 1939, Dick Tracy Contra o Crime / Dick Tracy vs. Crime Inc. / 1941), todos interpretados por Ralph Byrd. Desses quatro, eu vi o primeiro nos anos 50 e os demais, somente anos mais tarde em vídeo ou dvd; mas é exatamente do primeiro que eu quero falar, porque foi o seriado que mais me assustou quando criança.

A  história em quadrinhos de Dick Tracy era singular, particularmente por causa dos vilões imaginados por Gould. Eles eram monstruosidades bizarras, criaturas inacreditáveis que não poderiam ter existido em nenhum lugar deste planeta, nem mesmo nos mais extravagantes freak shows circenses.

Alguns desses tipos grotescos da tira de jornal foram mantidos, quando a Republic resolveu fazer o seriado Dick Tracy, o Detetive. O vilão era tão monstruoso quanto muitos dos arqui-inimigos do detetive  nos quadrinhos. Na trama, o policial tentava pôr fim às atividades de um bandido conhecido como The Spider (O Aranha) ou The Lame One (O Coxo), personagem feíssimo, com uma cabeça grande e calva, circundada por uma faixa de cabelos e ainda tinha as sobrancelhas cerradas. No processo dos vários crimes que O Coxo e sua quadrilha cometiam, entre os quais se incluia o uso de um raio da morte transportado por um avião futurístico, para destruir a Bay Bridge em San Franciso, o Coxo capturava o irmão de Tracy, Gordon (Charleton Young). O principal auxiliar do facínora, um corcunda chamado Dr.Moloch (John Picorri), praticava uma intervenção cirúrgica no cérebro de Gordon, tornando-o um autômato a serviço da quadrilha. No final, a verdadeira identidade do Coxo é revelada: aquela cara feia era apenas um disfarce. Nos seriados seguintes de Dick Tracy, as caracterizações insólitas e aterrorizantes foram substituídas por bandidos mais humanos.

A cena em que o Coxo aparece pela primeira vez num trem, nunca me saiu da memória, não só porque me deu medo, mas também porque era uma cena de cinema puro. A câmera focalizava apenas os seus pés, andando com um dos sapatos deformado e escutavamos o barulho que faz o andar de um manco.”Ele vem aí!”, exclama um dos cinco asseclas que o aguardavam numa das cabines do trem. De repente, surge o Coxo de corpo inteiro e vemos apenas seu vulto negro no escuro. Ele fica parado na porta da cabine e cobra dos cúmplices os resultados de suas ações criminosas. Um deles rebela-se contra o chefe, puxa uma arma e atira. Mas o vulto parece ser imune às balas e reage com uma gargalhada sinistra. “Ele não é humano!”, gritam os homens apavorados. Apavorado também estava eu, encolhido na poltrona de madeira desconfortável do Pirajá.

Dirigido por Ray Taylor e Alan James, Dick Tracy, o Detetive foi considerado um dos melhores seriados dos anos 30 por sua produção cuidada, trama bem urdida e efeitos especiais providenciados pelos irmãos Lydecker, os magos das miniaturas do estúdio. No papel principal, Ralph Byrd, ficou associado ao personagem até sua morte, em 1952, aos 43 anos de idade e se tornou um dos poucos atores reconhecidos como astros do filme seriado sonoro ao lado de Buster Crabbe e Kirk Allyn.

Existem porém preferências pelos outros três seriados de Dick Tracy, dirigidos por William Witney e John English, sob o fundamento de que tinham mais ação. Em A Volta de Dick Tracy / Dick Tracy Returns / 1939 o herói, agora G-Man, lutava contra Pa Stark (personificado por Charles Middleton, o Imperador Ming de Flash Gordon), chefe de uma quadrilha composta por seus cinco filhos perversos, que eram liquidados, um a um, até o último episódio. Neste seriado, foram usados dois “capítulos econômicos”, prática comum para se poupar dinheiro: os personagens recordavam-se de acontecimentos passados, projetando-se em flashback cenas já filmadas, integrantes de episódios anteriores.

Já em Novas Aventuras de Dick Tracy / Dick Tracy’s G-Men / 1939, o oponente de Tracy era o espião internacional Zarnoff (interpretado pelo futuro diretor Irving Pichel), cujos atos de sabotagem correspondiam a tomadas de arquivo de fatos reais como, por exemplo, o desastre do Hindenburg. A derradeira cena deste seriado tinha um clímax original: em pleno deserto, Zarnoff amarrava Tracy numa árvore perto de uma fonte, bebia sadicamente um gole de água e o abandonava para morrer de sede. A água, porém, estava envenenada, e Zarnoff sucumbia no meio do deserto enquanto Tracy era salvo por seus companheiros. No elenco, uma curiosidade: Jennifer Jones, no início da carreira, sob o nome artístico de Phyllis Isley.

Do lado do mal em Dick Tracy contra o Crime / Dick Tracy vs. Crime Inc./ 1941 estava The Ghost (O Fantasma), que conseguia ficar invisível, graças a uma máquina inventada por seu capanga, Lúcifer. No desenlace, Tracy descobria a verdadeira identidade do bandido (numa seqüência sensacional, toda fotografada em negativo) e este, ao tentar fugir, morria eletrocutado por fios de alta tensão.

Alguns anos depois, a RKO-Radio realizou uma série de quatro filmes: Dick Tracy, o Audacioso / Dick Tracy / 1945, de William Berke e O Punhal Sangrento / Dick Tracy vs. Cueball / 1946 de Gordon Douglas, ambos com Morgan Conway, substituído por Ralph Byrd nos dois seguintes: Dick Tracy Luta / Dick Tracy’s Dilemma / 1947 de John Rawlings e Dick Tracy contra o Monstro / Dick Tracy Meets Gruesome / 1947, também de Rawlings, com Boris Karloff como o vilão.

No rádio, Dick Tracy surgiu na voz de Ned Wever. Na abertura do programa, um anunciante dizia: “E agora…Dick Tracy!”. Ouvia-se o barulho de sinais de código radiofônico e depois Tracy dizendo: “Aqui é Dick Tracy no caso do…Estejam prontos para a ação!”. Entrava o som da partida dos carros de polícia e de suas sirenes e de novo a voz de Tracy: “Vamos, rapazes!”. Exclamava o anunciante: “Sim, é Dick Tracy. Protetor da Lei e da Ordem!”.

Cinco seriados, produzidos nos anos quarenta, são muito lembrados pelos fãs nostálgicos: Terry e os Piratas / Terry and the Pirates, Os Tambores de Fu Manchu / Drums of Fu Manchu, O Misterioso Dr.Satã / Mysterious Dr. Satan e O Rei da Polícia Montada / King of the Royal Mounted e Polícia Montada contra a Sabotagem / King of the Mounties. O primeiro e os dois últimos basearam-se em personagens das histórias em quadrinhos.                 .

Milton Caniff já havia deixado a série Dickie Dare (chamada Dick e depois Dan e Dick no Brasil) quando criou Terry e os Piratas em 1934, uma das histórias em quadrinhos mais lidas e estudadas em todo o mundo, não somente por desenhistas, mas também por cineastas, porque usava técnicas cinematográficas no que diz respeito principalmente ao emprego do claro escuro e dos enquadramentos. A sequência de abertura e muitas tomadas de O General Morreu ao Amanhecer / The General Died at Dawn / 1936, (Dir: Lewis Milestone), foram inspiradas pela arte de Caniff.

No seriado, o único dos quatro produzidos pela Columbia (os demais são da Republic), o arqueólogo americano, Dr.Herbert Lee (J. Paul Jones), seu filho Terry (William Tracy), seu assistente, Pat Ryan (Granville Owen), acompanhados pelo criado chinês, Connie (Allen Jung) e pelo e mágico Big Stoop (Victor DeCamp), envolvem-se em muitas aventuras. Eles enfrentam Fang (Dick Curtis), um chefe guerreiro mestiço, e seus Homens -Tigre, que querem se apoderar de um tesouro escondido no Templo de Mara, sob a guarda da sua inimiga, a Mulher Dragão (Sheila D’Arcy). No decorrer dos acontecimentos, Terry e seus amigos fazem amizade com o comerciante Allen Drake (Forrest Taylor) e sua filha Normandie (Joyce Bryant).

Muitos admiradores dos comics reclamaram da eliminação de personagens interessantes como a cantora loura com o coração de ouro, Burma e seu ex-parceiro, o infame Captain Judas, entre outros. O próprio Caniff declarou na sua biografia que odiava o seriado, por ter mudado tanto a sua história em quadrinhos. Mas, seja como for, além do ambiente exótico e tipos pitorescos, o seriado, dirigido por James W. Horne, contém muitas peripécias, encadeadas com eficiência. No final de cada capítulo, uma voz over anunciava os lances do próximo episódio enquanto passavam na tela as imagens correspondentes.

No rádio, Terry e os Piratas chegou ao ar nas vozes de Jackie Kelk (Terry) e Clayton “Budd” Collyer (Patric Ryan). Na abertura do programa, ouvia-se o som de um gongo. Em seguida, tendo como fundo sonoro uma conversa de chineses (na realidade algumas sílabas sem sentido, que pareciam o idioma chinês), o anunciante dizia: “Terry e os Piratas!”. Depois, Kelvin Keech cantava o tema e tocava ukelele. No papel da Mulher Dragão… Agnes Moorehead.

O Rei da Policia Montada, foi criado em 1935 pelo consagrado autor de histórias doOeste, Zane Grey (com base em um de seus romances) e pelo desenhista Allen Dean. Em 1938, Charles Flanders assumiu o lugar de Dean e o deixou um ano depois, sendo substituído por Jim Gary que, tal como Dean, conhecia muito bem o ambiente do Canadá, dos campos gelados do Yukon às intermináveis planícies de Saskatchewan, onde se desenrolavam as aventuras do Sargento King.

Sob o comando de William Witney e John English, o seriado mostra como o Sargento King da Polícia Montada do Canadá (Allan Lane) impede que espiões liderados por Juan Kettler (Robert Strange) e seu capanga Wade Garson (Harry Cording) usem uma substância denominada Complexo X para fins destrutivos. O inventor da substância, o dono de uma mina chamado Merritt foi morto pelos agentes nazistas. King ajuda os filhos de Merritt, Linda (Lita Conway) e seu irmão Tom (Robert Kellard), que é um novato na Polícia Montada, a prender os assassinos de seu pai e fazer com que o Complexo X caia nas mãos certas.

Trata-se de propaganda pura e simples, como foi normal durante a Segunda Guerra Mundial, quando Hollywood estava a serviço do esforço bélico, mas não há dúvida de que é um excelente northwestern com elementos modernos.

A cavalo, em automóvel, lancha, trem ou avião, o sargento King continua a luta contra os agentes inimigos, escapando de desastres em todos estes veículos, sem mencionar os momentos em que se safa de um incêndio ou de ser retalhado por uma serra elétrica.

A melhor cena de ação, no entanto, acontece quando King dá um salto espetacular de uma ponte, para cima de um bandido que está fugindo e os dois, ainda brigando, são arrastados pelas águas de um represa em direção a uma cachoeira.

No capítulo final, King e Tom Merritt estão prisioneiros no submarino de Kettler, trancados na sala de torpedos. King está decidido a explodir os torpedos para impedir a ação dos inimigos. Entretanto, antecipando uma situação semelhante no seriado O Terror dos Espiões / The Spy Smasher / 1942 da Republic, Merritt derruba King, coloca-o a salvo através de um tubo de torpedo e executa o plano de King, sacrificando sua vida.

Se o Sargento King encontrava muitos obstáculos no seu primeiro seriado, eles não significavam nada comparados com as aventuras que ele vivia em Polícia Montada contra a Sabotagem / King of the Mounties / 1942.

Sob a supervisão do Almirante Yamata (Abner Biberman), Conde Baroni (Nestor Paiva) e Marechal Von Horst (William Vaughn), chefes da Quinta Coluna do Eixo no Canadá, país que é bombardeado impiedosamente por um avião inimigo misterioso chamado “O Falcão”, cuja base é na cratera de um vulcão. Ninguém consegue identificar o avião até que um inventor americano, o professor Brent (George Irving) e sua filha Carol (Peggy Drake), chegam com um novo tipo de detector de aeronaves. Como o detector é uma ameaça à sua missão de preparar o Canadá para a invasão, os agentes inimigos mandam Harper (Douglas Dumbrille), o traidor local, seqüestrar Brent. Durante uma patrulha, o Sargento King (Allan Lane) tenta resgatar Brent, porém o inventor é morto. Carol decide prosseguir com o trabalho do pai e, com a ajuda de King, os espiões do Eixo são derrotados.

Parte deste seriado estava perdida, faltando 1 / 3 de sua trilha sonora e um rolo de filme. Ainda há pouco foi feita uma restauração da imagem e do som, mas permanecem trechos sem os diálogos, que foram substituídos por subtítulos. Assim mesmo, dá para perceber que Policia Montada contra a Sabotagem, dirigido por William Witney, é um dos seriados mais excitantes de todos os tempos.

Dois seriados que os fãs nostálgicos nunca esquecem: O Misterioso Dr. Satã / Mysterious Dr. Satan e Tambores de Fu Manchu / Drums of Fu Manchu, ambos dirigidos por William Witney e John English para a Republic e com inesquecíveis vilões.

O Misterioso Dr. Satã foi escrito originariamente para ser mais um seriado do Super-Homem, mas a licença que a  National Comics (depois DC Comics)  dera para o estúdio de animação de Fleischer fazer o seu desenho sobre o Homem de Aço, impedia que outras companhias pudessem usar o personagem na época, mesmo em uma produção não-animada. O script foi subsequentemente modificado, introduzindo-se um novo personagem, substituindo o Super-Homem.

O Dr. Satã (Eduardo Ciannelli), misterioso mestre do crime, inventou um robô, mas ele necessita de um controle remoto desenvolvido por um eminente cientista, Dr. Scott (C. Montague Shaw). Suas tentativas para obtê-lo são frustradas pela aparição do Copperhead (um homem com uma máscara metálica sugerindo a cabeça de uma cobra venenosa) que, na realidade, é Bob Wayne (Robert Wilcox), um rapaz que deseja proteger a sociedade das maquinações do Dr. Satã, que assassinara seu pai. O Dr. Satã faz várias tentativas para se apoderar do controle remoto, ameaçando de morte a filha Dr. Scott, Lois (Ella Neal).

Na sua luta contra o cientista louco, o Copperhead enfrenta todo tipo de perigos, inclusive o de ser encerrado num caixão e empurrado para uma fornalha. No último capítulo, o Dr. Satã planeja destruir o Dr. Scott e o Copperhead com o seu autômato de aço, mas o Copperhead, após uma briga, deixa-o inconsciente. Wayne tira a máscara de Copperhead e coloca-a no Dr. Satã. Quando este se reanima, chegam seus capangas e, confundindo-o com o verdadeiro Copperhead, ordenam que o robô o ataque. O Dr. Satã  vai recuando cada vez mais e acaba caindo na rua, juntamente como  robô, de uma altura de muitos andares.

Apesar dos seus inevitáveis clichês, o seriado apresenta um grande vilão – notável atuação contida de Eduardo Ciannelli num papel tão suscetível de super representação – e as melhores cenas com os stuntmen jamais vistas nas telas em qualquer tipo de filme.

Aquele salto que o Copperhead, dublado pelo excelente David Sharpe, dá de uma varanda do segundo andar de uma casa, indo cair sobre o bandido lá em baixo – é um pulo realmente sensacional.

Os Tambores de Fu Manchu é outro grande seriado realizado pela Republic e se baseia nas histórias escritas por Sax Rohmer um dos romancistas mais populares dos anos vinte. O personagem chegou às telas em várias ocasiões, notadamente em A Máscara de Fu Manchu / The Mask of Fu Manchu / 1932, filme dirigido por Charles Brabin, tendo no elenco: Boris Karloff, Myrna Loy, Lewis Stone, Charles Starrett e Karen Morley.

Fu Manchu (Henry Brandon) lidera uma organização secreta cujo propósito é fomentar a guerra na Ásia Central. Ajudado por sua filha, Fah Lo Suee (Gloria Franklin), ele procura o cetro perdido de Gengis Khan, que lhe dará autenticidade, como um novo conquistador do mundo. Sir Nayland Smith (William Royle), representante do British Foreign Office e o jovem Alan Parker (Robert Kellard), filho de um arqueólogo assassinado por Fu Manchu, impedem que as intenções maléficas deste se concretizem.

O seriado distingue-se antes de tudo pela ênfase dada aos elementos de mistério e pelos inaginativos momentos de perigo arquitetados pelo diabólico oriental como, por exemplo, Allan caindo em uma armadilha onde um polvo o esperava com seus ansiosos tentáculos, o lagarto envenenado na cama de Sir Nayland ou a tortura com o pêndulo oscilante, igual àquele de The Pit and the Pendulum de Edgar Allan Poe.

Tal como Eduardo Ciannelli em O Misterioso Dr. Satã, Henry Brandon “rouba” o espetáculo com a sua composição perfeita de Fu Manchu, apresentando-se como uma figura alta e imponente e aparência sinistra, ajudada pela maquilagem e vestimenta orientais.

Encerro este artigo, mencionando o seriado que mais me fez vibrar no tempo da minha infância, não só por causa dos extraordinários cliffhangers como pelo ingrediente de mistério, que nos fazia participar ainda mais intensamente do espetáculo.

O Maravilhoso Mascarado / The Masked Marvel / 1943 (dirigido magnificamente por Spencer Gordon Bennet), tal como O Guarda Vingador / The Lone Ranger / 1938, invertia a tendência habitual e mantinha a identidade do herói, e não a do vilão, desconhecida até o final.

O Maravilhoso Mascarado é um dos quatro agentes especiais de uma companhia de seguros – Bob Barton (David Bacon), Frank Jeffers (Richard Clarke), Terry Morton (Bill Healy) e Jim Arnold (Rod Bacon) – que enfrentam o japonês Mura Sakima (Johnny Arthur), responsável por atos de sabotagem nas indústrias de guerra. Alice Hamilton (Louise Currie), filha de um dos diretores da seguradora, une-se aos quatro agentes na sua luta contra Sakima. No derradeiro episódio, dois dos quatro investigadores, Frank e Jim, já tinham sido mortos, sobrando apenas Bob e Terry, para o público decidir qual deles era o Maravilhoso Mascarado, cuja verdadeira identidade somente Alice conhecia.

O Maravilhoso Mascarado era na verdade o stuntman Tom Steele em quase todas as tomadas, a não ser naquela em que tirava a máscara, quando então aparecia a figura do ator que fazia o personagem do investigador escolhido pelos seis roteiristas (Royal Cole, Ronald Davidson, Basil Dickey, Jessé Duffy, Grant Nelson, George Plympton, Joseph Poland) para ser o herói.

Como a voz anasalada de Steele não correspondia à imagem de um homem valente e corajoso, ele foi dublado pelo ator radiofônico Gayne Whitman. Mas o trabalho de Steele como dublê esteve impecável. Entre as cenas de ação espetaculares, destacava-se aquela em que O Maravilhoso Mascarado jogava seu automóvel de encontro a um carrinho manual de estrada de ferro cheio de explosivos, para impedir que ele colidisse com um trem, salvando-se a si próprio em uma fração de segundo.

Mais um momento de grande emoção que fazia a garotada vibrar dentro do cinema.

BUSBY BERKELEY

setembro 10, 2010

Durante os anos 30 e 40, um artista imensamente criativo marcou o percurso do filme musical, impondo-se como um dos gênios do Cinema: Busby Berkeley.

Ele descobriu por instinto que a câmera tinha de dançar mais que os próprios dançarinos e, com extraordinária imaginação e notável senso visual, elaborou um estilo incomparável. Busby acompanhava os bailarinos em travellings velozes, até chegar às tomadas de ângulo superior sobre os motivos geométricos de suas evoluções, que se compunham e se desmanchavam como num caleidoscópio. E usando também, com muita audácia, cenários gigantescos, luxo, sensualidade e estilização, forjou beleza e fantasia inimitáveis, constituindo-se um dos mais peculiares contribuidores da arte cinematográfica.

Busby Berkeley (William Berkeley Enos) nasceu a 29 de novembro de 1895, em Los Angeles, Califórnia, filho de Francis Enos e Gertrude Berkeley, ambos artistas de teatro. Aos doze anos, já órfão de pai, Busby entrou para a Academia Militar de Mohegan Lake, perto de Peekskill, Nova York enquanto que a mãe continuou nos palcos, alcançando certo prestígio em peças de Ibsen, ao lado de Alla Nazimova.

Diplomado em 1914, o jovem começou a trabalhar numa fábrica de sapatos. Quando os Estados Unidos entraram na Primeira Guerra Mundial, ele se alistou no Exército, sendo um dos escolhidos para treinamento especial na famosa Escola de Artilharia de Saumur, na França. Durante o confronto, descobriu seu verdadeiro talento e, tanto fez, que acabou encenando espetáculos variados para as tropas.

Ao retornar à América, Busby atuou como ator e coreógrafo de musicais numa companhia teatral itinerante. Sua reputação cresceu rapidamente e, em 1928, ele coreografou cinco shows da Broadway, um feito considerável para um homem que nunca havia estudado seriamente nem coreografia nem dança.

Após o sucesso na Broadway, chegou o convite para Hollywood. A princípio, Busby não ficou muito animado (“Eu havia visto alguns filmes musicais e não ficara impressionado: pareciam terrivelmente estáticos e muito limitados”), mas, diante da insistência, cedeu: e rumou para a Terra do Cinema, com a missão de encenar os números de dança de Whoopee / Whoopee / 1930, uma produção Samuel Goldwyn / Florenz Ziegfeld, dirigida por Thornton Freeland.

Filmado em duas cores, o filme, passado em ambiente de faroeste, girava em torno de um rapaz hipocondríaco, interpretado por Eddie Cantor, e nele Busby apanhava do alto as formações de coristas – entre elas Betty Grable aos 15 anos -, que também eram focalizadas em closeups, uma inovação na época (“Temos estas garotas maravilhosas, por que não deixar que o público as veja?”).

Busby procurou Goldwyn, disse-lhe que queria filmar seus próprios números e obteve a permissão (“Quando entrei no set para começar a filmagem, deparei com quatro câmeras e as respectivas equipes, e pedi ao meu assistente uma explicação. Ele me disse que a técnica usual era filmar de quatro posições diferentes e que o montador depois faria uma seleção das tomadas e comporia uma cena. Com uma demonstração de atrevimento, anunciei: ‘Bem, esta não é a minha técnica. Só uso uma câmera. Portanto, dispense as outras…’ Minha idéia era planejar cada tomada e montar com a câmera”).

Busby libertou a câmera, colocando-a em toda sorte de posições inclusive em gruas, a fim de chegar à altura que favorecesse a imagem que ele queria. Ele a colocou, não somente acima das cabeças dos dançarinos, mas também entre suas pernas, debaixo d’água, por cima de edifícios, focalizando o corpo feminino com um erotismo fetichista ou como “objeto” para as suas formações surrealistas. Foi também responsável por planos seqüência memoráveis.

Terminado Whoopee, ele assinou contrato com a Paramount. O primeiro compromisso que surgiu foi Kiki / Kiki / 1931 de Sam Taylor, protagonizado por Mary Pickford e, posteriormente, Goldwyn chamou-o de volta para um novo filme com Eddie Cantor, O Homem do Outro Mundo / Palmy Days / 1931, dirigido por Eddie Sutherland, no qual Cantor fazia um rapaz meio apalermado, envolvido com espertalhões. Em ambos os filmes, Busby não pôde demonstrar muito sua aptidão artística e pensou em partir para Nova York. Mas Mervyn Leroy, que substituiria Sutherland brevemente, convenceu-o a continuar no Cinema.

Enquanto aguardava melhores oportunidades, o coreógrafo prestou serviço à firma de Fanchon e Marco, especializada em produzir prólogos, ou seja, pequenos interlúdios musicais para servirem como atrações “ao vivo” nos palcos dos cinemas antes da projeção do filme principal. Subseqüentemente, trabalhou em Voando Alto / Flying High / 1931, Mundo Noturno / Night World / 1932 e Ave do Paraíso / Bird of Paradise / 1932, dirigidos, pela ordem, por Charles Riesner, Hobart Henley e King Vidor, exercícios pouco estimulantes.

O terceiro filme com Goldwyn e Eddie Cantor, O Meu Boi Morreu / The Kid from Spain / 1932, dirigido por Leo McCarey, propiciou-lhe maior criatividade, sendo muito lembrados o número numa enorme piscina com as Goldwyn Girls (entre elas, Paulette Goddard, Lucille Ball, Betty Grable e Virginia Bruce) em intrincadas posições de balé aquático e o da boate mexicana com as garotas formando uma tortilla humana.

Quando Darryl Zanuck persuadiu os chefes da Warner a investirem 400 mil dólares num musical, Rua 42 / 42nd Street / 1933, e entregou a direção a Lloyd Bacon, Mervyn Leroy indicou Busby como diretor de dança.

Rua 42 mostrava os bastidores de uma revista com a situação clássica da corista que, na última hora, se torna estrela do espetáculo. A corista era Ruby Keeler, esposa de Al Jolson, estreando no Cinema. Ela faria ao todo dez filmes musicais na Warner, formando, em oito deles, uma dupla romântica com Dick Powell. No elenco, além de Ruby e Powell, estavam Warner Baxter, Bebe Daniels, George Brent, Una Merkel, Guy Kibbee e Ginger Rogers, uma gracinha, de suspensórios e monóculo.

No número da canção-título, Ruby aparece primeiramente em close-up e, à medida que a câmera se afasta, ela é vista sapateando na capota de um táxi. A certa altura, os edifícios começam a dançar e o truque foi este: Busby colocou suas bailarinas numa escada gigantesca e, enquanto dançavam, cada qual segurava um cenário, onde tinha sido pintada a fachada de um prédio. O filme provocou o retorno da onda de musicais, ajudou a Warner a crescer e assegurou a Busby continuidade de emprego nos anos seguintes.

Ele havia sido chamado pela Warner só para fazer Rua 42, mas, antes de terminá-lo, assinou um contrato de sete anos, e o estúdio não perdeu tempo, informando-lhe da nova incumbência: Cavadoras do Ouro / Gold Diggers of 1933, dirigido por Mervyn LeRoy. Três jovens artistas do show business – Ruby Keeler, Joan Blondell e Aline MacMahon) – moram juntas num apartamento. Um rapaz rico (Dick Powell), com pretensões a compositor, corteja Ruby, sofrendo oposição da família. O irmão mais velho de Powell (Warren William) e o seu advogado (Guy Kibee) fazem tudo para terminar o romance, mas afinal se apaixonam respectivamente por Blondell e MacMahon.

Ginger Rogers abre o filme com um vestido coberto de moedas, cantando “We’re In The Money”, num cenário espetacular. Em “Pettin’ in the Park”, vários casais namoram num parque e, ao cair a chuva, as meninas vão mudar de roupa, vendo-se em silhuetas o contorno dos belos corpos desnudos – um toque erótico muito usado por Berkeley. Em outro número, “Remember my Forgotten Men”, 150 figurantes marcham uniformizados de soldados numa roda enorme enquanto Joan Blondell lembra os heróis esquecidos, que se transformaram em desempregados famintos durante a Depressão.

A obra-prima, entretanto, surge com “The Shadow Waltz”, quando 80 garotas, tocando violinos brancos, evoluem numa escadaria monumental e, no clímax, são filmadas do alto e no escuro, formando, num belíssimo efeito, a prodigiosa imagem de um violino fosforescente.

Ao entrar para a Warner, Busby deixou claro que queria dirigir filmes e não apenas inventar seqüências musicais. O estúdio então permitiu que ele dirigisse, assessorado pelo montador George Amy (“Aprendi muito com George sobre montagem, o que me ajudou na elaboração de minha própria técnica”), Amor por Atacado / She Had to Say Yes / 1933, filmezinho de rotina com Loretta Young, que serviu apenas para demonstrar sua capacidade em dirigir um filme inteiro.

Belezas em Revista / Footlight Parade / 1933, de Lloyd Bacon, o terceiro filme da Warner no subgênero “musical de bastidores”, não tinha quase intriga. A figura central era um produtor de teatro musicado interpretado dinamicamente por James Cagney, que idealizava a realização dos tais prólogos, nos quais, como vimos, Busby havia trabalhado em determinada fase de sua carreira. Joan Blondell era sua secretária e Ruby Keeler e Dick Powell, dois artistas A primeira parte do filme mostrava o lufa-lufa na preparação desses espetáculos, alternando-se pequenos trechos cômicos e românticos. Mais para o desenlace, seguiam-se três números musicais formidáveis “Honeymoon Hotel”, “Shanghai Lili” e “By the Waterfall”. “Honeymoon Hotel”, tem a forma de uma mini-opereta, na qual todo o diálogo rimado é cantado, mostrando com bom humor uma lua-de-mel continuamente interrompida. Em “Shanghai Lili” são inolvidáveis os tracking-shots pelo bar chinês, imerso numa atmosfera sternbergniana, o sapateado de Cagney e Ruby Keeler, a briga, e o desfecho eufórico e patriótico com os soldados formando a águia, a bandeira americana e o rosto de Roosevelt. “By the Waterfall”, com duração de cerca de 15 minutos, chama atenção pelo fantástico balé aquático com dezenas de garotas deslizando por várias cascatas e se agrupando em formações prismáticas, cada uma mais inventiva que a outra. Entre as chorus girls: Dorothy Lamour e Ann Sothern. Na estréia de Belezas em Revista em Nova York, o público, de pé, ovacionou o número e isto sempre aconteceu nas reprises, inclusive na Mostra programada pela USIS e pela Cinemateca do MAM em junho de 1980.

Busby se comprometera com a Warner, mas tinha ainda que rodar um filme para Samuel Goldwyn. Em Escândalos Romanos / Roman Scandals / 1933, dirigido por Frank Tuttle, Eddie Cantor faz o papel de um rapaz do Oklahoma, que sonhava ter voltado à Roma antiga, e tinha a seu lado a cantora Ruth Etting. O número mais famoso do filme era “No More Love”, culminando no mercado de escravas com as garotas inteiramente nuas. Busby convenceu as meninas a tirarem a roupa e elas concordaram, desde que a cena fosse filmada à noite com o set de portas fechadas e longas perucas louras cobrindo suas partes …estratégicas.

Voltando à Warner, Busby fez, em 1934, Wonder Bar / Wonder Bar, Modas de 1934 / Fashions of 1934 e Mulheres e Música / Dames, respectivamente dirigidos por Lloyd Bacon, William Dieterle  e Ray Enright.

Em Wonder Bar, cuja ação transcorre toda numa casa noturna de fama internacional, Dolores Del Rio e Ricardo Cortez formam um par de dançarinos. Cortez, um oportunista, despreza Dolores e esta acaba apunhalando-o, quando vê que ele vai abandoná-la por uma ricaça (Kay Francis). O dono do estabelecimento e entertainer (Al Jolson) e o cantor (Dick Powell), interessam-se ambos por Dolores; mas é Powell que, no final, conquista o coração da dançarina.

Num dos números mais brilhantes, “Don’t Say Goodnight”, Busby constrói um octógono de espelhos, que refletem as imagens dos bailarinos, multiplicando-os ao infinito, num efeito maravilhoso. Em outro número, “Going to Heaven on a Mule”, Al Jolson, com a cara pintada de graxa, passa pelas portas de São Pedro e penetra num Paraíso de 200 rapazes e moças na pele de anjos e querubins negros.

Modas de 1934 tem um argumento mais original para ligar os números musicais. William Powell, um vigarista do mundo da moda, chega com seus cúmplices Bette Davis e Frank McHugh a Paris, onde encontram um jovem compositor (Philip Reed), um comerciante da Califórnia (Hugh Herbert) que está tentando induzir os costureiros a usarem mais plumas em suas criações, e uma velha conhecida (Verree Teasdale), disfarçada de duquesa russa. Esta está de amores com um costureiro famoso (Reginald Owen), cujos modelos Powell pretende roubar. No final vem o número “Spin a Little Web of Dreams”, que é um desfile suntuoso de garotas – formando uma decoração de harpas humanas e em seguida carregando leques de plumas de avestruz, até formarem uma grande rosa-, fotografadas com a fluência característica de Berkeley.

Mulheres e Música reúne de novo Dick Powell e Ruby Keeler. Guy Kibbee, sua esposa ZaSu Pitts e a filha, Ruby Keeler,  herdarão dez milhões de dólares do primo milionário, excêntrico e puritano de ZaSu (Hugh Herbert), se suas vidas passarem pelo escrutínio moral dele, que detesta o pessoal do show business. Infelizmente, Ruby está apaixonada por Powell, um jovem compositor. Para complicar a situação, Joan Blondell, uma corista, chantageia Kibbee, depois que ela dormiu na cabine do trem em que viajavam. Embora inocente, mas com receio de perder os milhões do primo, Kibbee paga a soma exigida por Blondell. Com o dinheiro de Kibbee, Blondell e Powell montam um musical na Broadway, do qual Ruby participa como estrela.

No número mais empolgante “I Only Have Eyes for You”, Dick e Ruby se encontram na frente de um cinema, tomam o metrô e adormecem durante o trajeto. No sonho de Dick, surgem dezenas de garotas usando máscaras de Ruby. Cada uma delas tem um retângulo nas costas e, ao se aproximarem, inclinando-se, montam um gigantesco quebra-cabeça com a imagem de Ruby. No final, ocorre outra fascinante formação rítmica com as garotas de blusas brancas e calças pretas fragmentando-se em desenhos abstratos e mosaicos florais, vistos bem do alto pela câmera. Como disse alguém, Busby Berkeley ultrapassou Euclides em matéria de geometria.

A história de Mordedoras de 1935 / Gold Diggers of 1935, dirigido pelo próprio Busby Berkeley, desenrola-se num balneário durante um veraneio, onde o empregado do hotel Dick Powell namora a tímida Gloria Stuart, filha de uma senhora milionária (Alice Brady) enquanto sua noiva (Dorothy Dare), seduz o filho da ricaça (Frank McHugh). Alice contrata um empresário russo (Adolph Menjou) para dirigir seu espetáculo anual beneficente, surgindo as complicações.

Durante o baile de caridade, no número “The Words Are in My Heart”, Busby coloca 56 garotas sentadas em 56 pianos brancos que rodopiam e se mexem ao som da valsa, como se fossem recrutas em exercícios militares. O segredo é simples: debaixo de cada piano, extremamente leve, havia uma pessoa usando calças pretas, seguindo certas marcações num assoalho também preto.

Mas a grande atração do filme é o número “The Lullaby of Broadway”, crônica triste das últimas 24 horas na vida de uma garota das noites de Nova York. Quase um filme dentro do filme, ele se abre como o rosto de Wini Shaw, visto a distância como um ponto branco, que vai aumentando até o close-up isolado na tela escura. Depois, a câmera focaliza o rosto de Wini, de cabeça para baixo, e ele se dissolve numa vista aérea de Manhattan. Ali se sucedem lances incríveis de fantasia cinematográfica, atingindo o auge com um sapateado por centenas de bailarinos, fotografados de todos os ângulos concebíveis, num frenesi que deixa a platéia eletrizada. Logo depois, vem a queda de Wini de um arranha-céu, gritando e girando no espaço a caminho da morte, e o número se encerra, tal como começou, com o rosto de Wini desaparecendo aos poucos da tela negra.

Os filmes de Berkeley na Warner devem muito às maravilhosas canções de compositores como Harry Warren, Al Dubin, Richard Whiting e Johnny Mercer. Elas não ajudavam a desenvolver o personagem ou a avançar a intriga como num musical integrado; queriam apenas oferecer alguns momentos melodiosos no decorrer da narrativa. Em muitos casos, a maioria dos números musicais eram guardados para a parte final do filme, quando eram mostrados numa espécie de seqüência de montagem.

Entre 1935 e 1936, Busby fez cinco filmes, sendo três dirigidos por ele mesmo – Pilhérias da Vida / Bright Lights / 1935 com Joe E. Brown; Vivo para o Amor / I Live for Love / 1935 com Dolores Del Rio e o cantor Everett Marshall e Caprichos de Estrela / Stage Struck / 1936 com Dick Powell e Joan Blondell – e outros dois, Por uns Olhos Negros / In Caliente / 1935 e Estrelas da Broadway / Stars Over Broadway / 1935, sob o comando respectivamente de Lloyd Bacon e William Keighley, sendo o primeiro protagonizado por Dolores Del Rio e o segundo por Pat O’Brien, tendo a seu lado o tenor James Melton e a cantora de rádio Jane Froman.

Em setembro de 1935, Busby voltava de uma festa, quando estourou o pneu dianteiro do seu carro, causando um acidente, no qual morreram três pessoas. Processado criminalmente, Busby acabou sendo absolvido; mas os vários julgamentos o abalaram muito, emocional e fisicamente, pois estava num ritmo de trabalho intenso.

Cavadoras do Ouro de 1937 / Gold Diggers of 1937, mantém a tradição dos dispendiosos musicais da Warner, com cenários luxuosos e números com toda a verve de Berkeley. Dirigido por Lloyd Bacon, o filme mostra Dick Powell como um corretor de seguros, que preferia estar no show business. Powell vai vender uma apólice para um produtor teatral hipocondríaco (Victor Moore), cujos sócios aplicam mal o dinheiro da firma; com a ajuda de duas coristas (Joan Blondell, Glenda Farrell), ele não só salva o velho de um esquema criminoso armado pelos parceiros inescrupulosos como consegue montar um espetáculo.

Num dos magníficos números musicais, “Let’s Put Our Heads Together”, Busby coloca 50 enormes cadeiras de balanço, cada qual com um par de namorados, criando um efeito encantador, e, no final, em “All’s Fair in Love and War”, demonstra mais uma vez seu pendor para as marchas militares, apresentando 70 coristas com vistosos uniformes brancos e carregando bandeiras e tambores em inúmeras formações, contrastando com o assoalho preto, bastante lustroso.

Ainda como contratado da Warner, Busby dirigiu filmes de gêneros variados, nos quais, contando com menos recurso financeiro, fez o que pôde: Querer é Poder / The Go-Getter / 1937 com George Brent e Anita Louise; Hotel de Hollywood / Hollywood Hotel / 1937 com Dick Powell, Lola Lane e Frances Langford; Os Homens são uns Trouxas / Men are such Fools / 1938 com Wayne Morris, Priscilla Lane e Humphrey Bogart; No Mundo da Lua / Garden of the Moon / 1938, com Pat O’Brien, Margaret Lindsay e John Payne; Promessa Cumprida / Comet Over Broadway / 1938, com Kay Francis e Ian Hunter e Tornaram-se um Criminoso / They made me a Criminal / 1938, com John Garfield, Claude Rains, Ann Sheridan e Os Anjos de Cara Suja.

Busby criou também duas seqüências para O Cancioneiro Naval / The Singing Marine / 1937 de Ray Enright, os números de Cavadoras em Paris / Gold Diggers in Paris/ 1938, também de Enright, e o final de Aprenda a Sorrir / Varsity Show / 1937 de William Keighley. Neste último, para saudar as universidades e academias militares americanas, Busby dispôs num enorme palanque centenas de dançarinos que iam formando as iniciais e a insígnias das diversas instituições. Ele já havia concorrido ao Oscar de Melhor Direção de Danças (conferido pela Academia entre 1935 e 1937) com dois de seus números de Mordedoras de 1935 e, com essa coreografia de Aprenda a Sorrir, teve mais uma indicação.

Ao expirar o contrato com a Warner, Busby atendeu ao chamado da MGM para elaborar o final de Serenata da Broadway / Broadway Serenade / 1939, dirigido por Robert Z. Leonard e estrelado por Jeanette MacDonald e Lew Ayres.

Após este trabalho, ofereceram-lhe condições irrecusáveis, e ele iniciou sua fase na Marca do Leão com Sangue de Artista / Babes in Arms / 1939, o primeiro dos quatro musicais que faria com Mickey Rooney e Judy Garland, todos produzidos por Arthur Freed, o grande animador do gênero nos anos 40 / 50. Para Busby, era um mundo bem diferente dos dias na Warner, pois o número musical teria que ser parte da história e não haveria tanto espaço à disposição para expor as coristas. Ele, porém, adaptou-se às circunstâncias e nos brindou com um excelente final, “God’s Country”, filmado em três dias com a participação de dez pares de adolescentes, nove crianças, 20 músicos e 61 dançarinos.

Antes de fazer o segundo musical com Rooney e Garland, Busby  dirigiu Um Casal em Apuros / Fast and Furious / 1939, delicioso filme de mistério com Franchot Tone  e Ann Sothern  como um casal de livreiros metido a detetive e Mamãe eu Quero / Forty Little Mothers / 1940, comédia sentimental tendo Eddie Cantor como um professor solitário que encontra um bebê abandonado e o leva para um colégio de moças.

A excelente renda de bilheteria de Sangue de Artista e o elogio dos críticos à dupla Judy / Mickey, os induziram naturalmente a uma continuação para aproveitar o sucesso.

Em O Rei da Alegria / Strike up the Band / 1940, Busby uniu-se de novo aos dois admiráveis astros juvenís e engendrou, entre outros, os números:”Do the la Conga”, no qual foram usados os mais variados ângulos de câmera capazes de serem imaginados; o do prato de frutas que se transforma miraculosamente numa orquestra sinfônica (este com a ajuda de Vincente Minnelli e George Pal); e o final patriótico “Strike up the Band”, aproveitando muito bem os metais dos músicos de Paul Whiteman.

A seguir, Busby teve outra oportunidade de assumir a direção de um filme sem música, Loura Inspiração / Blonde Inspiration / 1941 e de apenas dirigir os números musicais de O Mundo é um Teatro / Ziegfeld Girl / 1941 e Se Você Fosse Sincera / Lady Be Good / 1941.

Em O Mundo é um Teatro, com direção a cargo de Robert Z. Leonard e estrelado por James Stewart, Hedy Lamarr, Lana Turner e Judy Garland, o que ele fez de melhor foi o exótico “Minnie from Trinidad”, um calipso com Judy e coro de bailarinas vestidas na moda dos trópicos e a extravaganza final, cantada por Tony Martin, “You Stepped Out of a Dream”, um desfile de mulheres glamourosas, ornadas de enfeites, descendo uma imensa escadaria em espiral, parte dos opulentos cenários criados por Cedric Gibbons.

Em Se Você Fosse Sincera, sob os cuidados de Norman McLeod e estrelado por Eleanor Powell, Robert Young e Ann Sothern, a grande atração foi “Fascinating Rhythm”, envolvendo oito grandes pianos, 100 dançarinos de casaca, cartola e bengala e uma espetacular cortina de chiffon ziguezagueando por um vastíssimo palco. Freed deu um ultimato a Berkeley: “Você tem três dias para ensaiá-lo e um dia para filmá-lo”.Busby começou a filmar às nove horas da manhã; às dez horas da noite seu fotógrafo, George Folsey, teve que ser substituído; às duas horas e meia da madrugada, a equipe deixou o set.

Calouros na Broadway / Babes on Broadway / 1941, o terceiro da série Freed / Berkeley / Rooney / , tal como seus predecessores, tinha tudo para agradar. Como sempre, o argumento girava em torno de jovens artistas dispostos a vencerem no show business e Mickey e Judy, com toda a corda, dançam, cantam e fazem imitações, entre elas uma de Carmen Miranda, por Mickey Rooney. Em destaque: “Hoe Down” – versão atualizada em ritmo de swing da old square dance, com Mickey, Judy, 75 moças e rapazes e os Six Hits and a Miss (Seis Rouxinóis e uma Cotovia) – e um apoteótico número de menestréis, no qual Mickey tira um solo de banjo de “Swanee River” e “Alabama Bound”.

Na MGM, Busby teve ainda a incumbência de cuidar do final de Mocidade do Barulho / Born to Sing / 1942 de Edward Ludwig; de dirigir (deixando as danças para Bobby Connoly) Idílio em Dó-Ré-Mi / For me and my Gal / 1942, homenagem nostálgica ao vaudeville de antes da Primeira Guerra Mundial com Judy Garland e Gene Kelly; de encenar o encerramento de Louco por Saias / Girl Crazy / 1943, último filme da dupla Rooney-Garland, dirigido por Norman Taurog.

Emprestado a Fox, Busby reviveu seu famoso estilo de tanto sucesso nos anos 30 em Entre Loura e Morena / The Gang’s All Here / 1943, agora com o auxílio de um equipamento moderno e do deslumbrante Technicolor. Berkeley contou com a colaboração de Harry Warren, o mesmo compositor que supriu de belas canções seus antigos musicais na Warner. Warren e o letrista Leo Robin criaram meia dúzia de músicas para o genial diretor de dança visualizar com sua prodigiosa imaginação. Entre elas, duas baladas para Alice Faye e, para Carmen Miranda, a muito apropriada “The Lady in the Tutti-Frutti Hat”, que gerou um número sensacional: Carmen surge numa carroça puxada por dois bois pintados de dourado, ela toda ornamentada de bananas e morangos e um enorme turbante. Ela canta e, depois, a câmera desliza vertiginosamente em planos inclinados por sobre as nativas seminuas que, segurando enormes (e fálicas) bananas, produzem formas ondulantes de grande beleza, num esplendor kitsch inolvidável. No desfecho do número, a objetiva recua, mostrando a cornucópia de bananas na cabeça de Carmen. Neste seu quinto filme em Hollywood, Carmen canta ainda “Aquarela do Brasil”, acompanhada pelo Bando da Lua, com uma introdução igualmente criativa.

No epílogo, emoldurando a canção “The Polka Dot Polka”, irrompe uma féerie surrealista com surpreendentes efeitos cinematográficos. Após uma orgia de imagens estilhaçadas e arcos iluminados, a seqüência culmina com os rostinhos dos componentes do elenco – cantando “Journey to a Star” – espalhados na tela.

Terminado Entre Loura e Morena, a MGM cedeu Busby para a Warner, onde, depois de dirigir Cinderella Jones / 1946 com Joan Leslie e Robert Alda, ele se desentendeu com Jack Warner e cancelou seu contrato.

Veio então um longo período de desemprego e depressão, a tentativa de suicídio e a internação num sanatório. Somente em 1948, Busby voltou ao Cinema, orientando os números musicais de Romance em Alto Mar / Romance on the High Seas, de Michael Curtiz, estrelado por Doris Day. Logo em seguida, Arthur Freed entregou-lhe a direção de A Bela Ditadora / Take Me out to the Ball Game / 1949 com Gene Kelly, Frank Sinatra e Esther Williams.

A Bela Ditadora seria o último filme de Busby como diretor. Daí em diante, ele apenas criaria ou dirigiria os números musicais de: Quando Canta o Coração / Two Weeks with Love / 1950 de Roy Rowland com Jane Powell e Ricardo Montalban; Minha Cara-Metade / Call Me Mister / 1951 de Lloyd Bacon com Betty Grable e Dan Dailey; Vinho, Mulheres e Música / Two Tickets to Broadway / 1951 de James V. Kern com Tony Martin e Janet Leigh; A Rainha do Mar / Million Dollar Mermaid / 1952 de Mervyn Leroy com Esther Williams e Victor Mature; Senhorita Inocência / Small Town Girl / 1953 de Leslie Kardos com Jane Powell, Farley Granger e Ann Miller; Fácil de Amar / Easy to Love / 1953 de de Charles Walter com Esther Williams e Van Johnson; Rose Marie / Rose Marie / 1954 de Mervyn LeRoy com Ann Blyth e Howard Keel; e, finalmente, encarregar-se-ia da direção de 2ª unidade em A Mais Querida do Mundo / Jumbo / 1962 de Charles Walter com Doris Day e Stephen Boyd.

Nesta derradeira fase de sua carreira destacam-se: o número em Senhorita Inocência, no qual apenas os braços e os instrumentos de uma orquestra são visíveis no chão e nas paredes enquanto Ann Miller sapateia e o balé aquático de Annette Kellerman (Esther Williams) no New York Hippodrome em A Rainha do Mar, filmado quase todo de um helicóptero com os esquiadores zunindo através dos ciprestes e gêiseres do lago Eloise na Flórida;

.     Busby Berkley faleceu em 14 de maio de 1976, aos 80 anos de idade, e as palavras de Arthur Freed, resumiram suas qualidades: “Ele foi provavelmente o talento mais notável dos primeiros dias dos filmes musicais. Tinha um senso inato da câmera, um “olho” fantástico. Suas criações são como sonhos da imaginação”.

BUCK JONES

setembro 4, 2010

Um dos maiores rivais de Tom Mix foi criado ali, ao seu lado, na Fox Film Company. Para mostrar ao famoso astro, que tinha um substituto pronto para assumir o lugar dele, o astuto William Fox preparou Buck Jones, jovem figurante que já havia aparecido inclusive em três filmes de Mix.

Buck, cujo verdadeiro nome era Charles Frederick Gebhart, nasceu a 4 de dezembro de 1891, filho de Charles Gebhart e Evelyn Showers em Vincennes, Indiana . Passou a infância na fazenda do pai, nas vizinhanças de Red Rock, Território Índio, hoje Oklahoma, para onde a família se mudara. Buck obteve o primeiro emprego como ajudante de mecânico numa fábrica de automóveis, a Marmon Automobil Company. Aos 15 anos, mentindo sobre sua idade, alistou-se no Exército, incorporando-se ao 6º Regimento de Cavalaria. Ele serviu na fronteira com o México e prestou serviços também nas Filipinas, onde foi gravemente ferido na perna esquerda, ao perseguir um notório bandido da região. Em 1913, desligado das obrigações militares, Buck ingressou no Miller Brothers 101 Wild West Show para uma temporada pelos Estados Unidos como cavaleiro de rodeio.

Embora esses fatos constem de várias biografias de Buck Jones eles devem ser colocados sob suspeita, pois os publicistas costumavam desvirtuar a realidade, para promoverem os astros e os historiadores geralmente endossam o que eles disseram.

Em 1914, Buck estava se exibindo no Madison Square Garden com o Miller Brothers 101, quando conheceu e se apaixonou por Odelle Osborne, uma jovem amazona do circo. Os dois trabalharam juntos no circo de Julia Allen, casando-se, em 11 de agosto de 1915, no meio do picadeiro durante uma função na cidade de Lima, Ohio. O matrimônio com Odelle duraria a vida toda, nascendo dessa união uma filha, Maxine.

Com a entrada dos Estados Unidos na Primeira Guerra Mundial, o casal foi morar em Chicago, onde Buck trabalhou como treinador de cavalos para os exércitos francês e britânico. Terminado esse trabalho, os dois voltaram ao mundo do circo, agregando-se ao Gollman Brothers Circus. Encerrada a temporada circense, Buck e Odelle partiram para Indianópolis, onde ele trabalhou como piloto de provas na Stutz Motor Company.

Porém foi com o Ringling Brothers Circus que Buck Jones chegou a Hollywood. Buck começou em 1918 como stuntman em westerns de dois rolos da Universal, ganhando cinco dólares por dia, transferindo-se depois para uma companhia independente, Canyon Pictures, na qual atuou numa série de filmes de Franklyn Farnum.

A Fox contratou Buck como dublé e figurante a 40 dólares semanais e, nessa ocasião, ele apareceu em filmes de William Farnum e Tom Mix. Em 1920, ganhou o estrelato em Quem Não Arrisca / The Last Straw e, diante do sucesso, William Fox percebeu que tinha algo mais do que “um martelo para bater na cabeça de Tom Mix”.

Embora tivessem trabalhado para o mesmo estúdio por dez anos (1918 a 1927), Tom Mix e Buck Jones nunca atuaram juntos. A Fox chegou a pensar em reuní-los – e mais George O’Brien – num filme que seria dirigido por John Ford, Three Bad Men. Porém o projeto foi alterado e o filme foi realizado apenas com George O’Brien no papel principal e os atores característicos Tom Santschi, J. Farrell MacDonald e Frank Campeau como os três homens maus do título.

O primeiro filme de Buck Jones exibido no Rio de Janeiro, Senda Tortuosa / Forbidden Trails, foi o segundo feito por ele como astro-cowboy. A revista Palcos e Telas, edição de 25 de novembro de 1920, assim se manifestou sobre o ator e o filme lançado no velho Pathé, na então Avenida Central – hoje Avenida Rio Branco. “Buck Jones, o novo rival de Tom Mix, segundo rezam os anúncios, aparece pela primeira vez ao nosso público, neste filme de aventuras e cavalgadas. É um artista mais ou menos simpático, montando com algum desembaraço e representando regularmente – três coisas que se exigem nos atores do gênero. O filme é regular”.

Buck foi creditado nos primeiros filmes também como Charles Jones e Charles “Buck” Jones, sendo o Buck uma redução do apelido que tinha quando moço, Buckaroo. A partir de 1924, o Buck Jones se tornou definitivo.

Nos próximos oito anos, Buck fez mais 60 filmes para a Fox, fabricando, com diretores como John Ford, William Wellman, W.S. Van Dyke, Scott R.Dunlap, Lambert Hillyer, etc., alguns dos maiores faroestes da cena muda. Mesmo atuando à sombra de Tom Mix, Buck conseguiu se impor, disputando com “O Rei dos Cowboys”, o aplauso dos fãs.

Buck lembrava um pouco William S. Hart pelo rosto granítico e pela interpretação contida, mas seus filmes seguiam mais a linha dos de Tom Mix, dando primazia ao espetáculo e à movimentação, em detrimento da reconstituição realista do Oeste.

Os westerns de Buck Jones ou eram totalmente impregnados de ação ou continham discreta comicidade folclórica, servindo o próprio mocinho como alvo das brincadeiras. Mais de uma vez, Buck demonstrou talento como ator em filmes que, embora passados em ambiente bucólico ou pastoril, não pertenciam ao gênero faroeste (particularmente em O Preguiçoso / Lazybones / 1925, dirigido por Frank Borzage). Seu cavalo Silver, animal de rara inteligência, parecia sentir que estava sendo focalizado pela câmera executando proezas extraordinárias.

Em 1925, Buck esteve altamente cotado para substituir George Walsh em Ben-Hur / Ben-Hur graças ao seu físico invejável. A escolha afinal recaiu em Ramon Novarro, que vinha de sucessos como O Prisioneiro de Zenda / The Prisoner of Zenda / 1922, Scaramouche / Scaramouche / 1923 e O Árabe Aristocrata / The Arab / 1924, com uma grande vantagem sobre os outros candidatos: a mocidade que o papel de Ben-Hur pedia – 26 anos.

Buck trabalhou na Fox até 1927, quando recebia 3.500 dólares semanais, deixando o estúdio por livre e espontânea vontade, por não ter a companhia honrado a promessa verbal de lhe pagar salários durante as férias.

Fora da Fox, Buck formou produtora própria, a Buck Jones Productions, e fez O Grande Salto / The Big Hop, uma mistura de western com aventuras aéreas dirigido por James W. Horne. Buck lançou o filme no mercado independente, dentro do sistema “states rights” – direitos de distribuição cedidos estado por estado – em 31 de agosto de 1928. Com efeitos sonoros e música sincronizada com a ação do filme, o espetáculo resultou num fracasso de bilheteria e Buck Jones perdeu 50.000 dólares com essa primeira experiência como produtor.

Buck fundou então o Buck Jones Wild West Show and Roundup Days, apresentando-se como grande atração ao lado da esposa Odelle e da filha Maxine, que se tornara excelente amazona, treinada por ele e pela mãe. Infelizmente o espetáculo não se firmou e ele perdeu 250.000 dólares nessa aventura.

Em 1930, Buck estava com dificuldades financeiras e assinou contrato com a Beverly Productions de Sol Lesser para fazer filmes que seriam distribuídos pela Columbia. Após uma série de oito filmes, a Columbia assumiu diretamente a produção. Seu salário era de 300 dólares por semana, muito menos do que recebia nos tempos da Fox.

Com o seu primeiro filme falado, O Cavaleiro Solitário / The Lone Rider / 1930, os exibidores e os fãs restabeleceram-lhe o prestígio nas bilheterias e ele e Silver concorreram com Ken Maynard e Tarzan para serem considerados a dobradinha do western favorita do país.

Em 1934, Buck atingiu uma popularidade que suplantava a dos melhores dias do período silencioso e foi para a Universal, onde fez 22 filmes e quatro seriados. Para dar o máximo de realismo aos filmes de Buck Jones, a Universal mandou construir nos seus terrenos em Universal City, uma cidade inteira, com 47 casas, representando Cactus City, no Arizona, onde transcorria a ação deles. Buck saiu da Universal em 1937 e se uniu a Coronet Productions, participando de uma série de westerns, distribuídos pela Columbia e produzidos pelos irmãos Maurice e Frank King.

Depois de um período ocioso, Buck interpretou o papel de um ex-lutador de boxe numa comédia doméstica da Paramount, Compromisso de Honra / Unmarried / 1939 e personificou um xerife corrupto em Caravana do Oeste / Wagons Westward / 1942 da Republic, desagradando os que preferiam vê-lo só como mocinho.

Em 1941, fez seus últimos seriados, Os Cavaleiros da Morte / Riders of the Death Valley para a Universal e Águia Branca / White Eagle para a Columbia. Foram ao todo seis seriados, cinco para a Universal (os outros chamavam-se Vila dos Fantasmas / Gordon of Ghost City / 1933, O Cavaleiro Vermelho / The Red Rider / 1934, Aventureiros Heróicos / The Roaring West / 1935, O Cavaleiro Fantasma / The Phantom Rider / 1936) e o derradeiro, Águia Branca, para a Columbia.

Finalmente, Buck formou, com Tim McCoy e Raymond Hatton, o trio de veteranos em oito filmes da série Rough Riders, produzida por seu antigo diretor Scott R. Dunlap, para a Monogram. Os enredos eram muito semelhantes, com Buck geralmente disfarçado de bandido para desmascarar a quadrilha ou facínora, que os três estivessem querendo prender. Buck tinha um maneirismo: sempre que ficava perturbado, punha um pedaço de goma de mascar na boca. Todos os filmes da série abriam com a “Canção dos Rough Riders” e, no final de cada um, Buck, Tim e Hatton gritavam “So long, Rough Riders (Até a vista, Rough Riders), saíam cavalgando por uma trilha e, em certo ponto, se separavam, ouvindo-se o mesmo tema musical do início.

A série foi iniciada com O Vaqueiro do Arizona / Arizona Bound / 1941 e se encerrou com À Margem da Lei / West of the Law / 1942, porque Tim McCoy se desligou do trio sob a alegação de pretender voltar ao serviço ativo do Exército, alistando-se como voluntário. Dunlap e Buck tencionavam reiniciar a série, substituindo McCoy por Rex Bell, mas, antes disso, os produtores resolveram fazer um filme especial com Buck como astro, Amanhecer na Fronteira / Dawn on the Great Divide / 1942, que marcaria a sua despedida das telas: foi o seu último filme.

Terminadas as filmagens de Amanhecer na Fronteira e enquanto eram ultimados os preparativos para a 2ª série dos Rough Riders, Buck foi a Boston em companhia do amigo e sócio Scott R. Dunlap com a finalidade de vender bônus de guerra. Era novembro de 1942 e, dentro de duas semanas, ele completaria 51 anos de idade. No dia 28 do mesmo mês a sociedade e o mundo artístico de Boston organizaram um jantar em sua homenagem no Buddies’ Club, do Boston Common, ao ar livre. Na véspera, Buck assistira a um jogo de rugby, em companhia do Prefeito Maurice Tobin. Chovia muito e ele apanhou um forte resfriado. Por causa disso, mudaram a festa para o ambiente fechado do Melody Lounge no andar térreo do Cocoanut Grove.  Quinhentos talheres – a maior homenagem até então prestada pela cidade a um ator. Enquanto se realizava o jantar, irrompeu um violento incêndio no local. Supostamente, um soldado que estava na buate, teria removido uma lâmpada que iluminava a sua mesa, para ter mais privacidade ao beijar sua acompanhante. Stanley Tomaszewski, ajudante de garçom de 16 anos, instruído para colocar a lâmpada no lugar, tentou apertá-la no bocal, mas ela escapou de suas mãos e caiu no chão. Sem conseguir achar o bocal, Tomaszewski acendeu um fósforo para iluminar a área. Quase que imediatamente, o fogo tomou conta de todo o local, incendiando os adornos de palmeiras feitos com material inflamável, que decoravam o ambiente. Como sempre acontece nas situações de pânico, muitos frquentadores tentaram sair, porém a entrada principal era por uma única porta giratória e a maioria ficou presa dentro do edifício. Foi um dos maiores incêndios nos Estados Unidos, no qual morreram 492 pessoas e mais de cem ficaram feridas.

Embora a lenda diga que Buck morreu como um herói, ao retornar à boate, para salvar vidas, na verdade ele ficou incapacitado no lugar onde se encontrava e viria a morrer algumas horas depois num hospital.

Mas Buck Jones continua sendo um herói para os milhares de fãs que acompanharam os seus filmes.

FILMOGRAFIA

Vou mencionar os filmes e seriados de Buck Jones com os respectivos títulos em português (fruto de uma pesquisa feita anos atrás com a colaboração de Gil Araújo e a ajuda inestimável de Antonio Cardoso, na época o maior conhecedor dos filmes de Buck Jones no Brasil), que é a informação que o imdb não dá. Minha fonte principal de dados para este artigo foi a magnífica biografia The Life and Films of Buck Jones, de Buck Rainey, publicada pela World of Yesterday em dois volumes, The Silent Years e The Sound Era, respectivamente em 1988 e 1991 e as conversas que tive com Antonio Cardoso e outro grande fã de Buck Jones, João Lepiane que, aliás, corrigiu alguns erros da nossa filmografia publicada na Cinemin.

De Buck Jones conheço apenas: O Preguiçoso, A Estância Sinistra, Senda Sangrenta, O Vingador, O Estigma do Acaso, A Pistola de Punho de Marfim, À Esquerda da Lei, O Cavaleiro da Justiça, O Filho da Tribo, Além da Fronteira e o seriado Águia Branca. Assim sendo, não me sinto qualificado para afirmar quais os melhores filmes do grande cowboy. Filmes na Fox: 1920 – QUEM NÃO ARRISCA / The Last Straw; SENDA TORTUOSA / Forbidden Trails; A CÉSAR O QUE É DE CÉSAR / The Square Shooter; O VALOROSO TREVISON / Firebrand Trevison; O INFERNO DA COBIÇA / Sunset Sprague; CAMARADAS / Just Pals; O ÓDIO ou ÓDIO DE CAMPONESA / Two Moons; O CICLONE / The Cyclone. 1921 – AMOR MATERNAL / The Big Punch; O CAMINHO DO DEVER / The One-Man Trail; ESCRAVOS DO DEVER / Get Your Man; UM HOMEM PACÍFICO / Straight from the Shoulder; COMBATE MORTAL / To a Finish; MEIOS ILEGÍTIMOS / Bar Nothin’; CAVALGANDO COM A MORTE / Riding with Death. 1922 – DESCULPE A OUSADIA / Pardon my Nerve; O OESTE PRIMITIVO / Western Speed; O HOMEM DE AÇO / Rough Shod; JURAMENTO DE HONRA / Trooper O’Neil; A TODA VELOCIDADE ou CONTRA VENTOS E MARÉS / The Fast Mail; HERDEIROS EXTEMPORÂNEOS / West of Chicago; OS SINOS DE SAN JUAN / Bells of San Juan. 1923 – O PREÇO DO TRIUNFO ou O PREÇO DO SUCESSO / The Footlight Ranger; FLOCOS DE NEVE / Snowdrift; O NOVO PATRÃO / The Boss of Camp 4; A BOCA DO INFERNO / Hell’s Hole; DEVORANDO ESPAÇOS / Skid Proof; REMENDANDO AMORES / Second Hand Love; A FÓRMULA SECRETA / The Eleventh Hour; DAN, O GRANDE / Big Dan; AMOR E CHAMAS / Cupid’s Fireman. 1924 – AMIZADE SUBLIME / Not a Drum Was Heard; DE VAGABUNDO A GENTLEMAN ou VAGABUNDO GENTILHOMEM / The Vagabond Trail; O JAGUARINO / The Circus Cowboy; O FILHO DO FOGO / Western Luck; REVELAÇÃO FINAL / Against all Odds; À MARGEM DO DESERTO / The Desert Outlaw; OU TUDO OU NADA / Winner Take All; A GALERIA DA MORTE / The Man Who Played Square; CAPRICHOS DE MULHER / The Arizona Romeo. 1925 – O ESTOURO DA BOIADA / The Trail Rider; CORAÇÕES E ESPORAS / Hearts and Spurs; O LOBO DOS MONTES / Timber Wolf; O PREGUIÇOSO / Lazybones; O TERROR DO DESERTO / Durand of the Bad Lands; O PREÇO DO DESERTO / The Desert’s Price. 1926 – O VAQUEIRO E A CONDESSA / The Cowboy and the Countess; A LEI DOS PUNHOS / The Fighting Buckaroo; O CAVALEIRO AUDAZ / A Man Four-Square; O PACIFICADOR / The Gentle Cyclone; GALOPES E GALANTEIOS / The Flying Horseman; 30 GRAUS ABAIXO DE ZERO / 30 Below Zero; O TIRO PIEDOSO / Desert Valley. 1927 – O CAVALO DE GUERRA / The War Horse; A BALA MARCADA / The Whispering Sage; O CERRO DOS PERIGOS / Hills of Peril; BOM COMO OURO / Good as Gold; O FAÍSCA / Chain Lightning; O MISTÉRIO DO DÓLAR / Blackjack; FAZENDO A PROVA / Blood Will Tell; O SEU A SEU DONO / The Branded Sombrero. Filme na Buck Jones Production: 1928 – BIG HOP ou O GRANDE PULO / Big Hop. Filmes na Beverly (Dist: Columbia): 1930 – O CAVALEIRO SOLITÁRIO / The Lone Rider; A ESTÂNCIA SINISTRA / Shadow Ranch; HOMENS SEM LEI / Men Without Law; SENDA SANGRENTA / The Dawn Trail. 1931 – VINGANÇA DO DESERTO / Desert Vengeance; O VINGADOR / The Avenger. O GUARDIÃO DO TEXAS / The Texas Ranger; A FÔRÇA DO DEVER / The Fighting Sheriff. Filmes na Columbia: O ESTIGMA DO ACASO / Branded; A LEI DA FRONTEIRA / Border Law; ESTÂNCIA EM GUERRA / The Range Feud; NO LIMITE DA JUSTIÇA / The Deadline. 1932 – O CAVALEIRO DA JUSTIÇA / Ridin’ for Justice; O GUARDIÃO DA LEI / One Man Law: O TERROR DOS BANDIDOS / South of Rio Grande; O REI DO VOLANTE / High Speed; O AMIGO DO PERIGO / Hello Trouble; HONRA PELO DEVER /  McKenna of the Mounted; O FILHO DA TRIBO / White Eagle;  A TRILHA PROIBIDA / Forbidden Trail. 1933 – CRIME DE TRAIÇÃO / Treason; O ANJO DE NOVA YORK / Child of Manhattan; AUDÁCIA DE TIRANO / The Califórnia Trail; O CAÇADOR DE SENSAÇÕES / The Thrill Hunter; O VALE DA MORTE / Unkown Valley; O CÓDIGO E UM HERÓI / The Fighting Code; O CAVALEIRO DO POENTE / The Sundown Rider. Filme na Universal: A VILA DOS FANTASMAS / Gordon of Ghost City (Seriado). Filmes na Columbia: 1934 – MÚSCULOS DE AÇO / The Fighting Ranger; FAREJANDO A CAÇA / The Man Trailer. Filmes na Universal: O CAVALEIRO VERMELHO / The Red Rider (Seriado); UM ROCEIRO DE SORTE / Rocky Rhodes; QUANDO UM HOMEM VÊ PERIGO / When a Man Sees Red. 1935 – PRÊMIO DE CONSOLAÇÃO / The Crimson Trail; AUDÁCIA RECOMPENSADA / Border Brigands; DÍVIDA DE JOGO / Outlawed Guns; ESPERANÇA QUE RENASCE  / Stone of Silver Creek; AVENTUREIROS HERÓICOS / The Roaring West (Seriado); LEMBRANÇA QUERIDA / The Throwback; A PISTOLA DE PUNHO DE MARFIM / The Ivory-Handled Gun. 1936 – O OCASO DO PODER / Sunset of Power; ENTREVISTA INTERROMPIDA / Silver Spurs; LUTA INGLÓRIA / For the Service; O BOIADEIRO E O ORFÃO / The Cowboy and the Kid; O CAVALEIRO FANTASMA / The Phantom Rider (Seriado); DEVORADOR DE QUILÔMETROS / Ride’em Cowboy; SEMELHANÇA ENGANADORA / Boss Rider of Gun Creek; O RANCHO DAS FEITIÇARIAS / Empty Saddles. 1937 – TUMULTOS DA VIDA / Sandflow; À ESQUERDA DA LEI / Left Handed Law; ASES NEGROS / Black Aces; VENCENDO A RAZÃO / Smoke Tree Range; AQUI MANDO EU / Law for Tombstone; ÚLTIMA ETAPA / Sudden Bill Dorn; CASTIGO IMPREVISTO / Boss of Lonely Valley. Filmes na Columbia: ÍDOLOS DE BARRO / Hollywood Roundup; ABUTRES DOS NEGÓCIOS / Headin’ East. 1938: O EXPRESSO POSTAL / The Overland Express; ZOMBANDO DO PERIGO / The Stranger from Arizona; ESPERTEZA DE TEXANO / Law of the Texan; FRONTEIRAS HERÓICAS / California Frontier. Filme na Paramount: 1939 – COMPROMISSO DE HONRA / Unmarried. Filmes na Columbia: 1940 – A CARAVANA DO OESTE / Wagons Westward. 1941 – ÁGUIA BRANCA / White Eagle (Seriado). Filme na Universal: OS CAVALEIROS DA MORTE / Riders of Death Valley. (Seriado). Filmes na Monogram (Série Rough Riders): O VAQUEIRO DO ARIZONA / Arizona Bound; O AGENTE ENCOBERTO / The Gunman from Bodie; OURO FATAL / Forbidden Trails. 1942 – ALÉM DA FRONTEIRA / Below the Border; O MISTÉRIO DA CIDADE FANTASMA / Ghost Town Law; RUMO AO TEXAS / Down Texas Way; CENTAUROS VINGADORES / Riders of the West; À MARGEM DA LEI / West of the Law (Fim da Sére Rough Riders); AMANHECER NA FRONTEIRA / Dawn on the Great Divide.