PEQUENAS COMPANHIAS INDEPENDENTES DE HOLLYWOOD ANOS 30-40

junho 18, 2012

No auge do sistema de estúdio, a estrutura da indústria cinematográfica americana assumia a forma de um oligopólio, formado por cinco grandes companhias integradas e interdependentes: a Loew’s, com seu estúdio MGM (Metro-Goldwyn-Mayer), Paramount, Warner Bros., Fox (20th Century-Fox  após 1935) e RKO (Radio-Keith-Orpheum). Essas companhias dominavam o mercado, manipulando ao mesmo tempo produção, distribuição e exibição. Cada companhia produzia seus próprios filmes, cuidava da sua distribuição e os exibia nos seus próprios cinemas. Em torno dessas cinco grandes companhias, giravam três de porte médio, que não possuíam cinemas porém estavam envolvidas na produção e na distribuição numa escala ligeiramente menor do que a das cinco grandes: a Universal (Universal-International após 1946), a Columbia e a United Artists.

As companhias independentes eram as que não pertenciam ao grupo das oito, isto é, das cinco grandes e suas três satélites. Havia três tipos de independentes: as que faziam filmes com maiores recursos, semelhantes aos produzidos pelas grandes companhias (Walt Disney, Samuel Goldwyn, David O. Selznick, Walter Wanger etc.); as que faziam filmes com menos recursos mas que desfrutavam de certo respeito no meio cinematográfico (vg. Republic, Monogram, Grand National, P.R.C., Mascot, Tiffany, Sono Art-World Wide, Chesterfield-Invincible, Ambassador-Conn-Melody, Liberty, Majestic, Reliable etc); e as produtoras dos chamados quickies ou cheapies, filmes muito baratos, feitos às pressas, sem preocupação com a qualidade técnico-artística (vg. Beacon, Crescent, Empire, Imperial, Peerless etc.).

“Poverty Row” era o termo usado em Hollywood, mais ou menos entre o final da década de vinte e meados dos anos cinquenta, para designar uma variedade de companhias independentes do segundo e terceiro tipos. Embora muitas delas concentrassem suas atividades numa área perto de onde estão hoje a Sunset Boulevard e Gower Street, o termo não se refere necessariamente à nenhuma localidade específica, sendo apenas uma expressão em sentido figurado do tipo de filmes feitos por aquelas companhias.

Neste artigo, relembro doze das mais conhecidas companhias independentes, que faziam filmes com poucos recursos, deixando o restante para uma outra oportunidade. Extraí informações principalmente de três livros indispensáveis, para quem se interessa pelo assunto: Hollywood Poverty Row 1930-1950 de Gene Fernett (Coral Reef, 1973); “B” Movies de Don Miller (Curtis Books, 1973; Poverty Row Studios 1929 – 1940 de Michael R. Pitts (McFarland, 1997). Muitos filmes não passaram no Brasil, razão pela qual estão sem o título em português. Alguns deles podem ser vistos hoje nos dvds da Sinister Cinema e no You Tube.

AMBASSADOR – CONN – MELODY PICTURES (1934 – 1937) – Mais de 30 filmes foram produzidos por Maurice Conn entre 1934 e 1937 sob a bandeira de quatro companhias diferentes: Ambassador, Conn, Ambassador – Conn e Melody Pictures. Três astros dominavam os filmes de Conn: Kermit Maynard, Frankie Darro e  Truman “Pinky” Tomlin. A Ambassador Pictures iniciou suas atividades no final de 1934 com o lançamento do western O Herói da Polícia Montada / Fighting Trooper. Seu astro, Kermit Maynard, o irmão mais moço de Ken Maynard, foi para Hollywood acompanhando o sucesso de seu irmão e se sobressaiu como dublê e stuntman. Em 1927, creditado como Tex Maynard, Kermit havia se apresentado em seis westerns produzidos pela Rayart. Depois disso, ele voltou a ser dublê e stuntman, quando finalmente Conn o contratou para estrelar 18 westerns.

Os melhores filmes da série foram aqueles nos quais Kermit era um Polícia Montada (O Herói da Polícia Montada, Justiça Sangrenta / His Fighting Blood /  1935,  A Lei Triunfa / The Red Blood of Courage / 1935, Fronteira do Norte / Northern Frontier/ 1935, O Bando Sinistro / Code of the Mounted / 1935, A Caverna dos Fantasmas / Trails of the Wild /1935, The Phantom Patrol / 1936), Wildcat Trooper / 1936 etc.).

Outra figura importante do elenco de artistas contratados por Conn era Frankie Darro, que começou sua carreira ainda criança no cinema mudo e se tornou ator adolescente, muito lembrado no papel principal de Idade Perigosa / Wild Boys of the Road / 1933 de William Wellman e também em seriados e séries. Os filmes de Darro oferecidos pela Conn Pictures entre 1935 e 1937 eram divertidos e contavam com a presença de um personagem simpático, otimista e temerário. Os temas e os gêneros variavam: Valley of Wanted Men / 1935, era um western; Born to Fight / 1936, filme sobre pugilismo; Racing Blood / 1936, filme sobrecorrupção no meio de corridas automobilísticas; Headline Crasher / 1937, filme sobre jornalismo; Anything for a Thrill / 1937, filme de detetive; The Devil Diamond / 1937, filme de mistério; Tough to Handle / 1937, filme sobre corrupção nas corridas de cavalos etc. Conn colocou um companheiro mais velho robusto e bonitão ao lado do jovem Darro, não somente para tirá-lo das várias situações difíceis nas quais ele se envolvia mas também para namorar as mocinhas.

Nos três filmes iniciais da Conn Pictures, este companheiro foi Roy Mason, mais conhecido como o vilão dos seriados, LeRoyMason. Este depois foi substituido por Kane Richmond, por coincidência, também conhecido nos seriados porém pelos papéis de herói.

Cantor, compositor e band leader, “Pinky” Tomlin encabeçava o elenco das quatro últimas produções de Maurice Conn, lançadas pela Melody Pictures: os musicais With Love and Kisses / 1936, Sing While You’re Able / 1937, Thanks for Listening / 1937 e Swing It Professor / 1937. Popular no rádio e nos discos,  Tomlin era um ator aceitável e bom vocalista porém não tinha muito carisma na tela. Curiosamente, os três derradeiros musicais citados foram dirigidos por Marshall Neilan, diretor de grande prestígio no cinema mudo, então em decadência por causa do alcoolismo.

CHESTERFIELD – INVINCIBLE (1925 – 1937) – Administrada por George R. Batcheller, a Chesterfield produziu na sua longa história mais de cem filmes de longa metragem, incluindo muitos lançamentos da Invincible (que funcionava sob as ordens de Maury M. Cohen), com a qual se fundiu em 1932. As duas companhias operavam em escritórios na Broadway em Nova York e, tal como a maioria das independentes de poucos recursos, não possuíam seu próprio estúdio. Elas alugavam espaço na Universal City e depois ambas foram para RKO Pathé e Republic, antes de fecharem as portas em 1937. Embora fabricados rapidamente, os filmes da Chesterfield-Invincible distinguiam-se pela qualidade em comparação com outras companhias de pequeno porte: M. A. Anderson, que veio para a Chesterfield em 1926 e permaneceu no estúdio por uma década, fotografou quase todos os filmes da companhia enquanto Edward C. Jewell cuidava da direção de arte e Abe Meyer das trilhas musicais. Outra figura importante para o funcionamento da companhia foi Lon Young, um ex-mágico, que veio para a Chesterfield em 1925 como supervisor, roteirista e autor de entretítulos e acabou se envolvendo em todos os aspectos da produção. Três diretores foram principalmente responsáveis pelos filmes da Chesterfield-Invincible: Richard Thorpe, Frank R. Strayer e Charles Lamont. Thorpe dirigiu mais de 12 filmes para a companhia e também funcionou como montador em muitas de suas produções. Strayer dirigiu 17 filmes, a maioria sob a marca Invincible. Lamont dirigiu 14 filmes. Outro diretor prolífico foi Phil Rosen, que dirigiu 9 filmes.

No período silencioso, destacam-se entre os filmes da Chesterfield: westerns de Bill Patton (vg. Flashing Steeds / 1925, Fangs of Fate / 1925) e Eilen Sedgwick (vg. The Girl of the West / 1925, Sagebrush Lady / 1925);  melodramas de aventuras com o cachorro Sandow (Code of the Northwest / 1925, Avenging Fang /1927); filmes de ação (vg. O Bandoleiro do Amor / The Sky Rider / 1928, South of Panama / 1928); dramas de mistério (vg. A Casa da Vergonha  / The House of Shame / 1928) etc. Na fase sonora: The King Murder / 1932, filme de mistério com Conway Tearle;  Fifteen Wives / 1934, sobre o assassinato de um homem que tinha quinze ex-esposas; Green Eyes/1934, que apresentava duas soluções diferentes e plausíveis para o mesmo homicídio mas era muito estático; Fugitive Road / 1934, envolvendo um triângulo amoroso com Erich von Stroheim,  Vera Engels e Leslie Fenton durante a Primeira Guerra Mundial; Death from a Distance / 1935, com efeitos especiais por Jack Cosgrove em uma história sobre uma arma futurística; A Marca do Vampiro / Condemned to Live / 1935, drama de horror com Ralph Morgan; Murder at  Glenn Athol / 1936, thriller de mistério; The Shadow Laughs / 1936, com uma trama  original cheia de surpresas etc.

Entre os astros: Jameson Thomas fez sete filmes; William Bakewell, também sete; Shirley Grey, seis; Charles Starett, cinco; Sally Blane, cinco. Embora a Chesterfield – Invincible tivesse se dissolvido como companhia produtora em 1936, seus filmes continuaram a ser vistos nos cinemas até 1937 e  um pouco mais.

GRAND NATIONAL FILMS, INC. (1936 – 1940) – Edward L. Alperson fundou a Grand National Distributing Corporation em 1935 porém logo no ano seguinte começou a produzir filmes. O próprio Alperson idealizou um logotipo chamativo para a firma, que consistia em uma torre com um relógio modernista, pensando em anúncios como “É hora de ver um filme da Grand National”. Enquanto cuidava dos detalhes da recém-criada organização, ele comprou os estúdios da Educational Pictures, que se transferira para  a costa leste. Entre os dez primeiros filmes da Grand National, B. F. Zeidman produziu dois; George Hirliman, quatro; Boris Petrov, um; Douglas McLean, um; e, finalmente, Edward Finney com a sua Boots and Saddles Productions, contribuiu com dois westerns, tendo como astro um novo cowboy, Tex Ritter.

Segundo Don Miller, os dois filmes produzidos por Zeidman, O Pecado dos Filhos / In His Steps / 1936, com a dupla juvenil Eric Linden – Cecilia Parker (também usada em outros dois filmes, Rapsódia do Amor / Girl Loves Boy / 1937 e A Noiva da Marinha / Sweetheart of the Navy / 1938) e Cruzada Heróica / The White Legion/ 1936, com Tala Birell, deram prestígio à companhia, principalmente o último, cujo enredo girava em torno de uma equipe médica lutando contra uma epidemia de febre amarela  durante a construção do Canal de Panamá.

Um acontecimento memorável foi a presença de James Cagney (momentaneamente afastado da Warner) em duas produções “Poverty Row”: Pesos e Medidas / Great Guy / 1936 e Domando Hollywood / Something to Sing About / 1937. Infelizmente, elas deixaram a Grand National em péssima situação financeira.

Ainda conforme Don Miller, merece destaque um quarteto de filmes produzido por Franklyn Warner (Fine Arts Pictures), que foram distribuídos pela Grand National:  Shadows Over Shanghai / 1938; Cipher Bureau / 1938; Panama Patrol / 1939 e The Long Shot / 1939, todos dirigidos por Charles Lamont. Um dos últimos filmes da Grand National foi um thriller de espionagem, Expresso do Exílio / Exile Express / 1939, produzido por Eugene Frenke  com Mrs. Frenke, mais conhecida como Anna Sten, no papel principal. A companhia faliu em 1940.

LIBERTY PICTURES CORPORATION (1930 – 1931 / 1934 – 1936). A Liberty Pictures teve duas vidas. O produtor. M. H. “Max” Hoffman formou-a em 1930 mas, no ano seguinte, depois de produzir apenas um filme, Ex-Flame, ele fundou a Allied Pictures Corporation e, nos próximos três anos, produziu 22 filmes para esta companhia, a maioria westerns de Hoot Gibson e adaptações modernas de clássicos da literatura. Em 1934, em seguida à extinção da Allied, Hoffman reativou a Liberty Pictures, produzindo filmes sob esta denominação entre 1934 e 1936. Tais como os filmes que Hoffman produziu para a Allied, os da Liberty eram “B plus” com valores de produção sólidos, bons diretores e artistas de renome. Entretanto, ao contrário da Allied, os lançamentos da Liberty não continham westerns ou modernização de obras literárias famosas, destacando-se mais os filmes sobre problemas sociais contemporâneos como infidelidade conjugal (Two Heads on a Pillow / 1934  e Penthouse Party / 1936) ou delinquência juvenil (School for Girls / 1934).

Houve também uma tentativa de produzir musicais de orçamento limitado como The Old Homestead / 1935 (que introduziu The Sons of the Pioneers – incluindo Roy Rogers – , na tela)  e Dizzy Dames / 1936. Entre os filmes mais interessantes da Liberty  – conforme opinião de Michael R. Pitts, foram When Strangers Meet / 1934 sobre as vidas entrecruzadas de residentes em um bangalô de Hollywood e No Ransom / 1935, que mostrava Jack LaRue como um gangster que se humanizava enquanto decidia se ia ou não cumprir seu ofício de matador.

Apesar de fazer bons filmes, a Liberty se viu em dificuldades financeiras em 1935 e foi  absorvida por Herbert J. Yates  que a fundiu com outras companhias para formar a Republic. Vi apenas um filme da Liberty (Já distribuido pela Republic), O Crime do Dr. Crespi / The Crime of Dr. Crespi com Erich von Stroheim / 1935, e até que não era mau. No enredo, Stroheim quer se vingar do homem que ama sua mulher planejando enterrá-lo vivo.

MAJESTIC PICTURES CORPORATION (1930 – 1935). A Majestic nasceu em 1930 com o lançamento de Esposas de Hoje / Today, melodrama produzido por Harry Sherman (mais tarde responsável pela série Hopalong Cassidy na Paramount), dirigido por William Nigh e fotografado por James Wong Howe, no qual uma jovem esposa (Catherine Dale Owen) se prostitui, quando não consegue se adaptar à pobreza, depois que o marido (Conrad Nagel) perdeu sua fortuna. A segunda produção da companhia só saiu em 1932 e, deste ano até 1935, foram realizados 24 filmes, quase todos produzidos  por Phil Goldstone ou Larry Darmour. Entre os filmes mais memoráveis da Majestic estavam The Crusader / 1932 (com Evelyn Brent, Lew Cody), O Vampiro / The Vampire Bat / 1933 (com Lionel Atwill, Fay Wray), The World Gone Mad / 1933 (com Pat O’Brien, Evelyn Brent), The Sin of Nora Moran / 1933 (com Zita Johann, Paul Cavanaugh) e The Scarlet Letter / 1934 (com Coleen Moore, Hardie Albright).

A companhia não possuía estúdio, filmando principalmente na Universal ou no Larry Darmour Studio no Santa Monica Boulevard. No início a Majestic mantinha algumas distribuidoras embora seu produto fosse distribuído na sua maior parte pela Capitol Film Exchange.

Em acréscimo aos seus lançamentos mais importantes, a Majestic fez seis westerns com Jack Hoxie para o público das matinês de sábado  (O Vale do Ouro /Gold ou Valley of Gold/ 1932, Justiça de Criminoso / Outlaw Justice / 1933, O Cavaleiro da Noite / Law and Lawless / 1933, O Correio Expresso do Arizona / Via Pony Express / 1933, O Salteador do Arizona /  Gun Law / 1933, Comprando Barulho / Trouble Busters / 1933). Em 1934, a Majestic  complementou seus programas com três filmes importados da Wardour Films britânica: The Charming Deceiver (Na Inglaterra: Heads We Go) / 1933 com Constance Cummings; You Made Me Love You / 1934 com Stanley Lupino e Thelma Todd; The Morning After (Na Inglaterra: I Spy)/ 1934, dirigido por Allan Dwan com  Sally Eilers e Ben Lyon. Em 1935, a Majestic integrou a fusão de empresas que deu origem à Republic.

MASCOT PICTURES CORPORATION (1927 – 1935) – Em 1926, Nat Levine, ex-secretário particular de Marcus Loew se envolveu com Sam Bishoff na produção de um seriado, O Avião Misterioso / The Silent Flyer, que foi vendido para a Universal. Em 1927, Levine fundou a Mascot Pictures e começou a produzir seriados como O Cavalo Selvagem / The Golden Stallion, A Ilha do Tesouro Enterrado / Isle of Sunken Gold e O Cavalo Fantasma / Heroes of the Wild. Em 1929, ele produziu O Uivar das Feras ou O Rei do Congo / King of the Congo, o primeiro seriado parcialmente falado e, em 1930, O Fantasma do Oeste / Phantom of the West,o primeiro seriado todo falado com Tom Tyler.

Os 24 seriados que Levine produziu entre 1930 e 1935, cheios de ação, valeram-lhe a consagração como o “Produtor Rei-dos-Seriados”: Sentinela Avançada / The Lone Defender / 1930 e O Grande Guerreiro / The Lightning Warrior / 1931 com o cão Rin-Tin-Tin Jr.; Legião dos Centauros / The Vanishing Legion / 1931,  O Cavalo Infernal / The Devil Horse / 1932 e O Último dos Mohicanos / Last of the Mohicans / 1932 com Harry Carey;

Os Cavaleiros Mascarados ou Sacrifício Glorioso / Fighting with Kit Carson / 1933 com Johnny Mac Brown; A Flotilha Misteriosa / Mystery Squadron / 1933 com Bob Steele; O Sertão Desaparecido / The Lost Jungle / 1934 com Clyde Beatty; O Cavaleiro Alado / The Miracle Rider / 1935 com Tom Mix etc

Foi Levine quem percebeu o potencial cinematográfico de um novato John Wayne e o colocou nos seriados Águia de Prata / The Shadows of the Eagle / 1932, O Trem Ciclônico / Hurricane Express e Os Três Mosqueteiros / The Three Musketeeers / 1933. Em 1932, a Mascot iniciou-se na produção de filmes comuns, sendo o primeiro deles, Orgulho Cativante / Pride of the Legion com Sally Blane, Victor Jory e RIn Tin Tin Jr. De um total de 16 filmes, sobressaíram Homenzinhos / Little Men / 1934, inspirado no romance de Lousa May Alcott; Santa Fé / In Old Santa Fe / 1934 com Ken Maynard e Melodias Inolvidáveis / Harmony Lane/ 1935, baseado na vida do compositor Stephen Collins Foster, interpretado por Douglass Montgomery.

Levine foi o descobridor do cantor de rádio Gene Autry para o Cinema. Devidamente preparado por Yakima Canutt, que o ensinou a montar a cavalo, Autry foi incluído no elenco de Santa Fé ao lado de Ken Maynard. Levine faria a seguir, ainda em 1934, o seriado A Montanha Misteriosa / Mystery Mountain, também com Maynard (e Gene Autry num papel minúsculo), após o qual o célebre cowboy desentendeu-se com o patrão e deixou a Mascot. Com isso, Gene Autry teve a oportunidade de assumir o papel principal do seriado O Império dos Fantasmas / The Phantom Empire – reservado para Maynard – em 1935, mesmo ano em que a Mascot desapareceria, transferindo para a Republic o contrato de Autry além de seu primeiro filme como cowboy-cantor, O Boiadeiro Trovador / Trumbling Tumbleweeds, que custou 75 mil dólares e rendeu 500 mil dólares!

MONOGRAM PRODUCTIONS, INC. (1931-1952). Quase tão importante quanto a Republic, a Monogram teve origem em 1924, quando W. Ray Johnston, em colaboração com um grupo de distribuidores independentes, formou a Rayart Productions. Em 1928, ela se tornou Syndicate Film Exchange e produziu cinco filmes sob a marca Continental Talking Pictures. Em 1930, a Syndicate foi reorganizada como Monogram Productions, com Johnston como presidente e Trem Carr como chefe da produção, produzindo seu primeiro filme em 1931. Em 1932, a Monogram celebrou um acordo de distribuição com a British Pathé, pelo qual cada companhia distribuiria os filmes da outra em seu próprio país.  Quando  foi formada em 1935, a Republic encampou as distribuidoras da Monogram e Johnston assumiu o cargo de presidente da nova companhia. Entretanto, em 1937, Johnston e Carr deixaram a Republic e reavivaram a Monogram como companhia produtora. Em 1946, Johnston passou para o Conselho de Administração e Steve Broidy ocupou a presidência. No mesmo ano, Broidy criou a Allied Artists como subsidiária da Monogram, para realizar filmes de melhor qualidade, que Walter Mirisch, então assistente de Broidy, chamava de “B-plus”. Em 1953, o nome da Monogram desapareceu completamente e a companhia passou a ser denominada Allied Artists Pictures Corporation.


A Monogram se especializou nas séries: Cisco Kid (com Duncan Renaldo e depois Gilbert Roland); Charlie Chan (com Sidney Toler e depois Roland Winter ); Kitty O’Day, Detective (com Jean Parker); Os Três Valentes ou Os Três Destemidos / The Range Busters (Ray Corrigan, John “Dusty” King, Max Terhune); The Rough Riders (Buck Jones, Tim McCoy, Raymond Hatton); Renfrew of the Royal Mounted (iniciada na Grand National); Jiggs and Maggie; The Trail Blazers (Ken Maynard, Hoot Gibson, Bob Steele); The Teen Agers; Bomba, the Jungle Boy; Joe Palooka; Mr. Wong; Snuffy Smith; Tailspin Tommy; East Side Kids, Bowery Boys etc.

Importantes também foram os 16 westerns da Lone Star Productions (de Paul Malvern) com John Wayne e a participação de Johnny Mac Brown, Rex Bell, Jack Randall, Tex Ritter, Tom Keene, e de Bob Steele (e seu pai, o roteirista e diretor Robert N. Bradbury), em vários filmes do gênero. A companhia ofereceu filmes também em outros gêneros, destacando-se as adaptações de romances clássicos como Oliver Twist / Oliver Twist / 1933 e Jane Eyre / Jane Eyre / 1934.

Nos anos quarenta, a Monogram distribuiu duas produções importantes dos King Brothers: Dillinger / Dillinger / 1945 (com Lawrence Tierney) e Delírio / Suspense / 1946 (com Belita). Na fase Allied Artists, destaque para Vampiros de Almas / Invasion of the Body Snatchers / 1956 de Don Siegel.

PRODUCERS RELEASING COMPANY – PRC (1940 -1948) – Em 1938, Ben Judell formou um par de companhias independentes, a Progressive Pictures Corporation e a Producers Distributing Corporation (obs. nenhuma conexão com a antiga organização de Cecil B. DeMille). Em 1939, trabalhando com Sigmund Neufeld como seu co-produtor e o irmão deste, Sam Newfield (Neufeld) como diretor,  Judell produziu um filme anti-nazi relativamente ambicioso, A Besta de Berlim / Hitler, Beast of Berlim, no qual um ainda muito jovem Alan Ladd fazia um pequeno papel. O filme irritou a German American Bund, organização nazista fundada em 1930 nos Estados Unidos, cujos adeptos invadiram o estúdio da PDC e destruíram quase que inteiramente os cenários da produção. Estes foram reconstruídos mas  a censura local se recusou a liberar o filme para exibição por causa da sua inclinação “anti-germânica”.

Com seis produções adicionais em andamento, Judell afundou-se em dívidas. Sigmund Neufeld aproveitou a oportunidade e ofereceu à Pathé Film Laboratory, um dos principais credores da PDC, o pagamento antecipado  da dívida de Judell em troca de uma participação na reorganização da PDC sob a denominação de PRC (Producers Releasing Corporation), como subsidiária da Pathé Industries, Inc. Assim, Judell estava fora e Sigmund Neufeld, nomeado chefe da produção, não perdeu tempo em contratar seu irmão Sam Newfield como diretor dos filmes da PRC.


De 1940 até o final de 1946, os irmãos Neufeld foram responsáveis por uma série de 7 westerns de Tim McCoy; pelos seis westerns da série Frontier Marshall (com Bill “Cowboy” Rambler, Art Davis e Lee Powell); pelos 17 westerns da série Lone Rider (com George Houston em 11 filmes e Bob Livingston em  seis filmes); pelos westerns da série Billy the Kid (6 filmes com Bob Steele como “Billy the Kid”; 13 filmes com Buster Crabbe como “Billy the Kid” e 23 filmes com Buster Crabbe como “Billy Carson”). Enquanto os Neufeld cuidavam dos westerns, Leon Fromkess, vice-presidente e gerente geral, encarregava-se do restante da produção, tendo sido responsável por três filmes importantes, dirigidos por Edgar G. Ulmer: Carrasco Sedutor / Bluebeard / 1944; Estranha Ilusão / Strange Illusion / 1944 e Curva do Destino / Detour / 1945.

A PRC fez também filmes de aventuras na selva (vg. Terrores da Mata Virgem / Jungle Man / 1941; Nabonga / Nabonga / 1944; Pongo, O Gorila Branco / White Pongo / 1945) e de horror (vg. A Volta de Drácula / Devil Bat / 1940 com Bela Lugosi e O Monstro Sinistro / Mad Monster / 1942; O Corvo Negro / Black Raven / 1943; Vingança do Túmulo / Dead Men Walk / 1943; Nevoeiro / Fog Island / 1945, todos com George Zucco). Em 1947, o ramo da distribuição da PRC foi comprado pela Eagle-Lion; porém o estúdio continuou a produzir filmes (inclusive os 8 westerns de Lash La Rue com seu personagem “Cheyenne” até 1948, quando também foi absorvido pela Eagle-Lion.

RELIABLE  PICTURES CORPORATION (1934 -1937) – No começo dos anos trinta, o ex-supervisor de laboratório da Biograph, cinegrafista, montador, assistente de diretor e técnico de efeitos especiais Bernard B. Ray fez parceria com o diretor  veterano Harry S. Webb, para formar a Bernard B. Ray Productions e depois fundaram o seu próprio estúdio, Reliable Pictures (originariamente chamada Rayliable), que ficava na esquina de Sunset Boulevard com Beachwood Drive. A Reliable esteve em atividade de 1933 a 1937 e, neste período de quatro anos, produziu 45 filmes, evitando seriados e, com exceção dos oito westerns da série “Bud’n Ben”, também os curtas-metragens. Estes westerns de 30 minutos de duração, distribuidos pela Astor, concentravam-se nas aventuras de dois vaqueiros amigos, com Ben Corbett interpretando o papel de Ben enquanto Bud era retratado na maioria dos filmes por Jack Perrin (e, em alguns, por Walt Williams (Wally Wales), Dennis Meadows (Dennis Moore) e Fred Humes, cada qual apenas em um filme.

Além da série “Bud’n Ben”, Perrin também participou de meia dúzia de westerns de longa-metragem para a Reliable: Emboscada Sangrenta / The Cactus Kid / 1934, Na Senda do Perigo / Loser’s End, O Assalto à Diligência / Rawhide Mail / 1934, North of Arizona / 1935, Texas Jack / 1935, Patrulhando a Fronteira / Wolf Riders / 1935. Entre 1934 e 1936 Tom Tyler fez 18 westerns para a Reliable porém infelizmente a maioria era de baixa qualidade, salvando-se apenas Bandido Invencível / The Unconquered Bandit, O Cavaleiro da Lei / Tracy Rides e A Bala de Prata / The Silver Bullet, todos de 1935. Por causa de seus orçamentos limitados, a Reliable contava com os westerns e os filmes de ação para sobreviver.

Outro trunfo da companhia foi o astro canino Rin-Tin-Tin Jr. O suposto filho de Rin Tin Tin  não era tão bem dotado como o pai e seu treinador, Lee Duncan, foi obrigado a arranjar emprego para ele em companhias independentes pequenas como Mascot e Reliable. Rin-Tin-Tin Jr. apareceu em alguns northernwesterns como Patrulha da Fronteira / Skull and Crown e Heróis das Selvas / The Test em 1935 e Testemunha Silenciosa / Caryl of the Mountains em 1936. Ele formou dupla também com Bob Custer em Vingança do Lobo / Vengeance of Rannah / 1936 e com Rex Lease  em A Mina de Prata / The Silver Trail / 1937. Richard Talmadge era um stuntman famoso no cinema mudo, que encabeçou o elenco de alguns filmes baratos durante os anos vinte, empolgando o público com suas façanhas acrobáticas. Na Reliable ele fez: Nunca é Tarde Demais / Never Too Late / 1935, The Live Wire / 1935, Repórter Veloz / The Speed Reporter / 1936 e  Momento Decisivo / Step on It / 1936. O derradeiro filme da Reliable foi A Mina de Prata com Rin-Tin-Tin Jr. , já citado.

REPUBLIC PICTURES CORPORATION (1935-1959) – Foi fundada em 1935 por Herbert J. (John) Yates, presidente de um grande laboratório, Consolidated Film Industries. Sua criação resultou da fusão das companhias independentes Monogram, Mascot, Liberty, Majestic, Chesterfield-Invincible. Estas companhias estavam em débito com o laboratório e Yates, em vez de cobrar a dívida, propôs a integração sob sua liderança. A Monogram trouxe para a Republic sua  organização de distribuição nacional em 39 cidades e a Mascot  o seu estúdio e a experiência de Nat Levine na realização de seriados. Yates prometeu aos parceiros independência nas suas produções sob a égide da Republic mas surgiram desentendimentos e ele acabou se tornando o único dono da companhia.

A Republic incluía entre seus astros mais conhecidos Gene Autry, Roy Rogers, John Wayne, John Carroll e a patinadora Vera Ralston (com quem Yates se casou em 1952). De 1935 a 1947, Gene Autry fez 58 westerns na Republic; em 1947 fez mais 32 westerns na sua própria companhia, a Flying A Productions, que distribuia os filmes pela Columbia. De 1938 a 1951, com o nome artístico de Roy Rogers, Leonard Slye, fez 82 westerns na Republic, além de participar de vários outros filmes, que não pertenciam à sua série.

John Carroll e Vera Ralston apareceram juntos em  A Chama do Pecado / The Flame / 1945, Escrava do Medo / Surrender / 1950; Náufragos da Vida / Belle Le Grand / 1951  etc. Vera contracenou  com John Wayne em Estranha Caravana / The Fighting Kentuckyan /  1949 e  Carroll foi seu coadjuvante em  Tigres VoadoresThe Flying Tigers / 1942.

As equipes técnicas da Republic eram conhecidas por sua habilidade. Muito do sucesso dos seus seriados (vg. A Deusa de Joba / Darkest Africa / 1936 (O primeiro seriado da Republic); O Imperio Submarino / Undersea Kingdom / 1936; O Misterioso Dr. Satã / Mysterious Dr. Satan / 1940; Os Tambores de Fu Manchu / Drums of Fu Manchu / 1940; A Filha das Selvas / Jungle Girl / 1941; O Homem de Aço / The Adventures of Captain Marvel / 1941; O Terror dos Espiões / The Spy Smasher / 1942; O Maravilhoso Mascarado / The Masked Marvel / 1943; Capitão America, o Vencedor / Captain America /1944 etc.)  deve ser atribuído aos três soberbos diretores de ação, William Witney, John English e Spencer Gordon Bennett, que sabiam instintivamente como “keep things moving”. O trabalho dos cinegrafistas (William Nobles, Reggie Lanning, Bud Thackery) foi sempre considerado excepcional – os numerosos travelings e panorâmicas davam às produções uma sensação de movimento, que não era encontrada na maioria dos filmes das grandes companhias.

Excelentes stuntmen (Tom Steele, Dave Sharpe, Dale Van Sickel, Eddie Parker, Duke Green, Ken Terrrell, Fred Graham), bons scores musicais (William Lava, Mort Glickman, Cy Feuer), efeitos visuais criados pelos irmãos Lydecker (Howard e Theodore) e uma montagem excitante também contribuíram para produzir um conjunto de espetáculos altamente competente e atraente. No gênero western, além da presença de Gene Autry e Roy Rogers, teve particular ressonância a série Os Três Mosqueteiros ou Os Três Sertanejos / The Three Mesquiteers e osfilmes de Rex Allen, Bill Elliott, Allan Lane, Don “Red” Barry, Monte Hale etc. enquanto Judy Canova e The Weaver Brothers (e Elviry) se encarregavam dos musicais rurais.

Um filme interessante da Republic dos anos trinta foi O Mistério de Hollywood / Hollywood Stadium Mystery / 1938 com Neil Hamilton e Evelyn Venable, dirigido por David Howard, no qual um lutador de boxe é assassinado à vista do público no ringue do Legion Stadium. Nos anos quarenta, Yates proporcionou ao público bons espetáculos (vg. O Anjo e o Malvado Angel and the Badman / 1947; O Rastro da Bruxa Vermelha Wake of the Red Witch / 1948; Estranha Caravana (todos com John Wayne) e contratou diretores como Raoul Walsh (Comando Negro / Dark Command / 1940); Orson Welles (Macbeth/ Macbeth / 1948), Frank Borzage (Ao Cair da Noite / Moonrise / 1948), Allan Dawn (Iwo Jima, O Portal da Glória / Sands of Iwo Jima / 1949, Lewis Milestone (O Vale da Ternura / The Red Pony / 1949), John Ford (Depois do Vendaval / The Quiet Man / 1952 etc.); Nicholas Ray (Johnny Guitar / Johnny Guitar / 1954.

SONO ART – WORLD WIDE (1929 – 1933 ) –  A Sono-Art Productions foi fundada em 1929 por J. Douglas Watson e, nos seus cinco anos de existência, produziu mais de 60 filmes, evitando curtas-metragens e seriados. Sediada na Broadway, em Nova York, a maioria de seus filmes foram feitos no International Studio de Ralph M. Like em Los Angeles. A Sono-Art começou produzindo uma série de  musicais estrelados pelo artista de rádio Eddie Dowling (vg. Blaze O’ Glory / 1930); versões em espanhol de filmes americanos (vg. Asi es la Vida / What a Man ! / 1930);  dramas de ação – “Thrill-O-Dramas” (vg. Swanee River / 1931 com Grant Withers); westerns (vg. In Old Cheyenne com Rex Lease) e northernwestern (vg. Mounted Fury com John Bowers  – cujo suicídio inspirou o final de Nasce uma Estrela / A Star is Born / 1937) e contou com o reforço da James Cruze Productions  (O Grande Gabbo / The Great Gabbo / 1929 com Erich von Stroheim, Hello Sister / 1930, O Seguro do Amor / Cock O’ the Walk / 1930 etc).

Em 1932, E. W. Hammons, o presidente da Educational Pictures Inc.  substituiu J. D. Watson como presidente da companhia e o nome desta mudou para World Wide Pictures. Sob o comando de Hammons, a World Wide ficou com os filmes que já tinham sido feitos pela Tiffany antes de sua extinção e distribuiu uma série de oito westerns de Ken Maynard, produzidos pela KBS Productions e  seis westerns com Bob Steele, produzidos por Trem Carr.

Dois filmes interessantes da World Wide foram A Cadeira Elétrica / The Last Mile /  1932,  com interpretação inspirada de  Preston Foster e A Study in Scarlet / 1933, com Reginald Owen no papel de Sherlock Holmes e Warburton Gamble como o Dr. Watson.

TIFFANY  PRODUCTIONS (1921 – 1932) – Foi fundada em 1921 pela atriz Mae Murray, seu marido, o diretor Robert Z. Leonard e Maurice H. Hoffman como uma pequena produtora  especializada em dramas da sociedade e melodramas, cujo exemplar mais expressivo foi Cleo de Paris / Peacock Alley, estrelado por Mae Murray, produzido como filme mudo (1922) e parcialmente falado com uma sequência em Technicolor (1930).

Os filmes da Tiffany eram distribuídos pela Metro Pictures porém, em 1927, a Metro se juntou com Goldwyn para formar a Metro-Goldwyn e a Tiffany teve que organizar o seu próprio sistema de distribuição. De 1927 a 1929 o diretor John M. Stahl se associou com a companhia, que passou a ser conhecida neste período como Tiffany-Stahl Productions.

O filme mais importante da Tiffany foi Journey’s End / 1930,  com Colin Clive, produção anglo-americana dirigida por James Whale, marcando o fim da “produção de qualidade” do estúdio. Com a chegada do som, a firma começou a oferecer westerns “B” com os cowboys Ken Maynard (11 filmes ) e Bob Steele (8 filmes) e tentou em vão impulsionar a carreira do comediante do vaudeville, Benny Rubin. No elenco dos dois filmes de Rubin, Sunny Skies / 1930 e Hot Curves / 1930, estava Rex Lease, que depois foi transformado num astro cowboy do estúdio. Jack Benny teve melhor sorte que Benny Rubin, impondo sua personalidade em The Medicine Man ao lado de Betty Bronson famosa por seus filmes silenciosos da Paramount, Peter Pan / Peter Pan e Os Mil Beijos de Cinderella / A Kiss for Cinderella.

A companhia produziu alguns filmes mais caros, O Zeppelin Perdido / The Lost Zeppelin / 1929 com Conway Tearle, Ricardo Cortez e Virginia Valli; Mamba / Mamba / 1930 com Jean Hersholt, Eleanor Boardman e Ralph Forbes; Aloha/ Aloha com Ben Lyon e Raquel Torres / 1931; O Doutor Karlov / Drums of Jeopardy / 1931 com Warner Oland, June Collyer e Lloyd Hughes, dirigidos o primeiro por Edward Sloman, o segundo e o terceiro por Albert S. Rogell e o quarto por George B. Seitz e, nos seus derradeiros dias, acabou se dedicando à produção de séries de curtas-metragens: Tiffany Talking Chimps; The Voice of Hollywood; Paul Hurst Comedies; Musical Fantasies; Forbes Randolph’s Kentucky Jubilee Singers etc., encerrando suas atividades em 1932.

OS FILMES DA HAMMER

junho 1, 2012

A Hammer Films foi a capital do horror nos anos cinquenta e sessenta, preenchendo o vazio deixado quando os estúdios americanos se voltaram para os discos voadores, alienígenas e mutantes atômicos. Entre a Época de Ouro do Cinema de Horror dos anos trinta e quarenta, durante a qual a Universal  introduziu os quatro ícones imortais do terror cinematográfico (Drácula, Frankenstein, A Múmia e O Lobishomem) e o renascimento do horror feito com maiores recursos dos anos setenta e oitenta ( O Exorcista / The Exorcist / 1973, Sexta-Feira Treze / Friday the 13th / 1980 e  A Hora do Pesadêlo / Nightmare at Elm Street /  1984 ), a Hammer foi o único refúgio para os fãs do macabro, que estavam  ansiosos para saciar sua sede por arrepios clássicos.

O pequeno estúdio britânico trouxe de volta as velhas histórias de monstros, refilmando-as em cores e, durante os seus anos de glória, dominou o mercado de filmes de horror, desfrutando de uma distribuição mundial e um êxito financeiro considerável, sucesso este lhe devido, em parte, à parcerias com grandes estúdios americanos.

A Hammer Productions Ltd. foi fundada em 1934 por William Hinds (1887 – 1957), um dono de joalheria que algumas vezes se apresentava como comediante no music hall sob o nome artístico de Will Hammer, formando a dupla “Hammer and Smith”, assim chamada porque ele e seu companheiro de palco moravam em Hammersmith.

O escritório da companhia situava-se na Regent Street e sua primeira produção  foi The Public Life of Henry the Ninth / 1935, uma paródia de Os Amores de Henrique VIII / The Private Life of Henry VIII de Alexander Korda. No mesmo ano, Hammer, como Hinds ficou sendo chamado pelo resto de sua vida, abriu com o exibidor Enrique Carreras uma distribuidora, a Exclusive Films, cujo escritório localizava-se na Wardour Street no Soho.

O primeiro filme de longa-metragem da Hammer foi The Mystery of the Mary Celeste / 1935, com Bela Lugosi, seguido por The Song of Freedom / 1935, com Paul Robeson. Em 1936, foram feitos mais dois filmes, The Bank Messenger Mystery e Sporting Love, antes da Exclusive se mudar para um escritório mais espaçoso em outro prédio na Wardour Street e a Hammer ser desativada por causa de problemas financeiros.

Em 1938, Michael Carreras (1909 – 1990) e Anthony Hinds 1922 –     ), filhos respectivamente de James Carreras e Will Hinds, ingressaram na Exclusive e, depois de servirem as Forças Armadas na Segunda Guerra Mundial, voltaram a trabalhar na empresa de seus pais. Outra aquisição importante da Exclusive foi Anthony “Brian” Lawrence (1920 – 2004), empregado em 1945 como assistente de vendas e posteriormente promovido a uma posição de maior influência.

O Cinematograph Act de 1927 teve por objetivo proteger os interesses da indústria cinematográfica britânica contra a afluência de filmes americanos. Ele estipulava que todos os cinemas ingleses teriam que exibir uma percentagem de filmes feitos na Inglaterra, os chamados “quota quickies” (filmes de orçamento modesto realizados para cumprir a legislação). As cadeias de cinemas tiveram dificuldade de preencher suas cotas e, animada com esta demanda, a Exclusive ressuscitou a Hammer, como uma de suas divisões, para produzí-los. Entre os “quota quickies” incluíam-se: Death in High Wheels / 1947, Crime Reporter / 1947, River Patrol / 1948, The Dark Road /1948, Who Killed Van Loon? / 1948. Como a Hammer não tinha condições de contratar grandes astros, seus proprietários adquiriram os direitos de filmagem de várias séries radiofônicas da BBC tais como Dick Barton Special Agent / 1948 e The Adventures of PC 49 / 1949. Durante a filmagem de Dick Barton Strikes Back / 1949, ficou claro que a companhia poderia economizar muito dinheiro, filmando em casas de campo, em vez de usar um estúdio profissional. Para a sua produção seguinte,  Dr. Morelle  – The Case of the Missing Heiress / 1949, outra adaptação radiofônica, a Hammer alugou Dial Close, uma mansão de 23 quartos perto do Rio Tâmisa em Cookham Dean, Maidenhead.

Em 1949, a Exclusive registrou oficialmente a “Hammer Film Productions” como uma companhia, cujos sócios eram William Hinds, seu filho Anthony Hinds, Enrique Carreras e seu filho James Carreras.

Pouco tempo depois, reclamações da vizinhança por causa do barulho durante as filmagens noturnas obrigaram a Hammer a sair de Dial Close e se mudar para outra mansão, Oakley Court, também às margens do Tâmisa em Bray, entre Windsor e Maidenhead. Cinco filmes foram rodados lá: The Man in Black / 1950; Room to Let / 1950; Someone at the Door / 1950, What The Butler Saw / 1950; The Lady Craved Excitement / 1950.

Em 1950, a Hammer mudou-se novamente, desta vez para Gilston Park, antigo clube campestre em Harlow Essex, onde foram filmados The Black Widow, The Rossiter Case, To Have and to Hold e The Dark Light, todos em 1951. No mesmo  ano, a Hammer transferiu-se para a sua sede mais famosa, Down Place, uma mansão em Bray no sudeste de Maidenhead, que foi transformada num grande estúdio, depois chamado de Bray Studios. Sua área extensa foi usada em quase todas as locações dos filmes da Hammer e constitui uma parte indispensável do “Hammer Look”. Os primeiros filmes rodados no Bray Studios foram Cloudburst / 1951 e Whispering Smith Hits London / 1952, ambos produzidos com a ajuda de financistas americanos, que impuzeram artistas de Hollywood nos papéis principais  (respectivamente Alexander Paal / Robert Preston e Sol Lesser / Richard Carlson).

Subsequentemente, a Hammer e a Exclusive assinaram um contrato de produção e distribuição de quatro anos com o produtor americano Robert Lippert. As partes trocaram filmes para distribuição nos seus respectivos lados do Atlântico e Lippert, tal como Paal e Lesser, exigiu a presença de artistas de Hollywood nos papéis de primeiro plano. Da parceria Lippert/Exclusive/Hammer surgiram: Trágica Aventura / The Last Page / 1952 (com George Brent, Marguerite Chapman), Wings of Danger / 1952(Zachary Scott), Stolen Face / 1952 (Paul Henreid, Lizabeth Scott), Jogo Perigoso / The Gambler and the Lady / 1953  (Dane Clark); The Flanagan Boy / 1953  (Barbara Payton); 36 Hours / 1954 (Dan Duryea); Face the Music / 1954 (Alex Nicol); The House Across the Lake / 1954 (Alex Nicol); Five Days / 1954 (Dane Clark); The Stranger Came Home / 1954 (Paulette Godard); Third Party Risk / 1955 (Lloyd Bridges); The Glass Cage / 1955 (John Ireland); Casei-me com a Morte / Murder by Proxy / 1955 (Dane Clark); Women Without Men / 1956 (Beverly Michaels).

Em 1953, foram lançados os dois primeiros filmes de ficção científica da Hammer, Os 4 Lados do Triângulo / Four Sided Triangle e Spaceways, ambos dirigidos por Terence Fisher, ex-montador da Warner Bros’ UK, que fôra contratado pelo estúdio em 1951 e já havia feito alguns dos filmes “B” da associação Lippert/ Exclusive/ Hammer. Eles foram os precursores  de Terror Que Mata / The Quatermass Xperiment / 1955 e Usina de Monstros /Quatermass 2 / 1956, baseados na série de televisão da BBC, The Quatermass Experiment (ambos estrelados por Brian Donlevy) e O Estranho de um Mundo Perdido / X , the Unknown / 1956. Terror Que Mata atraiu a atenção dos grandes distribuidores (Columbia, Paramount, United Artists e Universal-International). Além dos recursos financeiros que recebeu desses distribuidores, a Hammer se beneficiou do investimento contínuo de Eliot Hyman, patrocinador mais rico e poderoso do que Robert Lippert.

A resposta das bilheterias para aqueles thrillers de ficção científica, foi tão marcante, que a Hammer encomendou uma pesquisa para saber precisamente o que atraiu tantos espectadores para o cinema: teria sido o aspecto ficção científica ou o horror e a violência? O veredito esmagador foi ‘horror e violência’ e a Hammer então lançou a sua primeira produção em cores A Maldição de Frankenstein / The Curse of Frankenstein / 1957, que impulsionou o estúdio, transformando-o  num fenômeno mundial.

A Maldição de Frankenstein propiciou uma bela carreira para Terence Fisher e Peter Cushing e Christopher Lee tornaram-se  os astros de filme de horror mais famosos desde Boris Karloff e Bela Lugosi. Filmado por Jack Asher, com roteiro de Jimmy Sangster, cenários de época de Bernard Robinson e trilha musical de James Bernard, o espetáculo quebrou todos os recordes de bilheteria internacionalmente.

Animada com este resultado, a Hammer providenciou uma enxurrada de filmes de horror: O Vampiro da Noite / Dracula ou Horror of Dracula / 1958; A Vingança de Frankenstein / The Revenge of Frankenstein / 1958;  O Homem Que Enganou a Morte / The Man Who Could Cheat Death / 1958; A Múmia / The Mummy / 1959; As Noivas do Vampiro /  The Brides of Dracula / 1960; O Monstro de Duas Caras/ The Two Faces of Dr. Jekyll /1960; A Maldição do Lobishomem / The Curse of the

Werewolf / 1961; O Fantasma da Ópera / The Phantom of the Opera / 1962; A Górgona / The Gorgon / 1964; Dracula, o Príncipe das Trevas / Dracula, Prince of Darkness / 1966; E Frankenstein Criou a Mulher / Frankenstein Created Woman / 1967; As Bodas de Satã / The Devil Rides Out / 1968; Frankenstein Deve Ser Destruído / Frankenstein Must Be Destroyed / 1969, todos dirigidos por Terence Fisher; O Monstro de Frankenstein / The Evil of Frankenstein / 1964; Drácula, o Perfil do Diabo / Dracula Has Risen From the Grave / 1968, de Freddie Francis; O Monstro do Himalaya / The Abominable Snowman / 1957;  A Sombra do Gato / The Shadow of the Cat / 1961; A Epidemia de Zombies / The Plague of the Zombies / 1966;  A Serpente / The Reptile / 1966; O Sarcófago Maldito / The Mummy’s  Shroud / 1967 de John Gilling etc., para mencionar apenas os filmes dos diretores mais prolíficos da companhia.

Vou destacar os três filmes que reví recentemente em esplêndidas cópias em dvd: A Maldição de Frankenstein, O Vampiro da Noite e A Múmia.

Assim que começou a produção de Quatermass 2, a Hammer começou a procurar outro parceiro americano, disposto a investir e cuidar da promoção do novo produto nos Estados Unidos. Eventualmente, seus donos iniciaram conversações com Eliot Hyman, o presidente da Associated Artists Productions (a.a.p.). Durante este período, dois americanos, Max J. Rosenberg e Milton Subotsky, que mais tarde fundariam a Amicus, rival da Hammer, submeterem à a.a.p. um script para uma adaptação do romance Frankenstein. Hyman encaminhou o script para a Hammer mas, a fim de evitar uma ação judicial por parte da Universal-International, Anthony Hinds ordenou várias revisões do texto, até que, finalmente,  o roteirista Jimmy Sangster apresentou a versão definitiva.

Esta se concentrou mais sobre a personalidade do Barão Victor Frankenstein (Peter Cushing) do que na de sua Criatura (Christopher Lee) e introduziu um novo personagem: o amigo de Victor, Paul Krempe (Robert Urquhart).  Além disso, enquanto o barão do filme da Universal de 1931 era um cientista tímido, cheio de remorso e ultrapassado pelos acontecimentos, o barão do filme da Hammer de 1957 tornou-se uma pessoa fria, calculista, amoral e assassino.

O filme tem início com o barão numa cela, relatando a história de sua criação terrível e profana para um padre, antes de ser conduzido para a guilhotina. Com seu rosto esquelético, cabelos desalinhados e olhos cansados, Cushing constrói aquele papel com o qual ficaria para sempre identificado.

Outra mudança, por questão de direito autoral, foi o aspecto do monstro retangular de Boris Karloff por uma imagem mais descomposta do dito monstro – em vez de um ser cheio de parafusos na cabeça, vemos uma colagem de pedaços de carne bastante patética.

A criatura encarnada por Christopher Lee desperta alguma piedade, especialmente quando é transformada em um “animal” obediente, depois de ser lobotomizada pelo barão; porém este é que é verdadeiramente a razão de ser do filme.

Fisher teve muito cuidado com a atmosfera e os cenários mas o ritmo que imprimiu à narrativa, embora fluente, é às vezes lento. A cor (Eastmancolor) impressiona mas o diretor não a usou para servir a fins estritamente dramáticos ou horroríficos, como ele faria em Drácula.

Após o sucesso retumbante de A Maldição de Frankenstein, a Hammer se propôs a renovar a experiência com outra figura mítica do horror da Universal: o Conde Drácula. Entretanto, a necessária obtenção do direito para uma nova filmagem do romance de Bram Stoker não foi nada fácil, porque a Universal havia celebrado um contrato de exclusividade com o espólio de Stoker nos anos trinta.  Depois de vários meses de negociação, foi fechado um acordo, pelo qual a Hammer concedia o direito de distribuição para a Universal-International, em troca da permissão de realizar o filme.

O roteiro de Jimmy Sangster omitiu a viagem de Drácula a Londres, localizando o filme inteiramente na Europa Central. Certos personagens, como Renfield, o lunático comedor de moscas  mantido em estado de transe por Drácula, também foi extirpado. Sangster erotizou o vampiro. O seu Drácula é um sedutor ao mesmo tempo sensual e voraz, cuja visita noturna as mulheres aguardam impacientes, como se fossem suas amantes.

Christopher Lee consegue criar o pavor pela sua simples presença ameaçadora. A imagem do ator, coberto por uma capa negra, com os olhos injetados de sangue, captada em Technicolor, causa impacto. É pena que seus diálogos tivessem sido reduzidos a poucas linhas do texto e não pudéssemos ouvir de novo aquela frase imortal de Lugosi: “Listen to them. Children of the Night. What music they make!”.

Em contraponto, Peter Cushing compõe um Van Helsing perfeito, enérgico e incisivo, que não tem medo de enfrentar selvagemente  seu opositor de dentes sangrentos. No desenlace, Van Helsing sai em perseguição ao vampiro enquanto começam a despontar os primeiros clarões da madrugada. Ele encontra o monstro na mansão e sabe que não terá nenhuma chance no caso de um combate corpo a corpo. Então arranca as cortinas pesadas do grande salão e Dracula uiva de dor, quando a luz do sol penetra no ambiente. Van Helsing carrega dois candelabros, cruza-os para transformá-los em um crucifixo, do qual se serve para colocar o vampiro em plena luz. É o fim da perversa criatura: Dracula vira pó diante de nossos olhos e suas cinzas são levadas pelo vento.

Cineasta muito competente – mas destituido de gênio –  Fisher fez um trabalho de ilustração consciente, cuidadoso, oferecendo ao espectador uma surpresa a cada instante.

Em seguida ao êxito de O Vampiro da Noite,  a Hammer firmou um acordo com a Universal-International, que lhe permitia trazer outros mitos do horror clássico  para as telas e começou pela exumação da Múmia. No que se refere ao argumento, Sangster incorporou nesta refilmagem elementos de O Túmulo da Múmia / The Mummy’s Tomb / 1942, continuação da versão original A Múmia / The Mummy / 1932 de Karl Freund.

Tal como as outras duas grandes figuras do cinema de horror, Drácula e Frankenstein, a Múmia é um monstro trágico; mas ela não tem a mesma  espessura nem a ressonância universal que seus companheiros fantásticos. O Conde Drácula possui uma aura romântica e a condição de imortalidade que fascina o homem A criatura do Dr. Frankenstein simboliza a vontade do homem de se substituir ao deus criador. A Múmia é um mito menos rico e, portanto, não permitiu uma releitura tão interessante quanto a dos outros dois mitos anteriormente mencionados.

A múmia do filme não age por conta própria mas é manipulada por Mehemet, adorador de um deus egípcio, para punir os homens, que perturbaram a quietude de um túmulo. Ela só se emancipa, quando seu caminho se cruza com a mulher do último arqueólogo sobrevivente, que vem a ser a reencarnação da deusa Ananka,  seu grande amor. Servido por um roteiro banal, Fisher se concentrou mais no aspecto visual, compondo imagens rutilantes do Egito antigo em Technicolor, como no longo retrospecto relatando os funerais de Ananka, conduzidos pelo majestoso Kharis

Envolvido por uma maquilagem eficiente, com uma presença imponente devido à sua grande estatura e uma tristeza profunda, transmitida apenas pelos seus olhos, Christopher Lee adicionou outra brilhante composição ao seu currículo de monstro cinematográfico. A cena em que Kharis emerge do pântano, onde os carregadores de Mehemet perderam sua cripta, é memorável; poréma primeira aparição da múmia é bem melhor no filme de Boris Karloff, quando vemos somente umas ataduras se arrastando pelo chão. Peter Cushing é o homem de razão, obrigado a confrontar a verdade terrível subjacente numa maldição legendária e, como sempre, tem uma atuação impecável.

Além dos filmes já citados,  a Hammer produziu muitos outros nos mais variados gêneros como – ficção científica (vg. O Mundo os Condenou / The Damned / 1963; Gangsters na Lua / Moon Zero Two / 1969); dramascriminais (vg. A Mancha Verde / Hell is a City / 1960; Estranho Assalto / Cash on Demand /  1963); thrillers psicológicos ou de suspense (vg. Um Grito de Pavor / Taste of Fear / 1961; Fanatismo Macabro / Fanatic / 1965 (com Tallulah Bankhead); Nas Garras do Ódio / The Nanny / 1965 (com Bette Davis); aventura pseudo-histórica (vg. Os Estranguladores de Bombaim /The Stranglers of Bombay / 1959; A Seita do Dragão Vermelho / The Terror of the Tongs /1961); de capa-e-espada (vg. Os Piratas do Rio Sangrento / The Pirates of Blood River / 1962; A Espada de Robin Hood / The Men of Sherwood Forest / 1964); Cavaleiro Audaz / The Scarlet Blade / 1963, pré-histórica (vg. Mil Séculos Antes de Cristo / One Million Years B.C. / 1966; Quando os Dinossauros Dominavam a Terra / When Dinosaurs Ruled the Earth / 1970), de guerra (vg. A Ilha Sangrenta / The Camp on Blood Island / 1958; Turbilhão de Sangue / Yesterday’s Enemy / 1959); comédias (vg. Life with the Lyons/ 1954 (com a dupla de veteranos da cena muda, Ben Lyon e Bebe Daniels); On the Buses / 1971); adaptações de romances de autores famosos (vg. O Cão dos Baskervilles / The Hound of the Baskervilles / 1959 de Conan Doyle; A Deusa da Cidade Perdida / She / 1965 de Rider Haggard) –  curtas-metragens e séries de televisão (Hammer House of Horror / 1980; Hammer House of Mystery and Suspense / 1984).

Na medida em que as platéias se tornaram mais sofisticadas no final dos anos sessenta com a exibição de filmes de horror mais sutís como o Bebê de Rosemary  / Rosemary’s Baby / 1968 de Roman Polanski, a Hammer tentou manter sua posição no mercado, contratando novos roteiristas e diretores, testando novos personagens e tentando rejuvenescer seus filmes de vampiro e de Frankenstein com novas abordagens dos assuntos com os quais já estava familiarizada. Embora o estúdio continuasse fiel aos cenários de época em O Circo do Vampiro / Vampire Circus /1972, os seus Drácula no Mundo da Minissaia / Dracula AD 1972 e Os Ritos Satânicos de Drácula / The Satanic Rites of Dracula preferiram ter um  ambiente moderno; porém estes filmes não fizeram sucesso. Após a aparição de filmes como Bonnie and Clyde / 1967 e The Wild Bunch / 1968,  o público foi ficando cada vez mais preparado para ver cenas de gore. O filme A Noite dos Mortos-Vivos Night of the Living Dead / 1968 também havia introduzido um novo nível de representação visual da violência nas telas.

A Hammer tentou competir com esses espetáculos – por exemplo, em Frankenstein and the Monster from Hell / 1974 – mas verificou que seus filmes não conseguiam ser tão manchados de sangue como as novas produções americanas e seguiu uma tendência predominante nos filmes europeus da época, passando a dar mais ênfase ao conteúdo sexual. Na chamada trilogia Karnstein – composta por Os Vampiros Amantes / The Vampire Lovers / 1970, Luxúria de Vampiros / Lust for a Vampire / 1971 e As Filhas de Drácula / Twins of Evil / 1971 – baseada na novela de vampiro Carmilla (Karnstein) de J. Sheridan Le Fanu, a Hammer mostrou cenas explícitas de lesbianismo e aumentou as cenas de nudez.

No final da década de setenta, ela produziu menos filmes e foram feitas tentativas para se livrar dos então fora-de-moda filmes de horror gótico sobre os quais a companhia construira sua reputação. Uma dessas tentativas, A Lenda dos 7 Vampiros / The Legend of the 7 Golden Vampires / 1974, co-produção com os Irmãos Shaw de Hong Kong, que tentou combinar o filme de horror da Hammer com o filme de artes marciais, foi um desastre na bilheteria.

A última produção da Hammer, em 1979,  refilmagem do thriller de espionagem de Alfred Hitchcock, The Lady Vanishes / 1938, com Elliott Gould, Cybill Shepherd e Angela Lansbury nos papéis principais, também fracassou em termos financeiros e quase levou o estúdio à falência.

Conclusão decepcionante para a trajetória de uma companhia, que redefiniu o horror moderno, fazendo inovações importantes com relação ao estilo visual e aos temas.

DIREÇÃO DE ARTE NO CINEMA CLÁSSICO DE HOLLYWOOD III

maio 16, 2012

Muitos acham que é difícil identificar um estilo RKO definido porque, nos seus 27 anos de atividade (1929-1957), a companhia foi governada por uma sucessão de chefes de produção. Porém, pelos menos durante os anos trinta – a década mais importante da RKO -, havia um RKO “look” reconhecível  (mais precisamente entre os anos 1932-1942), na gestão do diretor de arte supervisor Van Nest Polglase (1898-1968).

Ele nasceu no Brooklyn em Nova York, estudou arquitetura na Beaux Arts School e praticou seu ofício em Nova York nos anos dez. Em 1917, foi para Cuba, onde passou um ano trabalhando em projetos de construção e colaborou com desenhos para o Palácio Presidencial de Havana. Após retornar aos Estados Unidos, ingressou no departamento de arte da Famous Players-Lasky (Paramount) nos estúdios Astoria em Nova York e se mudou para Hollywood no final de 1919.

Ele logo obteve destaque como um dos cenógrafos mais inovadores do cinema americano. Entre seus filmes notáveis na Paramount incluem-se Este Mundo é um Teatro / Stage Struck / 1925 e Quarteto de Amor / The Magnificent Flirt / 1928, cujos cenários já mostravam sua tendência para o modernismo. Em 1929, Cedric Gibbons contratou Polglase e ele se juntou ao quadro de técnicos da MGM como diretor de arte de unidade. Curiosamente, só recebeu crédito nos seus três anos na “Marca do Leão” por um filme, A Indomável / Untamed / 1929 mas, presumivelmente, trabalhou em outros projetos.

Em 1932, Polglase foi para a RKO, onde se tornaria um diretor de arte supervisor tão influente quanto Gibbons foi na MGM; porém, ao contrário de Gibbons, seu nome não foi arbitrariamente mencionado nos letreiros de apresentação de todos os filmes realizados pelo estúdio.

Entre os artistas mais talentosos supervisionados por Polglase, estavam Carroll Clark, Perry Ferguson, John Mansbridge, Allan Abbott, Maurice Zuberano, Darrel Silvera, Alfred Herman, Charles Kirk, Mark-Lee Kirk, Alfred Ybarra. Estes diretores de arte, decoradores de interiores e ilustradores da produção deram uma consistência visual reconhecível ao produto da RKO, especialmente perceptível nos musicais com Fred Astaire e Ginger Rogers. Nestes, os  traços mais acentuados eram a brancura dos cenários, o brilho dos assoalhos e uma predileção constante pela linhas duplas paralelas, algo que Polglase havia extraído dos veículos aerodinâmicos.

Todo o departamento de arte (com destaque para Polglase e Carroll Clark) deve ser creditado pelos cenários que incluíram principalmente o Club Carioca em Voando para o Rio / Flying Down to Rio / 1933;  o streamlined modern Bella Vista Hotel de A Alegre Divorciada / The Gay Divorcee / 1934; o Big White Set abstrato do Lido de Veneza e o quarto nupcial rococó de O Picolino / Top Hat / 1935; as boates art déco e o estúdio de dança de Ritmo Louco / Swing Time / 1936.

Como observou Beverly Heisner, os interiores art déco e art moderne da série atendiam ao desejo que as platéias da época da Depressão tinham de um mundo melhor. Se Fred e Ginger deixavam os espectadores pensando que talvez eles também pudessem dançar, Carroll Clark e Van Nest Polglase deixava-os acreditando que eles também algum dia poderiam viver em cenários tão luxuosos e modernos.

Embora  os filmes de época não fossem o forte da RKO, a companhia produziu alguns deles e o Departamento de Arte esteve à altura do empreendimento. Considerados como produções de prestígio, eles recebiam mais recursos e pessoal artístico dos que eram normalmente concedidos aos filmes com temas contemporâneos. Entre os verdadeiros triunfos da RKO nos anos trinta estavam os filmes de época Gunga Din/ Gunga Din / 1939 e O Corcunda de Notre Dame / The Hunchback of Notre Dame / 1939.

As locações de Gunga Din, uma história livremente adaptada do poema de Rudyard Kipling  passado na India, foram rodadas numa região campestre perto de Long Pine., California. Os cenários de Polglase e Perry Ferguson – casa colonial britânica,  barracas do exército, templo indiano e pequena aldeia construída em frente de uma montanha e num terreno árido –  não eram meramente um pano de fundo exótico mas verdadeiros cúmplices nas maravilhosas cenas de aventura que estavam no âmago do filme. Com exceção do canyon e da ponte oscilante (uma miniatura) que conduzem ao grande templo, foram dispensados os mattes ou efeitos especiais; até os telhados da aldeia eram de verdade, a fim de que as lutas e saltos audaciosos dos heróis pudessem ser encenados em cima deles.

O diretor de arte de unidade de O Corcunda de Notre Dame era Al Herman mas Polglase desenhou ele mesmo boa parte dos cenários. Os sets enormes foram construídos em San Fernando Valley num rancho que a RKO havia comprado em 1929. Na reconstituição da Catedral de Notre Dame e da praça, que constituíam o centro da Paris do século quinze, Polglase e Herman preocuparam-se com os mínimos detalhes. A catedral desempenha um papel importante na história e grande parte dela foi construída incluindo a torre gigantesca, as gárgulas no topo da fachada, os sinos enormes e a escada em espiral no interior do campanário; mas a nave e o altar da igreja foram feitos por mattes. Na última tomada da perseguição a Quasimodo, o corcunda agacha-se perto de uma das gárgulas, que se equiparam a ele em feiura, e deseja: “Eu também devia ter sido feito de pedra”.

Nos meados dos anos trinta, o expressionismo germânico começou a influenciar os desenhos cênicos da RKO notadamente em O Delator / The Informer / 1935 e Os Predestinados / Winterset / 1936, dois filmes com uma iluminação contrastada e atmosférica. O Delator, dirigido por John Ford e cujos cenários foram desenhados  por Polglase e Charles Kirk, é um drama tenso de delação, situado numa Dublin dos anos vinte coberta de nevoeiro, por onde transita furtivamente o informante interpretado magistralmente por Victor McLaglen. Na trama de Os Predestinados, baseado em uma peça de Maxwell Anderson, o personagem encarnado por Burgess Meredith tenta limpar o nome de seu falecido pai condenado injustamente. O filme tem um mínimo de cenários – construídos em estúdio por Polglase e Perry Ferguson – entre os quais sobressai a paisagem noturna triste e sombria com as pedras da calçada banhadas pela chuva (anunciando o clima do futuro filme noir) e o apartamento claustrofóbico habitado pelo protagonista, situado perto da Brooklyn Bridge.

Com a experiência adquirida em Os Predestinados, Perry Ferguson pôde assumir a tarefa muito mais complicada de desenhar os cenários de Cidadão Kane / Citizen Kane / 1941 para Orson Welles. Polglase foi mais uma vez creditado como diretor de arte mas, neste filme, de acordo com as declarações de Welles e do fotógrafo Gregg Toland, ele atuou apenas como supervisor.

Depois de um período de pré-produção, quase no início do filme, o orçamento previsto já havia sido ultrapassado. Para aliviar a crise financeira, Ferguson e o fotógrafo Gregg Toland tiveram que eliminar a construção de cenários inteiros, com exceção apenas da sala do café da manhã na casa de Kane e sua primeira esposa e os interiores da redação do jornal. Ferguson inventou fragmentos de cenário como uma lareira gigantesca, escadas enormes, e janelas góticas (especialmente para o castelo de Kane, Xanadu), combinando-os com mattes e efeitos especiais (múltiplas exposições, miniaturas), de modo que não se nota a pobreza dos sets; muito pelo contrário, eles são ricos e cheios de significados e símbolos relevantes para a história.

O êxito do filme pôs em moda a construção ou imitação dos tetos nos cenários de interiores e esta idéia foi usada com tanta propriedade, que causou um grande impacto, como se fosse nova (vg. John Ford utilizara os tetos em No Tempo das Diligências / Stagecoach / 1939).

Cidadão Kane e o filme de Welles seguinte, Soberba / The Magnificent Ambersons / 1942, desenhado por Mark-Lee Kirk, foram os pontos altos da história da direção de arte na RKO e com eles terminou o período de Polglase como diretor de arte supervisor. Por causa de problemas com alcoolismo, ele deixou o estúdio em 1942 mas, depois de um tratamento do seu vício, continuou a desenhar cenários até 1957, primeiro na Columbia (A Noite Sonhamos / A Song to Remember / 1945 e Gilda / Gilda / 1946 (com Stephen Goosson) e, a partir dos anos cinquenta, independentemente, em filmes de seu amigo  Allan Dwan (Homens Indomáveis / The Silver Lode / 1954; Sob a Lei da Chibata / Passion / 1954; Montana, Terra de Ódio / Cattle Queen of Montana / 1954; O Poder do Ódio / Slightly Scarlet / 1956) e outros. Porém será sempre lembrado pelos seus gloriosos dias na RKO, que lhe proporcionaram sete indicações para o Oscar: A Alegre Divorciada; O Picolino; Os Predestinados; Dance Comigo / Carefree / 1938; Duas Vidas / Love Affair / 1939; Minha Esposa Favorita / My Favorite Wife / 1940 e Cidadão Kane.

Em 1939,  Albert S. D ‘Agostino (1893 – 1970) entrou para a RKO como diretor de arte por unidade e  logo sucedeu Polglase como diretor de arte superintendente; ele ficou na RKO até 1958, quando a companhia deixou de existir. Nascido em Nova York, D’Agostino estudou desenho arquitetural e mecânico na Columbia University e no Mechanics Institute, antes de se tornar cenógrafo teatral em 1915. Embora tivesse sido empregado ocasionalmente pela Lewis J. Selznick Productions  e pela MGM, que produziam filmes em Nova York, a carreira de D’Agostino no cinema começou realmente em 1925, quando ingressou na Universal como diretor de arte de unidade e foi para Hollywood. Na empresa de Carl Laemmle, ele absorveu a técnica usada por Charles D. Hall para os filmes de horror clássicos feitos neste estúdio nos anos trinta (Ele trabalhou em O Lobishomem de Londres / The Werewolf of London / 1933; O Corvo / The Raven / 1935; A Filha de Drácula / Dracula’s Daughter / 1936 etc., cujos cenários combinavam o gótico e o moderno. Foi uma técnica que D ‘Agostino usaria nos seus desenhos para a RKO. Sozinho ou em colaboração com outros colegas, ele desenharia os cenários para todos os filmes noirs da RKO e a série de horror psicológico produzida por Val Lewton.

O primeiro filme de D’Agostino na RKO foi O Homem de Olhos Esbugalhados / Stranger on the Third Floor / 1940, considerado um precursor do filme noir pelo uso de sombras, ângulos estranhos e efeitos de luz contrastada, providenciados por Nicholas Musuraca, um dos grandes fotógrafos daquele subgênero  do drama criminal. A paranóia do protagonista, que se sente culpado pela condenação de um inocente, enseja uma sequência premonitória e expressionista, estendendo-se a influência germânica por todo o filme.

D’Agostino desenharia posteriormente outro filmes no estilo expressionista destacando-se Silêncio nas Trevas / The Spiral Staircase / 1946 (com Jack Okey); Interlúdio / Notorious / 1946 (com Carroll Clark); Expresso para Berlim / Berlin Express / 1948 (com Alfred Herman), Ninguém Crê em Mim / The Window / 1949 (com Walter E. Keller) etc.) e os estupendos filmes noires Fuga ao Passado / Out of the Past / 1947 (com Jack Okey); Trágico Destino / Where Danger Lives / 1950 e Cinzas Que Queimam / On Dangerous Ground / 1951 (estes dois últimos com Ralph Berger que, tal como Jack Okey e Walter E. Keller, entraram para a RKO durante a gestão de D’Agostino como executivo responsável de departamento de arte).

Entretanto, na RKO, o nome de D’Agostino estava mais íntimamente asssociado com o pequeno grupo criativo de pessoas que cercavam o produtor Val Lewton: D’Agostino e Walert E. Keller (com a colaboração de Darrel Silvera na decoração de interiores) desenharam para eles todos os filmes de horror psicológico de orçamento limitado e duração máxima de 75 minutos, que se tornaram jóias raras no gênero: Sangue de Pantera / Cat People / 1942; A Morta-Viva / I Walked With a Zombie / 10943; O Homem Leopardo / The Leopard Man / 1943; A Sétima Vítima / The 7th Victim / 1943; O Fantasma dos Mares / The Ghost Ship / 1943; A Maldição do Sangue de Pantera / Curse of the Cat People / 1944; A Ilha dos Mortos / Isle of Dead /1945; O Túmulo Vazio / The Body Snatcher / 1945; Asilo Sinistro / Bedlam / 1946.

D’Agostino e o Departamento de Arte da RKO tiveram que se sujeitar às restrições de filmagem do tempo de guerra. Por exemplo, em Sangue de Pantera, apenas uma sequência, a da piscina, foi rodada fora do estúdio, em um hotel residencial num distrito de Los Angeles; as jaulas do jardim zoológico e o apartamento de Alice / Simone Simon (uma parte aproveitada do cenário de Soberba) foram rodados nos palcos da RKO. A ilha das Caraíbas em A Morta-Viva foi igualmente recriada no estúdio, inclusive a caminhada sinistra da enfermeira e sua paciente pela selva à procura dos praticantes do voodoo. Os desenhos para esta sequência – e para todo o filme – mostram a forte influência dos elementos góticos e expressionistas, com os quais D Ágostino havia se familiarizado na Universal nos anos trinta.

Curiosamente, durante toda a sua carreira, D’Agostino recebeu cinco indicações para o Oscar (O Grande Bruto / The Magnificent Brute / 1936; Soberba / 1942; Adeus meu Amor / Flight for Freedom / 1943; Vivendo de Brisa / Step Lively / 1944 e Idílio Perigoso / Experiment Perilous / 1944), nenhuma delas relacionada com os filmes de horror de Val Lewton.

Stephen Goosson (1889 – 1973) foi diretor de arte supervisor da Columbia durante 25 anos. Natural de Michigan, ele estudou arquitetura da Syracuse University e praticou seu ofício em Detroit antes de prestar serviço para o produtor Lewis J. Selznick na condição de diretor de arte. Sua carreira nos anos vinte incluiu trabalhos para muitos produtores diferentes em uma variedade de filmes. Entre eles destacam-se O Pequeno Lord Fauntleroy / Little Lord Fauntleroy / 1921 e O Corcunda de Notre Dame / The Hunchback of Notre Dame / 1923 (com Elmer E. Shelleyy, Charles D. Hall), exemplos expressivos da influência do desenho gótico no cinema americano.

Goosson ingressou na Columbia em 1931 como diretor de arte supervisor e ali ficou até o final dos anos quarenta. Ele foi o principal designer de muitos dos grandes filmes de Frank Capra na empresa de Harry Cohn nos anos trinta: Loucura Americana / American Madness / 1932; Aconteceu Naquela Noite / It Happened One Night / 1934; Horizonte Perdido / Lost Horizon / 1937y e Do Mundo Nada se Leva / You Can’t Take It With You / 1938. Loucura Americana e Horizonte Perdido distinguiam-se peas suas  ousadas e ostensivas interpretações do art déco.

Goosson pesquisou intensamente a fim de reconstituir em Loucura Americana um banco do tempo da Depressão, com altas pilastras de mármore, portas pesadas de bronze, réplicas de ornamentos romanos e espaçoso salão central para acomodar as cenas de multidão importantes na história.

Para Horizonte Perdido, Goosson construiu  o imenso convento habitado pelo alto sacerdote de 200 anos de idade (Sam Jaffe), utilizando uma miniatura enorme do Vale da Lua Azul com terraços de pedra, córregos e jardins, envolvidos pelas montanhas do Himalaia. A residência do High Lama tem uma aparência moderna com referências à obra de Frank Lloyd Wright; por exemplo, a piscina serena de Shangri-La refletindo o exterior modernista do convento, que se eleva branco e imaculado sobre os terraços que o cercam. As paredes, colunas e entradas desse edifício seguem os modelos estabelecidos para o exterior mas os móveis desviam-se da modernidade: aparecem mesas rococó, bricabraque oriental, e pinturas da Renascença e do século dezoito nas paredes. Entretanto,  havia uma desculpa para isso na trama do filme, pois o convento era o repositório do conhecimento e dos tesouros da civilização. O magnifico trabalho de Goosson em Horizonte Perdido trouxe-lhe o prêmio da Academia entre suas outras indicações: Fantasias de 1980 / Just Imagine / 1930; Boêmio Encantador / Holiday / 1938; Pérfida / The Little Foxes / 1941; e Aladim e a Princesa de Bagdad / A Thousand and One Nights / 1945.

Nos derradeiros anos de sua carreira, Goosson criou cenários para três filmes noirs importantes: Gilda / Gilda / 1946; Confissão / Dead Reckoning / 1947 e A Dama de Shanghai / The Lady from Shanghai / 1948. Em Gilda, Goosson (com Van Nest Polglase) construiu em estúdio a boate exótica, a beira do cáis e os exteriores nebulosos, que são a própria imagem do film noir. O clima sensual, devido em grande parte à presença de Rita Hayworth no papel título, deveu-se também aos cenários elegantes de Goosson e Polglase. Entre eles sobressaem o cassino déco tropical onde Gilda, vestida de cetim preto, esquenta o ambiente com o seu famoso “strip-tease” e a mansão compartilhada por Gilda e seu marido (George Macready), na qual desponta um vestíbulo luxuoso no andar térreo com uma escadaria que conduz ao  segundo andar da casa. Em  A Dama de Shanghai, Goosson (com Sturges Carne) apresenta vários cenários de interiores imaginativos com especial destaque para a “casa do riso” do parque de diversões com seu tobogã em ziguezague e o labirinto de espelhos, onde tem lugar o acerto de contas final. A primeira parte da narrativa transcorre num Central Park e Nova York construídos em estúdio; as cenas da viagem a Acapulco e as cenas em San Francisco foram rodadas em locação. Neste último ambiente, surgem duas sequências mermoráveis: o encontro do marujo ingênuo (Orson Welles) com a mulher fatal (Rita Hayworth) em frente ao aquário onde se vêem tubarões e enguias no fundo (filmado com lente grande angular e traveling matte) e a sequência nas ruas de Chinatown e no teatro chinês (Mandarin Theatre).

Além de contar com a colaboração de Van Nest Polglase, Rudolph Sternard (em Confissão) e Sturges Carne na sua administração à frente do departamento de arte da Columbia, Goosson obteve os prestimosos serviços de Lionel Banks, cujos cenários mais admiráveis foram os que ele fez para a aventura – romântica Paraíso Infernal / Only the Angels Have Wings / 1939 e para o musical em Technicolor, Modelos / Cover Girl / 1944.

Desde a sua fundação em 1912 até os anos cinquenta, a Universal empregou alguns dos melhores diretores de arte de Hollywood – Charles D. Hall, Jack Otterson, John B. Goodman, Alexander Golitzen, Bernard Herzbrun, Herman Rosse, Robert Clatworthy etc.- mas é um dois estúdios mais difíceis de identificar em termos de “look“, em parte porque sempre esteve sob contínuas restrições econômicas. Porém, nos anos trinta, o estúdio se especializou no gênero de horror e foi em torno dele que o Departamento de Arte pôde desenvolver um aspecto visual identificável.

Nascido em Norwich, Inglaterra, Charles D. Hall ( 1899 – 1978) estudou arte, fez estágio no escritório de um arquiteto e foi cenógrafo de Fred Karno, o empresário teatral que descobriu Charles Chaplin e Stan Laurel. Hall partiu para Hollywood no começo dos anos vinte e ingressou na Universal como pintor cênico, assumindo gradualmente a respnsabilidade de diretor de arte de unidade.

Ele logo demonstrou capacidade de se adaptar a qualquer assunto no qual estivesse trabalhando mas se especializou nos temas de horror: O Corcunda de Notre Dame / The Hunchback of Notre Dame / 1923 (com Elmer E. Sheeley, Stephen Goosson); O Fantasma da Ópera / Phantom of the Opera / 1925 (com Elmer E. Sheeley, Sidney M. Ullman e Ben Carré); O Gato e o Canário / The Cat and the Canary / 1927 e O Homem Que Ri / The Man Who Laughs / 1928. Além das catacumbas subterrâneas inesquecíveis desenhadas por Ben Carré, os cenários de O Fantasma da Opera incluiam uma réplica opulenta da Ópera de Paris, com cinco balcões para abrigar três mil figurantes. Juntos com a interpretação ameaçadora de Lon Chaney, eles compuseram um dos filmes de horror mais impressionantes do período silencioso, abrindo caminho para a predominância da Universal no gênero nos anos trinta.

Ao mesmo tempo, Hall trabalhou independentemente para Charles Chaplin em  Em Busca do Ouro / The Gold Rush / 1925; ele posteriormente participaria de mais três filmes do diretor: O Circo / The Circus / 1928; Luzes da Cidade / City Lights / 1931 e Tempos Modernos / Modern Times / 1936 (com Russell Spencer). A fábrica onde a mecanização desumana dos “tempos modernos ” é simbolizada nas máquinas intrincadas que “trituram” e atacam Carlitos, está entre os sets mais complicados jamais criados para um filme de Chaplin.

No final da década de vinte, a Universal, juntamente com  outros estúdios de Hollywood, estava pronta para entrar na modernidade art déco embora o uso deste estilo na “casa de Carl Laemmle” não viesse a ser tão amplo como na Paramount, RKO e MGM. Hall aplicou-o no musical Broadway / Broadway / 1929, a primeira investida da Universal no cinema todo falado. Para esta adaptação cinematográfica de um êxito do palco, Hall imaginou um cenário audacioso e tão vasto, que teve de ser inventada uma grua especial para a filmagem. A produção foi orçada em um milhão de dólares e a maior parte deste dinheiro direcionada para cobrir despesas com o set, algo raro de acontecer na Universal. A boate criada por Hall foi descrita pelos publicistas do estúdio como “um exemplo perfeito da arte cubista ultra-moderna”.

Entretanto, os filmes que representam melhor a arte de Charles D. Hall são os de horror expressionista dos anos trinta: Drácula / Dracula / 1931; Frankenstein / Frankenstein / 1931; A Casa Sinistra / The Old Dark House / 1932; O Homem Invisível / The Invisible Man / 1933; O Gato Preto / The Black Cat / 1934 e A Noiva de Frankenstein / The Bride of Frankenstein / 1935.

Os sets mais famosos de Hall para esse ciclo são o castelo gótico de Drácula, assimétrico, escuro e parcialmente em ruínas e o laboratório com a torre elétrica e os instrumentos científicos “futuristas” (providenciados por Kenneth Strickfaden) usado em Frankenstein e preservado para a filmagem de A Noiva de Frankenstein.

Embora a reputação de Hall tivesse se firmado com o ciclo de horror, ele não trabalhou exclusivamente em filmes deste tipo. Foi, por exemplo, o diretor de arte (com W.R. Scmidt) do drama de guerra clássico, Sem Novidade no Front / All Quiet on the Western Front /1930, para o qual construiu o cenário da frente de batalha com a longas fileira de trincheiras, os prédios destruídos onde as tropas se refugiavam, a igreja de pedra que servia como hospital etc. e da comédia  Irene, a Teimosa /  My Man Godfrey / 1936, cujos sets estavam entre os melhores que ele fez na Universal. No final dos anos trinta, Hall foi para o Hal Roach Studios, trabalhando lá nos filmes de Laurel e Hardy. Após 1944, tornou-se um free lancer, destacando-se nesta fase a sua contribuição para Gardenia Azul / The Blue Gardenia / 1953 de Fritz Lang. Em sua carreira, ele recebeu indicações para o Oscar por Sua Excia., o Chauffeur / Merrily We Live / 1938 e Capitão Fúria / Captain Fury / 1939, tendo sido esquecido pelos membros da Academia os seus cenários para o ciclo de horror da Universal.

Em 1937, Jack Otterson substituiu Hall como diretor de arte supervisor na Universal e se manteve nesta posição até 1943. Ele era um proeminente arquiteto em Nova York, que colaborou com desenhos para o Empire State Building. Tal como outros arquitetos, Otterson foi atraído por Hollywood, ingressando na Fox em 1932. Em 1936, transferiu-se para a Universal, onde criou  cenários interessantes em muitos filmes, ganhando indicações para o Oscar por: O Grande Bruto / The Magnificent Brute / 1936; Louca por Música / Mad About Music / 1938; Primeiro Amoir / First Love / 1939; Os Gregos Eram Assim / The Boys from Syracuse / 1940; Paixão Fatal / Flame of New Orleans / 1941; A Indomável / The Spoilers / 1942; As Mil e Uma Noites / Arabian Nights / 1942 (com Alexandre Golitzen).

John B. Goodman exerceu o cargo de diretor de arte supervisor na Universal entre os anos 1943 – 1946, quando foi substituido por Bernard Herzbrun em 1947.

Alexander Golitzen entrou como diretor de arte na Universal em 1942 e trabalhou mais assíduamente nas produções de Walter Wanger. Um dos melhores cenários que ele fez para Wanger foi o de Correspondente Estrangeiro / Foreign Correspondent / 1940, dirigido por Alfred Hitchcock. Os sets mais impressionantes de Golitzen foram o moinho holandês com sua engrenagem barulhenta, onde os espiões operam; o aeroplano de quatro hélices, sua fuselagem e a asa gigantesca ocupada pelos sobreviventes do desastre aéreo; a praça em Amsterdam, na qual, durante uma tempestade, ocorre a morte do diplomata e a fuga do assassino através dos guarda chuvas abertos da multidão. Quando Wanger deixou a IUniversal, Golitzen ficou e, em 1953, foi promovido a diretor de arte supervisor no lugar de Bernard Herzbrun, continuando no cargo até sua aposentadoria em 1976.

Nascido em Moscou, Alexander Golitzen (1907 – 2005) imigrou com a família para os Estados Unidos com a idade de 16 anos. Ele estudou arquitetura na University of Washington, graduando-se em 1931. Golitzen começou a trabalhar como ilustrador, assistente de Alexander Toluboff na MGM em Rainha Christina / Queen Christina / 1933. Na primeira fase de sua carreira como diretor de arte, prestou serviço, como independente, a companhias como Goldwyn (O Furacão / Hurricane / 1936; O Morro dos Ventos Uivantes / Wutheriung Heights / 1939;  e United Artists (No Tempo das Diligências / Stagecoach / 1939)

Em 1942, Golitzen se empregou na Universal, onde demonstrou que era um dos mais versáteis e inventivos diretores de arte de Hollywood e seu melhor trabalho este estúdio foi criado para diretores europeus emigrados como Fritz Lang (Almas Perversas / Scarlet Street / 1945); Robert Siodmak (Mulher Satânica / Cobra Woman / 1944) Max Ophuls (Carta de uma Desconhecida / Letter to an Unknown Woman / 1948) e, sobretudo, Douglas Sirk (Palavras ao Vento / Written in the Wind / 1956; Almas Imaculadas / Tarnished Angels / 1958 e Imitação da Vida / Imitation of Life / 1959.

No seu percurso artístico, Golitzen foi muito agraciado. Ele obteve 14 indicações para o Oscar (Correspondente Estrangeiro / 1940; Quando Morre o Dia / Snndown / 1941; As Mil e uma Noites / 1942 (com Jack Otterson); O Climax / Climax / 1944; Flor de Lótus / Flower Drum Song / 1961; Carícias de Luxo / That Touch of Mink // 1962; Como Possuir Lissu / Gambit / 1966; Positivamente Millie / THoroughly Modern Millie /  1967; Charity, Meu Amor / Sweet Charity / 1969; Aer0porto / Airport / 1970; Terremoto / Earthquake /1974), conquistando a estatueta com O Fantasma da Ópera / 1943 (com John B. Goodman); Spartacus / Spartacus / 1960 (com Eric Orbom) e O Sol é para Todos / To Kill a Mockingbird / 1962 (com Harry Bumstead).

DIREÇÃO DE ARTE NO CINEMA CLÁSSICO DE HOLLYWOOD II

maio 6, 2012

A Warner Bros. nunca ficou conhecida na indústria do cinema por seus grandes departamentos técnicos. Apenas um prêmio da Academia pela direção de arte (para Carl Jules Weyl em As Aventuras de Robin Hood / The Adventures of Robin Hood / 1938) foi  para o estúdio no período entre a sua fundação nos anos vinte até os anos sessenta. Em parte, isto deve ser atribuído à política econômica unha-de-fome de Jack Warner, o chefe do estúdio nos anos trinta e quarenta. O Departamento de Arte da Warner, diferentemente dos departamentos semelhantes da MGM e da Paramount, nunca teve um diretor de arte supervisor  poderoso, que poderia ter lutado por maiores orçamentos e cenários de melhor qualidade.

Quem dominou a direção de arte na Warner Bros. (ele tinha o título de chefe do departamento de arte), de 1927 até sua aposentadoria em 1948, foi Anton Grot (1884 – 1974). Ele nasceu na Polonia com o nome de Antocz Franzizek Groszewski e seus desenhos sempre denunciaram seu background europeu. Grot estudou ilustração na Krakowskie Szkoly Artyczne (Escola de Arte da Cracóvia) e começou uma carreira no campo da arte comercial na primeira década do século vinte.

Em 1909, ele se mudou para Nova York, onde continuou suas atividades como artista comercial até 1913, quando foi contratado pelo produtor Sigmund Lubin,  para desenhar cenários na Lubin Company, com sede em Filadélfia. Grot ficou nesta empresa de 1913 a 1917, trabalhando também durante esse período na Vitagraph e na Pathé, onde contribuiu com cenários para filmes de George Fitzmaurice e para o seriado As Sete Pérolas / The Seven Pearls / 1917, de Louis Gasnier.

Antes dos cenários serem construídos, Grot fazia desenhos a carvão ou em tinta preta, que sugeriam idéias para a iluminação. A técnica de fazer esboços dos cenários dos filmes em sequência, desenvolvida particularmente através de sua associação com William Cameron Menzies (que serviu como seu assistente num filme de 1917, The Naulahka, dirigido por Fitzmaurice) passou a ser adotada por outros diretores de arte.

Os desenhos mais cimportantes de Grot no tempo do cinema mudo foram os que ele fez para Douglas Fairbanks e Cecil B. DeMille. Trabalhando em colaboração com outros diretores de arte, inclusive Menzies, Grot ajudou a criar os cenários monumentais  de Robin Hood / Robin Hood / 1922 e O Ladrão de Bagdad / The Thief of Bagdad / 1924. Ao mesmo tempo, iniciou uma associação com DeMille, contribuindo com desenhos  para Amor Eterno ou O Que Fomos no Passado / The Road to Yesterday / 1925, O Barqueiro do Volga ou O Bateleiro do Volga / The Volga Boatman / 1926 e o épico bíblico O Rei dos Reis / The King of Kings / 1927.

Grot ingressou na Warner Bros. em 1927 e sua primeira tarefa importante foi  desenhar o cenário de A Arca de Noé / Noah’s Ark / 1928, para o qual Grot providenciou a estátua maciça de Moloch  e um  dilúvio devastador no clímax do espetáculo.

Pouco depois, no filme de gangster Alma no Lodo / Little Caesar / 1930, influenciado pelo expressionismo, Grot usou a iluminação dramática em claro-escuro para criar imagens sombrias da vida noturna urbana, antecipando o estilo noir em mais de uma década. Neste filme, ele foi também influenciado pelo art nouveau e pelo art déco, porém de uma maneira mais contida do que a de seus contemporâneos Hans Dreier, Van Nest Polglase e Cedric Gibbons.

No ano seguinte, em Svengali / Svengali,  Grot desenhou alguns dos seus cenários  mais estilizados. Suas casas com tetos inclinados, portas e janelas alongadas, ruas labirínticas e escadas insólitas, de inspiração expressionista, estabeleciam o clima do filme e sugeriam a mente malvada e distorcida do professor de música hipnotizador, interpretado por John Barrymore. Grot também utilizou técnicas expressionistas em duas fantasias de horror produzidas pela Warner nos anos trinta: Doutor X / Doctor X / 1932 e Os Crimes  do Museu / The Mystery of the Wax Museum / 1933, ambos dirigidos por Michael Curtiz e filmados em Technicolor de duas cores.

Nesse período, Grot deu ainda uma preciosa colaboração para alguns musicais coreografados por Busby Berkeley (trabalhando juntamente com Jack Okey), notadamente em Cavadoras de Ouro Gold Diggers of 1933 (do qual foi o único designer), cujo números “By the Waterfall” e “Shadow Waltz” ainda hoje arrancam aplausos da platéia sempre que o filme é exibido em cineclubes, não somente pela genial coreografia de Berkeley mas também pelos cenários memoráveis de Grot. As curvas elegantes da escada em espiral de “Shadow Waltz” é um cenário clássico do filme musical com sua abstração, economia e amplidão funcional.

Os diretores da Warner com os quais Grot estava mais associado eram Michael Curtiz e William Dieterle. As colaborações de Grot-Dieterle incluíram as cinebiografias Anjo de Piedade / White Angel / 1935 (a vida de Florence Nightingale), Emile Zola / The Life of Emile Zola / 1937 e Juarez / Juarez / 1939;   Sonho de uma Noite de Verão / A Midsummer’s Night Dream. A recriação que Grot fez da Paris do século dezenove em Emile Zola, não tinha nenhuma afetação: o escritório de Zola, a prisão e o tribunal, onde ele defendia Dreyfus, eram realistas e cheio de detalhes.


Em Juarez, Grot procurou obter a mesma autenticidade na construção das aldeias mexicanas porém utilizou  cenários mais estilizados, semi-abstratos na criação dos ambientes da corte, a fim de contrastar o mundo real dos camponeses com o o mundo irreal, de fantasia do Imperador e da Imperatriz. A floresta cerrada (com folhas de verdade coladas nas árvores e depois pintadas – a pedido do fotógrado Hal Mohr – com tinta de alumínio e verniz), que Grot construiu para a comédia de Shakespeare, Sonho de uma Noite de Verão, bem com seus sets para os interiores, foram entusiasticamente elogiados por outros diretores de arte da indústria.

Grot foi o único diretor de arte da Warner repetidamente indicado para o prêmio da Academia nos anos trinta e quarenta (Svengali / 1931; Adversidade / 1936; Meu Reino por Um Amor / The Private Lives of Elizabeth and Essex / 1939 e O Gavião do Mar / The Sea Hawk / 1940) mas só ganhou um Oscar honorário em 1940 pela invenção de uma máquina que simula os efeitos do vento sobre as águas, usada pela primeira vez em O Gavião do Mar, que ele patenteou.

Na colaboração Grot-Curtiz destacam-se justamente os dois filmes citados de Curtiz indicados para o Oscar e Capitão Blood / Captain Blood / 1935. Seus esboços de continuidade para esses filmes foram seguidos quase que plano por plano pelo diretor. Em Meu Reino por um Amor, os desenhos de Grot são uma magnífica simbiose de réplica isabelina, modernismo e expressionismo, que faz um uso destacado das cores e do espaço para definir o estado íntimo dos personagens – amplitude e frieza nos aposentos de Elizabeth, colorido e intimidade nos aposentos de Essex. Em O Gavião do Mar, Grot ergueu uma selva panamenha artificial num terreno perto de Burbank, decorada por plantas tropicais, arbustos, árvores e água, formando um pântano,  que as  máquinas de fazer névoa tornaram ainda mais realista.

Tanto em O Gavião do Mar como em Capitão Blood,  o grande tema arquitetônico era o “barco de época” (os mastros com suas cordas e velas, a roda do leme, o camarote do capitão, o porão – prisão etc. ) reconstruído sempre por Grot com muito cuidado. Em Capitão Blood, Grot combinou admiravelmente expressionismo com minimalismo (vg. quando Blood vai atender o paciente em uma estalagem quase não se vê o cenário; os atores interpretam a cena diante de uma sombra enorme do médico cuidando do homem ferido, numa parede ao fundo). Porém o momento mais engenhoso em termos de economia de cenário ocorre na cena em que  Flynn e seus companheiros de prisão escapam de sua escravidão numa noite em que os piratas espanhóis atacam uma colônia inglesa: os fugitivos arrastam-se através de um longo corredor criado ilusionisticamente por luz e sombra, aparecendo no fundo a batalha na cidade, representada por sombras gigantescas dos homens lutando.

Entre os cenários contemporâneos de Grot, Alma em Suplicio Mildred Pierce foi provavelmente a sua realização mais famosa, que parecia se entrosar tematicamente com o seu estilo dramático de desenho e iluminação. Grot era um dos diretores de arte mais bem preparados para desenhar sets e storyboards para aqueles dramas criminais dos anos quarenta, que ficariam conhecidos como filme noir e isto fica bem visível desde a abertura dramática do filme, quando se ouve um tiro de revólver, um espelho se parte e um homem chamando “Mildred” cai no chão, morto. Da casa de praia (construída por Grot, cheia de sombras e trevas), surge uma mulher num píer em frente ao oceano, contemplando o suicídio. Até que um policial caminha em direção a Mildred e ela finalmente responde aos seus gritos e às batidas do seu cassete na amurada das docas.

Na época áurea do sistema de estúdio, a Warner Bros. tinha em seus quadros outros diretores de arte como Carl Jules Weyl, Robert Haas, Max Parker, Hugh Reticker, Esdras Hartley, John Hughes, Charles H. Clarke, Charles Novi, Stanley Fleicher, Leo Kuter, Douglas Bacon, Ted Smith e Edward Carrere, destacando-se entre eles, Carl Jules Weyl (As Aventuras de Robin Hood / 1938,  A Carta / The Letter / 1940; Casablanca / Casablanca / 1942 etc.) e Robert Haas (Jezebel / Jezebel / 1938; Relíquia Macabra/ The Maltese Falcon / 1941; Johnny Belinda / Johnny Belinda / 1948  etc.).

Na Paramount surgiu o mais importante dos primeiros diretores de arte de Hollywood: Wilfred Buckland (1866 – 1946). Nascido em Nova York, filho de um rabino, ele trabalhou como cenógrafo para o produtor teatral David Belasco durante muitos anos. Em 1914, Cecil B. DeMille o levou para Hollywood. Entre as inovações introduzidas por Buckland estavam o uso da iluminação artificial com as klieg lights (refletores de arco voltaico fabricados pela Kliegl Company) para  ajudar DeMille e o fotógrafo Alvin Wycoff a produzir efeitos de iluminação em chave baixa (low-key) em várias produções, notadamente em A Ferreteada ou A Embusteira / The Cheat / 1915, sobressaindo sob este aspecto a famosa  cena da marca a ferro quente e o tiroteio subsequente.

Nota-se também neste filme o estilo visual dramático desenvolvido por DeMille, Wycoff e Buckland, que deixava os personagens na escuridão, exceto por uma única fonte de luz (mostrando, por exemplo, apenas metade do rosto de um ator). Esta técnica de iluminação recebeu o nome de “Rembrandt lighting”, porque assemelhava-se ao tratamento da luz que o grande pintor usara nos seus quadros. A “Rembrandt lighting” ficou também conhecida na indústria como “Lasky lighting” (porque Lasky usava-a como um meio para obter publicidade para os filmes da Paramount) e serviu como modelo para a fotografia no cinema entre 1915 e 1918.

DeMille criou fama por causa de seus opulentos sets influenciados pelo art déco mas Buckland foi o criador da maioria desses cenários como, por exemplo, os de Por Quê Trocar de Amor? ou Velhas Esposas por Novas / Old Wives for New / 1918; Não Troqueis Vossos Maridos / Don’t Change Your Husband / 1918 e Macho e Fêmea ou De Fidalga a Escrava / Male and Female / 1919 (com Mitchell Leisen).

Entretanto, Buckland e DeMille entravam sempre em conflito. Em 1917, numa carta formal a DeMille, Buckland expôs as razões de seu descontentamento: “Vim para Hollywood (…) buscando uma oportunidade para visualizar de um modo mais “pictórico”, proporcionando ao cinema as mesmas regras que imperam na arte mais elevada da pintura”. Porém DeMille não atendeu a nenhuma de suas queixas. Depois de três anos conflitivos trabalhando juntos, Buckland foi bruscamente despedido em 1920.

Desligado de DeMille, Buckland uniu-se ao diretor Allan Dwan, sob o comando do qual ele concebeu (trabalhando com os diretores de arte Irewin J. Martin e Edward Langley e Anton Grot e William Cameron Menzies não creditados) o  castelo medieval de dimensões extraordinárias para Robin Hood / Robin Hood / 1922, um dos mais impressionantes jamais construído em Hollywood.

A vida de Buckland terminou em tragédia: em 1946, aos 80 anos, ele meteu uma bala na cabeça de seu filho, doente mental desde o falecimento da mãe, e em seguida se suicidou. Buckland deixou um bilhete, dizendo: “Estou levando Billy comigo”. Ele teria agido assim, pelo seu medo da morte que se aproximava e pela sua relutância em deixar o jovem sozinho no mundo.

Com a saída de Buckland da Paramount, DeMille recorreu a Paul Iribe (1887 – 1935), pintor, cenógrafo teatral e ilustrador francês, que fazia parte do movimento de vanguarda liderado por Jean Cocteau e cujo estilo aproximava-se do art nouveau com influências orientais e africanas, particularmente nas suas ilustrações para livros. Iribe desenharia (com outros colegas) seis grandes produções para aquele diretor: As Aventuras de Anatólio / The Affairs of Anatol / 1921; A Homicida / Manslaughter / 1922; Os 10 Mandamentos / The 10 Commandments / 1923, A Cama de Ouro / The Golden Bed / 1925; Amor Eterno ou O Que Fomos no Passado / The Road to Yesterday / 1923; O Rei dos Reis / The King of Kings / 1927. A mistura de sagrado e profano de DeMille nas suas interpretações das histórias Bíblicas foi estampada nos cenários de Iribe e seus associados. Sua combinação peculiar de influências históricas e modernas foi radical e nova e  até hoje impressionam o público e os críticos.

Porém Hans Dreier (1885 – 1966) é que foi o grande diretor de arte supervisor da Paramount. Natural de Bremen, Alemanha, Hans estudou arquitetura em Munique e trabalhou como arquiteto supervisor para o Governo Imperial Germânico na colônia alemã do Kamerun, Africa. Ele serviu no exército durante a Primeira Guerra Mundial e, após seu desligamento em 1919, ingressou na subsidiária da Paramount UFA-EFA em Berlim, onde participou de 34 filmes em quatro anos na companhia. Em 1923, transferiu-se para a Paramount em Hollywood, tendo sido promovido a diretor de arte supervisor do estúdio em 1932, ocupando esta posição até sua aposentadoria em 1950. Juntamente com Cedric Gibbons da MGM, Dreier foi o diretor de arte mais influente da Idade de Ouro de Hollywood, impregnando os filmes da Paramount com um “look” germânico, sofisticado e sensual. John Baxter (Hollywood in the Thirties, 1968) escreveu: “A Paramount era o cinema da meia-luz e sugestão: espirituoso, inteligente, ligeiramente corrupto”.

Tal como Gibbons e os outros diretores de arte supervisores, Dreier recebeu crédito em quase todos os filmes produzidos pelo estúdio, durante a sua gestão; porém, ao contrário de Gibbons, que conduzia o departamento de arte com mão firme, ele encorajava os outros diretores de arte (Boris Leven, Wiard Ihnen, Ernst Fegté, Roland Anderson, Hal Pereira, John Meehan, Bernard Herzbrun, Robert Husher, Earl Hedrick, Robert Odell, John B. Goodman, Franz Bachelin, Haldane Douglas, Walter Tyler, William Flannery, etc.) a  desenvolverem seus próprios estilos.

Os cenários mais originais de Dreier foram criados para dois diretores europeus, Ernst Lubitsch e Josef von Sternberg. Entre seus trabalhos mais notáveis estavam o cenário art déco para Ladrão de Alcova / Trouble in Paradise / 1932 (Lubitsch) e o cenário barroco  – grotesco mas estranhamente belo – de A Imperatriz Galante / The Scarlet Empresss / (Sternberg). Suas colaborações com Lubitsch nas operetas (Alvorada do Amor / Love Parade / 1929), Monte Carlo / Monte Carlo / 1930 e O Tenente Sedutor / The Smiling Lieutenant / 1932) e com Sternberg nos melodramas exóticos e exagerados, estrelados por sua musa Marlene Dietrich (Marrocos / Morocco / 1930; O Expresso de Shanghai /Shanghai Express / 1932; Mulher Satânica / The Devil is a Woman / 1935) também forjaram cenários impressionantes, devendo ser ressaltado ainda o cenário (com Roland Anderson) para Cleopatra / Cleopatra / 1934 de Cecil B.  DeMille / 1934.

Os elementos do estilo de Dreier, que Michel L. Stephens definiu, à falta de outro termo, como “poetic / hard-boiled, primeiramente explorados nos filmes de Sternberg do final dos anos vinte (Paixão e Sangue / Underworld /  1927; O Super Homem / Drag Net / 1927; Docas de Nova York / The Docks of New York / 1927), se tornariam cada vez mais dominantes nos anos quarenta, através do trabalho de Dreier em um novo sub-gênero, o filme noir (Alma Torturada / His Gun for Hire / 1942; Pacto de Sangue / Double Identity / 1944; A Dália Azul / The Blue Dahlia / 1946; O Relógio Verde / The Big Clock / 1948; A Noite Tem Mil Olhos / The Night Has a Thousand Eyes / 1948 etc.


Entretanto, Dreier ganhou seu primeiro Oscar (com Ernst Fegté) por seus cenários para um filme em Technicolor, A Gaivota Negra / Frenchman’s Creek / 1944, aventura romântica de pirata adaptada de um romance de Daphne du Maurier e dirigida por Mitchell Leisen, embelezada com sets luxuosos e um uso quase surreal das cores.Sua segunda e terceira estatuetas da Academia caíram-lhe nas mãos pela contribuição para Sansão e Dalila / Samson and Delilah / 1949 (com Walter Tyler), também em Technicolor e Crepúsculo dos Deuses / Sunset Boulevard / 1950 (com John Meehan), este sim, em preto-e-branco.

William Fox planejou um departamento de arte para a Fox Films nos anos vinte contratando William S. Darling em 1922, para ser o principal diretor artístico e técnico da companhia. Darling (1882 – 1963), cujo verdadeiro nome era Vilmos Bela Sanderhazi, nasceu na Hungria, quando ela ainda era  parte do Império Austro-Húngaro. Educado primeiramente em Budapest nos campos da arquitetura e pintura, foi depois para Paris, onde estudou na École des Beaux Arts. Em 1905, Darling emigrou para os Estados Unidos e se dedicou a fazer retratos de celebridades em Nova York até que chegou à Fox.

Ele ganhou o primeiro Oscar pelos seus cenários de Cavalcade Cavalcade / 1933, adaptação da peça de Noel Coward, que mostrava os acontecimentos históricos do início do século vinte e suas consequências sobre uma família da classe alta inglêsa. Darling recriou com uma atenção meticulosa o detalhe das ruas e praças de Londres (incluindo um pub, um music hall e uma incrível Trafalgar Square) e os acontecimentos marcantes  (a Guerra dos Boers, a morte da Rainha Vitória, o afundamento do Titanic, a Primeira Guerra Mundial), tudo isto na área externa e nos palcos de filmagem do estúdio da Fox em Hollywood. Outros filmes desenhados posteriormente por Darling (E As Chuvas Chegaram / The Rains Came / 1939; A Canção de Bernadette / The Song of Bernadette / 1943 (com James Basevi);  Ana e o Rei do Sião / Anna and the King of Siam / 1946 (com Lyle Wheeler) mostram o mesmo cuidado com a pesquisa e a minúcia, sendo que os dois últimos filmes citados lhe deram mais dois Oscar.


Em 1935, a Fox Film se fundiu com a produtora independente de Darryl F. Zanuck, 20th Century Productions e Darling foi substituido no cargo de diretor de arte supervisor por Richard Day (ver Direção de Arte no Cinema Clássico de Hollywood I). Mas ele continuou na empresa como diretor de arte de unidade e consultor de efeitos especiais, emprestando sua arte para  filmes (além dos já mencionados) como O Prisioneiro da Ilha dos Tubarões The Prisoner of Shark Island / 1936; Lloyds de LondresLloyds of London / 1936; No Velho Chicago In Old Chicago (com Rudolph Sternard) / 1938; Os Carrascos Também Morrem Hangmen Also Die / 1943 etc.

Lyle Wheeler (1905 – 1990) sucedeu Richard Day como diretor de arte supervisor da 20th Century-Fox. Nascido em Massachussetts, ele estudou desenho indústrial e arquitetural na University of Southern California. Nos anos vinte, trabalhou como ilustrador de revistas, chamando a atenção de Cedric Gibbons. Wheeler ingressou na MGM em 1929 como sketch artist e chegou a ser promovido a diretor de arte assistente; porém deixou o estúdio em 1933 para se unir a David O. Selznick na sua recém-formada Selznick International Pictures, onde fez os cenários para filmes como Jardim de Alá / The Garden of Allah / 1936 (com Sturges Carné); Nasce uma Estrela / A Star is Born / 1937; O Prisioneiro de Zenda / The Prisoner of  Zenda / 1937  (ganhando com este a primeira das suas 29 indicações para o Oscar); … E O Vento Levou / Gone with the Wind / 1939 (que lhe deu seu primeiro Oscar); Rebecca, a Mulher Inesquecível / Rebecca / 1940 etc. Em seguida, Wheeler fez os cenários da produção independente de Alexander Korda, Lady Hamilton, a Divina Dama That Hamilton Woman / 1941, antes de ir para a MGM, estúdio no qual trabalhou em outros filmes como Calouros da Broadway / Babes on Broadway / 1941; O Fogo SagradoKeeper of the Flame / 1942; A Mulher do Ano Woman of the Year / 1942; A Patrulha de BataanBataan / 1942; A Estirpe do DragãoDragon Seed / 1944; Trinta Segundos Sobre TóquioThirty Seconds Over Tokyo / 1944 etc.).


Finalmente, em 1944, Wheeler chegou à 20th Century-Fox onde, em 1947, passou a ocupar a posição de diretor de arte supervisor da companhia, depois de atuar como diretor de arte de unidade, ocasião em que fez Laura / Laura / 1944  (com Leland Fuller). Wheeler foi quem convenceu Otto Preminger a fazer aquele maravilhoso long take no início do filme, quando a câmera desliza pelas prateleiras e depois pela sala cheia de objetos de arte de Waldo Lydecker (Clifton Webb). O passeio do detetive (Dana Andrews) pelos cômodos de Laura, recolhendo suas cartas, retirando uma peça íntima da gaveta, abrindo um armário, destampando o frasco de perfume, também é mostrado da mesma maneira suave, sempre com a intenção de integrar os personagens ao ambiente. Cada interior doméstico foi concebido como um estudo do caráter e das circunstâncias de seu habitante. Wheeler faria, também para Preminger, os cenários de outros dois excelentes filmes noires, Anjo ou Demônio? / Fallen Angel / 1945 (com Lelland  Fuller) e Passos na Noite / Where the Sidewalk Ends / 1950 (com J. Russell Spencer), recriando o aspecto visual semi-expressionista de Laura.

Houve outros diretores de arte na 20th Century-Fox (James Basevi, Edward Carrere, John DeCuir, Albert Hogsett, Richard Irvine, J. Russell Spencer, Maurice Ransford, Jr, Chester Gore, Joseph C. Wright, John H. Hughes, Mark-Lee Kirk, George W. Davis, Louis H. Creber etc.) mas William S. Darling, Richard Day e Lyle Wheeler foram certamente os mais significativos.

Wheeler deixou a 20th Century-Fox em 1962 mas continuou bastante ativo nas duas décadas seguintes, prestando novamente serviço como diretor de arte ao produtor-diretor Otto Preminger em Tempestade sobre Washington / Advise and Consent / 1962, O Cardeal / The Cardinal / 1963, A Primeira Vitória / In Harm’s Way / 1965 e Diz-me Que me Amas / Tell Me You Love Me Junie Moon / 1969, recebendo sua última indicação para o prêmio da Academia por O Cardeal. Detentor de cinco estatuetas do Oscar ( … E O Vento Levou; Ana e o Rei do SiãoO Manto Sagrado / The Robe / 1953 (com George W. Davis); O Rei e Eu / The King and I / 1956 (com William S. Darling e Richard Day); O Diário de Anne Frank / The Diary of Anne Frank / 1959 (com John DeCuir), Wheeler aposentou-se em meados dos anos setenta. Embora não tivesse sido tão influente como Cedric Gibbons ou Hans Dreier, seu legado foi considerável e sua filmografia inclui muitos dos melhores filmes produzidos durante a Época de Ouro de Hollywood.

DIREÇÃO DE ARTE NO CINEMA CLÁSSICO DE HOLLYWOOD I

abril 27, 2012

A direção de arte é um ramo da arquitetura na qual os ambientes raramente são construídos na sua totalidade e para durar. O que um diretor de arte cria são espaços (internos e externos), fachadas e até cidades inteiras (Beverly Heisner – Hollywood Art: Art Direction in the Days of the Great Studios, McFarland, 1990).

Os cineastas usam o cenário em si, esse conjunto de materiais de construção,  para indicar o quadro onde se desenvolve a ação, evocar a atmosfera visual do filme, traduzir o clima psicológico do conteúdo, traçar o perfil dos personagens e  sugerir certas idéias simbólicas.

Os departamentos de arte das grandes companhias de cinema americanas, compostos por 50 a 80 pessoas, eram estruturados hierarquicamente com um diretor de arte supervisor também chamado de desenhista de produção  (supervising art diretorproduction designer), que supervisionava todas as funções do departamento e coordenava os diretores de arte das unidades (unit art directors ) e diretores de arte assistentes (assistant art directors). Alguns autores usam o termo desenhista de produção somente quando o diretor de arte supervisor tem uma função mais abrangente, estabelecendo, em colaboração  com o diretor e o diretor de fotografia, a aparência visual de todo o filme. Ele desenha os continuity sketches ou storyboards (série de desenhos em sequência  com o propósito de pré-visualizar o filme no papel, mostrando principalmente as angulações e enquadramentos de cada plano). Incluídos sob a égide do departamento de arte estavam: os cenógrafos, cenotécnicos (pedreiros, marceneiros, serralheiros etc.), decoradores, figurinistas (camareiras, costureiras etc.), cabelereiros, maquiladores, pintores de arte e produtores de objetos ou aderecistas, técnicos de efeitos especiais (plantas, maquetes, miniaturas, matte painting etc), gerente de locações e pesquisadores.

Os cenários eram construídos dentro do estúdio sempre que possível: a maioria dos diretores achava que tais cenários lhes permitiam maior controle e precisão. Porém alguns realizadores, principalmente a partir dos anos cinquenta, preferiam filmar em cenários autênticos mesmo em se tratando de interiores. Ao planejar os sets, o diretor de arte devia pensar não somente em termos estéticos mas também em termos orçamentários e técnicos. Com base nas maquetes, ele  tinha que avaliar o custo da construção  e eliminar aquelas partes do cenário que não seriam vistas na tela,  mas que haviam sido sugeridas no roteiro. Como regra, nada poderia ser construído “acima do que a câmera via”. Esta regra criava dificuldades para alguns atores, que achavam desconcertante representar em ambientes fragmentados: se o orçamento permitisse, os diretores de arte frequentemente construíam tetos e outros detalhes para ajudar os atores.

Os departamentos de arte dos grandes estúdios experimentavam mudanças anuais de pessoal porém a maioria permanecia por um período de tempo relativamente longo – uma década ou mais – no mesmo estúdio. A longevidade dos chefes de departamento era ainda maior. A criação de um estilo do estúdio ou “look” identificável, era resultante em parte dessa continuidade.

A United Artists não era um grande estúdio mas uma companhia de artistas independentes que distribuíam seus próprios  filmes feitos em vários  locais de filmagem em Los Angeles,  de modo que a companhia não desenvolveu nenhum grande departamento técnico. Apesar desta situação peculiar, alguns diretores de arte muito conhecidos se associaram ao estúdio de Mary Pickford, Douglas Fairbanks, Charles Chaplin e D.W. Griffith, porque haviam iniciado sua carreira ou passado a maior parte dela trabalhando com um dos dirigentes da companhia.

Tal como eles, esses diretores de arte, entre os quais se destacavam William Cameron Menzies e Richard Day, eram independentes. Menzies e Day costumavam mudar de um estúdio para outro, trabalhando sob contratos sem exclusividade de curto prazo, algo inusitado na época.

William Cameron Menzies (1896 – 1957) foi um dos diretores de arte mais influentes na história do cinema e o primeiro a receber o título  de “production designer”. Americano de origem escocêsa, ele nasceu em New Haven, Connecticut e estudou em Yale e na Art Student’s League em Nova York. Seus primeiros empregos foram na publicidade, fazendo leiautes de revistas e ilustrando livros infantís. Após prestar serviço na Marinha durante a Primeira Guerra Mundial, ele fez amizade com o diretor de arte Anton Grot, que o introduziu como seu assistente nos estúdios de Fort Lee em New Jersey. Convidado por Raoul Walsh para trabalhar em Hollywood, Menzies finalmente teve a chance de exercer seu ofício num filme que o confirmaria como um dos diretores de arte mais influentes no cinema silencioso, O Ladrão de Bagdad / The Thief of Bagdad / 1924, produzido e estrelado por Douglas Fairbanks. Menzies criou uma visão rica e extravagante do conto das Mil e Uma Noites, construindo uma cidade cheia de abóbadas, minaretes, arcadas, pontes, ruas estreitas e um palácio de proporções gigantescas, um décor quase todo branco, combinando semiabstração com detalhes ornamentais, que parecia estar flutuando no espaço, reforçando a impressão de fantasia.

Com sua reputação firmada, o jovem artista prosseguiu sua carreira, substituindo Natacha Rambova, esposa de Rudolph Valentino e sua diretora de arte, nos últimos três filmes do ator, Cobra / Cobra /1925, O Águia / The Eagle / 1925 e O Filho do Sheik / The Son of the Sheik /1926, que lhe permitiram ampliar sua visão de lugares distantes e românticos. Ele fez seu nome desenhando cenários monumentais e estilizados nos filmes Amor de Boêmio / The Beloved Rogue / 1927; Tempestade / Tempest / 1927 e A Mulher Cobiçada / The Dove / 1927 (que lhe deram o Oscar de Melhor Direção de Arte) e manifestou sua aptidão artística ainda em Dois Cavaleiros Árabes /Two Arabian Knights / 1927; Sedução do Pecado / Sadie Thompson / 1928; Jardim do Eden / The Garden of Eden / 1928; Du Barry, a Sedutora / Du Barry, Woman of Passion / 1928 (com Park French); Amante de Emoções / Bulldog Drummond / 1929; dois épicos dirigidos por D.W. Griffith, Melodia de Amor / Lady of the Pavements / 1929 e Abraham Lincoln / Abraham Lincoln / 1930 etc.

Menzies foi um dos primeiros diretores de arte americanos que começou a dirigir filmes no final dos anos vinte, sempre acumulando as duas funções, embora raramente recebesse créditos por ambas. Um de seus filmes mais notáveis como diretor /  diretor de arte foi Chandu, o Mágico / Chandu the Magician / 1932, aventura fantástica bizarra, que mostrava a influência do expressionismo. Entretanto, ele nunca se especializou em um único estilo ou desenvolveu um estilo pessoal – procurava se adaptar ao material que tinha em mãos. Um dos projetos mais curiosos na carreira de Menzies foi Alice no País das Maravilhas / Alice in Wonderland / 1933, dirigido por Norman Z. McLeod e desenhado por Menzies e Robert Odell. Esta produção luxuosa, sustentada pelos recursos da Paramount, era visualmente atraente e muito imaginativa mas pecava pela idéia de colocar máscaras em todos os atores, de modo a torná-los indistinguíveis.


Em 1935, Menzies recebeu um convite do grande produtor-diretor Alexander Korda para fazer o desenho de produção e dirigir um filme de ficção científica com insinuações políticas escrito por H.G. Wells, Daqui a Cem Anos / Things to Come / 1936. Demonstrando a influência da art déco, a dupla Vincent Korda (creditado como diretor de arte) / Menzies (creditado somente como diretor) desenhou uma série de cenários imaculadamente brancos, que se tornaram a imagem de um futuro antisséptico, no qual a tecnologia dominava e subvertia as vidas dos indivíduos.  Como explicou  Juan Antonio Ramírez (La Arquitetura en el cine Hollywood, la Edad de Oro – Alianza Editorial, 1993), os artistas recorreram a alguns projetos utópicos elaborados uma década antes na União Soviética: o resultado, com móveis transparentes, paredes curvadas e desnudas, volumes imensos com formas militares etc. é uma síntese entre a arquitetura expressionista de Mendelsohn (Erich Mendelsohn), futurismo, desenho industrial e as experiências mais radicais da vanguarda européia. O filme consagrou a iconografia arquitetônica dos século XXI mas na verdade Menzies não era um diretor particularmente talentoso; seus dotes eram mais adequados para o desenho cênico.

Quando acumulava as funções de director e designer, ele tendia a exagerar os elementos visuais dos cenários; sob o controle de um diretor de pulso firme como Sam Wood, para o qual Menzies desenhou cinco produções esplêndidas (Nossa Cidade / Our Town / 1940; Em Cada Coração Um Pecado / King’s Row / 1941; Ídolo, Amante e Herói / Pride of the Yankees / 1942; Por Quem os Sinos Dobram / For Whom the Bell Tolls / 1943), os cenários tornaram-se parte integral da cena. De qualquer modo, como observou Michael L. Stephens (Art Directors in Cinema – McFarland, 1998), um dicionário indispensável a todo estudioso da direção de arte no cinema,  a sensibilidade visual de Menzies dominou todos os filmes nos quais ele funcionou como diretor de arte. Ele foi, em certo sentido, o verdadeiro “autor” de clássicos como … E O Vento Levou e a refilmagem de O Ladrão de Bagdad.

O produtor David O. Selznick escolheu Menzies para desenhar toda a produção de … E O Vento Levou. Além de dirigir algumas cenas (ver quais foram estas cenas em nosso artigo “… E O Vento Levou: O Filme Mais Famoso De Todos Os Tempos), Menzies supervisionou todos os detalhes visuais da produção, incluindo cenários, figurinos e ângulos da câmera, tendo sido também responsável pela sua encantadora paleta de cores. Lyle Wheeler funcionou como diretor de arte do filme, criando o décor a partir dos esboços feitos pelo seu chefe, que deram ao filme a sua unidade visual, apesar da sucessão malograda de diretores e muitos incidentes na filmagem.

Menzies captou o espírito do velho Sul romântico e sua inevitável destruição e usou a cor de maneira simbólica e descritiva. O fogo é a metáfora visual central do filme e as cores de fogo são a sua matiz predominante. Antes mesmo do incêndio em Atlanta a poeira das ruas é cor-de-laranja e a terra, vermelha. Vermelho é também o tapete sobre o qual Scarlett desmaia e Rhett eventualmente parte. A resolução de Scarlett no final da primeira parte é mostrada sob a forma visual de uma silhueta negra contra um crepúsculo ardente cor-de-laranja. Lyle Wheeler recebeu o Oscar de melhor Direção de Arte e Menzies um prêmio especial da Academia “pelo emprego da cor na dramatização das cenas”.

Os cenários criados por Menzies e Zoltan Korda para O Ladrão de Bagdad / The Thief of Bagdad, 1940, refilmado em Hollywood por Alexander Korda, são ainda mais inventivos dos que os de … E O Vento Levou. A participação de Zoltan como desenhista de produção e Menzies como diretor de arte associado, garantiu um excelente desenho de produção, que oscilava entre o oriental convencional e a máxima estilização detectada na versão muda.

Nos anos quarenta, Menzies trabalhou em muitos filmes, dos quais os mais interessantes foram Correspondente Estrangeiro / Foreign Correspondent / 1940 (efeitos de produção especiais); Endereço Desconhecido / Address Unknown / 1944 (também direção), Duelo ao Sol / Duel in the Sun / 1946 (diretor de 2ª unidade não creditado) e A Sombra da Guilhotina / Reign of Terror ou The Black Book / 1949 (diretor de arte com Edward L. Ilou).

Quando o sistema de estúdio começou a chegar ao fim, a carreira de Menzies desacelerou.  Nos anos cinquenta,  ele já estava quase com sessenta nos de idade e provavelmente se sentindo inconfortável com as novas técnicas de filmagem em locação, que não utilizava o estúdio com tanta frequência. Porém foi nessa época que Menzies realizou o filme que alguns (a meu ver equivocadamente) consideram a sua obra-prima como diretor  / desenhista de produção, Invasores de Marte / Invaders from Mars / 1953,

um thriller de ficção científica tipicamente paranóico da Guerra Fria, sobre uma espaçonave interplanetária que aterrissa perto de uma pequena cidade. Com a assistência de Boris Leven, Menzies criou uma série de cenários despojados e sombrios com estruturas alongadas captadas por uma câmera quase sempre baixa (acentuando o fato de que a história é vista por uma criança), que revelam a influência do expressionismo alemão, chamando mais atenção a floresta caligaresca e a perspectiva forçada da cadeia.

Um dos diretores de arte mais reverenciados de Hollywood, Richard Day (1896 – 1972) nasceu no Canadá, estudou pintura e desenho arquitetônico e, em 1920,  rumou para a Terra do Cinema, onde trabalhou como pintor de cenário para vários produtores independentes. Em 1922, Day foi contratado por Erich von Stroheim, tornando-se seu diretor de arte principal, destacando-se sua colaboração em Esposas Ingênuas / Foolish Wives / 1922; Redemoinho da Vida / Merry-Go-Round /1923; Ouro e Maldição / Greed / 1924; A Viúva Alegre / The Merry Widow / 1925 e A Marcha Nupcial / The Wedding March / 1928. Bastante influenciado por Stroheim, Day foi um dos defensores mais ardorosos do realismo no cinema. O altar da catedral feito por Day para A Marcha Nupcial era tão autêntico, que o fotógrafo Hal Mohr resolveu se casar diante dele.

No final dos anos vinte, ele se juntou a Cedric Gibbons na recém – formada MGM e os dois trabalharam em filmes de Lon Chaney, Quando a Cidade Dorme / While the City Sleeps / 1928; Ridi, Pagliacci / Laugh, Clown, Laugh / 1928; A Oeste de Zanzibar / West of Zanzibar / 1928 e Trindade Maldita / The Unholy Three / 1930); Greta Garbo (A Mulher Divina / The Divine Woman / 1928; The Kiss / 1929; Anna Christie / Anna Christie / 1930; e em Filhas Modernas ou Garotas Modernas / Our Dancing Daughters / 1928, com Joan Crawford, que ajudou a fixar o estilo modernista.

Em 1930, Samuel Goldwyn contratou Day e o colocou nas comédias-musicais de  Eddie Cantor (Whoopee / Whoopee / 1930; O Homem do Outro Mundo /Palmy Days / 1931; Meu Boi Morreu /  The Kid from Spain / 1932 ; Escândalos Romanos / Roman Scandals / 1933). A partir daí, ele desenhou quase todos os grandes filmes produzidos pelo estúdio nos anos 1930-1938, recebendo o Oscar por Anjo das Trevas / The Dark Angel / 1935 e Fogo de Outono / Dodsworth / 1936. Este último filme, dirigido por William Wyler, conta a vida conjugal de um casal de meia-idade, Samuel e Fran Dodsworth (Walter Huston e Ruth Chatterton) e as mudanças que o oprimem, quando Sam se aposenta. Fran, temendo a velhice lança-se tolamente nos braços de homens mais jovens enquanto Sam, a princípio tolerante, depois se revolta e eventualmente deixa a esposa por uma viúva simpática (Mary Astor). Day usa magistralmente os cenários – a mansão branca dos Dodsworth sustentada por pilares em Zenith, Indiana; o camarote do Queen Mary; hotéis de primeira classe em Paris e Roma; e uma vila à beira do lago em Nápoles – para definir os personagens, fornecendo ao público um contexto visual para os conflitos interiores de cada um deles. Day criou alguns dos desenhos cênicos modernos mais extravagantes dos anos trinta, influenciado pelo Art Deco, Bauhaus e os movimentos futuristas que haviam nascido nos anos vinte.

No ano seguinte, em Beco sem Saída / Dead End / 1937, o diretor William Wyler se debruçou sobre as vidas perturbadas de rapazes de uma área pobre da cidade grande. Day não tentou disfarçar a origem teatral do filme: construiu apenas um cenário (a rua sugerida no título com fileiras de lojas e prédios residenciais apertados e o píer de um lado e um edifício de apartamento de classe alta no outro), onde se passava toda a ação do filme e que era, claramente, o personagem principal da história. Os cenários de Day mostram uma imagem altamente estilizada (e teatral) de Nova York na era da Depressão – realista porém poética.

Durante esse período, Day trabalhou também em muitas produções da MGM e para a Twentieth Century Productions de Darryl F. Zanuck, desenhando para este último as produções de filmes históricos elegantes como As Aventuras de Cellini / The Affairs of Cellini / 1934 e A Casa de Rothschild / The House of Rothschild / 1934.

Quando esteve na 20th Century-Fox nos anos quarenta, ele concebeu a aldeia de mineiros do País de Gales, meticulosamente detalhada para Como Era Verde o Meu Vale / How Green Was My Valley / 1942, conquistando (com Nathan Juran) mais um Oscar da Academia. Ainda na Fox, ele repetiu a façanha com Isto Acima de Tudo / This Above All / 1942 e Minha Namorada Favorita / My Gal Sal / 1942 (com Joseph Wright) e fez também, entre muitos outros, Vinhas da Ira / The Grapes of Wrath, no qual usou cenários naturais como num documentário e a metáfora, para sublinhar  as condições e situações precárias da família Joad na sua viagem para a Califórnia. Depois de servir a pátria na Segunda Guerra Mundial, Day retornou à Fox em 1946, agora como diretor de arte de unidade. Lyle Wheeler o havia sucedido como diretor de arte supervisor mas Zanuck lhe deu ampla liberdade  na escolha de projetos e ele demonstrou mais uma vez sua adaptabilidade a qualquer gênero (O Justiceiro / Boomerang / 1947; O Capitão de Castela / Captain from Castille / 1947, Joana D’Arc / Joan of Arc / 1948 etc).

No final dos anos quarenta, Day voltou a ser free-lancer e seus  melhores trabalhos, Uma Rua Chamada Pecado / A Streetcar named Desire / 1951 e Sindicato de Ladrões / On the Waterfront / 1954, pelos quais obteve seus dois últimos Oscar, foram realizados no estilo poético – realista. Dirigidos por Elia Kazan, eles mostram a diversidade de estilo utilizada por Day para obter efeitos semelhantes. Uma Rua Chamada Pecado foi baseado numa peça teatral e, tal como fizera em Beco sem Saída, Day não procurou ocultar a origem do filme. Pelo contrário, ele desenhou cenários estilizados para criar uma New Orleans exótica e sensual e espelhar com realismo o clima de neurose e repressão da obra de Tennessee Williams.

Já em Sindicato de Ladrões,  rodado quase que inteiramente em Hoboken, New Jersey, Day usou os cenários verdadeiros do ambiente portuário para criar com o máximo de autenticidade a atmosfera negra / cinzenta das docas, onde ocorre a exploração dos estivadores por sindicatos corruptos. Day prosseguiu sua carreira até o início dos anos setenta, já muito depois do desaparecimento do sistema de estúdio, trabalhando em filmes tão diversos como Caçada Humana /  The Chase /1965; O Vale das Bonecas / Valley of the Dolls /1967; e Tora! Tora! Tora! / Tora! Tora! Tora! / 1970.

Provavelmente Cedric Gibbons (Austin Cedric Gibbons, 1893 – 1960) foi o diretor de arte mais famoso, simplesmente porque seu nome apareceu nos créditos de mais filmes do que qualquer outra pessoa na História do Cinema. Ele foi também o diretor de arte mais premiado de todos os tempos, com 39 indicações para o Oscar, das quais ganhou onze (A Ponte de San Luis Rey / The Bridge of San Luis Rey / 1929; A Viúva Alegre / The Merry Widow / 1934; Orgulho e Preconceito / Pride and Prejudice / 1940; Flores do Pó / Blossoms in the Dust / 1941; À Meia-Luz / Gaslight / 1944; Virtude Selvagem / The Yearling / 1946; Quatro Destinos / Little Women / 1949; Sinfonia de Paris / An American in Paris / 1951; Assim Estava Escrito / The Bad and the Beautiful / 1952; Julio Cesar / Julius Caesar / 1953; Marcado pela Sarjeta / Somebody Up There Likes Me / 1957).

Filho de imigrantes irlandeses, Gibbons teria nascido em Nova York, onde seu pai se instalou como arquiteto. Gibbons estudou arte e desenho comercial na Art Students League e foi trabalhar no escritório de seu progenitor. Em 1914, ingressou nos estúdios Edison, onde insistiu para que os telões pintados de fundo fossem substituidos por cenários construídos, tri-dimensionais. Após servir na Marinha durante a Primeira Guerra Mundial, entrou para o estúdio de Samuel Goldwyn. Este era então um produtor independente (distribuindo seus filmes pela United Artists) e Gibbons, com Richard Day, era o principal desenhista da maioria das produções importantes da companhia no final dos anos dez e começo dos anos vinte. Quando o estúdio de Goldwyn se fundiu com a Metro Pictures e a Louis B. Mayer Productions em 1924 para formar a Metro-Goldwyn-Mayer, os dois continuaram a prestar serviço à nova firma norte-americana. Gibbons foi nomeado diretor de arte supervisor e aí nasceu o estilo visual suntuoso típico da MGM, que atendia ao gosto e à estratégia comercial do chefe de produção,  Irving Thalberg.

O maior legado de Gibbons foi o “Grande Cenário Branco” (Big White Set) influenciado pelo art déco. Em 1925, Gibbons visitou a Exposition des Arts Decoratifs et Industriels Modernes em Paris, que foi o auge do art déco na Europa. Ele trouxe essas idéias para os Estados Unidos, onde as incorporou em muitos filmes da MGM. Pode-se dizer que tudo começou com Filhas Modernas ou Garotas Modernas / Our Dancing Daughters / 1928 (co-desenhado por Richard Day), o primeiro filme da trilogia estrelada por Joan Crawford que contava as histórias das mulheres modernas na Era do Jazz. Nas sequências, Donzelas de Hoje / Our Modern Maidens / 1929 e Noivas Ingênuas / Our Blushing Brides / 1930 também apareciam os cenários modernistas. Outra estrela que se beneficiou dos desenhos  de Gibbons  foi Greta Garbo, que participou de filmes  art déco como Mulher de Brio / A Woman of Affairs / 1928; Mulher Singular / The Single Standard / 1929 e  O Beijo / The Kiss / 1929.

Um dos filmes de maior sucesso de Garbo foi Grande Hotel / Grand Hotel / 1932, que obteve o Oscar da Academia. Este é um filme-chave para definir o estilo modernista de Gibbons. Baseado no romance (e peça) de Vicki Baum e dirigido por Edmund Goulding, a ação se passa num luxuoso hotel alemão. A produção ensejou papéis para os maiores astros do estúdio (Greta Garbo, John Barrymore, Lionel Barrymore,  Wallace Beery, Joan Crawford etc.) e a direção de arte, assinada por Gibbons e Alexander Toluboff, refletia a elegância e o glamour do elenco. Seu cenário mais famoso era o magnificente saguão do hotel, que servia como uma ligação visual entre as desesperadas vinhetas da vida dos personagens. Este saguão era definido pela singeleza linear do art déco e predominância de contrastes em preto e branco, especialmente nos assoalhos de mármore lustrosos. O décor incluia ainda uma mesa em curva de 360º, permitindo que a ação fosse filmada virtualmente de  qualquer ângulo. Nunca o conteúdo de um filme e a arquitetura estiveram tão intimamente relacionados.

Como lembrou  Michel L. Stephens, Gibbons e Robert Day aprimoraram o estilo art déco, reduzindo-o aos seus elementos mais básicos. Outros filmes da MGM do final dos anos vinte e início dos anos trinta com cenários contemporâneos – Piratas Modernos / The Big City / 1928; A Atriz / The Actress / 1928,  Os Ociosos / The Idle Rich / 1929; Dinamite ou Bonecas de Luxo / Dynamite / 1929; Hollywood Revue / The Hollywood Revue of 1929 / 1930; Jantar às Oito / Dinner at Eight / 1933; Uma Noite na Ópera / A Night at the Opera / 1935 etc. – também eram dominados por este estilo.

Porém mesmo os épicos históricos: A Viúva Alegre / The Merry Widow / 1934; a opereta dirigida por Ernst Lubitsch e Madame Waleska / Conquest / 1937, a história do romance entre Napoleão e Marie Waleska, são exemplos excelentes do art déco, no que ele tinha de mais extravagante. Os desenhos de Gibbons para filmes como Nascí para Dançar / Born to Dance / 1936 e Rosalie / Rosalie / 1937, inspiraram fortemente a arquitetura de vários cinemas.

O primeiro filme de longa-metragem em Technicolor produzido pela MGM, O Mágico de Oz / The Wizard of Oz / 1939,  um musical-fantasia com cenários de William Horning (com a ajuda de Jack Martin Smith e Arnold Gillespie), supervisionados por Cedric Gibbons (que também contribuiu com alguns esboços), estabeleceu o estilo que o estúdio usaria nos seus musicais dos anos quarenta e cinquenta, uma abordagem quase surrealista, influenciada pela arte Impressionista e, em menor grau, pelo art déco. Entretanto, o musical technicolorido só dominaria a produção da MGM após os meados dos anos quarenta. Até então, as adaptações de obras literárias ainda ocupariam lugar de destaque na programação anual da companhia, sobressaindo as contribuições de Gibbons para Orgulho e Preconceito / Pride and Prejudice / 1940, Na Noite do Passado / Random Harvest / 1942 e À Meia Luz / Gaslight / 1944. Em 1945, Gibbons sofreu um ataque do coração, que afetou seriamente sua carreira. Embora ele continuasse como diretor de arte supervisor da MGM por mais uma década, o seu papel criativo  diminuiu muito.

A extensa filmografia de Cedric Gibbons deve-se ao fato de que, devido a uma cláusula inserida no seu contrato, ele recebeu crédito em quase todos os filmes produzidos pela MGM durante sua gestão como diretor de arte supervisor mas, ao contrário de seu colega Hans Dreier da Paramount, ele apenas ocasionalmente trabalhou num filme individual. Na sua maioria, os desenhos para cada filme foram criados pelos diretores de arte da unidade, que ele designava para o projeto.

Entretanto,  o “look” MGM dos anos vinte e trinta foi explicitamente delineado a partir do seu estilo pessoal. Além disso, ele formou um dos mais criativos departamentos de arte em Hollywood, contratando aqueles artistas de gosto parecido com o seu: Alexander Toluboff, Richard Day, Frederic Hope, Arnold Gillespie, Urie McCleary, Paul Grosse, William Horning, Edward Carfagno, Jack Martin Smith, Hans Peters, Randall Duell, Daniel B. Cathcart, Malcolm Brown, Preston Ames, Oliver Smith, Harry Oliver etc. Embora muitos desses diretores de arte tivessem trabalhado para outros estúdios, seus melhores e mais duradouros desenhos foram criados enquanto eram empregados na MGM sob a orientação do grande mestre.

CONEXÃO VAUDEVILLE – CINEMA III

abril 14, 2012

LEON ERROL (Leonce Errol Simms, 1881 – 1951) – Com suas “pernas de borracha”, Leon ficou bastante conhecido no vaudeville, no teatro de revista e nos filmes. Ele não se apoiava muito nas piadas, sua comicidade era mais acrobática, puramente física. Suas pernas eram chamadas de “pernas de borracha” por causa da maneira pela qual ele andava: fazia um bamboleio, no qual as pernas se curvavam, parecendo que  ia cair, mas não chegava a cair totalmente. Este geito de andar o ajudava bastante ao interpretar papéis de bêbado.

Natural da Austrália, Leon queria ser cirurgião, até que seus estudos de arte dramática na faculdade o afastaram daquele campo. Durante alguns anos, ele excursionou pela Australia, Nova Zelândia e Inglaterra, apresentando-se no vaudeville, circos, companhias de repertório e comédias musicais. Em 1911, Leon deu um impulso na sua carreira em Nova York, onde conheceu Florenz Ziegfeld e foi contratado para aparecer na edição do Follies daquele ano. Ele contracenou com o legendário comediante negro Bert Williams e fez um número cômico dançando com Stella Chatelaine, com quem  se casara em 10 de agosto de 1910.

A estréia dele no vaudeville deu-se em julho de 1916 no Brighton Theatre com um número no qual encarnava um bêbado numa estação de metrô. Leon atingiu o auge do sucesso ao figurar nos cartazes do Palace como principal atração. Ele fez seu primeiro filme, um curta-metragem cômico, Nearly Spliced, em 1921. Em 1930, deixou a Broadway e se dedicou exclusivamente ao cinema. Em 1933, participou de  comédias curtas da Paramount, da Columbia e de dois shorts no Technicolor de duas cores realizados pela VItaphone: Service With a Smile e Good Morning, Eve! Transferindo-se para RKO Radio Pictures em 1934, Leon continuou a fazer curtas-metragens (de 1934 a 1951), a maioria dos quais eram farsas conjugais, nas quais se envolvia com uma linda garota e recebia uma bronca de sua esposa

Entretanto, ele é mais lembrado por suas performances energéticas na série Mexican Spitfire ao lado de Lupe Velez (a fogosa Carmelita), na qual Leon fazia o papel duplo do afável Tio Matt e de Lord Basil Epping,  presidente da … House of Parliament Scotch Whisky Company. Finalmente, a Monogram contratou Errol para aparecer como o treinador Knobby Walsh nos filmes da série esportiva cômica, Joe Palooka (Joe Sopapo), baseada no personagem dos quadrinhos (obs. Em Ou Tudo ou Nada / Joe Palooka in Winner Take All / 1948 , Leon foi substituido por William Frawley). Filmes (excluídos os  mais de 90 curtas-metragens): Iolanda / Yolanda / 1924; Sally, a Enjeitada / Sally / 1925; O Pirata / Clothes Make the Pirate / 1925; Lunático à Força / The Lunatic At Large / 1927; Only Saps Work / 1930;  Uma Noite Sublime / One Heavenly Night / 1931; Divertindo Paris / Finn and Hattie /1931; Her

Majesty, Love / 1931;  Alice no País das Maravilhas / Alice in Wonderland / 1933; Cupido ao Leme / We’re Not Dressing / 1934;  A Célebre Sophie Lang / The Notorius Sophie Lang / 1934; O Capitão Odeia o Mar / The Captain Hates the Sea / 1935; Princess O’ Hara / 1935; A Praia da Alegria / Coronado / 1935; Música do Coração / Make a Wish / 1937; De Cabelinho nas Ventas / The Girl from Mexico / 1939; Entre o Amor e a Vida / Career / 1939; Adorável Impostora / Dancing Co-Ed / 1939; Quando a Mulher Vira Bicho / Mexican Spitfire / 1939 (*);  O Velho Sempre Paga / Pop Always Pay / 1940; Amor entre Arrufos / The Golden Fleecing / 1940; Quando Macacos se Encontram / Mexican Spitfire Out West / 1940 (*); Onde Achaste Esta Pequena ? / Where Did You Get That Girl? / 1941; Mme. Labonga / Six Lessons from Madame La Zonga / 1941: Pau de Cabeleira / Hurry Charlie, Hurry / 1941; Luar e Melodia / Moonlight in  Hawaii / 1941; Trouxas em Desfile / Never Give a Sucker an Even Break / 1941;

O Bebê de Carmelita / Mexican Spitfire ‘s Baby / 1941 (*); Estrada da Alegria / Melody Lane / 1941; Forrobodó em Alto Mar / Mexican Spitfire at Sea / 1942 (*); Aquele Careca Voltou / Mexican Spitfire Sees a Ghost / 1942 (*); O Elefante de Carmelita / Mexican Spitfire’s Elephant / 1942 (*); Mania Musical / Strictly in the Groove / 1943; Amor e Batucada / Follow the Band / 1943;  O Rei dos Boiadeiros / Cowboy in Manhattan /1943; Venus e Cia. / Gals, Incorporated / 1943; Bebê da Discórdia / Mexican Spitfire’s Blessed Event / 1943 (*); A Lua a seu Alcance / Higher and Higher / 1943; A

Family Feud / 1943 (documentário curto o governo);  A Pequena do Cabaré / Hat Check Honey / 1944; Prices Unlimited / 1944 (documentário curto para o governo); Cavadoras da Alegria / Slightly Terrific / 1944; Crepúsculo dos Pampas / Twilight on the Prairie / 1944; A Vingança do Homem Invisível / The Invisible Man’s Revenge / 1944; Mocidade Divertida / Babes on Swing Street / 1944; Conquistando a Muque / She Gets Her Man / 1945; Under Western Skies / 1945; What a Blonde / 1945; Mama Loves Papa / 1945; Céus do Oeste / Riverboat Rhythm /1946;

Joe Sopapo, Campeão / Joe Palooka, Champ / 1946;  Joe Sopapo, Grã-Fino / Gentleman Joe Palooka / 1946; Joe Sopapo não é de Briga / Joe Palooka in the Knockout / 1947; Comprando Briga / Joe Palooka  Fighting Mad / 1948; Dois Prontos de Sorte / The Noose Hangs High / 1948;  Pistoleiros do Ringue / Joe Palooka in the Big Fight / 1949; Joe Palooka in the Counterpunch / 1949; Lua-de-Mel a Socos / Joe Palooka Meets Humphrey / 1950; Joe Palooka in Humphrey Takes a Chance / 1950; Murros de Ouro / Joe Palooka in the Squared Circle / 1950; Joe Sopapo, Detetive / Joe Palooka in Triple Cross / (Obs. Os filmes seguidos por * entre parêntese são os da série Mexican Spitfire) .

RUTH ETTING (Ruth Etting, 1896 – 1978) – Nos anos trinta, Ruth Etting era uma das cantoras mais populares da America, a cantora de fossa por excelência.  Ela ficou conhecida como “The Sweetheart of Song” e sua popularidade como estrela da gravadora Columbia e como cantora de rádio jamais foi ultrapassada. Foi também uma importante artista do vaudeville, primeiro em Chicago e depois em Nova York. Ruth inicialmente queria ser desenhista de moda e, aos dezessete anos, entrou para o Chicago Art Institute.  Seu emprego como figurinista no Marigold Garden Theatre levou-a a ser contratada como corista. Em pouco tempo, ela  tornou-se a vocalista da boate e se casou com o gangster Martin “Moe the Gimp” Snyder em 1922. Snyder cuidou de sua carreira, arranjando-lhe participações em programas de rádio e a assinatura de um contrato de exclusividade com a Columbia Records.

Ruth estreou na Broadway na edição do Ziegfeld Follies de 1927. Em seguida, atuou em vários shows, inclusive Simple Simon (no qual cantava “Ten Cents a Dance”) e “Whoopee!” (no qual cantava “Love Me or Leave Me”). Outras canções famosas associadas a Ruth foram: “It All Depends on You”, “Button Up Your Overcoats”, “Mean to Me “, “Shaking the Blues Away” e “Everybody Loves my Baby”. Em Hollywood fez shorts entre 1929 e 1936 para a Paramount, Vitaphone e RKO e três longas-metragens: Escândalos Romanos / Roman Scandals / 1933, Noites da Broadway / Mr. Broadway / 1933 (como ela mesma); O Dom da Alegria / Gift of Gab / 1934 e Hip, Hip, Hooray / Hips, Hips, Hooray! / 1934. Aos 40 anos de idade, Ruth divorciou-se de Snyder em 1937. Ela se apaixonou pelo seu pianista Myrl Alderman mas em 1938 ele foi alvejado e ferido por Snyder, que foi condenado por tentativa de homícidio porém libertado em virtude de um recurso depois de ter cumprido um ano de prisão.

Ruth casou-se com Myrl, que era dez anos mais moço do que ela. O escândalo por causa do julgamento sensacional em Los Angeles pôs fim à carreira de Ruth embora ela ainda tivesse um programa de radio em 1947. A vida de Ruth Etting serviu de base para o filme Ama-me ou Esquece-me / Love Me or Leave Me / 1955 com Doris Day (Ruth), James Cagney (Snyder) e Cameron Mitchell (Myrl).

W. C. FIELDS (William Claude Dunkerfield, 1880 – 1946) – Aos quinze anos de idade, ele já estava desempenhando um número de equilibrismo em igrejas e teatros e ingressou no vaudeville  como um “mendigo equilibrista”, usando o nome de W.C. Fields. Fields excursionou por vários continentes e se tornou  uma  atração internacional. Ele se apresentava barbudo e com um smoking surrado e se limitava à pantomima,  a fim de que pudesse se apresentar em qualquer lugar do mundo. De volta à América, percebeu que poderia arrancar mais risadas da platéia, adicionando diálogo aos seus números. A sua marca registrada, que eram os seus resmungos e apartes sarcásticos, foram desenvolvidos nesta época. Logo ele estava na Broadway nas revistas de Florenz Ziegfeld, onde divertia o público em um esquete de jogo de bilhar com tacos de forma bizarra e uma mesa fabricada sob encomenda, usada para uma série de gags hilariantes. Fields atuou em múltiplas edições do Follies e na comédia musical da Broadway, Poppy, na qual ele aperfeiçoou o tipo do vigarista pitoresco de segunda categoria. Ele estreou no cinema em duas comédias curtas, filmadas em Nova York em 1915. Seus compromissos com o teatro impediram-no de fazer mais filmes até 1924, quando fez o papel de um sargento britânico em Janice Meredith / Janice Meredith. Em 1925, ele reviveu seu personagem de Poppy numa adaptação cinematográfica

silenciosa, reeintitulada Sally of the Sawdust e dirigida por D. W. Griffith e trabalhou em outro filme deste diretor, That Royle Girl. Fields foi um dos poucos artistas do vaudeville que conseguiu reproduzir na tela os seus próprios números  e, assim, não somente criou uma nova carreira financeiramente bem sucedida como também assegurou que suas performances no palco fossem conservadas para a posteridade. Em 1932 e 1933,  fez quatro comédias curtas para o pioneiro da comédia, Mack Sennett, distribuídas pela Paramount Pictures. Durante este período, a Paramount começou a colocá-lo em comédias de longa-metragem e, em 1934, Fields era um astro de primeira grandeza. O comediante colaborava frequentemente nos scripts de seus filmes sob pseudônimos incomuns tais como “Charles Bogle”, “Otis Criblecoblis”, e “Mahatma Kane Jeeves”. Ele gostava de nomes esquisitos e muitos de seus personagens tiveram nomes assim: “Larson E. (leia Larceny) Whipsnade”, “Egbert Sousé”, “Ambrose Wolfinger” e “The Great McGonigle”. Embora não tivesse tido uma educação formal, Fields lia muito e era um admirador do escritor Charles Dickens. Seu melhor desempenho no cinema foi no papel  de Mr.

Micawber na filmagem de David Copperfield pela MGM em 1935. A popularidade renovada pela suas participações no rádio ao lado de Edgar Bergen e McCarthy (onde trocava insultos com o boneco), ensejou-lhe um contrato com a Universal Pictures em 1939 e seu primeiro filme na Universal, You Can’t Cheat an Honest Man, levou adiante a rivalidade Fields-McCarthy. Em 1940,Fields fez My Little Chickadee com Mae West e The Bank Dick, contracenando com Shemp Howard, um dos Três Patetas.

Ele sempre desejou realizar um filme à sua maneira, com seu próprio roteiro e encenação e escolha dos coadjuvantes. A Universal finalmente lhe deu esta oportunidade e o filme resultante, Never Give a Sucker an Even Break, fo uma obra-prima de humor absurdo, no qual Fields aparecia como ele mesmo. Porém o filme que entregou para exibição era tão surreal, que o estúdio cortou e refilmou várias cenas, acabando por liberar o ator. Ele chegou a completar uma cena para a produção da 20th Century-Fox, Tales of Manhattan / 1942, no qual interpretava o papel de um professor excêntrico contratado por Margaret Dumont para dar uma palestra sobre abstinência na alta sociedade. Esta cena foi extirpada antes do lançamento mas veio a ser descoberta nos cofres da Fox em 1990 e incluída no lançamento em vídeo e DV do filme. Na vida real, Fields bebia muito mas aquela história de que ele odiava crianças, era pura lenda. Filmes: Curtas-metragens sonoros: The Golf Specialist / 1930; The Dentist / 1932; The Fatal Glass of Beer / 1933; The Pharmacist / 1933; The Barber Shop / 1933. Longas-metragens: Janice

Meredith / Janice Meredith / 1924; Sarinha do Circo / Sally of the Sawdust / 1925; Vontade Suprema / That Royle Girl / 1925; Risos e Tristezas / It’s the Old Army Game / 1926; Os Três Compadres ou Cacos de Vidro / So’s Your Old Man / 1926; Presente de Núpcias / The Potters / 1927; Leão sem Juba / Running Wild / 1927; Dois Rivais no Caiporismo / Two Flaming Youths / 1927; O Romance de Tillie / Tillie’s Punctured Romance / 1928; Dois Sabichões e um Canudo / Fools for Luck /1928; Her Majesty

Love / 1931; Ela Prefere os Atletas / Million Dollar Legs / 1932; Se Eu Tivesse Um Milhão / It I Had a Million / 1932; Torre de Babel / International House / 1933; Alice no País das Maravilhas / Alice in Wonderland / 1933; Seis Aventureiros / Six of a Kind / 1934; No Tempo do Onça / The Old FashionedWay / 1934; Um Sorriso Para Tudo / Mrs. Wiggs of the Cabbage Patch / 1934; Um Negócio da China / It’s a Gift / 1934; Mississipi / Mississipi / 1935; Man on the Flying Trapeze / 1935; David Copperfield / David Copperfield / 1935; A Filha do Saltimbanco / Poppy / 1936; Folia a Bordo / The Big Broadcast of

1938 / 1938; Quem Mal Anda Mal Acaba / You Can’t Cheat an Honest Man / 1939; Minha Dengosa / My Little Chickadee / 1940; O Turbulento / The Bank Dick / 1940; Trouxas em Desfile / Never Give a Sucker an Even Break / 1941; Seis Destinos / Tales of Manhattan / 1942; Epopéia de Alegria / Follow the Boys / 1944; Viva a Juventude / Song of the Open Road / 1944; Sensações de Paris / Sensations of 1945 / 1944. Obs. Rod Steiger encarnou W. C. Fields na cinebiografia, Frenesi de Glória / W.C. Fields and Me / 1976.

HARRY HOUDINI (Erik Weisz, 1874 – 1926) – Nascido em Budapest, Hungria, filho de um rabino, Erik (que depois mudou o nome para Ehrich Weiss) chegou aos Estados Unidos em 3 de julho de 1878 e fez sua primeira aparição em público como trapezista aos nove anos de idade, anunciando-se como “Ehrich, the Prince of the Air”. Adulto, ele começou sua carreira de mágico em 1891 (com o nome artístico de “Harry Houdini” porque foi muito influenciado pelo prestidigitador francês Jean Eugène Robert-Houdin), atuando em circos e parques de diversões. A certa altura, Houdini começou a se especializar em números de fuga. Em 1893, enquanto se apresentava com seu irmão “Dash” (Theodore) em Coney Island como “The Brothers Houdini”, ele conheceu Wilhelmina Beatrice (Bess) Rahner. Embora Bess tivesse sido inicialmente cortejada por “Dash”, ela e Houdini se casaram em 1894 e Bess substituiu, “Dash” no número, que passou a se chamar “The Houdinis”. A grande oportunidade para Houdini ocorreu em 1899,

quando ele conheceu o empresário Martin Beck, que o introduziu no circuito Orpheum de vaudeville. Em 1900, Beck levou Houdini para a Europa e ele ficou famoso como “The Handcuff King” (O Rei das Algemas). Em cada cidade, Houdini desafiava a polícia local a mantê-lo algemado em sua cadeia. De 1907 e durante os anos dez, Houdini obteve grande êxito nos Estados Unidos, livrando-se rapidamente das algemas, correntes ou camisas-de-força e realizando outros números mirabolantes, que eram realizados nas ruas, para suscitar a cobertura jornalística. Ele também convidava o público para inventar dispositivos que o mantivessem preso como, por exemplo, uma sacola dos correios ou um barril cheio de cerveja. Em 1912, Houdini introduziu talvez o seu número mais famoso, “The Chinese Water Torture Cell”, no qual era mergulhado  de cabeça para baixo algemado, em uma caixa de vidro cheia de água e, para conseguir escapar sem se afogar, tinha que prender a respiração por mais de três minutos. Outra

façanha incrível de Houdini ocorreu no Hippodrome Theater em Nova York, onde ele fez um elefante desaparecer do palco, debaixo do qual havia uma piscina. Em 1918, Houdini assinou contrato com o produtor B. A. Rolfe, para ser o ator principal de um seriado, O Homem de Aço / The Master Mystery, lançado em 1919 e depois transferiu-se para a Famous Players-Lasky Corporation/ Paramount Pictures, onde fez dois filmes, O Salto da Morte / The Grim Game / 1919 e A Ilha do Terror / Terror Island / 1920.

Posteriormente, fundou a sua própria companhia , “Houdini Picture Corporation” e produziu e estrelou O Imortal / The Man From Beyond / 1921 e Haldane of the Secret Service / 1923, este último dirigido por ele mesmo. Em 1953, Tony Curtis personificou Houdini na cinebiografia Houdini, O Homem Miraculoso / Houdini; mas houve também vários telefilmes e um documentário (Houdini / 1996) abordando a sua vida.

AL JOLSON (Asa Yoelson, 1886 – 1950) – Jolson nasceu em Seredzius, na Lituânia, então ocupada pelo Império Russo. Em 1891, seu pai, que era rabino e solista da sinagoga, emigrou para Nova York, a fim de garantir um futuro melhor para a sua família. Em 1894, ele trouxe a esposa e os cinco filhos para a América.  Em 1897, Asa e seu irmão Hirsch começaram a cantar nas ruas por uns trocados, usando os nomes “Al” e “Harry”. Na primavera de 1902, Al arrumou emprego como indicador de lugares no Walter L. Main’s Circus; porém Main ficou tão impressionado com a voz do rapaz, que lhe promoveu a cantor. Em maio de 1903, Al foi contratado pelo produtor do espetáculo burlesco, Dainty Duchess Burlesques. Infelizmente, o teatro encerrou suas atividades no final do ano e Al então formou uma parceria com o irmão Hirsch que, a esta altura, já era conhecido no meio do vaudeville como Harry Yoelson. Al e Harry eventualmente formaram um trio com Joe Palmer mas depois os três se separaram

Al, sozinho, decidiu atuar com o rosto pintado de preto até que chamou a atenção de Lew Dockstader, produtor dos Dockstader’s Minstrels e logo se tornou o artista principal do show. Em 1911, Jolson estreou na revista musical La Belle Paree apresentada no Winter Garden Theater em Nova York e conquistou imediatamente o público do teatro de Lee Shubert, interpretando as canções de Stephen Foster com o rosto pintado de preto. Após ter estrelado mais um musical, Vera Violetta, ele “arrebentou” num terceiro, The Whirl of Society, propulsionando sua carreira para novas alturas.

Durante as representações no Winter Garden, Jolson passou a dizer a frase “You ain’t heard nothing yet”(“Vocês ainda não ouviram nada”), antes de cantar uma canção adicional e, em The Whirl of Society criou o seu personagem blackface chamado “Gus”. Sua carreira seria impulsionada mais ainda, quando estrelou o musical Sinbad, de grande sucesso, com as famosas canções do seu futuro repertório, “Swanee” e “My Mammy”. Em sua homenagem, Lee Shubert batizou seu novo teatro perto do Central Park como Jolson’s Fifty-ninth Street Theatre. Em 1920, Jolson havia se tornado o maior astro da Broadway. Ele sabia manter uma platéia sob controle como ninguém. George Jean Nathan escreveu: “O poder de Jolson sobre o público eu nunca vi ser igualado”. Seu estilo de interpretação era impetuoso e extrovertido e ele popularizou um grande número de  canções, que se beneficiaram de sua  abordagem sentimental  e melodramática. Em 1927, a Warner Bros. decidiu transpor para a tela a peça popular da Broadway escrita por Samson Raphaelson, The Jazz Singer, utilizando o seu novo sistema Vitafone de som-em-disco. George Jessel havia interpretado o papel principal na peça e foi inicialmente contratado

para repetí-lo no cinema. Mas, por razões não esclarecidas, foi substituido por Al Jolson. Como a história do filme era supostamente baseada em parte na vida de Jolson, ele parecia ser a escolha lógica para o protagonista. O Cantor de Jazz abriu para Al Jolson uma nova carreira como astro do cinema. Ele também se tornou muito popular no rádio, primeiro com o programa Presenting Al Jolson em 1932 e depois com Kraft Music Hall em 1934 e posteriormente com Shell Chateau em 1935. À medida em que a carreira de sua terceira esposa, Ruby Keeler crescia, a fama de Jolson começava a diminuir. Entretanto, ele se recuperou artisticamente quando, em 1946, a Columbia produziu The Jolson Story com Larry Parks encarnando Jolson e fazendo a mímica para a voz do próprio Jolson nas canções. Em 1949, The Jolson Story teve uma continuação, Jolson Sings Again. Filmes: Plantation Act / 1926 (curta-metragem); O Cantor de Jazz / The Jazz Singer / 1927; A Última Canção / The Singing Fool / 1928; Diz Isso Cantando / Say It with Songs / 1929; Sonny Boy / Sonny Boy / 1929 (cameo); Minha Mãe / Mammy / 1930; Paixão de Todos / Showgirl in Hollywood / 1930 (cameo); Big Boy / 1930; O Venturoso Vagabundo /

Hallelujah! I’m a Bum / 1933; Wonder Bar / Wonder Bar / 1934; Cassino de Paris / Go Into Your Dance / 1935; Canta e Serás Feliz / The Singing Kid / 1936; O Meu Amado / Rose of Washington Square / 1939; Hollywood em Desfile / Hollywood Cavalcade / 1939; O Coração de um Trovador / Swanee River / 1939; Rapsódia Azul / Rhapsody in Blue / 1945 (breve cena com Jolson de blackface, apresentando Swanee); Sonhos Dourados / The Jolson Story / 1946 (emprestando a voz para Larry Parks e breve aparição); Trovador Inolvidável / Jolson Sings Again / 1949 (emprestando a voz para Larry Parks); Bonequinha Linda / Oh, You Beautiful Doll / 1949 (apenas a voz)

OS IRMÃOS MARX – Groucho (Julius, 1890 – 1977), Gummo (Milton, 1897 – 1977), Harpo (Arthur, 1888 – 1964 e Chico (Leonard, 1886 – 1961) –  Nascidos em New York City, eles eram filhos de imigrantes judeus da Alemanha e França. Sua mãe, Minnie Schönberg, era oriunda da Frísia e seu pai, Simon Marx (cujo nome depois foi mudado para Samuel Marx), era natural da Alsácia. Os irmãos pertenciam a  uma família de artistas e seu talento musical despontou desde a infância. Harpo aprendeu a tocar seis instrumentos diferentes, especializando-se como harpista. Chico era excelente pianista. Groucho, guitarrista e cantor e Zeppo (Herbert, 1901-1979), cantor. Eles foram introduzidos no vaudeville por intermédio de seu tio, Albert Schönberg, que atuava nos palcos como Al Shean, da dupla Gallagher e Shean. Groucho foi o primeiro dos irmãos Marx a ingressar no vaudeville em 1905, como membro do Leroy Trio. Em 1907, ele e Gummo estavam cantando juntos com Mabel O’Donnel  como “The Three Nightingales”. No ano seguinte, Harpo tornou-se o quarto Nightingale e, em 1910, o grupo foi expandido, com a entrada da mãe dos Mark, Minnie e da tia deles, Hannah. O grupo foi rebatizado de “The Six Mascots”.  Os quatro irmãos Marx reuniram-se em um esquete que o tio Al Shean escreveu para eles, intitulado “Fun in a Hi Skool”,no qual Groucho era um professor de sotaque alemão numa sala de aula que incluía os alunos Harpo, Gummo e Chico. Em um outro esquete, “Home Again”, Zeppo se uniu aos seus quatro irmãos, formando o quinteto no palco, provavelmente pela única vez. “Os Quatro Irmãos

Marx” começaram a desenvolver os seus personagens e o seu estilo inconfundível de comédia anárquica e do absurdo. Groucho criou a sua marca registrada, que era o bigode pintado de graxa, o charuto e o seu andar curvado. Harpo, perdeu a voz, começou a usar uma peruca vermelha encaracolada e a carregar uma buzina de automóvel. Chico passou a falar com um sotaque italiano enquanto Zeppo adotou o papel do “escada” romântico. Nos anos vinte, os Marx Brothers haviam se tornado um dos números teatrais favoritos da América. Os irmãos conquistaram a Broadway, primeiro com uma revista musical, I’ll Say She Is (1924-1925) e depois, com duas comédias musicais, The Cocoanuts (1925-1926) e Animal Crackers (1928-1929).Quando veio o cinema falado, eles assinaram contrato com a Paramount e deram início à sua carreira cinematográfica. Seus dois primeiros filmes exibidos (eles haviam feito anteriormente um curta-metragem silencioso chamado Humor Risk, que não foi lançado) eram adaptações dos seus shows da Broadway: Hotel da Fuzarca / The Cocoanuts / 1929 e  Os Galhofeiros /

Animal Crackers / 1930, ambos escritos por George S. Kaufman e Morrie Ryskind. Subsequentemente, eles participaram de um short que foi incluído no documentário em comemoração do vigésimo aniversário da Paramount, The House That Shadows Built / 1931, no qual eles adaptaram uma cena de I’ll Say She Is. Seu próximo filme de longa-metragem, Batutas Burlescos / Monkey Business / 1931, foi o primeiro não baseado numa produção teatral e o único filme no qual a voz de Harpo é ouvida (ele canta dentro de um barril na cena de abertura). Os Gênios da Pelota  / Horse Feathers / 1932, que  satirizou o sistema educacional americano e a Lei Sêca, foi o seu filme mais popular  até então e ganhou a capa do Time. Nessa época, Chico e Groucho estrelaram uma série de comédia radiofônica, Flywheel, Shyster and Flyheel, cujos scripts e gravações foram dados como perdidos durante décadas e recentemente encontrados nos anos oitenta na Biblioteca do Congresso. O último filme dos Marx na Paramount,  O

Diabo à Quatro / Duck Soup / 1933 foi dirigido pelo diretor de maior prestígio com o qual trabalharam: Leo McCarey. A esta altura, Zeppo deixou o quarteto e fundou, com seu irmão Gummo, uma das maiores agências de talento em Hollywood. Groucho e Chico apresentaram-se no rádio e estavam pensando em voltar à Broadway quando, num  jogo de bridge, Chico e Irving Thalberg celebraram o contrato da ida dos Marx Brothers (que agora eram três) para a MGM. Thalberg insistiu para que os  scripts fossem melhor estruturados do que os da Paramount, entremeando a comicidade do trio com tramas românticas e números musicais não cômicos e que as injúrias se limitassem aos vilões bem evidentes. O primeiro

filme no novo estúdio foi Uma Noite na Ópera / A Night at the Opera / 1935, uma sátira ao mundo da ópera na qual os irmãos ajudavam dois jovens apaixonados transformando a produção de “Il Trovatore” num caos. O filme, que apresentava a sequência antológica do camarote abarrotado de gente, foi um grande sucesso, seguido por outro êxito ainda maior, Um Dia nas Corridas / A Day at the Races / 1937,

onde os irmãos causam a maior desordem numa casa de saúde e numa corrida de cavalos. Após a morte súbita de Thalberg, os Marx fizeram uma curta experiência na RKO (Por Conta do Bonifácio / Room Service / 1938), depois retornaram à MGM (Os Irmãos Marx no Circo / At the Circus / 1939, No Tempo do Onça / Go West / 1940, Casa Maluca / The Big Store / 1941) e, logo após, anunciaram o fim de sua atividade na tela. Porém Chico estava em dificuldades financeiras e, para saldar suas dívidas de jogo, os Marx fizeram mais dois filmes juntos: Uma Noite em Casablanca / A Night at Casablanca / 1946 e  Loucos de Amor / Love Happy / 1949, ambos distribuídos pela United Artists. A partir de 1940, Chico e Harpo apareceram separadamente e juntos em boates e cassinos; Chico ainda organizou uma banda, The Chico Marx Orchestra. Groucho iniciou sua carreira sozinho com You Bet Your Life, que foi ao ar de 1946 a 1962 no rádio e na televisão. Finalmente, Groucho, Chico e Harpo trabalharam no filme A História da Humanidade / A Story of Mankind / 1957.

HELEN MORGAN (Helen Riggin, 1900 – 1941) – Ninguém foi capaz de cantar as canções que a fizeram famosa (“Bill”, “Can’t Help Lovin’Dat Man”, “Why Was I Born?”, “What Wouldn’t I Do for That Man”, “Don’t Ever Leave Me”, “Body and Soul”) com o mesmo sentimento e a mesma emoção. Depois de trabalhar como modelo de roupa íntima feminina, balconista e empacotadora, Helen ganhou um concurso de beleza e foi contratada por Florenz Ziegfeld, para compor o coro de Sally, que estreou em 21 de dezembro de 1920. Ela atuou em várias boates durante os anos da Lei Sêca e, apesar do National Prohibition Act de 1919, se tornou alcoólatra.  Helen cantava sempre apoiada em cima do piano, porque estava geralmente bêbada para ficar de pé. Em 1927, ela fez grande sucesso como Jules LaVerne no elenco original de Show Boat, cantando “Bill” e “Can’t Help Lovin’ Dat Man”. Helen trabalhou em duas versões cinematográficas deste musical. Na versão de 1929, parcialmente falada, aparecia somente na canção prólogo e Alma Rubens fazia o papel de Julie. Na versão de 1936, Helen interpretava realmente Julie

Depois de participar da versão de 1929 de Show Boat, ela estrelou o musical da Broadway,  Sweet Adeline, no qual introduziu as canções “Why Was I Born” e “Don’t Ever Leave Me”. Porém quando Sweet Adeline foi filmado em 1934, o papel de Helen caiu nas mãos de Irene Dunne, que possuía uma bela voz de soprano mas não era uma cantora de fossa. No cinema, Helen teve seu melhor desempenho em

Aplausos / Applause / 1929, dirigido por  Rouben Mamoulian,  como a  rainha do burlesco bêbada, Kitty Darling. Nos anos trinta, ela continuou se apresentando em boates, vaudeville e comédias musicais mas os críticos  se queixavam de que todas as suas canções eram as mesmas, que ela estava sempre repetindo a sua “melancolia crônica”. Em 8 de outubro de  1941 Helen faleceu no palco durante uma performance de George White’s Scandals  of 1942, vitimada pela cirrose. Ela foi retratada por Polly Bergen num drama do Playhouse 90, The Helen Morgan Story, dirigido por George Roy Hill (Bergen recebeu um Emmy Award  por sua interpretação). No mesmo ano, foi produzido o filme Com Lágrimas na Voz / The Helen Morgan Story, estrelado por Ann Blyth (dublada por Gogi Grant). Filmes: Tudo por um Automóvel / Six Cilinder Love / 1923; A Gatuna de Corações / The Heart Raider / 1923; Boêmios / Show Boat / 1929; Aplausos / Applause / 1929; Glorificação da Beleza / Glorifying the American Girl / 1930; Repórter Audacioso / Roadhouse Nights / 1930; The Gigolo Racket (curta) / 1931; Manhattan Lullaby (curta) / 1933; The Doctor (curta) / 1934; Agora És Meu / You Belong to Me / 1934; Marie Galante / Marie Galante / 1935; Melodias Radiantes / Sweet Music / 1935; Cassino de Paris / Go Into Your Dance / 1935; Frankie and Johnny / 1936; Magnolia / Show Boat / 1936.

WILL ROGERS (William Penn Adair “Will” Rogers, 1879 – 1935) – foi artista do vaudeville, jornalista, humorista, comentarista social e astro do rádio e do cinema. Nascido no Oklahoma, filho de um casal de índios Cherokee, ele entrou para o mundo do espetáculo trabalhando em Wild West Shows. Em seguida passou para o vaudeville, atingindo a fama como um cowboy muito habilidoso com o laço. No outono de 1915, Rogers apareceu na revista musical  “Midnight Frolics” encenada na boate do New Amsterdam Theatre de Florenz Ziegfeld. O número de Rogers agora incluía monólogos sobre as notícias do dia. Ele aparecia no palco vestido de cowboy, rodopiando indiferentemente o seu laço e dizendo: “Bem, sobre o quê eu vou falar? Não tenho nada engraçado para dizer. Tudo o que sei é o que lí nos jornais”. E então começava a fazer piadas sobre o que  tinha lido nos jornais daquele dia. Rogers tinha uma capacidade incrível de improvisar comentários espirituosos sobre os acontecimentos diários com uma maneira anasalada de falar (típica dos seus conterrâneos), que fascinava os espectadores.

Em 1916, ele foi contratado para atuar em um lugar mais famoso, o Ziegfeld Follies. Hollywood descobriu Rogers em 1918, quando Samuel Goldwyn colocou-o no papel título em Laughing Bill Hyde. A assinatura de um contrato de três anos com Goldwyn, ganhando o triplo do seu salário na Broadway, levou Rogers para a Costa Oeste. Entretanto, suas aparições em filmes mudos eram prejudicadas pelas óbvias restrições do silêncio –  tinha que se expressar somente pelos intertítulos, que ele mesmo escrevia. Seu primeiro filme sonoro, They Had to See Paris / 1929, finalmente lhe deu a oportunidade de exercitar a sua comicidade verbal e ele se tornou um grande astro do cinema. Rogers apareceu em 21 filmes sonoros de longa-metragem, tendo sido dirigido três vezes por John Ford (Dr. Bull / 1934; Judge Priest / 1934; Steamboat Round the Bend / 1935). Filmes mudos (excluídos os 12 travelogues feitos pela Pathé Exchange durante a excursão do ator pela Europa em 1927): Decreto de um Ladrão / Laughing Bill Hyd

/ 1918; Quase um Marido / Almost a Husband / 1919; Vagabundo Regenerado / Jubilo / 1919; Água Por Toda a Parte / Water, Water Everywhere / 1919; O Crime à Meia-Noite / The Strange Boarder / 1920; Testemunha Fantasma / Jes’ Cal Me Jim / 1920; Cupid the Cowpuncher / 1920; Tesouro Desenterrado / Honest Hutch / 1920; Guile of Women / 1920; Boys Will Be Boys / 1921; An Unwilling Hero / 1920; Um Romeu a Força / Doubling for Romeo / 1921; O Poder da Família / A Poor Relation / 1921; One Glorious Day / 1922; The Headless Horseman / 1922; Fruits of Faith / 1922;  Hollywood / Hollywood / 1923 (cameo); Hustling Hank / 1923; Two Wagons Both Covered / 1923; Jus’ Passing Through / 1923; Uncensored Movies / 1923; The Cowboy Sheik / 1924; The Cake Eater / 1924; / 1924; Big Moments From Little Pictures / 1924; High Brow Stuff / 1924; Going to Congress / 1924; Don’t Park There / 1924; Jubilo, Jr. (Our Gang Series); Our Congressman / 1924; A Truthful Liar / 1924; Gee Whiz Genevieve / 1924; Tip Toes (produção britânica) / 1927; A Texas Steer / 1927. Filmes sonoros: Eles Tinham Que ver Paris /

They Had To See Paris / 1929; Dias Felizes / Happy Days / 1929; So This is London / 1930, Dois Araras na Cidade / Lightnin’ / 1930; Mocidade Ainda Que Tardia / As Young As You Fell / 1930; O Embaixador Bill / Ambassador Bill / 1930; Um Ianque na Corte do Rei Arthur / A Connecticut Yankee in King Arthur’s Court / 1931; Volta para a Realidade / Down to Earth / 1932; Too Busy To Work

1932; Business and Pleasure / 1932; Feira de Amostras / State Fair / 1933; Doutor Bull / Doctor Bull / 1933; Pai de Família / Mr. Skitch / 1933; Apostando no Amor / David Harum / 1934; Receita para a Felicidade / Handy Andy / 1934;  O Juiz Priest (na TV) / Judge Priest / 1934; The County Chairman / 1935; A Vida Começa aos 40 / Life Begins at Forty / 1935; Doubting Thomas / 1935; Nas Águas do Rio

(TV) / Steamboat Round the Band / 1935; Dois Campeões / In Old Kentucky / 1935. Will Rogers Jr. personificou o pai na cinebiografia A História de Will Rogers / The Will Rogers Story, realizada em 1952. Rogers faleceu aos 55 anos de idade, vítima de um desastre aéreo com seu avião particular ocorrido no Alaska.

MAE WEST (Mary Jane West, 1893 -1980) – Era filha de um pugilista, que depois abriu uma agência de detetives e de uma modelo. Em 1907, Mae começou a atuar profissionalmente, aos quatorze anos de idade, com o nome de Baby Mae. Sua primeira aparição num espetáculo da Broadway deu-se em 1911, na revista A La Broadway mas o show saiu de cartaz após oito apresentações. Em 1918, ela estava em Vera Violetta, cujo elenco era encabeçado por Al Jolson e Gaby Deslys. Neste mesmo ano, Mae teve a sua grande oportunidade na revista dos irmãos Shubert, Sometime: sua personagem, Mayme, dançava o shimmy.

Seu primeiro papel principal na Broadway foi em 1926 numa peça intitulada Sex, escrita, produzida e dirigida por ela (usando o pseudônimo de Jane Mast). A produção teve uma bilheteria razoável porém houve uma batida no teatro e Mae foi presa juntamente com o resto do cast. Ela foi indiciada criminalmente e condenada a dez dias de prisão por “corromper a moral e a juventude”. O caso chamou a atenção da mídia e impulsionou sua carreira. Sua próxima peça, The Drag (1927) abordava o homossexualismo e era o que ela chamava de um de seus “comedy-dramas of life”. Após uma série de testes em Connecticut e New Jersey, Mae anunciou que estrearia a peça em Nova York. Entretanto, The Drag nunca chegou à Broadway por causa das ameaças de Sociedade de Prevenção contra o Vício de interditá-la se a sua autora ousasse encená-la.

Mae continuou a escrever peças inclusive The Wicked Age, Pleasure Man e The Constant Sinner. Suas produções sempre causaram controvérsia e era justamente este fato que  lhe garantia a permanência no noticiário e os teatros lotados. Sua peça, escrita em 1928, Diamond Lil, sobre uma dama desembaraçada e espirituosa dos anos 1890, tornou-se um êxito na Broadway. Em 1932, aos 38 anos de idade, Mae assinou contrato com a Paramount Pictures e fez sua estréia no cinema num pequeno papel ao lado de George Raft em Night After Night. Na sua primeira cena, uma chapeleira da boate exclama: “Goodness, what beautiful Diamonds!”. West replicava: ”Goodness had nothing to do with it, dearie”. Raft declarou: “Ela roubou tudo menos as câmeras”. Mae trouxe sua personagem Diamond Lil, agora rebatizada de Lady Lou, para a tela em She Done Him

Wrong / 1933, revelando o novato Cary Grant. O filme foi um sucesso de bilheteria e ganhou uma indicação para o Oscar. Seu próximo filme, I’m No Angel / 1933, novamente com Cary Grant como seu parceiro, foi um sucesso de bilheteria ainda maior. Em 1933, Mae West era a pessoa mais bem paga nos Estados Unidos (depois de William Randolph Hearst), dizem que salvando a Paramount da falência.

Quando o Código de Produção foi seriamente imposto em 1 de julho de 1944, os roteiros de Mae passaram a ser severamente fiscalizados. Conhecida pelos seus duplos sentidos despudorados, ela causou problemas para a NBC, quando participou de um esquete (escrito por Arch Oboler) ao lado de Don Ameche como Adão e Eva no Jardim do Paraíso. Ela disse para Ameche no show “To get me a big one … I feel like doin’a big apple!”. Dias depois da transmissão, a NBC recebeu cartas dos ouvintes chamando o programa de “imoral” e “obceno”. Clubes femininos e grupos católicos repreenderam o patrocinador, por ter permitido que a “impureza invadisse o ar”. A Federal Communications Commission (FCC) julgou  a transmissão  “vulgar “e “indecente”. A NBC culpou Mae pessoalmente pelo incidente e a baniu (bem como a menção do seu nome) de suas estações. Após seu último filme dos anos quarenta, The Heat’s On, Mae continuou ativa. Entre as suas representações no palco destacou-se o papel principal de Catherine was Great (1944) na Broadway, no qual ela parodiava  a história de Catarina da Rússia

cercando-se de uma “guarda imperial” de rapazes musculosos. Quando estava escolhendo o elenco de Crepúsculo dos Deuses / Sunset Boulevard / 1950, Billy Wilder ofereceu a Mae (então com 60 anos) o papel de Norma Desmond (felizmente mudou de idéia). Em 1959, ela publicou sua autobiografia, “Goodness Had Nothing to Do with It”. Após uma ausência de 26 anos, Mae reapareceu nas telas em Myra Breckinridge / 1970 e  Sextette / 1978, dois fracassos comerciais. Filmes: Valentino ou Noite Após Noite / Night After Night / 1932; Uma Loura Para Três / She Done Him Wrong / 1933; Santa,

Não Sou / I’m No Angel / 1933; Uma Dama do Outro Mundo / Belle of the Nineties / 1934;  Senhora da Alta Roda / Goin’ to Town / 1935; Sereia do Alaska / Klondike Annie / 1936;  Amores de uma Diva / Go West, Young Man / 1936;  A Vida é uma Festa / Everyday’s a Holiday / 1937; Minha Dengosa / My Little Chickadee / 1940; Sedução Tropical / The Heat’s On / 1943; Homem e Mulher Até Certo Ponto / Myra Breckinridge / 1970; Sextette / 1978.

CONEXÃO VAUDEVILLE – CINEMA II

abril 7, 2012

GEORGE BURNS (Nathan Birnbaum, 1896 – 1996 ) e  GRACIE ALLEN (Gracie Ethel Cecile Rosalie Allen, 1905 – 1964) – Burns e Allen apareceram pela primeira vez juntos em 1922 no Hill Street Theatre em Newark, New Jersey; eles se casaram quatro anos depois em 7 de janeiro de 1926. A princípio, Grace fazia o papel de “escada” e Burns era o comediante mas em poucos meses os papéis haviam se invertido com George como straight man, ouvindo filosoficamente as respostas desmioladas de Gracie com um charuto nos lábios. George começou no vaudeville como cantor num quarteto infantil intitulado The Pee Wee Quartet. Depois, trabalhou com vários parceiros (vg. Sid Gary, Bill Lorraine) até encontrar Gracie e formarem a dupla cômica Burns e Allen. Seu primeiro sucesso deu-se com um esquete denominado “Lamb Chops” escrito para eles por Al Boasberg, que depois se tornaria um roteirista de comédias muito requisitado pelo cinema.  O diálogo de “Lamb Chops” era algo como: George – Você se interessa por amor? Gracie – Não. George – Você se interessa por beijos? Gracie – Não. George – Por que você se interessa? Gracie – Costeletas de Cordeiro. Para tudo o que George perguntava, Gracie tinha resposta. Quando George, como seu patrão, comentava zangado: “Você deveria ter chegado há duas horas”. A inocente secretária Gracie respondia: “Por quê, o que aconteceu?”.

Filha de um artista de vaudeville, Edward Allen, Gracie começou a representar ainda criança ao lado do pai e depois apareceu com suas irmãs Bessie, Pearl e Hazel em um número intitulado Larry Reilly and Company, no qual ela dançava e cantava uma música irlandesa. No verão de 1929, George e Gracie foram para a Inglaterra, anunciados como “The Famous American Comedy Couple”. Quando eles voltaram aos Estados Unidos, não havia dúvida quanto à sua popularidade. Sua carreira cinematográfica começou com uma série de curtas-metragens para a Paramount e prosseguiu nos longas-metragens. Burns e Allen tornaram-se artistas de rádio em 1932, contratados para participar do programa de Guy Lombardo e logo estrearam seu próprio programa. O Burns and Allen Show foi para a televisão em 1950, (após ter sido transmitido durante dezoito anos pelo rádio), e permaneceu no ar até 1958, quando Gracie anunciou sua aposentadoria.

George continuou trabalhando e, em 1975, ele, já viúvo, retornou triunfalmente às telas, conquistando o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante pelo seu desempenho em Uma Dupla Desajustada / The Sunshine Boys. Em 1977, obteve novo êxito, interpretando o papel principal em Alguém Lá em Cima Gosta de Mim / Oh God!. Burns fez seu último filme aos 98 anos de idade. Filmes: Ondas Sonoras / The Big Broadcast / 1932; Mocidade e Farra / College Humour / 1933; Torre de Babel / International House / 1933; Seis Aventureiros / Six of a Kind / 1934; Cupido ao Leme / We’re Not Dressing / 1934; Muitas Felicidades / Many Happy Returns / 1934; Louco por Tí / Love in Bloom / 1935; Ondas Sonoras de 1936 / The Big Broadcast of 1936 / 1935; A Pobre Milionária / Here Comes Cookie / 1935; Alegria à Solta / College Holliday / 1936; Ondas Sonoras de 1937 / The Big Broadcast of 1937 / 1936; Cativa e Cativante / A Damsel in Distress / 1937; Jazz Academia / College Swing / 1938; Honolulu / Honolulu / 1939.

Gracie sozinha: A Comédia de um Crime / The Gracie Allen Murder Case / 1939; Aventura para Dois / Mr. and Mrs. North / 1942; Duas Garotas e um Marujo / Two Girls and a Sailor / 1944. George sozinho: O Cadillac de Ouro / The Solid Gold Cadillac / 1956; Uma Dupla Desajustada / The Sunshine Boys / 1975; Alguém Lá em Cima Gosta de Mim / Oh God! / 1977; Sargento Pepper e sua Banda / Sergeant Pepper’s Lonely Hearts Club Band / 1975; Movie  Movie, a Dupla Emoção / Movie Movie / 1978 (não creditado); Just Me and my Kid / 1979; Oh God! Book Two / 1980; … E O Céu Continua Esperando / Oh God! You Devil / 1984; De Volta aos 18 / 18 Again ! / 1988; Assassinatos na Rádio WBN / Radioland Murders / 1994.


EDDIE CANTOR (Isidore Iskowitz, 1892-1964) – Filho de imigrantes russos, nascido no Lower East Side de Nova York, Eddie ficou órfão muito cedo e foi criado por sua avó, Esther Kantrowitz. Quando entrou para o colégio, ele começou a usar o sobrenome dela. O responsável pela matrícula,  disse-lhe que Isidore Kantor era suficiente. Mais tarde, o K tornou-se C e sua noiva e futura esposa, Ida Tobias, o persuadiu a adotar Eddie como seu prenome. Em 1908, o rapazinho paupérrimo (teve que pedir emprestado as calças de um amigo para se apresentar) ganhou o primeiro lugar num concurso de calouros realizado no Miner’s Bowery Theatre, levando para casa os doze dólares de prêmio. A grande oportunidade de Cantor no vaudeville surgiu quando Gus Edwards o contratou para aparecer no seu Kid Kabaret. Foi ali que ele criou o personagem “Jefferson”, com o rosto pintado de preto. Cantor escreveu: “Não era um vaudeville de primeira classe mas a melhor e a única escola de interpretação no seu gênero, onde moços e moças pobres podiam aprender a arte do entretenimento em todas as suas formas e ainda serem pagos para aprender”.

A segunda chance ocorreu em 1916, quando ele obteve um grande sucesso na produção de Florenz Ziegfeld, Midnight Frolics e, em consequência, foi escalado para a edição do Ziegfeld Follies de 1917. As edições de 1918 e 1919 se seguiram e Cantor poderia ter continuado no Follies durante os anos vinte, se não tivesse participado de uma greve promovida pela Actors Equity Association. Ziegfeld declarou que não queria mais saber de Cantor e este então formou uma aliança com os Shuberts, para os quais apareceu em Broadway Brevities of 1920 e Make It Snappy (1923). Felizmente, Cantor e Ziegfeld depois se reconciliariam e Cantor voltaria para estrelar duas das mais importantes comédias musicais de sua carreira, Kid Boots (1923) e Whoopee! (1928) além da edição do Ziegfeld Follies de 1927. Entrementes, Cantor retornou ao vaudeville e provou que continuava tão popular  com o público deste tipo de divertimento como era com as platéias das comédias musicais. Em 1926, ele estreou no cinema na versão de Kid Boots mas foi somente em 1930, com a filmagem de Whoopee!, que se distinguiu na tela. Dançando, batendo palmas no ritmo da música, revirando os seus olhos (“Banjo Eyes”, conforme o apelido que recebeu por causa de uma caricatura feita pelo desenhista Frederick J. Gardner), cantando num tom alto inimitável e manifestando sua condição de judeu e origem russa em piadas espirituosas, Cantor se tornou um grande astro de Hollywood nos anos 30. Algumas das canções que interpretou tornaram-se inesquecíveis como, por exemplo, “Making Whoopee”, “My Baby Just Cares for Me” e “If You Knew Susie”. No rádio, Cantor começou a se destacar em The Chase and Sanborn Hour na NBC em 1931.

Como The Eddie Cantor Show, o programa foi ouvido pela CBS a partir de 1935 e Cantor ficou conhecido pelas suas descobertas radiofônicas, que incluiram Deanna Durbin, Bobby Breen e Dinah Shore. Ele se transferiu para a televisão em 1950 com The Colgate Comedy Hour. Paralelamente ao seu trabalho no rádio, teatro e cinema, Eddie Cantor escreveu duas autobiografias (“My Life is in Your Hands” e Take My Life”) e outros livros: Caught Short!, Yoo Hoo, Prosperity, Your Next President, Between the Acts e Who’s Hooey? Ele também se interessou por atividades politicas e sociais. Cantor inventou o título “The March of Dimes” para a campanha de doação em favor do combate à poliomielite. Foi fundador da Actor’s Equity, American Federation of Radio Artists (AFTRA) e Screen Actors Guild. Em 1956, a Academia

conferiu-lhe um Oscar especial “pelo notável serviço prestado à indústria cinematográfica”. Em 1964, o Presidente Johnson lhe concedeu a U.S. Service Medal como reconhecimento de seu trabalho humanitário. Filmes: Casar e Descasar / Kid Boots / 1926; Encomenda Postal / Special Delivery / 1927; A Glorificação da Beleza / Glorifying the American Girl / 1929; Whoopee / Whoopee / 1930; O Homem do Outro Mundo / Palmy Days / 1931; Meu Boi Morreu / The Kid from Spain / 1932; Escândalos Romanos / Roman Scandals /  1933; Abafando a Banca / Kid Millions / 1934; Cai, Cai, Balão / Strike me Pink / 1935; Ali Baba é Boa Bola / Ali Baba Goes to Town / 1937; Mamãe Eu Quero / Forty Little Mothers / 1940; Graças à Minha Boa Estrela / Thank Your Lucky Stars / 1943; Um Sonho em Hollywood / Hollywood Canteen (cameo) / 1944; E O Espetáculo Continua /  Show Business / 1944; Você Conhece Susie? / If You Knew Susie / 1948; A História de Will Rogers / The Story of Will Rogers / 1952 (convidado). Cantor apareceu brevemente na sua cinebiografia, Nas Asas da Fama / The Eddie Cantor Story / 1953, na qual foi retratado por Keefe Brasselle.

GEORGE M. COHAN (George Michael Cohan, 1878-1942) – Ator, cantor, dançarino, autor, compositor e produtor, George Cohan é o símbolo do teatro popular americano nas primeiras décadas do século vinte. Conhecido na década anterior à Primeira Guerra Mundial como “O Dono da Broadway”, ele é considerado o “Pai da Comédia Musical Americana”. Uma estátua de Cohan na Times Square em Nova York comemora suas contribuições para o teatro musical americano. O menino aprendeu a tocar violino com oito anos de idade e aos doze anos já estava interpretando o papel principal em Peck’s Bad Boy. Porém, antes disso, na primavera de 1889, havia nascido um número de vaudeville originalmente intitulado The Cohan Mirth Makers, composto por Mr. (Jerry) e Mrs. (Nellie) Cohan e seus filhos George e Josie, coletivamente descritos como “The Celebrated Family of Singers, Dancers and Comedians with Their Silver Plated Band and Symphony Orchestra”. Sob o patrocínio de J. F. Keith, a família excursionou pela América até que, como The Four Cohans, os quatro artistas passaram a ser um dos pequenos grupos mais bem pagos do país. George começou a fornecer material para o número da família, em particular um playlet intitulado “Running for Office” e outros esquetes. O agradecimento final de George antes da cortina descer, ficou famoso: “My mother thanks you, my father thanks you, my sister thanks you and I thank you”. Na virada do século, após uma discussão com Keith a respeito da colocação do nome deles nos cartazes, George e sua família deixaram o vaudeville

Em 1901 ele escreveu, dirigiu e produziu seu primeiro musical na Broadway, The Governor’s Son, para os Quatro Cohans. Seu grande êxito ocorreu em 1904 com o espetáculo Little Johnny Jones, que introduziu as canções “Give My Regards to Broadway” e “The Yankee Doodle Boy”. Cohan tornou-se um dos mais destacados compositores de Tin Pan Alley, publicando mais de 300 músicas notabilizadas por suas melodias facilmente lembradas e letras inteligentes. Seus outros sucessos incluíam: “You’re a Grand Old Flag”, Forty-Five Minutes to Broadway”, “Mary is a Grand Old Name”, e a canção mais popular na América durante a Primeira Guerra:  “Over There”. De 1904 a 1920, Cohan criou e produziu mais de 50 musicais, peças e revistas na Broadway juntamente com seu amigo Sam Harris, inclusive Give My Regards to Broadway e Going Up em 1917, que  fariam grande sucesso em Londres no ano seguinte. Em 1925, ele publicou sua autobiografia, “Twenty Years on Broadway and The Years It Took to Get There”.

Em 1930, Cohan apareceu em The Song and Dance Man, reapresentação de seu tributo ao vaudeville e a seu pai. Sua última peça, The Return  of The Vagabond, foi encenada em 1940. Em 29 de junho de 1936, o Presidente Franklin Delano Roosevelt condecorou-o com a Congressional Golden Medal, por suas contribuições para levantar a moral dos soldados na Primeira Guerra Mundial.

Filmes: Broadway Jones / 1917; Seven Keys to Baldpate / 1917; Guerra às Bebidas / Hit-the-Trail Holliday / 1918; O Falso Presidente / The Phantom President / 1932 e Gambling / 1934. Em 1942, foi lançada a cinebiografia de Cohan, A Canção da Vitória / Yankee Doodle Dandy, na qual ele foi personificado por James Cagney em uma atuação extraordinária, que rendeu o Oscar para o ator. Cagney interpretaria Cohan mais uma vez em Um Coringa e Sete Ases / The Seven Little Foys / 1955 com Bob Hope no papel de Eddie Foy. Em 1957, Mickey Rooney retrataria Cohan num especial para a televisão, Mr. Broadway e, em 1968, Joel Grey faria o mesmo no musical da Broadway, George M!

THE DOLLY SISTERS (Roszika, 1892 – 1970 e Yansci Dutsch, 1892 – 1941) – Roszika e Yansci (mais conhecidas como Rosie e Jenny) eram gêmeas idênticas nascidas em Budapeste, na Hungria. Elas estrearam no Keith‘s Union Square Theatre e depois foram para a edição de 1911 do Ziegfeld Follies, na qual interpretavam um número de dança como gêmeas siamesas. As irmãs Dolly também participaram de His Bridal Night, farsa escrita por Lawrence Rising,  que estreou no Republic Theatre em agosto de 1916. Elas apareceram no cinema primeiramente separadas (Rosie em The Lily and the Rose / 1915; Jenny em The Call of the Dance / 1916) e depois juntas em The Million Dollar Dollies, exibido pela Metro em 1917. De 1916 em diante, as Dolly Sisters apresentaram-se habitualmente no vaudeville,

embora os críticos sempre reclamassem que sua capacidade como cantoras era quase inexistente e que elas não se preocupavam em variar os seus números. Entretanto, cantar e dançar importava pouco, comparado com os trajes que as Dolly usavam e com o número de vezes que elas trocavam de roupa. O público gostava de vê-las luxuosamente vestidas. Nos anos vinte, as Dolly Sisters foram vistas mais em Londres e Paris do que nos palcos de Nova York. Uma de suas revistas francesas foi Broadway a Paris, o show mais popular de 1928. Após seu afastamento dos palcos no final da década de vinte, as Dolly Sisters se concentraram na cena social. Em junho de 1941, Yansci Dolly foi encontrada morta no seu apartamento em Beverly Hills. Ela fez um laço com o cordão da cortina e se enforcou. Oito anos antes, ela havia sido ferida gravemente em um acidente de carro na França e necessitara de várias cirurgias plásticas. Yansci Dolly nunca se recuperou do trauma de ter perdido sua beleza.  Em 1945, George Jessel produziu um filme na 20th Century-Fox baseado na vida das duas jovens, As Irmãs Dolly / The Dolly Sisters, estrelado por Betty Grable e June Haver.

MARIE DRESSLER (Leila Marie Koerber, 1869 – 1934) – Antes de se tornar uma grande atriz no cinema, Marie se distinguiu no teatro de repertório, no teatro burlesco e no vaudeville. Canadense, filha de artistas itinerantes, aos quatorze anos de idade ela ingressou na Nevada Stock Company; por causa da oposição dos pais, mudou o nome para Marie Dressler, como  chamava sua tia. Depois de participar de outras companhias de repertório, ela chegou a Nova York e começou a cantar no Atlantic Garden no Bowery. Sem ter um físico atraente, Marie se encaminhou para a comédia.

Seu primeiro sucesso teve lugar numa ópera cômica intitulada The Lady Slavey, na qual ela fez o papel de Flo Honeydew of the Music Halls. Ao irromper o século vinte, Maria adquiriu popularidade no teatro burlesco e no vaudeville tanto como coon singer (intérprete de canções que zombavam da raça negra e eram cantadas por artistas negros ou brancos),  como pelas suas imitações. Em 5 de maio de 1910, no Herald Square Theatre, Marie apareceu pela primeira vez na farsa, Tillie’s Nightmare, como a personagem Tillie Blobbs, uma empregada de pensão. Esta peça levou ao filme Idílio Desfeito, O Casamento de Carlitos ou O Grande Romance de Carlito (no Brasil o filme mudou de título cada vez que era exibido) / Tillie’s Punctured Romance / 1914, uma comédia de Mack Sennett, na qual Charles Chaplin e Mabel Normand foram seus coadjuvantes. Nos anos vinte, sua carreira entrou em  declínio, prejudicada pela participação da atriz na greve de coristas, que aconteceu em 1917. Marie já estava pensando em abandonar a profissão, quando a roteirista Frances Marion convenceu a Metro a contratá-la em 1927. Além de marcantes papéis de coadjuvante em grandes produções da MGM (um dos quais, O Lírio do Lodo / Min and Bill / 1934 lhe deu o Oscar de Melhor Atriz), Marie fez uma série de comédias classe “B” ao lado de Polly Moran, que também passara pelo vaudeville. A Metro a chamou de “A Melhor Atriz do Mundo”, quando, em quatro anos seguidos, ela foi a atração número um das bilheterias nos Estados Unidos. Sua autobiografia intitulou-se “The Life Story of an Ugly Ducking”.

Filmes além de Ídilio Desfeito, Tillie’s Wakes Up e Tillie’s Tomato Surprise: os curtas-metragens Fired / 1917; The Scrub Lady / 1917; The Red Cross Nurse / 1918 e The Agonies of Agnes / 1918; The Callahans and the Murphys at Sunrise / 1927; A Menina Alegre / The Joy Girl / 1927; Marido de Mentira / Breakfast at Sunrise / 1927; Pai de Família / Bringing up Father / 1928 (com J. F. Farrell MacDonald e Polly Moran nos papéis de Jiggs (Pafúncio) e Maggie (Marocas), personagens da conhecida história em quadrinhos); Filhinha Querida / The Patsy / 1928; Divina Dama / The Divine Lady / 1929; Hollywood Revue / The Hollywood Revue / 1929; Dangerous Females / 1929 (curta-metragem); Rei Vagabundo / The Vagabond Lover / 1929; No Mundo da Lua / Chasing Rainbows / 1930; Anna Christie / Anna Christie / 1930; Ela Disse Não / The Girl Said No / 1930, Noite de Idílio/ One Romantic Night / 1930; Castelos no Ar / Caught Short / 1930; Gozemos a Vida / Let Us Be Gay / 1930; O Lírio do Lodo / Min and Bill / 1930; Gente de Peso / Reducing / 1931; Madame Prefeito / Politics / 1931; Emma / Emma / 1932 (indicada para o Oscar); Prosperidade / Prosperity / 1932; Narcissus / Tugboat Annie / 1933; Jantar às Oito / Dinner at Eight / 1933; Relíquia de Amor / Christopher Bean / 1933.

DUPLAS DE DANÇARINOS – As duplas de dançarinos eram atrações muito populares nos teatros de vaudeville e floresceram nos anos dez até os meados dos anos vinte. Entre as mais famosas que tiveram alguma ligação com o cinema, estavam: Mae Murray e Clifton Webb, Vernon e Irene Castle e Fred e Adele Astaire. Antes de suas respectivas carreiras cinematográficas, Mae Murray e Clifton Webb circularam pelo vaudeville apresentando “Society Dances”. Cinco músicos negros acompanhavam o par enquanto eles dançavam “Brazilian Maxixe”, um tango intitulado “Cinquante Cinquante”, “Barcarole Waltz” e outros números. Clifton Webb (Webb Parmelee Hollenback, 1889 – 1966) nasceu em Indiana.

Em 1892, sua mãe, Mabel (ou “Mabelle”, depois que se separou do marido), mudou-se para Nova York com seu querido “pequeno Webb” , como ela o chamaria pelo resto de sua vida. Aos dezenove anos de idade, Clifton tornou-se dançarino profissional  de salão, muitas vezes fazendo dupla com Bonnie Glass. Ele trabalhou em operetas e estreou na Broadway em 1913 no musical The Purple Road. Nos anos seguintes, Clifton continuou atuando em musicais, revistas, operetas e no cinema mudo (National Red Cross Pageant / 1917, O Almofadinha e a Francesa / Polly with a Past / 1920; Abaixo o Divórcio / Let No Man Put Asunder / 1924; New Toys / 1924; Vencedora de Corações / The Heart of a Siren / 1925). Ele formou dupla também com Mary Hay, ex-corista do Ziegfeld Follies e esposa de Richard Barthelmess e dançou com a bailarina russa Tamara Geva nos musicais Three Is a Crowd e Flying Colors. Quando estava com cinquenta anos, Clifton foi escolhido pelo diretor Otto Preminger (contra as objeções do chefe de produção da 20th Century Fox, Darryl F. Zanuck, que o achava demasiadamente efeminado), para interpretar o papel do elegante colunista de rádio, Waldo Lydecker em Laura / Laura / 1944. Daí para diante, ele se dedicou mais uma vez ao cinema de Hollywood, onde construiu uma carreira de 27 filmes entre 1917 e 1962).

Mae (Marie Adrienne Koenig, 1889 – 1965) começou a atuar na Broadway em 1906 com o dançarino Vernon Castle. Em 1908, ela passou a ser corista do Ziegfeld Follies, alcançando uma posição de destaque em 1915. Mae se tornou uma grande estrela na Universal, contracenando com Rudolph Valentino em Nos Cabarés de Nova York / Delicious Little Devil / 1919 e Repudiada / Big Little Person / 1919. No auge de sua popularidade, ela fundou sua própria companhia de produção (Tiffany Productions) com seu marido, o diretor Robert Z. Leonard. O seu papel mais famoso foi o de Sally O’Hara em A Viúva Alegre / The Merry Widow / 1925, produzido pela MGM e dirigido por Erich von Stroheim, no qual John Gilbert foi o Príncipe Danilo. Sua filmografia inclui ao todo 41 filmes, realizados entre 1916 e 1931.


Vernon (William Vernon Blyth, 1887 – 1918) e Irene Castle (Irene Foote, 1893 – 1969) formaram uma dupla de marido-e-mulher dançarinos de salão do início do século vinte. Após seu casamento, Irene se juntou a Vernon em The Hen-Pecks (1911), uma produção na qual ele era a atração principal. Então viajaram juntos para Paris,  a fim de trabalhar em uma revista. O show ficou pouco tempo em cartaz mas o casal foi contratado para o Café de Paris. Interpretando as últimas novidades em matéria de música de ragtime, tais como o Turkey Trot e o Grizzly Bear, os Castles tornaram-se uma sensação na sociedade parisiense e seu sucesso repercutiu largamente nos Estados Unidos. Estreando em Nova York  em 1912, numa sucursal do Café de Paris, a dupla logo recebeu convites para atuar no palco, vaudeville e cinema. Eles também se tornaram importantes na Broadway. Entre seus shows estavam The Sunshine Girl (1913) e Watch Your Step ( 1914). Neste espetáculo, o casal aperfeiçoou e popularizou o Foxtrot.

Considerados modelos de classe e respeitabilidade, os Castle ajudaram a eliminar o estigma de vulgaridade do close-dancing. As performances dos Castles, geralmente embaladas pelo ragtime e ritmos de jazz, também popularizaram a música afro-americana entre as elites abastadas. O par estrelou um filme chamado The Whirl of Life / 1915  e, depois da morte de Vernon em um desastre de aviação e

1918, Irene fez vários filmes mudos: Patria / Patria (seriado) / 1917; Perdidos na Arcádia / Stranded in Arcady / 1917; A Marca de Caim / The Mark of Cain / 1917; A Mulher Polícia / Sylvia of the Secret Service / 197; Vingança / Vengeance is Mine / 1917; A Presa Evadida / Convict 993 / 1918; O Mistério de Hillcrest / The Hillcrest Mystery / 1918; O Cliente Misterioso / The Mysterious Client / 1918; A Lei da Conservacão / The First Law / 1918; Alma Boemia / The Girl from Bohemia / 1918; The Common Cause / 1919; Amor Rebelde / The Firing Line / 1919; Elo Invisível / The Invisible Bond / 1919; Miss Antique / The Amateur Wife / 1920; The Broadway Wife / 1921; Eu Te Quero, Eu Te Adoro / French Heels / 1920; É Proibido Passar? / No Tresspassing / 1922; Ombros de Mulher / Slim Shoulders / 1922. Em 1939, a vida de Vernon e Irene foi dramatizada em A História de Vernon e Irene Castle / The Story of Vernon and Irene Castle com Fred Astaire e Ginger Rogers.

O progenitor de Fred Astaire (Frederick Austerlitz, 1899 – 1987) e Adele Astaire (Adele Marie Austerlitz, 1896 – 1981), imigrante austríaco, filho de pais judeus que haviam se convertido ao catolicismo, emigrou para os Estados Unidos e foi trabalhar numa fábrica de cerveja em Omaha, Nebraska. Depois que Adele, desde cedo, se revelou uma dançarina e cantora instintiva, sua mãe sonhou em sair de Omaha, explorando o talento dos filhos num número-de-irmão-com-irmã, muito comum no vaudeville da época.

Quando o pai perdeu o emprego, a família foi para Nova York, a fim de lançar os filhos no mundo do espetáculo com o sobrenome de “Astaire”, porque “Austerlitz” soava como nome de batalha. O primeiro número dos irmãos intitulava-se Juvenile Artists Presenting an Electric Musical Toe-Dancing Novelty e estreou em New Jersey num pequeno teatro, “para testá-los”. Graças à habilidade de vendedor de seu pai, Fred e Adele rapidamente conseguiram ser incluídos no famoso Orpheum Circuit, que se estendia por todo o país. Os Astaires chegaram à Broadway em 1917 com Over the Top, uma revista patriótica e, ao assistirem The Passing Show (1918), os críticos reconheceram a arte de Fred Astaire e de sua parceira. Durante os anos vinte, Fred e Adele apresentaram-se na Broadway e nos palcos de Londres em shows como Lady Be Good (1924), Funny Face (1927) e, mais tarde, The Band Wagon (1931), conquistando o aplauso do público nos dois lados do Atlântico.

Após o término de Funny Face, os Astaires fizeram um teste em Hollywood na Paramount mas foram considerados inadequados para filmes. Os irmãos se separaram em 1932, quando Adele se casou com seu primeiro marido, Lord Charles Arthur Francis Cavendish, filho do Duke de Devonshire. Fred continuou sua carreira, obtendo sucesso sozinho na Broadway e em Londres com Gay Divorce enquanto recebia convites para o cinema. De acordo com o folclore de Hollywood, o resultado de um teste de Fred na RKO Radio Pictures dizia: “Can’t sing. Can’t act. Balding. Can dance a little”. Astaire insistiu depois que o relatório na realidade foi: “Can’t act. Slightly bald, Also dances”. Entretanto, isto não afetou os planos da RKO para o seu novo contratado. Em 1933, ele foi emprestado para MGM, onde ele estreou na tela dançando (como ele mesmo) com Joan Crawford em Amor de Dançarina / Dancing Lady e depois o estúdio o incluiu, ao lado de Ginger Rogers, no elenco de Voando para o Rio / Flying Down to Rio. Como se sabe, o duo Astaire-Rogers atingiu o estrelato, advindo seus célebres musicais na RKO entre os anos 1933 e 1939. De 1948 a 1957, deu-se a fase áurea de Fred na MGM.

JIMMY DURANTE (James Francis Durante, 1893-1980) – Filho de um camelô de parque de diversões, Jimmy foi apelidado de “Schnozzola” por causa de seu nariz enorme e bulboso. Aos dezesseis anos, ele iniciou sua  carreira no mundo do espetáculo tocando jazz ao piano nas boates do Bowery. Formando um trio com Lou Clayton e Eddie Jackson, Jimmy obteve grande sucesso nos circuitos de vaudeville e boates. Em 1928, eles se apresentaram no  teatro Palace de Nova York e, no ano seguinte, na Broadway, num show de Florenz Ziegfeld. Jimmy estreou no cinema em 1930 e assinou um contrato de cinco anos com a MGM. Durante os anos trinta, ele transitou entre Hollywood e a Broadway, conquistando muita popularidade tanto nos musicais do teatro como nos filmes. Mais tarde ele levaria seu emprego errôneo de palavras com efeito ridículo e sua voz  rouca de cantor para o rádio e para a televisão. Sua longa trajetória artística se estendeu até os anos setenta, quando  ainda era visto nos nightclubs de Las Vegas ou em especiais de TV,  acenando seu chapéu freneticamente e anunciando o final da sua apresentação com a frase que era sua marca registrada, “Goodnight Mrs. Calabash, wherever you are” (“Boa noite, Sra. Calabash, onde quer que você esteja”  – Calabash era o nome carinhoso com o qual se dirigia à sua falecida esposa).

Filmes: Repórter Audacioso / Roadhouse Nights / 1930; O Homem da Nota / New Adventures of Get-Rich-Kick- Wallingford / 1930; Melodia Cubana / The Cuban Love Song / 1931; Salve-se Quem Puder / The Passionate Plumber / 1932; E O Mundo Marcha / The Wet Parade / 31; Pernas de Perfil / Speak Easily / 1932; Princesa da Broadway / Blondie of the Follies / 1932; O Falso Presidente  / The Phantom President / 1932; Entre Secos e Molhados / What! No Beer? / 1933; Além do Inferno / Hell Below / 1933: Da Broadway a Hollywood / Broadway to Hollywood / 1933; Viva o Barão / Meet the Baron / 1933; Palooka / 1934; Escândalos da Broadway / George White’s Scandals / 1934; Festa de Hollywood / Hollywood Party / 1934; Dinamite … E Nada Mais / Strictly Dynamite / 1934; Ela e os Três Marujos / She Learned About Sailors / 1934; Folias de Estudantes  / Student Tour / 1934; Carnaval da Vida / Carnival / 1935; Três Moças Sabidas / Sally, Irene and Mary / 1938: Mocidade Gloriosa / Start Cheering / 1938; Miss Broadway / Little Miss Broadway / 1938; Land Without Music (Produção britânica exibida nos EE.UU. como Forbidden Music)/ 1938; Valentia Adquirida / Melody Ranch / 1940; Pode Ser ou Está Difícil? /You’re In the Army Now / 1941; Satã Janta Conosco / The Man Who Came to Dinner / 1942; Duas Garotas e um Marujo / Two Girls and a Sailor / 1944; Música para Milhões / Music for Millions / 1945; O Rouxinol Mentiroso / Two Sisters from Boston / 1946; Aconteceu Assim / It Happened in Brooklyn / 1947; Saudade de teus Lábios / This Time for Keeps / 1947; Numa Ilha com Você / On An Island With You / 1948; The Great Rupert / 1950; O Leiteiro / The Milk Man / 1950; O Prefeito se Diverte / Beau James (cameo) / 1957; Pepe / Pepe / 1960; Jumbo / Billie Rose’s Jumbo / 1962; Deu a Louca no Mundo / It’s a Mad, Mad, Mad, Mad World / 1963.

JULIAN ELTINGE (William Julian Eltinge, 1883 – 1941) – Julian foi um dos transformistas mais famosos de todos os tempos, cognominado por sua beleza o  “Mr. Lillian Russell de nosso tempo”. Ele se vestiu pela primeira vez de mulher aos dez anos de idade, quando surgiu na Boston Cadets Revue no Tremont Theater em Boston. Julian chamou a atenção de vários empresários teatrais e logo já estava trabalhando em pequenas produções através do país. A maior chance de Eltinge ocorreu em 1904, quando ele se apresentou em Mr. Wix of Wickham, comédia musical com música de Jerome Kern, que ajudou a firmar sua reputação como artista. Eltinge começou a  atuar no vaudeville, excursionando em 1906 pela Europa e Estados Unidos, apresentando-se inclusive diante do Rei Edward VII em Londres.

Em 1907, ele  fez a sua estréia em Nova York no Alhambra Theater, obtendo o louvor da crítica. Numa entrevista concedida em 1909, Eltinge explicou que levava duas horas para se transformar num mulher com a ajuda de seu camareiro japonês, Shima e que, dessas duas horas, uma era dedicada à maquilagem. Em 1911, The Fascinating Widow estreou no Liberty Theatre. Tal como em futuras peças e filmes, Julian Eltinge fazia um papel duplo: o de Mrs. Monte e o de Hal Blake. Ele era Hal Blake, que se disfarçava de “Mrs. Monte”, numa trama parecida com a de Charley’s Aunt (A Tia de Carlito). O êxito deste espetáculo levou o produtor A. H. Woods a inaugurar o Eltinge Theatre em Nova York – uma das maiores honrarias que um ator poderia receber. Eltinge fez mais duas comédias, Crinoline Girl e Cousin Lucy, que seriam ambas filmadas no cinema mudo em 1914. Em 1915, ele apareceu numa ponta no filme How Molly Malone Made Good e, finalmente, obteve seu primeiro sucesso cinematográfico com

A Tentadora Condessa / The Countess Charming. Estabelecendo-se em Hollywood, Eltinge fez outros filmes entre os quais A Ilha do Amor / An Adventuress com Rudolph Valentino e Virginia Rappe. Quando Eltinge chegou à Terra do Cinema, ele era um dos artistas mais bem pagos do teatro americano; mas com a Grande Depressão e a morte do vaudeville, a estrela de Eltinge começou a perder o brilho. Ele continuou a mostrar seu show em boates porém teve pouco êxito. Ao contrário de muitos números de female impersonation, ele não apresentava uma caricatura das mulheres mas a ilusão de realmente ser uma mulher. Ele se anunciava simplesmente como “Eltinge”, o que deixava seu sexo desconhecido e, na conclusão de sua performance, retirava a peruca, revelando a sua verdadeira natureza para surpresa da platéia. As mulheres ficavam tão encantadas com suas performances, que ele criou o Eltinge Magazine, para lhes dar conselhos sobre beleza e moda. Em 1920, Eltinge estava muito rico e vivendo numa das mais luxuosas mansões do Sul da Califórnia, “Villa Capistrano”. À parte a graciosa feminilidade que ele exibia no palco, Eltinge usava uma fachada super-masculina em público, para combater os rumores  de sua homossexualidade. Esta fachada incluía brigas de bar, compromissos com mulheres (embora ele nunca tivesse se casado), ataques físicos aos operários cênicos, espectadores e outras pessoas que fizessem comentários sobre sua sexualidade. Sua dualidade sexual gerou a criação do termo “ambisextruous” para descrevê-lo.

Filmes: Crinoline Girl / 1914; Cousin Lucy / 1914; How Molly Malone Made Good (cameo) / 1915; A Tentadora Condessa / The Countess Charming / 1917; Mme. Carfax / The Clever Mrs. Carfax / 1917; O Poder da Viúva / The Widow’s Night / 1918; Princess Martini / 1918; A Ilha do Amores / An Adventuress / 1920 (também conhecido como Over the Rhine e The Isle of Love); Madame Charleston  / Madame Behave / 1925; The Fascinating Widow / 1925; The Voice of Hollywood nº 3 (short); Intrigas do Sexo / Maid to Order / 1931; Se Fosse Eu / If I Had My Way / 1940.

CONEXÃO VAUDEVILLE – CINEMA I

março 26, 2012

Por muitos anos o vaudeville foi a forma de entretenimento mais popular nos Estados Unidos. No final do século dezenove, o termo vaudeville designava uma série de oito a dez números de variedades, sem nenhuma relação narrativa ou temática entre eles, que se sucediam continuamente no palco, tais como cantores, comediantes, músicos, dançarinos, animais adestrados, transformistas, acrobatas, equilibristas, “mentalistas” (transmissão de pensamento), mágicos, “playlets” (cenas de peças de teatro populares na época), declamações, etc.

Esta forma de diversão tinha muitos parentes próximos ou distantes na família das variedades a saber: o medicine show, pequena trupe itinerante cujas performances serviam principalmente para anunciar remédios “milagrosos” de curandeiros; o circo, com sua ênfase nos palhaços, acrobatas e animais adestrados; o dime museum, precursor do sideshow, expondo criaturas deformadas e aberrações da natureza; o minstrel show, revista musical com números apresentados por atores brancos maquilados de negros tocando banjo, pandeiro e castanholas, intercalados por diálogos cômicos; o music hall inglês; e o chautauqua, espécie de espetáculo de variedades intelectual, combinando palestras, poesia, recitais de música e um humor mais refinado.

O programa do vaudeville era dividido em duas partes com um intervalo no meio. O ator principal (headliner) sempre aparecia no número imediatamente anterior ao intervalo e no penúltimo número do programa. O espetáculo abria com um “dumb act”, normalmente um animal adestrado ou um acrobata. “Dumb” (mudo, silencioso) não se referia à qualidade do número mas ao fato de que ele não dependia de som e, portanto,  era apropriado para ser usado como número de abertura ou de encerramento, quando os espectadores estavam entrando ou saindo ruidosamente do teatro. O “dumb act” de encerramento era chamado de “chaser”, porque tinha o objetivo de “expulsar” os espectadores, a fim de que desocupassem seus lugares para novos fregueses.

Os filmes curtos (aproximadamente de dez minutos), exibidos pelos primeiros projetores (Vitascópio, Cinematógrafo), inicialmente serviam como “chasers” na vasta rede de teatros de vaudeville do país, pertencentes a empreendedores como Antonio “Tony” Pastor (“O Pai do Vaudeville”), Benjamin Franklin Keith (B.F. Keith), Edward Franklin Albee, Frederick Freeman (“F.F.”) Proctor, Henry Miner, Oscar Hammerstein, Sylvester Poli, Percy Williams, John W. Considine, Pericles Pantages, C. E. Kohl e George Castle, John Koster e Adam Bial, Morris Meyerfeld, Martin Beck, etc. O Vitascópio estreou no dia 23 de abril de 1896 no Koster’s and Bial’s Music Hall e o cinematógrafo no Keith’s Union Square Theatre no dia 29 de junho do mesmo ano. Os principais teatros de vaudeville eram o Palace Theatre, o Victoria, o Hippodrome, o Colonial e o Alhambra.

Para manter seus teatros lotados, os ditos empresários procuravam sempre novos números, notadamente espetáculos visuais tais como marionetes, projeção de sombras feitas com a mão, living pictures (modelos imóveis em poses recriando quadros ou estátuas famosos) e apresentações de lanterna mágica. A projeção de filmes foi a última novidade a ser mostrada num palco como espetáculo visual.

Em 1905, surgiram  os primeiros cinemas (store front theatres ou nickelodeons), que se tornaram os locais predominantes de exibição de filmes e assim permaneceram até o início dos anos dez, quando começaram a ser construídos os grandes cinemas (movie palaces). Quatro dos maiores estúdios de Holywood – Loew’s (MGM), Paramount, Fox e RKO – tinham laços históricos com a indústria do vaudeville. Marcus Loew, Adolph Zukor e William Fox possuiram uma cadeia de teatros de vaudeville e a RKO foi criada pela fusão da Radio Pictures com os circuitos de vaudeville Keith (Keith / Albee) e  Orpheum (Meyerfeld / Beck).

Inspiradas pelo êxito do vaudeville, outras formas de competição ao vivo emergiram no século vinte. Os produtores da Broadway e os donos de buates atraíram alguns dos melhores artistas do vaudeville, oferecendo-lhes altos salários. O pioneiro neste campo foi Florenz Ziegfeld, cujo Follies foi inaugurado em 1907. O Follies combinou elementos do vaudeville e do teatro burlesco ( lindas garotas despidas) e os envolveu com o luxo dos espetáculos musicais da Broadway; porém Ziegfeld não foi o único empresário de revistas. Outros surgiram através dos tempos: a série Passing Show apresentada pelos Shuberts, George White’s Scandals, Earl Carrol’s Vanities, Greenwich Village Follies, Music Box Revues, etc.

Alguns artistas continuaram a atuar ao mesmo tempo no vaudeville e nas revistas (vg. as cantoras Nora Bayes, Belle Baker, Eva Tanguay, Ruth Etting) mas muitos disseram adeus aos circuitos de vaudeville, trocando-os pelo maior prestígio e remuneração que teriam nos palcos do teatro de revista. Entre os artistas que deram esse salto estavam Leon Errol, Bert Williams, Ed Wynn, W.C. Fields, Will Rogers e Eddie Cantor. Outros artistas abandonariam os circuitos de vaudeville para estrelar musicais da Broadway (vg. George M. Cohan, Al Jolson, Vernon e Irene Castle, Fred e Adele Astaire) ou atuar em shows de cabaré ou em speakeasies, buates que vendiam bebidas ilegais durante a Depressão (vg. Jimmy Durante, Texas Guinan, Helen Morgan).

Nos meados dos anos dez, alguns desenvolvimentos no mundo cinematográfico tiveram um impacto profundo sobre o vaudeville. Em 1912, Mack Sennett contratou alguns pequenos artistas do vaudeville para as suas comédias Keystone, entre eles, Fred Mace, Ford Serling e Roscoe “Fatty” Arbuckle.  Quando Sennett arrebatou Charles Chaplin da trupe de Fred Karno em 1913 e ele se tornou uma sensação da noite para o dia, um grupo de talentosos vaudevillians como W.C. Fields, Buster Keaton, Larry Semon, Will Rogers, Harry Houdini, Bert Williams, Weber e Fields, Eddie Foy, Moran e Mack, as Irmãs Duncan, as Irmãs Dolly, etc. – trilharam o caminho para Hollywood.

Mais devastadora para a indústria do vaudeville foi o incremento do filme de longa-metragem. Um por um, os teatros de vaudeville se transformaram em cinemas. Estes ainda incluíam alguns números de vaudeville no programa mas não havia muito espaço para artistas ao vivo em torno de um filme de longa-metragem.

Em 1919 existiam cerca de mil teatros de vaudeville nos Estados Unidos. Em 1921 estimava-se que um quarto dos teatros que haviam oferecido tanto filmes como vaudeville deixaram de apresentar os espetáculos de vaudeville. A nova moda passou a ser as “presentation houses” – grandes cinemas que também ofereciam entretenimento ao vivo, tais como grandes orquestras e números de comédia popular. Estes cinemas eram enormes: o Roxy tinha 6.200 lugares, o Capitol tinha 5.300 lugares; o Loew’s State, tinha 3.500 lugares, o Rivoli tinha 2.100 lugares, destacando-se também o Rialto, Paramount e Strand.

Em 1926,  uma nova audiência nacional para o vaudeville acabara de ser forjada: o rádio. Três milhões de lares americanos já possuíam aparelhos de rádio em 1927. No final dos anos 30, o número havia aumentado dez vezes. Astros do vaudeville como Eddie Cantor, Burns e Allen, Fred Allen, Jack Benny, Ed Wynn, Fanny Brice, Edgar Bergen e todos os grandes chefes de orquestra da época tornaram-se grandes astros do rádio.

O advento do som deu o golpe de misericórdia no vaudeville. A Warner Bros. adotou o sistema de som-em-disco Vitafone e em 1927, foi lançado o primeiro filme parcialmente falado, O Cantor de Jazz / The Jazz Singer, estrelado por Al Jolson. A partir daí, todos os grandes cantores e comediantes do vaudeville começaram a fazer Vitaphone shorts (ironicamente, a Warner foi o único dos cinco grandes estúdios de Hollywood que não havia sido criado por antigos empresários do vaudeville).

Houve duas razões para a invasão dos artistas de vaudeville no cinema: primeiro, porque oferecia às celebridades do cinema uma oportunidade de provar aos donos de seus estúdios que eles podiam falar, cantar e dançar, provando assim que estavam aptos para trabalhar nos talkies; segundo, porque era um meio de reativar uma carreira em declínio ou, em muitos casos,  condenada à extinção.

Mesmo antes da estréia de O Cantor de Jazz um ou outro astro do cinema mudo havia experimentado atuar no vaudeville. Conforme Anthony Slide (The Vaudevillians, Arlington House, 1981), em dezembro de 1914, Crane Wilbur que havia sido o parceiro da Rainha do Seriado, Pearl White, apareceu no palco do Teatro Poli em Springfield. Francis X. Bushman e Beverly Bayne, par romântico dos anos dez, apareceu em um esquete cômico, “Poor Rich Man”, no Palace, em fevereiro de 1921. Henry B. Walthall, um dos atores de O Nascimento de uma Nação / The Birth of a Nation, fez sua estréia no vaudeville no Hill Street Theatre em Los Angeles em maio de 1922 em um playlet de vinte minutos, “The Unknown. Dorothy Gish recusou uma proposta para aparecer no vaudeville em 1921 porém Bebe Daniels, uma grande estrela da Paramount, participou de espetáculos de vaudeville em Buffalo e Detroit no verão de 1923. Betty Blythe, cuja carreira cinematográfica estava quase em decadência, era a primeira atração do Palace em agosto de 1926. Esses são apenas alguns exemplos, pois Slide cita ainda as experiências no vaudeville, algumas frustradas, como a de Anita Stewart, Bryant Washburn, Anna May Wong, Helen Holmes e outras bem sucedidas, como as de Ruth Roland, Tom Mix, Ricardo Cortez.

Por volta de 1929, os maiores artistas do vaudeville  como os Irmãos Marx, Joe E. Brown e Eddie Cantor estavam fazendo filmes sonoros. Logo, eles seriam acompanhados nas telas por Bill Robinson, Will Rogers, Os Três Patetas, Wheeler e Woolsey, Mae West, os Ritz Brothers e muitos outros.

Durante os anos 30 e 40, Hollywood produziu inúmeros “revue films” (filmes revista), entremeados de números de vaudeville, criados especificamente para o cinema. Entre eles posso apontar: a série Gold Diggers (Mordedoras / The Gold Diggers of Broadway / 1929, Cavadoras de Ouro / The Gold Diggers of 1933 / 1933; Mordedoras de 1935 / The Gold Diggers of 1935 / 1935, Cavadoras de Ouro de 1937 / The  Gold Diggers of 1937 / 1936;  Cavadoras em Paris / The Gold Diggers in Paris / 1938); Follies / Fox Follies of 1929;  a série Broadway Melody (Broadway Melody / The Broadway Melody / 1929, Broadway Melody de 1936 / Broadway Melody of 1936 / 1935; Broadway Melody de 1940 / Broadway Melody of 1940 / 1940; a série The Big Broadcast (Ondas Musicais / The Big Broadcast  / 1932 / 1932; Ondas Sonoras de 1936 / The Big Broadcast of 1936 / 1935 ; Ondas Sonoras de 1937 / The Big Broadcast of 1937 / 1936; Folia a Bordo / The Big Broadcast of 1938); a série George White’s Scandals (Escândalos da Broadway / George White Scandals of 1934 / 1934; Escândalos da Broadway de 1935 / George White Scandals of 1935 (reintitulado George White’s 1935 Scandals) / 1935; Turbilhão de Melodias / George White Scandals of 1945 / 1945; Hollywood Revue / The Hollywood Revue of 1929; Torre de Babel / International House /1933, Noivas de Tio Sam / Stage Door Canteen /1943 e outros.

Foram feitas também várias cinebiografias de artistas do vaudeville: A História de Vernon e Irene Castle / The Story of Vernon and Irene Castle / 1939; A Bela Lillian Russell / Lillian Russel / 1940; A Canção da Vitória / Yankee Doodle Dandy / 1942 (George M. Cohan); Melodia de Amor / Shine on Harvest Moon / 1944 (Nora Baynes); As Irmãs Dolly / The Dolly Sisters / 1945; Chispa de Fogo / Incendiary Blonde / 1945 (Texas Guinan);  Sonhos Dourados / The Jolson Story / 1946 e O Trovador Inolvidável / Jolson Sings Again / 1949; A História de Will Rogers / The Story of Will Rogers / 1952; A Louca Aventura / The I Don’t Care Girl / 1953 (Eva Tanguay); Nas Asas da Fama / The Eddie Cantor Story / 1953; Houdini – O Homem Miraculoso / Houdini / 1953; Ama-me ou Esquece-me / Love me or Leave me / 1955 (Ruth Etting), Um Coringa e Sete Ases / The Seven Little Foys / 1955 (Eddie Foy); Com Lágrimas na Voz / The Helen Morgan Story / 1957; O Palhaço que não Ri / The Buster Keaton Story / 1957; Funny Girl – A Garota Genial / Funny Girl / 1968 (Fanny Brice); Frenesí de Glória / W.C. Fields and Me / 1976, etc.

Alguns historiadores afirmam que o espetáculo de vaudeville derradeiro teve lugar no Loew’s State em 1947 mas sabe-se que o Palace Theater (conhecido como o “Valhalha do Vaudeville’) voltou a adotar a política de intercalar vaudeville com filmes de Hollywood de 1949 a 1957. Houve também outros esforços para “reavivar” o vaudeville como o do colunista Walter Winchell. Ele foi responsável pelo sucesso de Hellzapoppin, um espetáculo que havia sido criticado acerbamente pelos comentaristas de Nova York. Esta revista absurda, protagonizada pela dupla Olsen e Johnson, estreou em 1938 e foi um sucesso  de público extraordinário. Transposta para a tela em 1941, recebeu no Brasil o título de Pandemônio.

No final dos anos 30, sob o governo do Presidente Roosevelt, o Federal Theatre Project, uma divisão da Works Progress Administration, tinha uma unidade de vaudeville. Durante a Segunda Guerra Mundial, a United Service Organization (USO) usou os serviços de muitos artistas de vaudeville (Joe E. Brown e Bob Hope foram os que mais se destacaram neste serviço) para divertir os pracinhas no exterior. Na frente doméstica, a USO utilizou-os na Hollywood Canteen, onde toda noite uma grande orquestra tocava e os homens de uniforme podiam dançar com as estrelas glamourosas, que também serviam as mesas e lavavam os pratos. Hotéis de veraneio em Catskill Mountains, Miami, Atlantic City e Las Vegas, buates e parques de diversão continuaram a programar talentos ao vivo. E, finalmente, pouco após a apresentação do último show de vaudeville no Loew’s Theater em 1947, o Variety publicou um anúncio dizendo: “Vaudeville is Back! The Golden Era of Variety begins with the Premiere of Texaco Star Theatre on Television”(O Vaudeville está de Volta! A Era do Teatro de Variedades começa com a Estréia do Texaco Star Theatre na Televisão).

Segundo Trav S.D. (No Applause – Just Throw Money, Faber and Faber, 2005), o programa citado, de Milton Berle, foi acompanhado naquele mesmo ano pelo programa de Ed Sullivan, Toast of the Town; no ano seguinte acompanhado por The Admiral Broadway Revue, estrelado por Sid Caesar e por Cavalcade of Stars, liderado primeiramente por Jack Carter e mais tarde por Jackie Gleason. Em 1950, estrearam The Ken Murray Show, The Colgate Comedy Hour (com convidados como Eddie Cantor, Bob Hope, e Jimmy Durante) e The Four Star Revue (com Durante, Ed Wynn, Danny Thomas e Jack Carson alternando como anfitriões). O Red Skelton Show foi lançado em 1951 e o Red Buttons Show, em 1952. The Tonight Show, conduzido por Steve Allen começou em 1954. Em 1964, um variety show chamado The Hollywood Palace, especificamente modelado no velho formato do vaudeville, teve início na ABC e se manteve em boa posição nas pesquisas de audiência até seu desaparecimento em 1970. Bob Hope e Jack Benny fizeram inúmeros “especiais” de televisão com o formato de variedades. Groucho Marx e Fred Allen tinham seus próprios quiz shows (programas de perguntas),  You Bet Your Life e What’s My Line? respectivamente.

Nos verbetes que se seguem, descrevo sucintamente (neste e nos próximos artigos) alguns dos  principais artistas de vaudeville americanos, que tiveram alguma ligação com o cinema:

FRED ALLEN (John Florence Sullivan, 1894-1956) – Estreou no vaudeville no início de 1910 como equilibrista e ventríloquo Em 1922, ainda no vaudeville, tornou-se uma atração principal como comediante e depois foi para o Teatro de Revista. Posteriormente, tornou-se muito conhecido no rádio com o “The Fred Allen Show” (1939-1949) e, finalmente, aderiu à televisão, integrando o painel do programa,  ”What’s My Line”. Sua mulher, Portland Hoffa, foi sua parceira no vaudeville e no rádio durante muitos anos. Filmes: Mil Vezes Obrigado / Thanks a Million / 1935; Três Moças Sabidas / Sally, Irene and Mary / 1938; Dois Bicudos não se Beijam / Love Thy Neighbour / 1941; Está no Papo / It’s in the Bag / 1945; Travessuras de Casados / We’re Not Married / 1952; Páginas da Vida / O Henry’s Full House / 1953.

BELLE BAKER (Bella Baker, 1895-1957) – foi uma das grandes cantoras do vaudeville, onde estreou em 1911 e manteve uma amizade com Irving Berlin, que escreveu várias canções para ela. Em 1926, Belle integrou o elenco de uma revista de Florenz Ziegfeld, “Betsy”, que, no entanto, ficou pouquíssimo tempo em cartaz. Em 1929, entrou no elenco de uma produção da Columbia intitulada The Song of Love e, mais tarde, participaria de um outro filme, Atlantic City / Atlantic City / 1944. Belle voltou ao vaudeville em 1932, quando apresentou um de seus maiores êxitos: “All of Me”. Em 1934 ela foi atração principal ao lado de Beatrice Lillie num espetáculo no London Palladium e participou de um filme inglês, Charing Cross Road, lançado no ano seguinte. Em 1936, Belle estreou na boate Versailles Club de Nova York  (depois de ter trabalhado em Londres no Kit Kat e no Café de Paris). Suas aparições no palco  diminuiram nos anos quarenta  e ela fez sua última aparição em público em 1950.

BARBETTE (Vander Clyde, 1904-1973) – Como transformista, Barbette era único, porque aparecia como uma extraordinária mulher trapezista, eletrizando as platéias do vaudeville dos anos dez e deliciando a sociedade parisiense nos anos vinte. Aos quatorze anos de idade, Vander Clyde respondeu um anúncio colocado por uma das Alfaretta Sisters, que eram conhecidas como “Word Famous Aerial Queens”. Uma das irmãs havia falecido e a outra estava procurando um parceiro. Ela explicou ao rapaz que o público ficava mais impressionado com mulheres trapezistas e sugeriu que ele se vestisse como uma moça. Aos poucos, Barbette desenvolveu um número sozinho e logo se tornou uma grande atração. Em 1923, apresentou-se no casino de Paris e foi o sucesso da noite, aparecendo num vestido branco coberto de penas de avestruz e terminando seu número com um “chute d’ange” do trapézio para o tapete branco do palco. Quando ele tirou sua peruca e tomou a posição de um pugilista profissional, a platéia ficou enlouquecida. Nos anos seguintes, Barbette foi um dos astros mais populares do cabaré na França. Seu amigo, Jean Cocteau, disse: ”Ele é um anjo, uma flor, um pássaro”. Em 1930, o cineasta colocou Barbette  travestido no seu filme  Le Sang d’un Poete. O filme de Hitchcock, Murder! / 1930, apresenta um trapezista homossexual transformista como o assassino e não resta dúvida de que este personagem foi baseado em Barbette.

NORA BAYES (Eleanor ou Leonora Goldberg, 1880-1928). Ninguém era capaz de dramatizar uma canção como ela.  Nora foi um dos grandes nomes do vaudeville no mesmo nível de Elsie Janis e Eva Tanguay. Ela trabalhou também sob contrato de Florenz Ziegfeld no Follies de 1908 juntamente com seu marido, o compositor Jack Norworth, e em outras revistas musicais. A vida do casal foi filmada em 1944 pela Warner sob o título de Melodia do Amor / Shine on Harvest Moon com Ann Sheridan e Dennis Morgan. Após seu divórcio de Norworth, Nora voltou para o vaudeville, sendo anunciada como “The Greatest Single Woman Singing Comedienne in the World”. Durante a Primeira Guerra Mundial, ela divertiu as tropas e lançou em 1917 a canção mais famosa de tempo de guerra, “Over There”, de autoria de George M. Cohan.

JACK BENNY (Benjamin Kubelski, 1894-1974) –  Célebre comediante do rádio, da TV e, ocasionalmente, do cinema. Seu inimitável olhar repreensivo e seu violino odioso, seu timing perfeito e o uso supremo da pausa para arrancar risadas, mantiveram sua popularidade intacta por muitos anos. Benny começou no vaudeville fazendo dupla com Cora Salisbury: ela tocava piano e ele violino e seu número era anunciado como “From Grand Opera to Ragtime”. Quando a America entrou na Primeira Guerra Mundial ele se alistou na Marinha e alí descobriu seu talento para a comédia, divertindo as tropas com solos de violino entremeados com piadas. Depois da guerra, Benny retornou ao vaudeville sozinho, chamando-se inicialmente Ben K. Benny; mas depois mudou de nome. Além do vaudeville,  Jack Benny trabalhou em buates e na  revista Earl Carroll’s Vanities. Em 1927, ele se agrupou com um grupo musical chamado The New Yorkers e depois retornou ao vaudeville. Seu programa de rádio, “The Jack Benny Program”, entrou no ar em 1 de outubro de 1944. Em poucos anos alguns artistas se tornaram familiares no seu programa: o locutor Don Wilson, Eddie Anderson como Rochester, o cantor Dennis Day, o chefe de orquestra Phil Harris, Mel Blanc (conhecido por ter emprestado a voz para o Coelho Pernalonga / Bugs Bunny e do Picapau / Woody Woodpecker) e a mulher de Benny, Mary Livingstone. O “Jack Benny Program” passou para a televisão e ficou no ar de 1950 a 1965. Filmes: Hollywood Revue of 1929 / 1929; No Mundo da Lua / Chasing Rainbows / 1930; Medicine Man / 1930; Folias Transatlânticas / Transatlantic Merry-Go-Round /1934; Broadway Melody de 1936 / Broadway Melody of 1936 / 1935; Dois Águias em Vôo / It’s in the Air/ 1935; Ondas Sonoras de 1937 / The Big Broadcast of 1937/ 1936; Alegria à Solta College Holiday / 1936; Artistas e Modelos / Artists and Models / 1937; No Turbilhão Parisiense / Artists and Models Abroad / 1938; O Terror dos Maridos / Man About Town / 1939; Romeu a Cavalo / Buck Benny Rides Again / 1939; Dois Bicudos não se Beijam / Love Thy Neighbour / 1940; A Tia de Carlito / Charley’s Aunt / 1941; Ser ou Não Ser /To Be or Not To Be / 1942; Mania de Antiguidades / George Washington Slept Here / 1942; O Maior Sovina do Mundo / The Meanest Man in the World / 1943; Um Sonho em Hollywood / Hollywood Canteen / 1944; Está no Papo / It’s in the Bag / 1945; The Horn Blows at Midnight / 1945; Diário de um Homem Casado / A Guide for the Married Man / 1967. Cameos em: Romance e Fantasia / Without Reservations / 1945; O Prefeito se Diverte / Beau James / 1957; Deu a Louca no Mundo / It’s a Mad, Mad, Mad, Mad  World / 1963.

EDGAR BERGEN (Edgar Breggen, 1903-1978). Americano de origem sueca, Bergen divertiu o público com os seus bonecos Charlie McCarthy e  Mortimer Snerd, que eram seus alter egos. Quando ele fazia seu número de ventríloquo  as pessoas se encantavam com o seu humor gentil e se esqueciam de que seus lábios se moviam. Em 1930, Bergen e Charlie fizeram a sua primeira aparição numa série de filmes curtos da Vitafone porém a grande chance para a dupla chegou em 1936, quando eles apareceram como convidados no programa de rádio de Rudy Vallee. Em 1937 Bergen e Charlie iniciaram o seu próprio programa radiofônico, que ficou no ar pelos próximos vinte anos. No rádio, Bergen introduziu outros bonecos como Effie Klinger; Ophelia; Maisie e Matilda; Podine Puffington; Lars Lindquist; e Gloria Graham. Depois de participar de vários filmes, inclusive como coadjuvante sem o boneco, Bergen anunciou seu afastamento do show business e que Charlie McCarthy seria legado ao Smithsonian Institution. Charlie retrucou: “Bem, pelo menos eu não serei o único boneco em Washington”. Filmes: Goldwyn Follies / The Goldwyn Follies /  1938; Um Dia de Promessa / Letter of Introduction / 1938; Quem Mal Anda, Mal Acaba / You Can’t Cheat an Honest Man / 1939; Charlie McCarthy Detetive / Charlie McCarthy Detective / 1939; Quem Se Ri Por Último / Look Who’s Laughing / 1941; Ursadas e Peruadas / Here We Go Again / 1942; Noivas de Tio Sam / Stage Door Canteen / 1943; Viva a Juventude / Song of the Open Road / 1944; Pongo / Fun and Fancy Free / 1947; A Vida de um Sonho / I Remember Mama / 1948; Capitão China / Captain China / 1949; One – Way Wahine / 1966;  Não Faça Onda / Don’t Make Waves / 1967. Cameos: Conjunto de Espiões / The Phynx / 1970; Won-Ton-Ton o C Won Ton Ton – The Dog That Saved Hollywood / 19 76; The Muppet Movie / 1979.

MILTON BERLE  (Milton Berlinger, 1908- 2002) – Berle entrou para o vaudeville ainda criança  e teve sua grande chance na nova montagem de “Florodora” como parte de um Baby Sextette, seis meninos e meninas que cantavam  a canção de sucesso do espetáculo, “Tell Me Pretty Maiden”. Em 1921, ele formou uma dupla com Elizabeth Kennedy em um número de vaudeville intitulado Kennedy e Berle Berle estreou sozinho em 1924 e foi adquirindo popularidade, passando depois a atuar em boates, onde suas piadas eram ajustadas deliberadamente para insultar os fregueses. Por exemplo, ele se dirigia a um dos frequentadores do local e dizia: “Oh, temos novidade; o senhor está acompanhado de sua esposa”. No rádio, ele ficou no ar de 1934 a 1948. Seu programa mais conhecido foi a série “Let Yourself Go”, que encorajava o ouvinte a fazer exatamente aquilo e a expressar seus desejos secretos. Berle esteve nas telas desde o cinema mudo, fazendo “pontas” no seriado de Pearl White, The Perils of Pauline e em outros filmes rodados em Fort Lee, New Jersey. Porém o seu maior êxito foi na televisão no “The Texaco Star Theater”, que depois se chamou “The Milton Berle Show” e assim continuou até 1956, quando foi cancelado. Ele praticamente dominou a televisão entre 1948 e 1956 a ponto de ser nomeado “Mr. Television” ou, mais afetuosamente,  “Tio Miltie”.  Filmes sonoros: Caras Novas de 1937 / New Faces of 1937; Folias de Radio City / Radio City Revels / 1938; Alto, Moreno e Simpático / Tall, Dark and Handsome / 1941; Quero Casar-me Contigo / Sun Valley Serenade / 1941; O Bamba da Pelota / Rise and Shine / 1941; Um Blefe Formidável / A Gentleman at Heart / 1942; Veleiro Fantasma / Whispering Ghosts / 1942; Over My Dead Body / 1942; Um Pequeno Erro / Margin for Error / 1943; O Mundo de um Palhaço / Always Leave Them Laughing / 1949; Deu a Louca no Mundo / It’s a Mad, Mad, Mad., Mad World / 1963; Confidências de Hollywood / The Oscar / 1965; O Ente Querido / The Loved One / 1965; Don’t Worry We’ll Think of a Title / 1966; Acontece Cada Coisa / The Happening / 1967; Quem está Guardando esta Erva? / Who’s Minding the Mint? / 1967; For Singles Only / 1968; Can Heironymous Merkin Ever Forget Mercy Humppe and Find True Happinness? / 1969; Regresso ao Mundo Maravilhoso de Oz / Journey Back to Oz (somente a voz do Leão Covarde) / 1974; Lepke / Lepke / 1975; Won Ton Ton – O Cachorro Que Salvou Hollywood / Won Ton Ton – The Dog That Saved Hollywood / 1976; O Mundo Mágico dos Muppets / /The Muppet Movie / 1980; Broadway Danny Rose / Broadway Danny Rose / 1984; As Loucuras de Jerry Lewis / Smorgasbord / 1985; Driving me Crazy / 1992; Storybook / 1996.

FANNY BRICE (Fannie Borach, 1891-1951). Fanny ficava sempre à vontade tanto interpretando canções cômicas como letras de música trágicas. Ela era uma grande cantora de fossa, como ficou evidenciado na interpretação de sua canção mais famosa, “My Man”. Magra e comprida, com olhos em forma de meia lua e um nariz de papagaio, sorriso largo e forte sotaque yddish, a popular artista era muito engraçada, principalmente quando compunha o tipo de uma vamp cinematográfica ou de uma madame da alta sociedade. Depois de se apresentar como amadora num teatro do Brooklyn, cantando  – com lágrimas de emoção – “You Know You’re Not Forgotten by the Girl You Can’t Forget”, Fanny fez um teste com George M. Cohan mas foi reprovada porque não sabia dançar. Ela então excursionou com uma companhia de teatro burlesco, até ser vista por Florenz Ziegfeld, que estava escolhendo o elenco de sua Follies de 1910. Quando o espetáculo estreou no New York Theatre em 20 de junho de 1910, inquestionavelmente uma estrela acabara de nascer. Ziegfeld colocou Fanny como atração principal de sua Follies de 1911, 1916, 1917, 1920, 1921 e 1923 mas o célebre show man nunca lhe deu oportunidade de fazer outra coisa senão comédia. Depois ela foi estrela na “Music Box Revue”(1924-1925) e em peças da Broadway. Fanny se tornou uma favorita do público também no vaudeville. Ela estreou no Palace em fevereiro de 1914 e seria uma artista habitual no gênero pelos próximos vinte anos. Um primeiro casamento, quando ela era ainda adolescente com Grant White logo se dissolveu tal como seu segundo matrimônio, em 1918, com o jogador Nick Arnstein (que inspirou a canção “My Man”).

Em 1930, Fanny casou-se com Billy Rose porém divorciou-se dele oito anos depois. A caracterização mais famosa de Fanny Brice foi a de Baby Snooks. A personagem apareceu pela primeira vez no rádio  em 29 de fevereiro de 1936 e continuou no ar intermitentemente até a sua morte. Suas aparições no cinema foram poucas: My Man / 1928; Night Club / 1929 (curta-metragem); Astúcia Feminina / Be Yourself / 1930; Ziegfeld, o Criador de Estrelas / The Great Ziegfeld / 1936; Diabinho de Saias / Everybody Sing / 1938; Ziegfeld Follies / Ziegfeld Follies / 1945.

A história de sua vida foi o tema de um musical da Broadway e do filme Funny GirlA Garota Genial / Funny Girl / /1968 e de sua continuação, Funny Lady / Funny Lady / 1975, ambos com Barbra Streisand. Referências ligeiramente disfarçadas sobre sua intimidade foram também feitas em Luzes da Broadway / Broadway Thru a Keyhole / 1933 com Constance Cummings e O Meu Amado / Rose of Washington Square / 1939 com Alice Faye.

MICHAEL CURTIZ II

março 8, 2012

Michael Kertesz chegou em Nova York na noite de domingo do dia 6 de junho de 1926. Albert Warner, o terceiro dos irmãos Warner e tesoureiro do estúdio reteve-o na cidade  uma semana à espera do regresso de Harry de Chicago. Assim que este chegou, e uma vez resolvidos vários assuntos legais, entre eles a mudança do nome artístico do diretor de Kertesz para Curtiz, eles partiram para Hollywood. Contratado da Warner durante a maior parte de sua carreira, Curtiz tornou-se o diretor mais importante do estúdio, odiado pelos atores e técnicos por suas grosserias, ridicularizado pelo seu inglês errôneo (“Bring on the empty horses”) e monitorado constantemente pelos produtores por seu perfeccionismo.

De 1926 a 1961, Michael Curtiz fez 102 filmes, dos quais pude assistir 73. Na filmografia que se segue, destaco os que mais me agradaram (sem deixar de apreciar muitos outros de seu extenso currículo) e assinalo com um * os filmes que não assistí.

FILMOGRAFIA

A TORTURA / The Third Degree / 1926 (*); O SACRIFÍCIO / A Million Bid / 1927 (*); MULHER DESEJADA / The Desired Woman (*); NOBREZA E VILANIA / Good Time Charley / 1927 (*); FLOR DO LODO / Tenderloin / 1928 (*); A ARCA DE NOÉ / Noah’s Arc / 1929; The Glad Rag Doll / 1929 (*); A MADONA DA AVENIDA  / The Madonna of Avenue A / 1929 (*); The Gamblers / 1929 (*); CORAÇÕES EM EXÍLIO / Hearts in Exile / 1929 (*); MINHA MÃE / Mammy / 1930 (*); DON JUAN DO MÉXICO / Under a Texas Moon / 1930 (*); The Matrimonial Bed / 1930 (*); Bright Lights / 1929; O MORTO-VIVO / River’s End / 1930 (*); A Soldier’s Plaything / 1930 (*); Dämon des Meeres (versão em língua alemã de “Moby Dick”, dir: Lloyd Bacon) / 1931 (*); God’s Gift to Women / 1931 (*); O GÊNIO DO MAL / The Mad Genius / 1931; A DAMA DE MONTE CARLO / The Woman from Monte Carlo / 1932 (*); GLÓRIA AMARGA / Alias the Doctor / 1932 (*); HÁ MULHERES ASSIM / The Strange Love of Molly Louvain / 1932; DOUTOR X / Doctor X / 1932; ESCRAVOS DA TERRA / Cabin in the Cotton / 1932; 20.000 ANOS EM SING SING / 20.000 Thousands Years in Sing Sing / 1932;  MUSEU DE CÊRA / Mystery of the Wax Museum / 1933; PELA FECHADURA / The Keyhole / 1933; QUANDO A SORTE SORRI / Private Detective 62 / 1933; Goodbye Again / 1933 (*); O CASO DE HILDA LAKE / The Kennel Murder Case / 1933; TU ÉS MULHER / Female / 1933; CAPRICHO BRANCO / Mandalay / 1934; BANCANDO O CAVALHEIRO / Jimmy the Gent / 1934; A CHAVE / The Key / 1934; ESPIONAGEM / British Agent / 1934; INFERNO NEGRO / Black Fury / 1935; A NOIVA CURIOSA / The Case of the Curious Bride / 1935; MISS REPÓRTER / Front Page Woman / 1935 (*); A PEQUENA DITADORA / Little Big Shot / 1935 (*);

CAPITÃO BLOOD / CAPTAIN BLOOD / 1935. Aventura de capa-e-espada baseada no romancede Rafael Sabatini, marcando o verdadeiro início (Flynn já havia feito uma ponta em A Noiva Curiosa) da colaboração entre Curtiz e Errol Flynn, que se estenderia por mais onze filmes até 1941. Flynn entrou no lugar de Robert Donat que não pôde assumir o papel principal por motivo de saúde. Olivia de Havilland, então com 19 anos, foi escolhida para interpretar Arabella, depois de cogitadas Bette Davis, Anita Louise e Jean Muir. Ação, humor e romance – fórmula básica da dupla – foram forjados com técnica e senso rítmico impecáveis. A direção de Curtiz, servida por um excelente roteiro de Casey Robinson e pela estupenda montagem de George Amy, mantém um clima de constante euforia. Ele teve à sua disposição três assistentes de direção entre eles Jean Negulesco, futuro diretor de prestígio e mais de 2 mil figurantes para as batalhas marítimas e o assalto a Port Royal, sequências complicadas nas quais os cenários de Anton Grot e as miniaturas e os efeitos especiais criados por Fred Jackman supriram a ausência, tanto de qualquer embarcação de verdade como da própria cidade portuária, tendo sido depois incorporados planos gerais de outros filmes, notadamente O Gavião do Mar / The Sea Hawk / 1924 (Dir: Frank Lloyd). O célebre duelo na praia entre Blood (Errol Flynn) e Levasseur (Basil Rathbone), orientados pelo

especialista em esgrima Fred Cavens, filmado em Laguna Beach à luz do crepúsculo, é um trecho de antologia. Mohr foi substituido temporariamente por Ernest Haller e ocasionalmente por Byron Haskin. Estreando como autor de partituras originais para Cinema, o compositor austríaco Erich Wolfgang Korngold criou, em apenas três semanas, vibrante composição de acordo com a excitante narrativa. Capitão Blood foi indicado para o Oscar, mas perdeu para O Grande Motim / Mutiny on the Bounty (Dir: Frank Lloyd). O MORTO AMBULANTE / The Walking Dead / 1936 (*);

A CARGA DA BRIGADA LIGEIRA / THE CHARGE OF THE LIGHT BRIGADE / 1936. Aventura colonialista no auge do Império Britânico, inspirada pelo poema de  Alfred, Lord Tennyson sobre a famosa carga de cavalaria ligeira suicida em Balaclava durante a Guerra da Crimeia e também na sangrenta rebelião dos cipaios em 1857, sem se preocupar com a fidelidade histórica. O ponto culminante do espetáculo é a emocionante sequência, na qual centenas de homens e cavalos correm em direção aos canhões russos, pontuada pela música excitante de Max Steiner e editadas por George Amy num ritmo acelerado à maneira de Eisenstein.

Rodada quase que inteiramente em Chatsworth, perto de Los Angeles,  com o apoio do diretor de segunda unidade B. Reeves Eason e do fotógrafo siciliano Sol (Salvador) Polito (utilizando sete câmeras para filmar 280 figurantes e 320 cavalos), a célebre carga dura 6 minutos na tela e é sem dúvida uma dos momentos mais espetaculares do Cinema. Infelizmente, durante a filmagem, vários animais tiveram que ser abatidos por causa dos ferimentos causados pelos fios colocados para provocar sua queda e um stuntman faleceu por ter caído sobre uma espada perdida, cujo cabo se encontrava fincado no solo com a lâmina apontada para cima. O filme não somente confirmou Errol Flynn e Olivia de Havilland como astros, mas também colocou Michael Curtiz no topo dos diretores de Hollywood; VENTURA ROUBADA / Stolen Holiday / 1937; JUSTIÇA HUMANA / Mountain Justice / 1937; TALHADO PARA CAMPEÃO / Kid Galahad / 1937; O HOMEM PERFEITO / The Perfect Specimen / 1937; ONDE O OURO SE ESCONDE / Gold is Where You Find It / 1938;

AS AVENTURAS DE ROBIN HOOD / THE ADVENTURES OF ROBIN HOOD / 1938. Indiscutivelmente um dos melhores filmes de aventura de todos os tempos e clássico permanente. Os chefões da Warner pensaram primeiramente em James Cagney para o papel principal, porém o ator brigou com o estúdio e finalmente eles escolheram Errol Flynn. Sob o comando de William Keighley, (acompanhado pelo fotógrafo Tony Gaudio e pelo diretor de segunda unidade B. Reeves Eason) a equipe viajou até Bidwell Park em Chico, na California, onde filmou as cenas na floresta de Sherwood e depois rumou para Busch Gardens, em Pasadena, a fim de rodar a sequência do torneio. Devido ao atraso da filmagem acumulado em quinze dias, o produtor executivo Hal Wallis substituiu Keighley por Curtiz. Enquanto este se inteirava do que já havia sido realizado e tomava as primeiras providências para o prosseguimento da produção, William Dieterle filmou durante dois dias várias cenas com atores secundários. Curtiz dispensou Tony Gaudio e colocou Sol Polito no seu lugar (a primeira sequência a cargo de Curtiz / Polito foi a da entrada de Robin no salão real com o cervo nos ombros) e refilmou algumas cenas de ação na floresta de Sherwood e no torneio. Fred Cavens ensinou Errol Flynn e Basil Rathbone  a manejarem as espadas, tal como fizera em Capitão Blood e Howard Hill instruiu Flynn no arco-e-flecha. As cenas do duelo no desenlace

iluminadas com sombras gigantescas dos esgrimistas numa das colunas do castelo jamais sairá da memória dos fãs. Os cenários foram erguidos por Carl Jules Weyl e Erich Wolfgang Korngold  compôs uma obra-prima de partitura original, sublinhando percussivamente os lances da história. Weyl, Korngold e o montador Ralph Dawson ganharam o Oscar. As Aventuras de Robin Hood foi indicado para o prêmio da Academia, mas perdeu para Da Vida Nada se


Leva / You Can’t Take it With You (Dir. Frank Capra). O novo processo Technicolor tricromático jamais se encaixou tão bem num filme, graças ao trabalho do perito W. Howard Greene, assessorado pelos fotógrafos Gaudio e Polito. O elenco muito bem escolhido (no qual sobressaiam, além do par romântico, Basil Rathbone / Sir Guy de Gisbourne, Claude Rains / Prince John, Alan Hale / Little John, Eugene Pallette / Friar Tuck e Patrick Knowles / Will Scarlet) estava em plena forma e Errol Flynn e  Olivia de Havilland interpretaram algumas de suas melhores cenas de amor. Vibrante, dinâmico e atlético, Flynn firmou-se como o maior espadachim do Cinema; AMANDO SEM SABER / Four’s a Crowd / 1938 (*); QUATRO FILHAS / Four Daughters / 1938;

ANJOS DE CARA SUJA / ANGELS WITH DIRTY FACES / 1938. Retornando à Warner depois de um desentendimento, que o deixou afastado do estúdio durante dois anos, James Cagney tem um de seus melhores desempenhos (como sempre, pondo todo o corpo para representar) neste clássico do filme de gângsteres, em que Curtiz dá uma aula de exposição cinematográfica e o rítmo e as sombras (controladas por Sol Polito) assumem particular relêvo. O ator conquistou o prêmio dos críticos de Nova York e recebeu sua primeira indicação para o Oscar, porém os “Anjos”(Leo Gorcey, Huntz Hall, Bobby Jordan,

Billy Halop, Bernard Punsley, Gabriel Dell) quase lhe “roubaram” o filme. Após uma estréia auspiciosa ao lado de Humphrey Bogart na produção de Samuel Goldwyn, Beco sem Saída / Dead End / 1937 (Dir: William Wyler), o grupo de rapazes (Já conhecido como “Dead End Kids”) assinou contrato com a Warner, para aparecer em filmes classe “B” assim como em produções mais caras. Entretanto, antes de colocá-los em Os Anjos de Cara Suja, Jack Warner testou-os num filme modesto chamado No Limiar do Crime / Crime School / 1938  (Dir: Lewis Seiler), também protagonizado por Bogart. O tema de dois amigos de infância que se vêem em campos opostos da lei não era novo, mas o filme de Curtiz atingiu um nível artístico mais elevado do que o de seus predecessores, graças à clareza e agilidade da sua mise-en-scène, à fotografia notável de Polito, aos excelentes cenários de Robert Haas, ao score animado de Max Steiner e aos intérpretes de primeira qualidade, entre eles Bogart no seu primeiro filme ao lado de Cagney. A cena ambígua da execução, na qual Cagney (Rocky Sullivan) finge (ou não?) que é covarde, para dissuadir os rapazes da sua antiga vizinhança de seguir os seus passos no caminho do crime, ainda hoje causa um forte impacto; UMA CIDADE QUE SURGE / Dodge City / 1939; FILHAS CORAJOSAS / Daughters Courageous / 1939; MEU REINO POR UM AMOR / The Private Lives of Elizabeth and Essex / 1939; QUATRO ESPOSAS / Four Wives / 1939; CARAVANA DO OURO / Virginia City / 1940;

O GAVIÃO DO MAR / THE SEA HAWK / 1940. Com esta nova visita ao mundo da pirataria, Curtiz atingiu o auge do seu cinema de aventuras, realizando um dos filmes mais férteis do gênero. Desprezando a adaptação que Delmer Daves havia feito do romance de Rafael Sabatini, os roteiristas Seton I. Miller e Howard Koch preferiram escrever uma história original, inspirada na vida de Francis Drake, contando as aventuras do grupo de Sea Dogs, que enriqueceram a corôa da Inglaterra como corsários, apenas mudando a expressão Sea Dogs para Sea Hawks, que parecia fazer alusão à obra de Sabatini. O script e os altos valores de produção deram a Curtiz ampla liberdade para aperfeiçoar seu estilo, compondo à vontade seus espetaculares movimentos de câmera e seus jogos de sombras gigantescos sobre as paredes dos castelos, que são a sua marca registrada. A ação transcorre quase sempre em lugares claustrofóbicos (galeras, selva, etc.), onde são postos em evidência a tensão, o esforço heróico e doloroso dos participantes. A arte de Curtiz se expressa com veemência no duelo de espada entre o Capitão Geoffrey Thorpe (Flynn / dublado em algumas cenas por Don Turner) ) e (Lord Wolfingham (Henry Daniell / dublado em todas as cenas por Ralph Faulkner e Ned Davenport) e nas sequências em que Thorpe e seus homens são emboscados nos pântanos do Panamá e sua subsequente fuga da nau espanhola. Sol Polito proporcionou ao espetáculo uma esplêndida fotografia em preto e branco e Erich Wolfgang Korngold contribuiu com uma partitura bombástica, indicada para o Oscar. O diretor teve à sua disposição um tanque erguido no palco 21 do estúdio, que era literalmente um lago

artificial, onde os engenheiros da companhia e 375 operários construíram réplicas perfeitas de embarcações da era isabelina, um navio de ataque inglês com mais de 41 metros de distância da popa à prôa e um galeão espanhol de uns 50 metros. As naus foram montadas em plataformas de aço conectadas a trilhos que permitiam movê-las para a frente e para trás; do movimento lateral e do balanço se encarregavam uns macacos hidráulicos facilmente manejáveis. As paredes do tanque estavam cobertas por um ciclorama monumental de musselina pintada, representando o céu e o mar infinito

enquanto que a ilusão do movimento das águas era criado pela “Máquina de Ondas”, um invento de Anton Grot (também indicado ao Oscar), que utilizava silhuetas móveis de ondas convenientemente localizadas e iluminadas atrás da tela do ciclorama. Grot reciclou um bom número de cenários usados em Meu Reino por um Amor, trabalho igualmente cometido por Orry-Kelly, cujos desenhos básicos de vestuários usados no referido filme foram reutilizados juntamente com novas roupagens. Olivia de Havilland não quís participar do filme e, no lugar dela, entrou  Brenda Marshall, um jovem atriz nascida nas Filipinas, passando a frente de Andrea Leeds, Jane Bryan e Geraldine Fitzgerald. O produtor executivo Hal Wallis queria tingir de verde a sequência do Panamá com a intenção de transmitir o tremendo calor tropical mas foi advertido pelos técnicos de que o efeito seria o oposto e acabou optando pela cor sépia. Esta, no entanto, só foi usada em algumas cópias exibidas por ocasião da estréia do filme.

A ESTRADA DE SANTA FE / SANTA FE TRAIL / 1940. Por sugestão de Curtiz e do produtor Robert Fellows, o roteirista Robert Buckner começou a conceber um relato épico sobre a colonização do oeste americano através da construção da estrada de ferro de Santa Fe, incluindo uma segunda linha temática, que envolvia um conspirador inspirado em John Wilkes Booth, o assassino de Lincoln. Entretanto, com o passar dos meses, o argumento foi derivando para os anos anteriores à Guerra Civil e a história do abolicionista John Brown, uma figura controvertida, que até hoje continua dividindo os estudiosos. Na trama, dois cadetes de West Point, J.E.B. Stuart (Errol Flynn) e George A. Custer (Ronald Reagan) procuram reprimir as atividades de Brown (Raymond Massey), apresentado no filme como um antiescravagista fanático. Brown ataca o arsenal de Harper’s Ferry na Virginia, onde ocorrerá o combate final, terminando com a campanha do agitador. O filme condena o fanatismo e os métodos violentos  de John Brown, mas faz referências elogiosas às suas idéias sobre escravidão. A inexatidão histórica de muitos fatos (entre eles a relação amistosa, profissional e de rivalidade amorosa entre Stuart e Custer) é compensada por esplêndidas cenas de ação, dirigida com vigor por Curtiz. Além do ataque ao arsenal e do enforcamento expressionista de Brown, o que mais impressiona no espetáculo é a composição alucinada de Raymond Massey, concentrando toda a atenção do público sobre o personagem. O filme

demonstra a aptidão de Curtiz num terreno onde Ford, Hawks, Walsh e alguns outros até então reinavam como mestres e é um dos westerns mais sombrios dos anos 40, com uma atmosfera dark, pessimista, transmitida admiravelmente  pela câmera  de Sol Polito e pela música de Max Steiner. Olivia de Havilland, que havia sido punida com suspensão do salário por se negar a trabalhar em O Gavião do Mar, teve que concordar em ser mais uma vez “a namorada de Flynn”. Durante a filmagem ocorreram alguns acidentes desagradáveis como os figurantes em perigo na cena do incêndio do celeiro, o Flynn ferido por um sabre ou a bala de festim que atingiu a perna de Massey, além dos incômodos físicos próprios de uma rodagem em exteriores – poeira, calor – e a habitual atenção de Curtiz para o detalhe

realista; O LOBO DO MAR / THE SEA WOLF / 1941. Inicialmente, a Warner adquiriu de David O. Selznick os direitos de filmagem do romance de Jack London com a intenção de filmá-lo com Paul Muni sob a direção de Mervyn LeRoy. Depois que este projeto não foi avante, o produtor Henry Blanke assegurou-o para Edward G. Robinson, que desejava interpretar o papel do Capitão “Wolf” Larsen, designando Curtiz como diretor. Embora distanciando-se consideravelmente do texto original, o roteiro de Robert Rossen condensou-o  admiravelmente, mantendo o espírito do autor. Do começo ao fim, o filme transcorre num compasso veloz e vigoroso. Os personagens principais além de Larsen –  o escritor

Humphrey Van Weyden / Alexander Knox e os fugitivos Ruth Brewster (Ida Lupino) e George Leach (John Garfield) – são apresentados, instantaneamente definidos e em seguida rapidamente aprisionados a bordo do navio “fantasma”.  Enquanto Weyden fica sabendo algo mais sobre o enigmático comandante da embarcação, Ruth e Leach se apaixonam. Eles sonham com a fuga e a liberdade mas a sombra de Larsen paira sobre eles. Na verdade, a sombra de Wolf Larsen paira sobre todo o filme. Edward G. Robinson deu ao público talvez a melhor performance de sua carreira como o capitão cruel e sádico, um tirano com traços claramente nietzcheanos e uma obsessão pelo poeta Milton, cujo verso “Melhor reinar no Inferno do que servir no Paraíso” está sublinhado no seu exemplar do “Paraíso Perdido”. É difícil esquecer a imagem do rosto de Robinson em primeiro plano, contorcida pelo medo, quando a tripulação descobre a sua cegueira. Curtiz mantém uma forte atmosfera dramática ao longo de todo o desenrolar da intriga – sobressaindo a cena do suicídio do médico de bordo alcoólatra, Dr. Prescott (Gene Lockhart), atirando-se do tôpo de um mastro e a cena em que Larsen incita a tripulação a jogar o cozinheiro Cookie (Barry Fitzgerald) no mar durante um ataque de tubarões e depois manda os homens “remendar o que sobrou de sua perna”. O clima de tensão é reforçado pela penumbra fantástica de Sol Polito e pela direção de arte de Anton Grot, ambas influenciadas pelo cinema expressionista alemão bem como pelos acordes angustiantes de Erich Wolgang Korngold; DEMÔNIOS DO CÉU / Dive Bomber / 1941;  CORSÁRIOS DAS NUVENS / Captains of the Clouds / 1942;

A CANÇÃO DA VITÓRIA / YANKEE DOODLE DANDY / 1942. A Canção da Vitória é um musical panfletário que presta homenagem ao legendário ator-autor-compositor-dançarino americano de origem irlandesa George M. Cohan, cujos musicais dominaram a Broadway de 1902 ao começo dos anos 20.  Ao saber, aos 62 anos, que um câncer estava acabando com sua vida, Cohan se interessou em levar sua história para a tela. A MGM foi seu primeiro destino, porém o acordo se frustrou diante da negativa de Louis B. Mayer em lhe ceder o direito de supervisionar a montagem final de um filme que deveria revisitar seus anos de juventude com Mickey Rooney como protagonista. Numa segunda tentativa, ele chegou aos estúdios de Samuel Goldwyn, que havia aceitado as suas condições mas não conseguiu convencer Fred Astaire a interpretar o famoso artista dos palcos. Em março de 1941, Jack Warner comprou o direito de filmagem da vida de Cohan e este concordou com a escolha de James Cagney para o papel principal, que foi convencido por seu irmão William Cagney (que seria o produtor associado)  a aceitar. O roteirista Robert Buckner optou por uma estrutura circular, iniciando e terminando o filme na Casa Branca onde Cohan conta ao Presidente Roosevelt a  sua trajetória artística num retrospecto e recebe a condecoração mais alta dada a um civil. Emocionado, Cohan agradece da mesma maneira como  agradecia ao público no final dos espetáculos dos “Quatro Cohans”: “My mother thanks you, my father thanks you, my sister

thanks you, and I thank you”. Depois que Buckner deu por encerrado o seu trabalho, por insistência de Cagney foram chamados os irmãos Philip e Julian Epstein. Estes recomendaram Edmund Joseph em seu lugar mas a contribuição de Joseph foi mínima, e os Epstein acabaram aperfeiçoando eles mesmos o script de Buckner; porém nos créditos do filme só aparecem os nomes de Buckner e Joseph. Cantando e dansando, James Cagney é a grande atração do filme. Ele se entregou de corpo e alma ao papel e teve um desempenho efervescente, conquistando o Oscar de Melhor Ator. Para imitar o mais possível o biografado, o ator conseguiu que a Warner contratasse o bailarino Johnny Boyle, antigo coreógrafo de Cohan, profundo conhecedor do seu estilo de dança, com quem ensaiou exaustivamente. A imitação dos passos de Cohan é perfeita e eu posso dizer isto porque tive a sorte de ver o verdadeiro Cohan dançando em O Falso Presidente / The Phantom President / 1932. Na equipe técnica, o fotógrafo James Wong Howe, o diretor de arte Carl Jules Weyl, o montador George Amy e dois diretores de segunda unidade, Seymour Felix (para  os números musicais) e Don Siegel (para as sequências de montagem), ajudaram Curtiz a criar, com aquela sua flexibilidade de câmera caraterística e seu senso visual, um espetáculo divertido e contagiante, valorizado também pela presença dos coadjuvantes Walter Huston, Rosemary DeCamp, Jeanne Cagney e Joan Leslie respectivamente como o pai, a mãe, a irmã e a mulher de Cohan

(obs. o personagem é um amálgama, pois Cohan foi casado mais de uma vez na vida real). Do número musical mais empolgante, “Grand Old Flag”, participaram 42 cantores, 35 figurantes, 24 escoteiros autênticos, 25 bailarinas, um coro de 16 cantores negros, centenas de bandeiras dos Estados Unidos, fragmentos de canções populares (“Dixie”, “Auld Lang Song”, “When Johnny Comes Marching Home”, etc.), reconstituições ao vivo de momentos históricos (Betsy Ross costurando a primeira bandeira, o quadro “Spirit of ‘76’ de Archibald McNeal Willard, Theodore Roosevelt à frente das tropas na guerra contra a Espanha e inclusive o monumento em homenagem a Lincoln juntamente o seu célebre discurso em Gettysburg (“… e que o governo do povo, pelo povo e para o povo não desapareça da face da Terra”). Com seus números musicais nacionalistas e o contexto da Segunda Guerra Mundial, A Canção da Vitória tornou-se o maior sucesso de bilheteria do ano e da Warner até então e foi indicado ao prêmio da Academia em oito categorias, inclusive a de Melhor Filme e Melhor Diretor, saindo vencedores, além de Cagney, George Amy, o Departamento de Som da Warner Bros, dirigido por Nathan Levinson, e os

arranjadores Ray Heindorf e Heinz Roemheld; CASABLANCA / CASABLANCA / 1942. Quando em 1943 Casablanca recebeu o Oscar de Melhor Filme (e também de Melhor Diretor e Melhor Roteiro Adaptado), ninguém podia adivinhar que iria se tornar film cult, depois que o desaparecimento de Humphrey Bogart contribuiu para dar um novo brilho aos filmes nos quais ele foi o astro. Mas, no correr do tempo, tornou-se evidente que o renome de Casablanca não era inteiramente devido à lenda bogartiana. O espetáculo contém todos os elementos capazes de agradar o público – ação, romance, aventura, ambiente exótico,  patriotismo, canção linda, etc. – e é aquele filme raro onde tudo deu certo, apesar do tortuoso processo pelo qual chegou à tela. Casablanca foi baseado numa peça não encenada, “Everybody Comes to Rick’s,” escrita por Murray Burnett e Joan Allison, quando o casal estava em lua-de-mel na Europa e viu o anti-semitismo nazista em primeira mão. Depois que a peça foi comprada pela Warner Bros., o produtor Hal Wallis designou Wally Kline e Aeneas MacKenzie para escrever o roteiro. A peça e o tratamento de Kline-MacKenzie foram por sua vez entregues para os irmãos gêmeos Julius e Philip Epstein. Ainda não


satisfeito, Wallis decidiu incorporar Howard Koch à equipe de escritores, não com o objetivo de que eles ajudassem os Epstein, mas para que ele escrevesse um roteiro independente, e cada qual foi dando a sua contribuição. Finalmente, Wallis colocou outros dois escritores para trabalhar no script. Lenore Coffee, roteirista veterana da Warner, prestou serviço durante menos de uma semana. Casey Robinson deu forma à história de amor da trama, especialmente o flashback de Paris. O par amoroso de Rick Blaine era originariamente uma americana, Lois Meredith, e o estúdio pensou que Ann Sheridan seria a atriz ideal para o papel Mas quando a leading lady foi transformada em uma européia, Ilsa Lund Laszlo, Sheridan ficou de fora e o personagem foi oferecido para Hedy Lamarr. Como a MGM não quís emprestar Hedy para a Warner, seus executivos então chamaram Michele Morgan. Ela chegou a fazer um teste, dirigido pelo próprio Curtiz, porém o agente de Hedy exigiu muito dinheiro. A esta altura, a Warner fechou um acordo de intercâmbio com David O. Selznick: a cessão de Ingrid Bergman por oito semanas de trabalho por 25 mil dólares – em vez dos 55 mil dólares perdidos por Morgan – e a opção de que Olivia de Havilland trabalhasse para Selznick nas mesmas condições. Quando Wallis decidiu qual seria o título definitivo do filme, o estúdio divulgou material de propaganda, anunciando que Ronald Reagan iria encabeçar o elenco ao lado de Ann Sheridan e Dennis Morgan. Entretanto, de acordo com memorandos

internos concernentes ao cast, Wallis tinha em mente o nome de Humphrey Bogart desde o início da produção. Na verdade, o anúncio dos nomes de Reagan, Sheridan e Morgan não passou de uma manobra promocional, para tornar o título do filme conhecido e ao mesmo tempo promover três jovens atores, que a Warner estava querendo elevar à categoria de astros. Outro rumor conhecido foi o de que George Raft teria sido convidado para ser Rick, porém o filme nunca chegou a ser oferecido oficialmente a Raft. A notícia deve ter surgido pelo fato de que Raft havia recusado papéis importantes, que depois foram para Bogart como o de Roy Earle em O Último Refúgio /  High Sierra / 1940 e o de Sam Spade em Relíquia Macabra / The Maltese Falcon / 1941. Para personificar Victor Laszlo, Wallis havia pensado somente em dois nomes: o holandês Philip Dorn e o austro-húngaro Paul Henreid, porém o primeiro tinha um contrato de exclusividade com a MGM e o segundo, estava no meio da filmagem de Estranha

Passageira / Now Voyageur / 1942, cuja produção se arrastava, sem prazo para terminar. Wallis e Curtiz se viram forçados a considerar outros atores como o dinamarquês Nilz Asther, o francês Jean-Pierre Aumont, o austríaco Carl Esmond  e o americano Joseph Cotten, entre outros. Depois de conseguir o compromisso de que seu papel seria aumentado e seu nome teria um destaque nos créditos do filme igual ao de Humphrey Bogart, Henreid aceitou o convite. Claude Rains e Peter Lorre foram logo previstos para os papéis respectivamente do Capitão Louis Renault e Ugarte. Conrad Veidt assumiu o papel do Major Strasser após terem fracassado as negociações com a Fox por Otto Preminger. A escolha de Dooley Wilson para personificar o pianista negro é que foi surpreendente, porque Dooley não sabia tocar piano, mas sim bateria, tendo sido dublado pelo pianista do estudo, Elliott Carpenter. Wallis havia pensado até em mudar o sexo deste último personagem, contemplando a possibilidade de contratar Lena Horne, Hazel Scott ou Ella Fitzgerald para o mesmo, mas logo desistiu da idéia, e ficou de escolher entre Dooley e Clarence Muse. Ele acabou decidindo em favor de Dooley. Atrás da câmera, Curtiz contou novamente com a colaboração do diretor de arte Carl Jules Weyl, cuja sapiência arquitetural foi posta à

prova no desenho e construção dos principais entornos do filme, as ruas da capital marroquina e o interior da buate de Rick. O fotógrafo desta vez foi o inglês Artur Edeson, Owen Marks ocupou-se da montagem, Don Siegel do montage (sequência de montagem) e Max Steiner foi contratado como compositor de uma trilha sonora que devia contar obrigatoriamente com a canção “As Time Goes By”, que não ganhou o Oscar, porque não era sequer elegível para ser indicada, por não ser um trabalho original, mas sim uma canção antiga, composta por Herman Hupfeld para um show da Broadway em 1931. Produzido no ápice do sistema de estúdio, Casablanca ilustra admiravelmente as qualidades maiores de Michael Curtiz: a fluência, a energia e a concisão de sua mise-en-scène, o seu perfeito domínio daquele “estilo clássico”, que deixa o espectador completamente envolvido pelo enredo e pelos personagens.  O cabaré de Rick onde se reúnem os exilados do nazismo, a aparição de Ingrid Bergman toda de branco, uma canção inesquecível, Paul Henreid mandando tocar a Marselhesa para abafar o hino nazista, Bogart deixando partir a mulher de sua vida, casada com um resistente francês … Em suma, Casablanca é um desses filmes que a gente não se cansa de ver; MISSÃO EM  MOSCOU / Mission to Moscow / 1943; FORJA DE HERÓIS / This is the Army / 1943; PASSAGEM

PARA MARSELHA / PASSAGE TO MARSEILLE / 1944. Adaptação cinematográfica de “Men Without Country”, romance escrito por James Norman Hall e Charles Nordoff, que conta a história de cinco presos fugitivos da colônia penal francêsa da Guyana na Ilha do Diabo, cujo objetivo é regressar ao seu país de origem e lutar contra o inimigo invasor. O romance de Hall e Nordhoff (os autores de “Mutiny on the Bounty” levado ao cinema como O Grande Motim) não tinha um único protagonista, funcionando como uma trama coral na qual, um dos personagens – Jean Matrac – é retratado como um herói de passado misterioso. Os roteiristas Casey Robinson e Jack Moffitt, incluíram um elemento romântico no argumento (Paula, a esposa de Matrac, interpretada por Michèle Morgan, depois de cogitada Nina Foch) e converteram Matrac num jornalista politicamente comprometido e vítima dos setores mais reacionários do governo de Eduard Daladier, chefe do executivo francês, que havia celebrado, em 28 de setembro de 1938, o Pacto de Munich com Chamberlain, Mussolini e Hitler. O filme é tributo aos combatentes da França Livre, uma maneira de justificar a legitimidade do governo no exílio de De Gaulle.

Apoiando-se no fato de que o  romance já fazia uso de um duplo retrospecto, para contar a história, Curtiz e seus roteiristas  decidiram ir mais longe e apostar numa arriscada estrutura narrativa, um conjunto de histórias contadas em quatro níveis. O primeiro nível é o presente da trama, que mostra a realidade do momento e a luta dos patriotas francêses no exílio inglês; o segundo nível é o relato em flashback que Freycinet (Claude Rains) – o oficial francês – faz a Manning (John Loder)  – o jornalista americano – sobre como Matrac ( Humphrey Bogart, depois de Jean Gabin ter sido considerado como intérprete) e seus companheiros (Marius / Peter Lorre, Renault / Philip Dorn, Garou / Helmut Dantine, Petit / George Tobias), se tornaram parte da França Livre, enfrentando primeiramente o Major Duval (Sidney Greenstreet), simpatizante de Vichy; o terceiro nível é a história (exposta por um flashback dentro do flashback) que Renault, um dos condenados foragidos conta a Freycinet como era a vida na Guyana e como foi a fuga da colônia penal;  o quarto, e último, narra (por meio de um flashback dentro do flashback dentro do flashback) como Matrac chegou a ser condenado. Coube a Curtiz fazer com que esta complexidade narrativa funcionasse perfeitamente e não se voltasse contra o filme. Ele venceu o desafio, empregando todos os recursos de seu arsenal cinematográfico para dar conta da tarefa,

destacando-se não só a eficiência na condução dos flashbacks como as cenas na Ilha do Diabo (enriquecidas pela fotografia de James Wong Howe e pelos cenários de Carl Jules Weyl) e as duas batalhas no cargueiro, esplendidamente encenadas com a música excessiva de Max Steiner. Curtiz evitou deliberadamente a descrição glamourosa da guerra usualmente feita por Hollywood e não é por acaso que, tanto Matrac quanto Marius são mortos, sem saber que a libertação de seu país estava assegurada. Após a morte de Marius, Matrac metralha os pilotos alemães indefesos e seus olhos se enchem de ódio enquanto ele se delicia,  vendo os alemães caírem no mar e morrerem. O Capitão Malo (Victor Francen) o chama de assassino e ele responde, pedindo ao capitão para olhar a morte e a destruição em torno dele e identificar os verdadeiros assassinos. Esta cena de ambiguidade moral recebeu protestos do OWI (Office of War Information) e da Legião da Decência que classificou o filme na sua categoria “B” (sujeito a objeções), porque “estamos cometendo o mesmo crime contra a humanidade do qual acusamos os alemães e japoneses”. A Warner não deu à Legião o poder de vetar a cena mas para atender às objeções do OWI, extirpou a cena, para que o filme pudesse obter a licença de exportação; JANIE TEM DOIS NAMORADOS / Janie / 1944 (*); O PREÇO DA FELICIDADE / Roughly Speaking / 1945; ALMA EM

SUPLÍCIO / MILDRED PIERCE / 1945. Mildred Pierce (Joan Crawford após terem sido cogitados os nomes de Bette Davis, Ida Lupino e Ann Sheridan mas realmente consideradas para o papel Rosalind Russell e Barbara Stanwyck) é uma dona-de-casa preocupada em oferecer para a sua filha mais velha, Veda (Ann Blyth, depois de testadas Bonita Granville,  Martha Vickers e cogitadas Virginia Weidler e  Shirley Temple), os bens materiais que o marido, Bert Pierce (Bruce Bennett, depois de escolhido anteriormente Ralph Bellamy), não pode lhes proporcionar. Mildred separa-se de Bert e emprega-se como garçonete. Passado algum tempo, Mildred abre um restaurante em parceira com Wally Fay (Jack Carson), seu eterno admirador e Monte Beragon (Zachary Scott), um playboy da alta sociedade. Mildred começa a sair com Beragon . Também atraída por ele, Veda seduz o namorado da mãe, mas este lhe diz que não tem nenhuma intenção de se casar com ela. Percebendo que Veda matou Beragon, Mildred tenta assumir a culpa. A realização é noir no que diz respeito ao estilo visual (fotografia expressionista) e à estrutura narrativa (o assassinato logo na primeira cena enseja alguns retrospectos e a voz over), porém Mildred é uma heroína convencional  de um “filme para mulheres”, a mãe com uma paixão obsessiva pela filha

perversa e ingrata e seu desejo de lhe dar uma “boa vida”.  O romance de James M. Cain, no qual foi baseado o filme, passou pelas mãos de vários roteiristas – entre eles Catherine Turney, Albert Maltz, William Faulkner, Louise Randall Pierce, Ranald MacDougall (o único creditado), etc. – que foram fazendo muitas modificações, eliminando os aspectos sórdidos da obra original para escapar da censura do Código de Produção, transportando a trama para o presente, eliminando toda referência à Depressão e introduzindo um assassinato como artificio dramático para contar a história de Mildred, conforme desejo do produtor executivo Jerry Wild e de Curtiz. O espetáculo é feito de uma série de confrontações emocionais acompanhadas pela música estridente de Max Steiner. Assim, por exemplo,  ouvimos Veda gritar para a sua progenitora: “Você nunca vai deixar de ser uma mulher vulgar!”, com a resposta de Mildred: “Saia da minha casa antes que eu a mate!”. Em vários momentos Curtiz expressa-se só por meio de imagens. Logo que os letreiros de apresentação terminam, apagados pelas ondas que se desmancham na areia, vemos uma casa na praia à noite. O silêncio é interrompido pelo som de tiros. Um corte rápido e Beragon cai no chão, crivado de balas. Alguém joga um revólver ao lado do seu corpo, iluminado pelos clarões de uma lareira. Ele balbucia “Mildred!”, antes de morrer. A câmera capta a figura de Mildred Pierce andando por um píer. Ela se aproxima de uma amurada e contempla o mar. Quando vai se atirar na água, um guarda bate com o cassetete na grade e ela recobra a razão. São alguns minutos de cinema

puro, para a realização dos quais o diretor contou com a ajuda dos cenários de Anton Grot daquele cais fantasmagórico e daquela casa opressiva na praia, da iluminação expressionista de Ernest Haller e da partitura de Max Steiner, dominada por um tema principal potente. Por curiosidade, o tema que Steiner compôs para Bette Davis em Estranha Passageira / Now Voyageur / 1942 é ouvido na cena em que Mildred e Beragon se beijam em frente da lareira no primeiro dia em que passam juntos, e em outros momentos, como aquele em que Bert surpreende Mildred beijando Beragon. Joan Crawford deu a volta por cima, depois um declínio na sua carreira,  e conquistou o Oscar de Melhor Atriz. Alma em Suplício propiciou ainda indicações para Melhor Filme, Melhor Atriz Coadjuvante (Ann Blyth e Eve Arden), Melhor Fotografia e Melhor Roteiro Adaptado (Ranald MacDougall) mas, a meu ver, merecia também uma indicação para Michael Curtiz; CANÇÃO INESQUECÍVEL / Night and Day / 1946; NOSSA VIDA COM PAPAI / Life With Father / 1947; SEM SOMBRA DE SUSPEITA / The Unsuspected / 1947; ROMANCE EM ALTO MAR / Romance on the High Seas / 1948; MEUS SONHOS TE PERTENCEM / My Dream is Yours / 1949; CAMINHO DA REDENÇÃO / Flamingo Road / 1949; ATÉ PARECE MENTIRA / The Lady Takes a Sailor / 1949 (*); ÊXITO FUGAZ / Young Man With a Horn / 1950; CINZAS AO VENTO / Bright Leaf / 1950; REDENÇÃO SANGRENTA / THE BREAKING POINT / 1950. Esta segunda

adaptação do romance de Ernest Hemingway, “To Have and Have Not”, feita por Ranald Mac Dougall, é mais fiel ao texto original do que a versão dirigida por Howard Hawks com Humphrey Bogart em 1944. Em Newport Beach, California, Harry Morgan (John Garfield), veterano de guerra, aluga seu barco, “The Sea Queen”, para pescarias, a fim de sustentar sua esposa, Lucy (Phyllis Thaxter, depois de cogitada uma dezena de atrizes entre elas Doris Day, Jane Wyman, Ruth Roman, Teresa Wright) e suas duas filhas. Cansada dos problemas financeiros, Lucy implora continuamente que ele desista do barco e se mude para a fazenda do seu pai. Um dia, Harry é contratado para levar Hannagan (Ralph Dumke) e sua amante Leona Charles (Patricia Neal, depois de outras candidatas, principalmente Jane Greer) para uma pescaria na costa do México. Hannagan abandona Leona e não paga Harry. Desesperado, Harry faz um acordo com um advogado inescrupuloso, Duncan (Wallace Ford), para introduzir trabalhadores chineses clandestinamente nos Estados Unidos. A fim de impedir que seu imediato, Wesley Park (Juano Hernandez) se envolva numa atividade ilícita, Harry tenta mandá-lo de volta para a Califórnia de ônibus; porém Wesley e Leona entram às escondidas no barco. Mais tarde, Harry embarca os chineses

numa pequena enseada deserta, mas Mr. Sing (Victor Sen Young), o contrabandista, se recusa a pagar o restante da quantia que lhe devia pelo serviço, irrompe uma briga e Sing é morto. Harry joga o corpo de Sing no mar e obriga os chineses a voltarem para a terra, devolvendo a eles parte do dinheiro recebida. Entretanto, um dos chineses  denuncia o “The Sea Queen” à Guarda Costeira e, quando Harry chega a San Diego, seu barco é confiscado. Posteriormente, Leona e Duncan aparecem em Newport Beach. Harry quase sucumbe aos encantos de Leona, mas finalmente decide ser fiel à sua esposa. Duncan consegue liberar o barco, exigindo em troca que Harry transporte quatro gângsteres, depois do assalto a um hipódromo. Quando o barco chega em alto mar, os criminosos matam Wesley e Harry  vai

eliminando os bandidos um a um, como havia planejado. A Guarda Costeira encontra o “The Sea Queen” e Harry bastante ferido. O médico pede permissão a Lucy para amputar o braço de Harry. Quando eles partem, Joseph, o filho de Wesley aguarda em vão nas docas o retorno de seu pai. Produzido quando John Garfield estava sob o ataque da House of Un-American Activities Commitee, Redenção Sangrenta, é um melodrama com  certos elementos do filme criminal e alguma crítica social. Morgan representa os milhares de soldados que retornaram do campo de batalha e não se adaptaram à bolha de prosperidade do pós guerra. Ele se vê compelido a praticar atos ilegais em virtude de uma situação econômica implacável, até que chega ao seu “breaking point” (ponto de ruptura). Harry poderia ser um “perdedor” noir, mas ele não se submete ao desespero, e resolve armar a emboscada para os bandidos. Ninguém melhor do que John Garfield para expressar o rancor do desafortunado marinheiro, o seu comportamento diante de uma sociedade construída sobre a injustiça e a violência. Sua atuação é impecável, uma das melhores de sua carreira e ele é acompanhado por um elenco em plena forma, especialmente Hernandez, Neal e Ford. Integrando seus personagens ao cenário natural exigido pelo argumento (o filme foi rodado em Newport Bay e Balboa na California), Curtiz fugiu da rotina das reconstituições em estúdio. Esta preocupação com o realismo é ainda reforçada pelo trabalho de Ted Mac Cord, um mestre na fotografia de exteriores. Sempre em busca da perfeição técnica, Curtiz não deixou que nenhuma imagem ficasse sobrando. Cada plano, cada movimento de câmera tem a sua razão de ser. As melhores cenas do filme são as do episódio com os chineses, o assalto ao hipódromo – notadamente aquel

momento em que Duncan corre atrás dos bandidos que fogem pelo corredor subterrâneo do estádio até ser alvejado pelos policiais –  e o acerto de contas final, que termina com Harry gravemente ferido, dizendo: “Um homem sozinho não pode ir a lugar algum” e o barco vagando no mar sob a luz do crepúsculo. O plano final do menino negro, imóvel e silencioso, aguardando no cais o retorno do pai que não virá, impressiona pela sua amargura; QUANDO PASSAR A TORMENTA / Force of Arms / 1951; HOMEM DE BRONZE / Jim Thorpe – All American / 1951; SONHAREI COM VOCÊ / I’ll See You in My Dreams / 1951; A HISTÓRIA DE WILL ROGERS / The Story of Will Rogers / 1952; O CANTOR DE JAZZ / The Jazz Singer / 1953; ATALHOS DO DESTINO / Trouble Along the Way / 1953; AÇO DE BOA TÊMPERA / The Boy from Oklahoma / 1954, O EGÍPCIO / The Egyptian / 1954; NATAL BRANCO / White Christmas / 1954; VENENO DE COBRA / We’re No Angels / 1955; HORA ESCARLATE / The Scarlet Hour / 1956; O REI VAGABUNDO / The Vagabond King / 1956; O ENCANTO DE VIVER / The Best Things in Life Are Free / 1956; COM LÁGRIMAS NA VOZ / The Helen Morgan Story / 1957; O REBELDE ORGULHOSO / The Proud Rebel / 1958; BALADA SANGRENTA / King Creole / 1958; O MENSAGEIRO DA MORTE / The Hangman / 1959; A MULHER QUE COMPROU A MORTE / The Man in the Net / 1959; O ESCÂNDALO DA PRINCESA / A Breath of Scandal / 1960; AS AVENTURAS DE HUCKLEBERRY FINN / The Adventures of Huckleberry Finn / 1960; SÃO FRANCISCO DE ASSIS

Francis of Assisi / 1961; OS COMANCHEROS /  THE COMANCHEROS / 1961. Era natural que Michael Curtiz encerrasse sua carreira com um filme de ação excitante. George Stevens havia comprado os direitos de filmagem do romance de Paul I. Wellman em 1952 mas depois cedeu-os  para a 20th Century-Fox, que achou o texto adequado para um western estrelado por John Wayne. Por intermédio de seu velho amigo, o diretor George Sherman, agora produtor executivo do filme por imposição sua, Wayne trouxe seus amigos, o roteirista James Edward Grant e o fotógrafo William H. Clothier; seu próprio filho Patrick; e seus colegas Bruce Cabot e Lee Marvin. Porém Curtiz  teve muito a dizer na hora de completar o resto do elenco. Foi dele a sugestão de entregar o papel de Paul Regret a Stuart Whitman, contra a opinião do estúdio assim como a de contratar  Ina Balin e Nehemiah Persoff, dois seguidores do Método e com uma forma de trabalhar radicalmente diferente à de Wayne. Depois de feitas algumas modificações no texto original (com ajuda inestimável de Clair Huffaker), a história entregue por Grant, em síntese, ficou assim: o jogador profissional Paul Rogert (Stuart Whitman) e o Texas Ranger Jack Cutter (John Wayne) são convocados para uma missão muito perigosa: descobrir o esconderijo dos Comancheros, bando de renegados brancos chefiado por um ex-confederado, Graile (Nehemiah Persoff), que pretende construir um império no México e armar os índios, incitando-os contra a União. Trata-se, com efeito, de um Western clássico com ingredientes básicos do gênero: representantes da lei, brancos traidores, ataques de índios, perseguições, amor, amizade, honra, etc. Eles estão todos aí, expostos inicialmente em tom de farsa, que depois adquire austeridade com os abruptos rompantes de brutalidade. Como Curtiz estava seriamente doente, Cliff Lyons cuidou das cenas de ação, sob a supervisão do diretor; mas a participação de Curtiz não se limitou às cenas passadas em interiores. Ele deve ter filmado pelo menos alguns exteriores, porque sofreu um acidente numa locação, enquanto dirigia um ataque dos índios

enfrentado por Cutter e Regret. O resultado foi um bom espetáculo, faltando-lhe apenas certa coesão dramática. As duas principais sequências de ação, a do assalto ao rancho dos Schofield e a do confronto final na cidade dos Comancheros (erguida pelos diretores de arte  Jack Martin Smith e Alfred Ybarra na área conhecida como Fishers Towers nos arredores da cidade de Moab no Utah) mostram uma planificação bem cuidada e um esforço por parte dos stuntmen para criar lances arrojados. Outras cenas que chamam a atenção são as cenas da briga fordiana no saloon e a cena em que Regret golpeia Cutter com uma pá, causando grande surpresa na platéia. Uma atração à parte é a partitura de Elmer Benstein, marcada por um tema principal, que atrai a atenção do espectador para a história desde o início. Os Comancheros foi um epitáfio sob medida para Michael Curtiz. Dentro de poucos meses o câncer que já o vitimava há quatro anos, retirou-o do mundo. Ele faleceu em 11 de abril de 1962 com a idade de 73 anos.

MICHAEL CURTIZ – I

fevereiro 16, 2012

Michael Curtiz costuma ser caracterizado como “diretor típico de estúdio”,  profissional competente e confiável, que estava sempre pronto a assumir qualquer tarefa que lhe dessem. Todavia, ele foi responsável por alguns dos melhores filmes da Época de Ouro de Hollywood.

Associado aos mais talentosos intérpretes e técnicos da indústria cinematográfica, Curtiz trabalhou em variados gêneros – drama criminal e romântico, western, aventura histórica e de guerra, musical, cinebiografia, comédia, horror, filme noir, etc., aos quais imprimiu uma energia dramática contagiante.

Na sua longa filmografia não se vislumbra uma visão pessoal, porque ele visava apenas o entretenimento, preocupando-se sempre em fazer com que seus filmes valessem o preço do ingresso. Mas é fácil reconhecer imediatamente o estilo Curtiz: extrema mobilidade da  câmera, angulações variadas, efeitos incessantes de sombras impregnadas de um germanismo expressionista, profusão de travelings, direção bastante expressiva dos atores, rapidez na narrativa e o uso constante da elipse.

Ele dirigiu ao todo 168 filmes, sendo 66 na Europa e mais 102 nos Estados Unidos, onde logo se tornou o principal diretor contratado da Warner Bros., encarregado de seus astros e produções de maior magnitude.

Emmanuel Kaminer, logo rebatizado como Mihály Kertész, nasceu em Budapest, Hungria no dia 24 de dezembro de 1886, filho de Ignácz Kaminer  e Aranka Natt.

Seus pais eram de origem humilde. A família de Ignácz,  de sobrenome Kohn,  era uma das tantas estirpes judias que há vários séculos haviam se estabelecido na Europa Central. Ignácz se mudou de Delatyn, pequena  povoação no centro da província de Galitzia, para Budapest em busca de trabalho e mudou o sobrenome para Kaminer.

Na sua infância, Mihály vendia doces nas portas dos teatros mais pobres para poder assistir as representações e, pouco a pouco, foi adquirindo interesse pelas artes cênicas. Em 1904, ele terminou seus estudos primários e sua intenção era ser ator profissional; porém na Austria-Hungria era necessário ser graduado pela Academia Real de Teatro e Arte e o jovem Mihály não tinha condições para se matricular. Em 1908, ele conseguiu finalmente entrar para a Academia Real e, após sua formatura em 1911, assinou contrato com o Magiar Színhaz (“Teatro Nacional”) de Budapest. Mihály teve ali a oportunidade de aprender o suficiente para se tornar diretor, primeiro de teatro e depois de cinema.

Eis que um dia, a companhia de cinema Projectograph decidiu realizar “o primeiro filme dramático húngaro”, Ma és Holnap / 1912, drama social moralista que abordava os perigos do álcool e do jogo. No momento de começar a filmagem, o francês Raymond Pellerin, contratado para manejar a câmera,  declarou que não podia acumular as funções de fotógrafo e diretor. A produtora, ciente do prestígio que Mihály já havia obtido como diretor de teatro, viu nele a solução para o problema. E assim começou a carreira cinematográfica do futuro Michael Curtiz.

Depois de realizar três filmes na Projetograph (Krausz doktor a vérpadon / 1913, Házasodik az uram / 1913, Mozikirály / 1913) num gênero híbrido peculiar que estava em moda no país, o esquete cinematográfico (incorporação no espetáculo teatral de algumas cenas filmadas para representar os sonhos ou os pensamentos dos personagens), Mihály foi para a Dinamarca, berço de uma cinematografia  popular e prestigiosa na época, em busca do que evidentemente não encontrava em Budapest: experiência profissional e conhecimentos técnicos.

Na Nordisk, ele participou como ator no filme Atlantis / 1913 (Dir: Augusto Blom) e teve o privilégio de assistir várias filmagens, ficando impressionado com a forma ditatorial pela qual os diretores dinamarqueses extraíam a interpretação que necessitavam de seus atores – tal como ele faria mais tarde em Hollywood, quando ganhou a fama de profissional exigente e dedicado ao seu trabalho.

De volta a Budapest, Mihály dirigiu mais seis filmes (Az utolsó bohém / 1913, Rablélek / 1913, Az aranyásó / 1914, A hercegnõ pongyolája / 1914, Az éjszaka rabja / 1914, A szökött katona / 1914), até seu encontro com Jen Janovics, um produtor e diretor teatral que, na remota Kolozvár, capital da Transilvania quís oferecer uma alternativa para a produção em Budapest, construindo em 1914 o estúdio Proja.

Interessado em ser o diretor de suas produções, porém desconhecendo o meio cinematográfico, Janovics decidiu contratar Mihály, oferecendo-lhe a possibilidade de dar um passo adiante em sua carreira. Mihály fez três filmes para a Proja: A kölcsönkért csecsemõk / 1914, A tolonc / 1914 e Bánk Bán / 1914.  Este terceiro filme, uma superprodução cuja  trama era ambientada na Hungria feudal do século treze, constituiu-se no maior sucesso artístico da sua ainda breve carreira. Quase no final da filmagem de Bánk Bán, irrompeu a Primeira Guerra Mundial e Mihály decidiu retornar a Budapest onde, aos vinte e oito anos, se alistou na milícia magiar, sendo designado para prestar serviço numa unidade de artilharia.

O acontecimento mais importante na trajetória artística de Mihály ocorreu em 1915 (ano de seu casamento com bailarina Ilonka Kovács com quem teve sua única filha, Katalin Eva Ilona Kertész), quando, após ele ter feito mais um pequeno esquete, A paradicsom, István Kiss, que acabara de fundar a produtora Terrus, o contratou para filmar Akit ketten szeretnek. Logo depois, Kiss o apresentou a Jenõ Illés, o qual fez uma proposta tentadora ao jovem cineasta: tornar-se o diretor principal de sua produtora Kino-Riport, sem prejuízo de realizar filmes em outras companhias (A bánat asszonya / 1916 – Benõ Moskovits, A karthausi / 1916 – Star Film , A halálcsengõ / 1917 – Star Film) ou atender a uma convocação da Cruz Vermelha Húngara para realizar um  filme de propaganda (A magyar föld ereje / 1916).

Em 1916, Mihály realizou 5 filmes para a Kino-Report –  Makkhetes, A doktor úr, Az ezüst kecske, A farkas, A fekete szivárvány – e com eles consolidou sua posição como uma das principais figuras cinematográficas da Hungria naquele momento.

Em 6 de abril de 1917, a Projetograph criou a sua filial Phönix Film, que nasceu  comprando todas as instalações, câmeras, laboratórios e cenários da Kino-Report. O objetivo da Phönix era alcançar um nível artístico e profissional comparável ao das companhias cinematográficas mundiais. Mihály foi nomeado Diretor Geral com poder absoluto de decisão sobre os aspectos artísticos de todas as produções.

O primeiro filme na Phönix, Zoárd Mester / 1917, drama escrito pelo próprio Mihály sobre um escultor maduro apaixonado por uma órfã, foi feito de uma maneira um tanto precipitada e não agradou nem ao público nem à crítica, mas cumpriu a finalidade de tornar conhecida a marca da nova firma. Antes de se dedicar ao seu próximo trabalho na Phönix, Mihály teve que filmar Tatárjáras / 1917, cuja realização já havia prometido a outra nova produtora, Gloria-Film. Em seguida, ele fez mais 18  filmes para a Phönix: A kuruzsló / 1917 A senki fia / 1917, A szentjóbi erdõ titka / 1917, Az utolsó hajnal / 1917, A föld embere / 1917, A vörös Sámson / 1917, A béke útja / 1917, Tavasz a télben / 1918, A csúnya fiú / 1918, Egy krajcár története / 1918, Az arendás zsidó / 1918, Az ezredes / 1918, Lulu / 1918, 99 / 1918, Az ordög / 1918, A skorpió I / 1918, A skorpió II / 1918 e Júdás / 1918.

Não se sabe o que levou Mihály a sair da Phönix, mas na última semana de outubro de 1918, ele já era diretor geral da Semper-Film, levando consigo a maior parte do melhor capital artístico da Phönix, entre eles Mihály Várkonyi (depois Victor Varconi em Hollywood) um dos maiores astros da época. Na Semper, Kertesz fez Varázskeringõ, A víg õzvegy e Lu, a kokott, anunciados enfaticamente como “os melhores da temporada”.

Ao se aproximar o ano de 1919, a sociedade húngara começa a se radicalizar, e logo se faz sentir a influência soviética. Béla Kun funda o Partido Comunista Húngaro e Mihály é um dos primeiros a colaborar com o aparelho propagandístico do regime (cf. curta-metragem Jön az öcsém de ideologia marcadamente comunista).

Com a queda de Kun, Mihály parte com a Ilonka e Katalin para Viena, a fim de iniciar uma nova vida, respondendo ao chamado de Alexander “Sascha” Joseph Graf Kolowrat Krakowsky, dono da maior empresa cinematográfica austríaca, a Sascha – Filmindustrie AG., cujo estúdio estava localizado no subúrbio de Sievering.

Em Viena, acabam confluindo grande parte de artistas conhecidos de Mihály, como o roteirista László Vajda e Ica Lenkeffy, então considerada como  “a atriz húngara mais querida do público. Ica era também reconhecida na Austria, o que lhe facilitou conseguir um contrato com uma pequena produtora-distribuidora, Allianz-Film GmbH e chamar Mihály para dirigir o seu primeiro filme austríaco, Boccacio (cf. Fernando Moretzsohn) / Boccaccios Liebesnächte / 1919, cujo protagonista masculino era outro emigrado húngaro, Pál Lukács, que posteriormente também iria trabalhar na América com o nome de Paul Lukas.

Mihály resolveu germanizar seu nome, passando de Mihály Kertész para Michael Kertesz e, com ele, assinou seu primeiro trabalho para Kolowrat, O Mistério da Luva Preta / Die Dame mit dem schwarzen Handschuh / 1919 (realizado antes de Boccaccios Liebesnächte), com Ilonka como protagonista; pois Michael estava convencido de que poderia transformá-la numa estrela de primeira grandeza no panorama cinematográfico europeu com o nome artístico de Lucy Doraine. Era uma história de intriga e mistério de tom folhetinesco sobre a viúva de um duque, que foi marcada com ferro em brasa numa de suas mãos – sinal que ela oculta com uma luva – por ter sido acusada da morte do marido e sua relação tormentosa com um diplomata francês, com quem se casa para lhe roubar documentos importantes.

Em 1920, Kertesz, seu fotógrafo Gustav Ucicky (todos os 18 filmes de Kertesz na Austria foram fotografados por Ucicky, filho presumido do pintor Gustav Klimt, que depois se tornaria diretor (vg. Heróis do Mar / Morgenrot /1932, Santa Joana D’Arc /Das Mädchen Johanna / 1935, Der Postmeister / 1940) e a estrela Lucy Doraine partiram para a Bosnia, onde dedicaram os próximos seis meses à filmagem simultânea de Estrela de Damasco / Die sterne von Damaskus, Die Gottesgeissel e Die Dame mit den Sonnenblumen. Os dois primeiros eram adaptações de um romance póstumo de George Ohnet e, embora pudessem ser exibidos como um só filme de longa duração, foram apresentados separadamente e anunciados como filmes independentes. No primeiro, A Estrela de Damasco, um pintor francês salva uma bela mestiça quando ela é maltratada numa rua da capital Síria e se enamora perdidamente por ela; a mestiça o acompanha de regresso à França, mas dentro em pouco o abandona por um aventureiro. Surpreendendo-a com o rival, o pintor fere sua amante e é condenado a trabalhos forçados. Na continuação, Die Gottesgeissel,  assistimos à redenção do pintor após sair do cárcere e o castigo posterior da mulher ingrata. No terceiro filme, Die Dame mit den Sonnenblumen, para socorrer seu pai paralítico, a protagonista é obrigada  trabalhar por um salário de miséria. Ela é o centro de atenção de mais de um homem: seu noivo, um marinheiro e um conde muito rico; do primeiro ela que se desfazer para se casar com o terceiro, mas é pelo segundo que está apaixonada. No decorrer da intriga, a jovem provocará a morte acidental do noivo e assassinará o conde, depois de haver conseguido seu título e seu dinheiro; porém acabará se suicidando, quando o marinheiro a repele, por ter sido testemunha de seus atos criminosos.

A mesma equipe terminou o ano realizando no norte da Itália uma comédia romântica seguindo os modelos americanos, Senhorita Caprichosa Mrs. Tutti Frutti e logo depois Cherchez la Femme! / Cherchez la Femme! (título alternativo Herzogin Satanella), no novo estúdio de Kolowrat situado no bairro Prater em Viena, um espaço enorme destinado a ser o centro de grandes filmes com os quais ele esperava alcançar o controle absoluto do mercado nacional. Em Cherchez la Femme, é muito lembrada a reconstrução dos três mundos de sonho, nos quais a Mulher (sempre representada por Lucy Doraine) destrói o Homem, sem nenhum remorso: o Japão onde uma geisha complica a vida de um oficial da Marinha; a França pré-revolucionária, onde a perigosa marquesa Rochefoucauld seduz um sacerdote, cujo destino é morrer pelas mãos de seu despeitado marido; e a India, onde Enunah, é escolhida como “a mulher mais bela da terra” e futura esposa do sultão, e  acaba por provocar a sua queda. Além desses três papéis no sonho, Lucy ainda interpreta a Duquesa Orlonia, que se suicida no final do filme, porque seu amante (Alphons Fryland) a trocou por uma jovem americana.

Em 1921, ainda com Gustav Ucicky e Lucy Doraine na equipe, Kertesz fez Frau Dorothys Bekennetnis e Horas de Terror Wege Des Schreckens (também conhecido como  Labyrinth des Grauens) e, no intervalo entre estes dois filmes, ele teve tempo de colaborar com o diretor Károly Lajthay no roteiro de Drakula Halála, uma abordagem do mito do vampiro da Transilvânia, remotamente inspirado no romance de Bram Stoker.

No ano seguinte, Kertesz concretizou o projeto épico de Kolowrat,  Sodoma e Gomorra / Sodom Und Gomorrha. Kolowrat ficara impressionado com as grandes produções de Pastrone, Guazzoni e Griffith e quís oferecer ao seu público um espetáculo de proporções semelhantes, ainda mais quando a sua rival, Vita – Film de Sandór (Alexander) Korda, estava planejando a filmagem de Sansom und Delila / 1922.

Lászlo Vadja e Michael Kertesz escreveram juntos o roteiro, de Sodoma e Gomorra, dividindo-o em  onze atos, entre os quais incluíram duas sequências de ambiente bíblico, misturando passado e presente como Cecil B. DeMille fazia em alguns de seus melhores filmes. Kertesz contou mais uma vez com Lucy sendo a protagonista feminina e, a seu lado, colocou Mihály Várkonyi, além do novato Walter Slezak e uma inumerável quantidade de figurantes, entre os quais se encontravam o crítico Béla Balázs e o futuro  diretor Willi Forst.

O relato exigia localizações contemporâneas espetaculares com um luxuoso palácio e amplos jardins e se situava ainda em uma cidade russa durante a revolução bolchevique, uma Sodoma bíblica e uma Assíria imaginária. Para fazer tudo isso, Kertesz contou com os palcos dos estúdios da Sascha em Sievering e  Prater, assim como locações exteriores nos palácios e jardins de Lazemburg e Schöbrunn e em Laärberg, uma zona afastada do centro de Viena, ideal para representar a corte babilônica

Como observou Manuel A. Fidalgo, autor do livro Michael Curtiz – Bajo la Sombra de ‘Casablanca’ (T&B Editores, 2009), certamente o trabalho mais completo que existe sobre o cineasta (de onde colhemos a maior parte das informações para este artigo), toda a sabedoria cinematográfica acumulada por Kertesz nos dez anos em que passou atrás das câmeras se encontra refletida nas poderosas imagens de Sodom und Gomorrha (hoje disponível em dvd na Amazon. de).

Perfeccionista incansável, Kertesz só se importava com o seu trabalho, atitude que manteria até o fim de seus dias. O pouco tempo que lhe restava era para outra paixão: o gênero feminino. No início de 1920, após sua chegada a Viena, ele havia mantido uma breve aventura amorosa com uma empregada de banco, menor de idade, chamada Mathilde Foerster. No dia 20 de novembro do mesmo ano, Mathilde deu à luz um menino de saúde precária, de nome Michael, não reconhecido pelo pai. Quando ela resolveu reclamar pessoalmente seus direitos, Ilonka, ofendida, pediu o divórcio. No começo de 1923, Mathilde recorreu às vias judiciais e Kertesz então admitiu a paternidade de Michel e passou a pagar o sustento e a educação da criança. Quase na mesma ocasião, uma atriz de segundo plano, chamada Teresa Dalla-Bona, que havia participado de um pequeno papel em Sodoma e Gomorra, deu à luz uma menina chamada Sonja, cuja paternidade Kertesz logo assumiu. Em 7 de dezembro de 1929, Kertesz se casaria nos Estados Unidos com a roteirista Bess Meredyth.

Entrementes, o diretor húngaro  foi promovido ao cargo de Diretor Supervisor da Sascha com um salário semanal de quatro milhões de coroas e se tornou diretor do primeiro sindicato cinematográfico austríaco unificado, o Gewerkschaft der Filmshaffeden Öterreichs.

Em 1923, Kertesz realizou: Amor, Egoismo e Glória / Der junge Medardus, A Avalanche / Die Lawine e Namenlos. O primeiro se baseia numa peça escrita pelo dramaturgo Arthur Schnitzler, que gira em torno de um estudante vienense, Medardus Klähr (Mihály Várkonyi), seduzido por uma francesa monarquista,  Hélène de Valois (Agnes Esterhazy), que o usa num plano para matar Napoleão (Michele Xantho). No segundo, realizado quase que inteiramente nos Alpes, sobressai a brancura da neve e das geleiras, magnificadas pelas lentes de Ucicky, cenário do drama de um engenheiro, George Rotwill (Mihály Várkonyi) atormentado por suas relações com duas mulheres Kitty (Lili Marischka) e Maria (Mary Kid). No terceiro, o protagonista, Jean Muller (Mihály Várkonyi), por amor à sua mãe adotiva, assume a culpa por um crime praticado pelo seu irmão de leite.

No ano seguinte, Kertesz filmou Harun al Raschid, a mais desconhecida das produções austríacas do diretor. O filme é considerado perdido e dele sabemos  – por intermédio de Miguel Fidalgo – apenas o enredo: um jovem de passado obscuro decide suicidar-se, após perder sua fortuna nas mesas de jogo. Quando está a ponto de dar um tiro na cabeça, o misterioso ancião causador de sua ruína lhe oferece um cheque de um milhão de francos; sua única condição é que, exatamente um ano depois, ele se enforque. Neste período, o jovem encontra o amor, o perdão por um crime cometido e, no último momento, a salvação de um complicado plano de vingança. Como se vê, o título do filme tem ressonâncias orientais mas transcorre em ambiente contemporâneo e é uma fábula sobre o jogo, a vida e a morte. Na sua Histoire du Cinema  (André Martel, 1953, pg. 334), Maurice Bardèche et Robert Brassillach citam Harun al Raschid (pelo seu título em francês,  L’Amour est le maître) como uma das obras extremamente cuidadas da  Cinematografia Austríaca no anos vinte.

Com a chegada de 1924, ninguém mais duvidava de que a indústria cinematográfica austríaca estivesse em dificuldades. A crise econômica iniciada dois anos antes, destruiu os planos ambiciosos de muitas produtoras, mas Kolowrat, como o apoio  da produtora inglesa Stoll Pictures Productions Ltd,  apostou num projeto que se assemelhava ao superespetáculo de DeMille, Os Dez Mandamentos / The Ten Commandments / 1923, dele resultando o filme mudo mais famoso de Michael Kertesz: Lua de Israel / Die Sklavenkönigin. Partindo do romance “Moon of Israel”, escrito em 1918 por H. Ridder Haggard, autor do célebre “As Minas do Rei Salomão”, o relato conjugava a história de amor entre  Seti – filho do faraó Menepath – e uma escrava  israelita de nome Merapi – chamada de “Lua de Israel” por sua beleza radiante – com a narrativa bíblica da saída do Egito do povo hebreu.

O papel de Merapi coube a Maria Corda, cuja popularidade entre o público germano-austríaco estava no seu melhor momento após os  filmes alemães dirigidos por seu marido, Sandór (Alexander) Korda; para interpretar o personagem Seti, foi contratado o ator chileno Adelqui Millar; e, encarnando a formosa Userti, futura mulher do herdeiro do trono, estava a atriz francesa Arlette Marchal.

A divulgação das imagens do interior da tumba de Tutankhamon, descoberta recentemente, facilitou o trabalho dos diretores de arte Artur Berger, Emil Stepanek e Hans Roue, que reconstruiram Tanis, a capital do Egito antigo, seus palácios e os templos de Amon e Pftah com um detalhisno realista, aplicável também ao vestuário providenciado por Remigius Geyling (o figurinista de Sodoma e Gomorra de Kertesz e também de Sansom und Delila de Korda).

Meu amigo Sergio Leemann, frequentador assíduo da Giornate del Cinema Muto em Podernone na Itália, viu o filme ano passado na dita Jornada e achou que a sequência da separação do Mar Vermelho não tem nada a dever à mesma sequência de Os Dez Mandamentos de DeMille.

Quando o filme foi exibido em Londres, o enviado do Variety escreveu: “Em termos de direção e produção, Lua  de Israel é suficientemente forte para entrar em competição com o filme de DeMille em qualquer lugar do mundo, inclusive nos Estados Unidos. Seu êxito na América vai depender de uma  campanha de publicidade eficiente”. Porém isso não aconteceu: Adolph Zukor  e Jesse Lasky, os donos da Paramount, compraram os direitos do filme de Kertesz para arquivá-lo e Lua de Israel só estreou nos Estados Unidos no dia 29 de junho de 1927 numa versão muito reduzida de 63 minutos, distribuída pela independente F.B.O.

Em 1925, Kertesz começa o ano recebendo a noticia do nascimento de mais um rebento, cuja mãe, Franzeska Vondrak, uma figurante de dezoito anos que participava dos filmes da Sascha, havia chamado sua atenção no começo da filmagem de Lua de Israel, sucedendo-se uma relação sentimental entre os dois; só que desta vez a separação foi cordial e Franzeska não guardou nenhum ressentimento de sua aventura amorosa.

A trama do novo filme de Kertesz, intitulado A Boneca de Paris / Das Spielzeug von Paris, adaptação cinematográfica de “Red Heels”, romance da inglesa Margery Lawrence, situa-se na Paris do tempo das vanguardas artísticas. No relato, Célimène (Lili Damita) é o centro de uma “ronda”. Estrela de cabaré e indiscutivel rainha da cidade, ao seu redor se movem uma série de personagens, todos desejando alguma coisa: o velho Visconde de Maudry (Georges Tréville) vê nela sua última oportunidade romântica; Germaine (Maria Asti), antiga amante de Maudry, quer reconquistá-lo, fazendo com que Célimène encontre outro admirador; Miles Seward (Eric Barclay), um insípido diplomata britânico a princípio se aproxima de Célimène de maneira cautelosa e afetada,  mas acaba completamente obcecado em desposá-la; Nan Seward (Marietta Müller) quer casar seu irmão com a igualmente insípida Dorothy Madison (Ria Günzel), cuja posição nobiliária e econômica a torna particularmente interessante; Duval (Hugo Thimig), o gerente do cabaré, quer Célimène no seu palco; Michel Fournichon (Theo W. Shall), o amigo francês de Miles, simplesmente a quer na cama, embora nunca tenha a chance de lhe dizer isso. Quanto a Célimène, ela somente quer ser feliz, desfrutar da vida, do momento, do amor e da fama.

Uma sequência particularmente notável mostrava a inconstante heroína perseguindo Miles sob uma chuva torrencial, que acaba lhe causando a morte por pneumonia no final filmado para exibição na Austria, Alemanha e Inglaterra. Numa outra montagem, que foi vista na França e Espanha,  Célimène não morre,  mas sobrevive, para recuperar sua posição de privilégio na noite parisiense enquanto o seu visconde apaixonado a observa nos bastidores e Miles prossegue sua vida tediosa com a sua prometida Dorothy.

Miguel Fidalgo disse a respeito de A Boneca de Paris: “é um dos frequentes paradoxos da História do Cinema que um filme tão maravilhoso como este esteja hoje virtualmente esquecido”.

Liliane Marie Madeleine Carré, ex-estrela máxima do Casino de Paris, iniciou sua carreira cinematográfica com um pequeno papel em L’Empereur des Pauvres / 1922 (Dir: René Leprince), no qual havia atuado com o pseudônimo de Lili Deslys; depois de interpretar papéis de maior envergadura, mudou definitivamente seu nome artístico para Lili Damita. O filme seguinte de Lili com Kertesz foi A Dançarina Colette / Einspänner Nr. 13, nova adaptação do folhetim “Fiacre No.13” de Xavier de Montépin, que já havia sido levado à tela em 1917. Desta vez, a narrativa se concentra em Lilian (Lili Damita), a desaparecida herdeira de um milionário, encontrada quando bebé por um cocheiro parisiense, criada como sua filha e vítima de um caloteiro astucioso, que havia descoberto sua verdadeira origem. Especialmente interessante foi a contribuição do diretor de arte alemão Paul Leni, que havia aprendido com Max Reinhardt o uso da luz e do espaço. Nele, Kertesz encontrou um temperamento artisticamente parecido com o seu e os dois trabalhariam juntos novamente no filme seguinte do diretor húngaro.  Leni também seguiria mais tarde para Hollywood, onde fez O Gato e o Canário /The Cat and the Canary / 1927, O Papagaio Chinês / The Chinese Parrot / 1927, O Homem que Ri / The Man Who Laughs / 1928; A Última Ameaça / The Last Warning / 1929.

Foi em Paris, enquanto filmava as primeiras sequências de A Dançarina Colette, que Kertesz teve o encontro profissional mais importante de sua vida, um momento que mais tarde recordaria com bom humor: “Vejo que dois homens me observam. Me vigiam durante três dias. Como sou um diretor temperamental,  aproximei-me deles e lhes disse: ’O diretor está nervoso. Queiram retirar-se, por favor, e fechar rapidamente a porta do estúdio?’. Um dos dois homens sussurra algo para o meu assistente e este me diz que Mr. Warner, da América, está me observando e quer me oferecer um emprego”.

Mr. Warner da América não era outro senão Harry Warner, presidente e o mais velho dos irmãos donos dos estúdio de Hollywood que leva seu nome em visita à Europa à busca de novos talentos. Desde sua chegada à França, Harry Warner vinha recebendo boas referências sobre Kertesz e seu filme Lua de Israel,  sobre sua personalidade e caráter forte; vê-lo em ação, confirmou seu entendimento de que encontrara o diretor que estava buscando. A entrevista foi cordial, embora não tivesse ocorrido nenhum ajuste, salvo a declaração de Kertesz de que estava disponível e preparado para iniciar uma nova carreira do outro lado do Atlântico. Harry passa um telegrama para seu irmão Jack, vice-presidente encarregado da produção em Hollywood e lhe pede que consiga uma cópia de Lua de Israel, que a Paramount tinha arquivado. Depois, se despede de Kertesz com a promessa de lhe dar uma resposta num breve período de tempo.

Com a ajuda da Phoebus-Film AG, pequena produtora e distribuidora, integrante  do enorme conglomerado UFA (Universal Film Aktiengesellschaft),  que já havia cooperado financeiramente para a realização de A Dançarina Colette, Kolowrat realizou A Borboleta Dourada / Der goldene Schmetterling / 1926, baseado num musical londrino de 1921, com libreto de Fred Thompson e P.G. Woodehouse e música de Ivor Novello.

Convenientemente atualizado pelos alemães Jane Bess e Adolf Lantz, habituais colaboradores da UFA, o novo filme de Kertesz transcorre nas ruas da capital Britânica  e conta a história de Lilian (Lili Damita), filha adotiva de Mac Farland (Herman Leffler), dono de um restaurante. Ela deseja ser estrela de um espetáculo contra a vontade do pai e de seu apaixonado meio-irmão, Andy (Nils Asther); a aparição de Aberdeen (Jack Trevor), um milionário que manifesta um interesse pessoal e profissional pela jovem, complicará ainda mais a situação. Lilian aceita se casar com Aberdeen mas um dia, durante uma representação, o cabo que a sustenta no seu número se rompe e Lilian, ferida, tem que encerrar sua carreira e os dois jovens são reunidos por Aberdeen, que se sacrifica.

Antes de iniciar a filmagem de A Borboleta Dourada, Kertesz recebeu a notícia de que os irmãos Warner haviam visto Lua de Israel e estavam lhe oferecendo um contrato por um ano com opções renováveis. Kertesz já tinha firmado outro compromisso com o produtor independente Jacob Karol, porém o estúdio norte-americano pagou uma indenização a Karol pela dissolução do referido acordo e, em 10 de maio de 1926, Kertesz assinou em Berlim seu primeiro contrato com a Warner Bros.

Kertesz não fez nenhuma objeção às cláusulas rígidas que lhe foram impostas, pois confiava na sua capacidade para obter o que sempre desejara, aquilo que ele definia como “um filme artística e tecnicamente perfeito”. Foi com esta preocupação em mente, que ele realizaria um punhado de obras-primas do Cinema Clássico de Holywood.