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OTTO PREMINGER II

Em 1953 Otto Preminger fez sua estréia como produtor-diretor independente com Ingênua Até certo Ponto / The Moon is Blue, adaptação cinematográfica da peça de Hugh Herbert que havia dirigido na Broadway. Nos mesmos cenários Preminger filmou também uma versão alemã intitulada Die Jungfrau auf dem Dach com Johanna Matz, Hardy Krüger e Johannes Heesters nos papéis de Maggie McNamara, William Holden e David Niven. O filme foi desaprovado pelo Código Hays, órgão responsável pela autocensura de Hollywood e pela Legião Católica da Decência, mas Preminger decidiu lançá-lo assim mesmo. Sua rebeldia representou o início do fim do Código e ajudou Hollywood a se livrar dos seus valores antiquados.

Desde que assinou seu novo contrato com a Fox, Preminger evitou assumir algum novo compromisso, mas quando Zanuck chamou-o para dirigir O Rio das Almas Perdidas / River of No Return / 1954, ele gostou da história, aprovou a escolha dos dois atores principais (Robert Mitchum, Marilyn Monroe) e achou quer seria uma oportunidade de filmar em CinemaScope, formato no qual se tornaria um mestre. Após O Rio das Almas Perdidas, Preminger decidiu que nunca mais trabalharia como empregado de um estúdio e, de fato, até o final de sua carreira cinematográfica, ele só faria dois filmes para outro produtor.

 Sua trajetória fílmica a partir de então se dividiria em duas fases: a primeira, mais fértil artisticamente, vai de 1954 a 1965, incluindo os seguintes filmes, dentre os quais destaco como melhores aqueles que estão assinalados em negrito: 1954 – Carmen Jones / Carmen Jones. 1955 O Homem do Braço de Ouro / The Man with the Golden Arm; Seu Último Comando / The Court Martial of Billy Mitchell, drama biográfico sobre o julgamento do militar (Gary Cooper) que em 1925 denunciou o estado precário da Força Aérea americana e previu o ataque japonês de 1941 (Prod: Milton Sperling). 1957 – Santa Joana / Saint Joan, drama histórico baseado na peça de Bernard Shaw com Jean Seberg, como Joana D´Arc e Richard Widmark como Carlos VII). 1958 – Bom Dia Tristeza / Bonjour Tristesse. 1959 – Anatomia de um Crime / Anatomy of a Crime; Porgy e Bess / Porgy and Bess, drama musical baseado na ópera de George Gerswhin com Sidney Poitier e Dorothy Dandridge (Prod: Samuel Goldwyn). 1960 Exodus / Exodus, drama histórico sobre a fundação do Estado de Israel com roteiro abertamente creditado de Dalton Trumbo em um desafio à Lista Negra de Hollywood. 1962Tempestade sobre Washington / Advise and Consent. 1963 O Cardeal / The Cardinal, drama (indicado para o Oscar de melhor Filme) sobre a ascenção de um irlandês católico (Tom Tryon) do sacerdócio para o Colégio de Cardeais.  1965 – Primeira Vitória / In Harm´s Way, drama de guerra com John Wayne, Kirk Douglas, Patricia Neal, Tom Tryon, Jill Haworth, Paula Prentiss, Brandon de Wilde e participação de Dana Andres, Burgess Meredith, Franchot Tone, Henry Fonda, focalizando a Marinha e seus oficiais do ataque japonês a Pearl Harbor ao primeiro ano do envolvimento dos EUA no Segundo Conflito Mundial; Bunny Lake Desapareceu / Bunny Lake is Missing.

Dorothy Dandridge e Harry Belafonte em Carmen Jones

Carmen Jones. Drama baseado em um espetáculo musical da Broadway de Oscar Hammerstein II e não diretamente da ópera de Georges Bizet e as interpretações das melodias são mais jazzísticas do que líricas, muito embora os atores tivessem sido dublados por cantores líricos. A ação foi transposta do ambiente antigo de Sevilha para os EUA nos dias da Segunda Guerra Mundial, onde a intriga se desenrola não mais em uma fábrica de tabaco, mas em uma fábrica de paraquedas do Exército integrada somente por operárias negras e guarnecida por uma unidade militar também composta inteiramente por negros. Carmen ainda se chama Carmen e continua impetuosa e sensual, mas em vez de cigana vadia é uma operária relapsa; Don José (Harry Belafonte) é ainda um cabo do exército, porém com o nome de Joe; e o toureiro Escamillo torna-se um campeão de boxe chamado Husky Miller (Joe Adams).  Preminger mantém o espírito da ópera trágica e ardente de Bizet, aproveita com discernimento a música maravilhosa do compositor francês e as letras e canções de Hammerstein, e faz uma utilização audaciosa do CinemaScope contando com uma fotografia em cores soberba de Sam Leavitt / Albert Myers, devendo ser mencionada ainda a atuação de Dorothy Dandridge (indicada para o Oscar de Melhor Atriz) e a abertura bem moderna de Saul Bass.

KIm Novak e Frank Sinatra em O Homem do Braço de Ouro

O Homem do Braço de Ouro. Drama baseado em um romance de Nelson Algren, contando a história dolorosa de Frankie Machine (Frank Sinatra), croupier de um cassino clandestino de Chicago, que luta com todas as suas forças para renunciar ao vício da heroína. Após uma estadia de seis meses em um centro de desintoxicação, ele decide mudar de vida, tornando-se baterista em um grupo de jazz. Sua esposa Zosh (Eleanor Parker) foi vitimada em um acidente de carro ocasionado por Frankie e não pode caminhar. Tomado por um sentimento de culpa, ele não ousa abandoná-la, embora se sinta atraído por Molly (Kim Novak), uma dançarina de boate que lhe dá apoio moral. Aborrecimentos com a polícia e com os traficantes reconduzem-no ao antigo vício. Zosh, que se finge de paralítica para manter o marido sob seu controle, mata acidentalmente o fornecedor de entorpecente Louie (Darrin McGavin) e Frankie é suspeito do crime. Ele se refugia no apartamento de Molly, que o tranca em um quarto e consegue desintoxicá-lo. Zosh, interrogada pela polícia, sentindo-se desmascarada, se atira do alto de um prédio. Frankie poderá então refazer sua vida com Molly. Preminger conduz a narrativa em um ritmo vivo, forjando cenas excitantes como aquele em que ele estende o braço para que lhe seja aplicada a droga ou as cenas no quarto de Molly onde ele se isola na sua tentativa de vencer sua dependência. O caráter trágico do enredo é acentuado pelos cenários tristes e miseráveis de Joseph C. Wright, pela fotografia fortemente contrastada de Sam Leavitt, pelo tema musical de Elmer Bernstein e pela abertura criativa de Saul Bass. Sinatra é um intérprete espantoso nas suas crises de delírio, seus sofrimentos e seus gritos quando é privado do entorpecente. Sinatra, Joe Wright e Bernstein foram indicados para o Oscar.

Jean Seberg, David Niven e Deborah Kerr em Bom Dia, Tristeza

Bom Dia, Tristeza. Adaptação do best seller de Françoise Sagan relatando em flashbacks o drama de Cécile (Jean Seberg), jovem mimada que vive uma vida livre e dissoluta na companhia do pai viúvo, Raymond (David Niven), e de uma das namoradas dele, Elsa (Mylène Demongeot), na “Côte d´Azur”. Suas existências superficiais em busca de prazer são ameaçadas até que a chegada de Anne (Deborah Kerr), amiga da ex-mulher de Raymond reaparece. Quando Raymond propõe casamento a Anne, Cécile percebe que sua vida vai mudar por completo e, para se libertar da futura madrasta, arma uma intriga, usando seu namorado Philippe (Geoffey Horne) e Elsa, ocasionando uma tragédia. Preminger teve a idéia inteligente de usar a fotografia em preto e branco para mostrar o tempo presente triste em Paris, passado quase todo nos bistrôs e nas caves, e o technicolor para exprimir o passado alegre na Riviera Francesa. Também arguta foi a utilização da música de Georges Auric e a aparição discreta de Juliette Greco em uma boate cantando “Bonjour Tristesse” e suscitando as memórias de Cécile.  Estas se encerram com as lágrimas escorrendo pelo seu rosto enquanto ela o cobre de creme após mais uma noitada de vida falsa, mas agora angustiada pelo remorso e com um sentimento de tristeza que não a deixará jamais. Notável a abertura de Saul Bass, onde as pétalas de uma flor se transformam em lágrimas.

James Stewart e Ben Gazarra em Anatomia de um Crime

Anatomia de um Crime. Drama de tribunal passado em uma pequena cidade do Michigan, onde o advogado Paul Biegler (James Stewart), ex-promotor público que perdeu sua reeleição, assessorado por seu colega alcoólatra Parnell McCarthy (Arthur O´Connell) e sua secretária sarcástica Maida (Eve Arden), aceita a defesa do tenente Frederick Manion (Ben Gazarra), soldado arrogante acusado da morte de um homem que, segundo ele alega, violentara sua mulher, Laura (Lee Remick). Depois de uma verdadeira batalha judicial, Biegler obtém sua absolvição usando o argumento do “impulso irresistível”. Embora longo e muito dialogado o espetáculo mantém a atenção do princípio ao fim graças ao interesse do assunto versando sobre tema sexual, ao valor dos intérpretes, à boa fotografia de Sam Leavitt, à música maravilhosa de Duke Ellington e principalmente à habilidade diretorial de Preminger, valendo mencionar ainda a abertura como sempre soberba de Saul Bass com aquele corpo quebrado. O filme, indicado ao Oscar, faz uma autópsia do sistema judiciário americano, suscitando questão importante como a fragilidade de uma justiça para a qual não existe uma verdade objetiva. E contém ainda um tema secundário: a vitória pessoal do trio do escritório: Biegler retoma seu gôsto pela advocacia, McCarth para de beber e Maida fica feliz em ter ajudado os dois. Houve indicações ao Oscar também para James Stewart (Melhor Ator), Arthur O´Connell e George C. Scott, que faz o papel do promotor público (Melhor Ator Coadjuvante), Sam Leavitt (Melhor Fotografia em preto e branco), Wendell Mayes (Melhor Roteiro Adaptado) e Louis R. Loeffler (Melhor Montagem).

Cena de Exodus

Exodus. Drama histórico grandiloquente (e com evidente parti pris), baseado no livro de Leon Uris sobre a criação de Israel, com roteiro de Dalton Trumbo, ousadamente creditado em um desafio à Lista Negra de Hollywod.  O filme acompanha a aventura do navio Exodus que conduz refugiados para a nova pátria, a oposição entre dois movimentos judeus, um pacifista (o Hagana), outro terrorista (o Irgun), a luta contra os ingleses e o início do conflito com os árabes. Preminger conduz o espetáculo com muita segurança, abordando com inteligência cinematográfica tanto as cenas de ação política ou de violência quanto as cenas românticas (entre Ari Ben Canaan / Paul Newman e Kitty Fremont / Eva Marie Saint). Ele como sempre emprega a tela larga de maneira admirável, notadamente nas cenas com muitos figurantes e mantém o espetáculo em constante excitação. Ernest Gold ganhou o Oscar de Melhor Música e Sal Mineo e Sam Leavitt foram indicados respectivamente para o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante e Melhor Fotografia em cores.

Charles Laughton e Walter Pidgeon em Tempestade sobre Washington

Tempestade sobre Washington. Drama político baseado em um romance de Allen Drury, ganhador do Pulitzer Prize, descreve com lucidez e sob forma de reportagem o desenrolar da nomeação de um Secretário de Estado, Robert Leffingwell (Henry Fonda), que deve ser sabatinado pelo Senado.  Os inimigos do candidato, tendo à frente um velho senador reacionário da Carolina do Sul, Seabright Cooley (Charles Laughton), tentam desacreditá-lo, acusando-o de ter pertencido a uma célula comunista. Preminger apresenta uma reflexão amarga e desiludida sobre a mecânica do poder e a manipulação política nos Estados Unidos, penetrando no interior do Capitólio para  mostrar com força dramática as maquinações que são tramadas nos seus corredores – incluindo campanha de difamação, falsos testemunhos, barganhas e chantagem – que podem levar até à morte. O cineasta mantém o filme permanentemente tenso até o final surpreendente apoiado por uma equipe técnica competente e pelo elenco de grandes atores veteranos (além de Fonda e Laughton, Walter Pidgeon, Peter Lawford, Gene Tierney, Franchot Tone, Lew Ayres, Burgess Meredith).

 

Tom Tryon e John Huston em O Cardeal

O Cardeal. Drama de dimensão épica baseado no romance de Henry Morton Robinson acompanhando o caminho espiritual de Stephen Fermoyle (Tom Tryon) que, no momento de sua nomeação como Cardeal em 1939, lembra-se das etapas principais de sua vida, passando por problemas dentro e fora da Igreja desde sua ordenação como padre em 1917. Este itinerário engloba uma vasta quantidade de espaços, de experiências, de conflitos históricos e particulares  – v. g. além de Roma, episódios em Boston, com o problema familiar de sua irmã ( Carol Lynley) querendo casar-se com um rapaz  judeu e se tornando mãe solteira;  no Canadá, com o padre Halley em estado terminal; em Viena, com o quase romance – quando provisoriamente secularizado – com uma moça austríaca sua aluna, Annemarie (Romy Schneider); na Georgia, com a defesa do padre negro  (Ossie Davis) e a Ku-Klux-Khan; novamente em Viena com o Cardeal Innitzer (Josef Meinrad) e os nazistas – , sem que esta constante deslocação no espaço e no tempo prejudique a unidade narrativa. Preminger expõe os fatos objetivamente, mostrando virtudes e defeitos da Igreja, em um estilo visual composto por belas composições pictóricas e seus famosos planos longos enquanto uma música linda de Jerome Moross fornece um clima solene à narrativa. Em papéis coadjuvantes vemos o diretor John Huston e dois ex-galãs de épocas distintas, Tullio Carminatti e Raf Vallone. Preminger recebeu sua segunda indicação ao Oscar de Melhor Direção e John Huston, Leon Shamroy, Lyle Wheeler, Louis R. Loeffler e Donald Brooks também foram indicados respectivamente para Melhor Ator Coadjuvante, Fotografia, Direção de Arte, Montagem e Figurinos.

Carol Lynley em Bunny Lake Desapareceu

Bunny Lake Desapareceu. Drama psicológico e de mistério tendo como ponto de partida o desaparecimento de uma menina, Bunny Lake, filha de uma mãe solteira, Ann Lake (Carol Lynley), que vive sob o domínio afetivo de seu irmão Stephen (Keir Dullea). A Polícia inicia uma investigação, mas o tenente Newhouse (Laurence Olivier) não encontra nenhum traço da criança. O policial segue várias pistas falsas encontrando tipos excêntricos (interpretados pelos atores veteranos britânicos Noel Coward, Martita Hunt, Finlay Currie) e acaba se perguntando se a menina realmente existe. Progressivamente começamos a duvidar dos personagens. Anna Lake é louca? E o irmão? Qual é a dele? O suspense vai crescendo até um final inesperado evocando de modo sutil um assunto tabu. Um dos pontos altos do filme é a fotografia em preto e branco (Denys Coop) das locações e interiores de Londres, sobressaíndo a sequência do hospital de bonecas no porão com Ann segurando uma lamparina de óleo. Outros  trunfos da realização são a partitura de Paul Glass, apresentada de um modo inventivo pelo diretor e a participação de Laurence Olivier, compondo com incomparável destreza o papel do inspetor gentil  e metódico que conduz a apuração dos fatos.

A segunda e derradeira fase da trajetória fílmica de Otto Preminger a partir de 1954 é um período de declínio criativo e comercial e vai 1967 a 1979, incluindo os seguintes filmes: 1967 – O Incerto Amanhã / Harry Sundow. 1968 – Skidoo Se Faz A Dois / Skidoo. 1970 – Dize-me Que Me Amas / Tell Me That You Love Me, Junie Moon. 1971 – Amigo É Pra Essas Coisas / Such Good Frends. 1975 – Setembro Negro / Rosebud.1979 – O Fator Humano / The Human Factor.

Este final de carreira melancólico e seu comportamento intimidativo em relação às suas equipes especialmente atores com menos experiência foram os pontos fracos do percurso cinematográfico de Otto Preminger porém, pelo conjunto de seu legado artístico como diretor e seu pioneirismo como produtor independente e corajoso merece ser sempre lembrado como um grande cineasta.

OTTO PREMINGER I

Sua importância na História do Cinema como produtor que desafiou o Código de Produção e a Lista Negra de Hollywood e como diretor de uma quantidade expressiva de bons filmes sobre uma ampla variedade de assuntos, é inegável. Além disso, ele quebrou outras barreiras realizando dois filmes somente com atores negros e abordando temas controvertidos ou proibidos.

Otto Preminger

Otto Ludwig Preminger (1905-1986), filho de Markus Preminger e Josefa Fraenkel, nasceu em Wiznitz na Polonia, mas sempre se apresentou como natural de Viena, a capital do Império Austro-Húngaro, do qual a Polonia fazia parte na época. Após ter exercido o cargo de promotor público em sua cidade natal, Czernovic, Galicia e em Graz, Esfíria, Markus ocupou o cargo eminente de procurador geral em Viena, para onde se mudou com sua família. Com a dissolução da monarquia depois da Primeira Guerra Mundial o Dr. Preminger abriu um escritório de advocacia e ganhou muito dinheiro defendendo clientes prósperos da elite.

Desde seus primeiros dias em Viena Otto ficou obcecado pelo teatro lendo e assistindo peças de famosos dramaturgos.  Sua ambição era se tornar um ator. Enquanto seu pai continuava a prosperar na Viena do pós-guerra, ele decidiu seriamente fazer uma carreira no palco. Sua grande chance surgiu em 1923, quando o vienense Max Reinhardt, que havia instalado sua base de operação em Berlim – onde firmou uma reputação de renome mundial como diretor e empresário teatral -, resolveu formar uma companhia em Viena no velho teatro Josefstadt. Otto escreveu uma carta para Reinhardt pedindo para fazer um teste, no qual foi aprovado. O Dr. Markus aceitou a decisão de Otto pedindo-lhe apenas que se formasse em Direito, o que ele conseguiu, embora faltando muito às aulas.

Quando o teatro, depois de uma reforma, foi reinaugurado em 1 de abril de 1924, Preminger fez uma breve aparição na peça Arlecchino Servitore di due patroni de Carlo Goldoni. Depois interpretou Stephano, um dos criados de Portia em The Merchant of Venice. Reinhardt pode ter tido reservas sobre a atuação de Otto, mas percebeu logo sua capacidade como administrador e o nomeou seu assistente. Porém o rapaz queria atuar e depois de passar um ano com o mestre, observando e aprendendo, achou que sua carreira iria avançar melhor se ele se juntasse a uma companhia onde tivesse a oportunidade de interpretar melhores papéis.

Com este objetivo Otto trabalhou em teatros de língua alemã de Praga, Zurich e Aussig e em 1928 voltou para Viena onde fundou uma companhia de teatro de câmara, Die Komödie, da qual se desligou no ano seguinte por divergência com seus associados. Com novos parceiros Otto organizou um teatro de repertório com o nome pomposo de Neues Wiener Schauspielhaus (Nova Casa de Teatro de Viena). Em junho de 1930, insatisfeito com o resultado artístico da companhia, demitiu-se. No mesmo ano, voltou para o teatro Josefstadt, desta vez como executivo solucionador de todos os problemas (inclusive o egocentrismo ou a irascibilidade de astros como Peter Lorre, Lili Darvas, Elisabeth Bergner, Oscar Karlweis e Alexander Moissi).  Apesar de ter sido contratado como executivo, Otto estava de olho na direção e não demorou muito para dirigir um drama de tribunal, Voruntersuchung (Investigação Preliminar), escrito por um advogado de Berlim, Max Alsberg em colaboração com o dramaturgo Otto Ernst Hesse. Na noite de estréia ele foi chamado vinte e uma vezes ao palco com seu elenco e os coautores exultantes.

Logo após este êxito, um industrial rico de Graz, Heinrich Haas, propôs ao jovem diretor de teatro que ele dirigisse um filme intitulado Die Grosse Liebe (o Grande Amor). Otto não sabia nada sobre técnica cinematográfica e, além disso, não tinha a mesma paixão pelo cinema como tinha pelo teatro, mas aceitou porque gostou da história sobre um soldado austríaco (Attila Hörbiger) que retornava da Rússia dez anos depois do final da Primeira Grande Guerra e encontrava uma senhora viúva (Hansi Niese) que pensava que ele é seu filho. Otto rejeitou o filme como uma loucura juvenil e preferiu esquecê-lo.

Desde a encenação de Voruntersuchung em janeiro de 1931 até sua última produção no Josefstad em outubro de 1935, Otto Preminger dirigiu 26 espetáculos até que Joseph Schenck (aconselhado por Julius Steger, um austríaco que havia sido parceiro de William Fox, ganhara uma fortuna na América e retornara a Viena onde se tornou cliente do Dr. Markus Preminger) o convidou para trabalhar na recém-formada Twentieth Century-Fox em Los Angeles. Preminger chegou em Nova York em 21 de outubro de 1935 e, antes de partir para Los Angeles, cumpriu um compromisso que havia assumido com o produtor teatral Gilbert Miller de reencenar Sensationsprozess, um de seus maiores sucessos em Viena, agora com o título americano de Libel!

Preminger foi contratado por Schenck, mas seria o parceiro dele, Darryl F. Zanuck, que determinaria seu destino na Twentieth Century-Fox. Depois de um aprendizado observando a filmagem de Novos Ecos da Broadway / Sing, Baby, Sing, musical de rotina dirigido por Sidney Lanfield, foi designado por Zanuck para a unidade de Sol Wurtzel (responsável por todos os filmes B do estúdio), ocupando-se da direção de duas comédias, Canção Facinadora / Under Your Spell / 1936 (com o cantor de ópera Lawrence Tibbett) e Quando o Amor Trabalha / Danger – Love at Work / 1937 (com Ann Sothern). Satisfeito com o trabalho de Preminger, Zanuck escolheu-o para dirigir um filme classe A, Kidnapped, adaptação do romance de Robert Louis Stevenson, cujo roteiro ele próprio escreveu; porém, após uma discussão séria entre eles, o diretor foi despedido. O filme seria realizado por Alfred Werker e exibido no Brasil com o título de Raptado.

Otto Preminger em Abandonados

 

Otto Preminger em Um Pequeno Erro

Com dificuldade de arranjar emprego em algum outro estúdio, Preminger retornou ao teatro, dirigindo as peças Outward Bound, Margin for Error, My Dear Children, Beverly Hills, Cue for Passion, The More the Merrier, In Time to Come, funcionando também como ator em Margin for Error e somente como ator em The Man Who Came to Dinner. Impressionado com a performance de Preminger no palco como o consul nazista Karl Baumen na peça Margin for Error, Nunnally Johnson convidou -o para interpretar o papel de outro nazista, Major Diessen, no filme Abandonados / The Pied Piper / 1942, que ele estava escrevendo e produzindo na Twentieth Century-Fox, de onde ele havia sido banido. A Fox requisitou-o novamente para repetir o papel de Karl Baumen na versão cinematográfica de Margin for Error e então Otto conseguiu convencer William Goetz (que estava administrando a Fox na ausência de Zanuck, então servindo no Army Signal Corps) a lhe conceder também a direção do filme. Depois de terminar Um Pequeno Erro / Margin for Error / 1943 e antes de conseguir outra incumbência como diretor na Fox, Preminger foi contratado por Samuel Goldwyn para aparecer como um nazista em uma comédia de Bob Hope, Correspondente Fenômeno / They Got Me Covered / 1943, e ele aceitou, porque uma aliança com Goldwyn seria útil no dia em que Zanuck retornasse do serviço militar.

Entretanto, quando Zanuck reassumiu seu posto na Fox, deu permissão para que Preminger continuasse desenvolvendo seus dois projetos, Army Wives (depois renomeado Por Enquanto, Querida / In the Meantime Darling / 1944) e Laura / Laura / 1944, ambos destinados para a unidade B; porém Preminger só poderia dirigir o primeiro. A direção de Laura, depois elevado à classe A, foi entregue a Rouben Mamoulian, mas Zanuck não gostou das primeiras cenas que ele rodou e acabou colocando Preminger no seu lugar. O filme obteve êxito e proporcionou indicações ao Oscar para Melhor Direção, Ator Coadjuvante (Clifton Webb), Roteiro, Direção de Arte e Joseph La Shelle arrebatou a estatueta por sua esplêndida fotografia em preto e branco.

Começava assim a fase na qual Preminger, continuando como diretor contratado da Fox, realizou alguns de seus melhores filmes, adiante assinalados em negrito: 1944 Laura. 1945 – Czarina / A Royal Scandal, comédia romântica histórica com Tallulah Bankhead como Catarina da Rússia no papel que fôra de Pola Negri na versão silenciosa, Paraíso Proibido / Forbidden Paradise / 1924 (Dir: Ernst Lubitsch). Anjo ou Demônio? / Fallen Angel. 1946 – Noites de Verão / Centennial Summer, musical romântico histórico passado durante a Exposição de Filadélfia em 1876 com Jeanne Crain, Cornel Wilde, Linda Darnell. 1947 – Entre o Amor e o Pecado / Forever Amber, drama romântico histórico com Linda Darnell, Cornel Wilde, George Sanders, tendo como pano de fundo a côrte de Carlos II na Inglaterra do século XVII; Êxtase de Amor / Daisy Kenyon. 1948 – A Condessa se Rende / That Lady in Ermine (Preminger apenas terminou a filmagem após a morte de Lubitsch). 1949 O Leque / The Fan; A Ladra / Whirlpool. 1950 – Passos na Noite / Where the Sidewalk Ends; Cartas Venenosas / The Thirteenth Letter, drama criminal de mistério com Linda Darnell, Charles Boyer, Michael Rennie. 1952 – Alma em Pânico / Angel Face.

Gene Tierney e Dana Andrews em Laura

Gene Tierney e Clifton Web em Laura

Laura é o mais estilizado de todos os filmes noirs. Investigando o assassinato de Laura Hunt (Gene Tierney) diretora de uma agência de propaganda, o detetive Mark McPherson (Dana Andrews) interroga seu mentor, um influente jornalista quinquagenário, Waldo Lydecker (Clifton Webb) que considerava Laura não apenas como sua maior “criação”, mas também propriedade pessoal. No decorrer da investigação McPherson começa a ficar fascinado pela falecida e quando vai ao apartamento dela em busca de provas, senta-se em uma poltrona e, contemplando seu retrato pendurado na parede, adormece. De repente, a porta se abre e entra a Laura de carne e osso. “Nunca me esquecerei do fim de semana em que Laura morreu”. É com este monólogo interior de Lydecker que começa o filme. Antes do aparecimento de Laura, é ele – já no outro mundo – quem recorda uma série de flagrantes evocando a ascensão profissional da jovem. Depois que Laura surge viva, a trama passa a ser conduzida por McPherson, objetivamente. O estilo conciso e sereno do diretor é notado desde os primeiros instantes, quando a câmera desliza da esquerda para a direita pelas prateleiras e depois pela sala cheia de objetos de arte do apartamento de Lydecker. Este deslocamento de câmera fluido e delicado casa-se perfeitamente com o leit-motiv musical e com os diálogos sofisticados enquanto a iluminação dramatizada de Joseph La Shelle – premiada com o Oscar – fornece o clima noir adequado.

Dana Andrews em Anjo ou Demônio

Alice Faye e Dana Andrews em Anjo ou Demônio

Anjo ou Demônio? Tem início quando Eric Stanton (Dana Andrews) chega a Walton, pequena cidade da Califórnia, e logo se interessa por Stella (Linda Darnell), uma linda e sensual garçonete. A jovem desperta também o desejo de outros homens como o velho Pop (Percy Kilbidge) proprietário da lanchonete na qual trabalha, e Dave Atkins (Bruce Cabot), um sujeito que explora máquinas de caça níqueis. Para conquistar Stella, Eric casa-se com June (Alice Faye), uma solteirona rica, pretendendo deposá-la de sua fortuna e se divorciar em seguida. Porém Stella aparece morta. Erica acaba descobrindo que o policial Judd (Charles Bickford) adorava Stella e a matou, quando esta lhe disse que ia se casar com Dave. Um aspecto interessante da trama é justamente a paixão que Stella desperta em quatro homens, cada qual reagindo de uma maneira diferente. A reação mais estranha é a de Judd que, no final da narrativa, revela para Eric: “Durante anos eu vim tomar café aqui, somente para vê-la. Todos os dias, durante dois anos”. Uma loucura que o levou ao crime. Além de um close-up original em silhueta de Eric e Stella no   baile, chamam a atenção a cena do interrogatório na qual o assassino veste uma luva de borracha para extorquir brutalmente a confissão de um inocente e a do final, quando, antes de ser levado preso, aciona a vitrola da lanchonete e emerge a melodia favorita da vítima, restituindo por alguns instantes a sua invisível presença.

 

Madeleine Carroll, Richard Greene e Jeanne Crain em O Leque

Richard Greene, George Sanders e John Sutton em O Leque

O Leque é uma adaptação da peça de Oscar Wilde que Ernst Lubitsch já havia ilustrado no tempo da cena muda. Preminger se concentrou mais no melodrama do que sobre a sátira brilhante da alta sociedade londrina vitoriana, mas conservou os diálogos deliciosos oriundos da pena do grande escritor, dramaturgo e poeta irlandês.  Desta vez, em uma Londres devastada pelos bombardeios após a Segunda Guerra Mundial, uma velha senhora, Mrs. Erlynne (Madeleine Carroll) assiste à venda em um leilão de um leque que lhe pertence. Ela gostaria de recuperá-lo. O leiloeiro lhe dá um prazo de vinte quatro horas para provar suas alegações. Mrs. Erlynne então vai ao domicílio de um de seus antigos relacionamentos, Lord Darlington (George Sanders). Com a ajuda de retrospectos, eles revivem o passado quando Lord Darlington contou para Lady Windermere (Jeanne Crain), de quem estava apaixonado, que seu marido (Richard Greene) a traíra com Mrs. Erlynne. Magoada, Lady Windermere parte para a residência de seu admirador Lord Darlington, que lhe havia declarado seu amor. Mrs. Erlyne vai atrás dela e lhe diz qque seu marido lhe é fiel. Quando Lord Darlington chega em casa na companhia de Lord Windermere, Lord Lorton e um outro amigo, as duas mulheres se escondem. Os homens encontram o leque de Mrs. Windermere e Lord Windermere acusa Lord Darlington de ser amante de sua esposa.  Lady Windermere foge e Mrs. Erlynne, que não é outra senão a mãe que ela nunca conheceu, sacrifica sua própria felicidade que o casamento com Lord Lorton (Hugh Dempster) lhe proporcionaria, assumindo que o leque era seu. A encenação elegante e fluente de Preminger e a atuação primorosa dos quatro intérpretes principais tornam o filme muito agradável.

Dana Andrews em Passos na Noite

Dana Andrews e Gene Tierney em Passos na Noite

Passos na Noite retrata ao mesmo tempo uma cidade noturna e um homem da lei que se corrompeu. O pai de Mark Dixon (Dana Andrews) era um ladrão, e isto o tornou o que é: um policial perigoso que quer fazer justiça pelas próprias mãos. Depois de ser repreendido por seu superior por excesso de violência, Dixon investigas a morte de um sujeito que morreu no cassino clandestino do gângster Scalise (Gary Merrill). O principal suspeito é Paine (Craig Stevens) que havia atraído Morrison para o jogo, usando a jovem Morgan Taylor (Gene Tierney). Ao interrogá-lo, Dixon entre em luta corporal com ele, matando-o acidentalmente. O chofer de taxi, Jiggs Taylor (Tom Tully), pai de Morgan, é incriminado, pois fôra procurar Paine no dia em que foi morto para tentar afastá-lo da filha. Dixon interessa-se por Morgan e faz tudo para incriminar Scalise. É com um estilo visual calmo e preciso que Preminger descreve a passagem de seu herói para a ilegalidade, sua inquietude, seu trauma de infância (“Fiz tudo para ser diferente dele”) e sua visão dark do mundo (“Um passo em falso e você pode se meter em uma enrascada”). Dixon torna-se um personagem noir típico, desorientado existencialmente e vítima das circunstâncias; porém o amor o encaminhará para a redenção. Exteriores filmados em locação e a acurada fotografia em preto e branco de La Shelle criam uma atmosfera adequada ao drama e os momentos de suspense (v. g. quando Dixon deixa o local do crime disfarçado de Paine e depois carrega seu corpo até o carro; a cena em que o tenente manda-o fingir que é Paine, reconstituindo sua saída apartamento do morto) são muito bem construídos.

Robert Mitchum e Jean Simmons em Alma em Pânico

Jean Simmons e Robert Mitchum em Alma em Pânico

Alma em Pânico tem início quando o chofer de ambulância, Frank Jessup (Robert Mitchum) salva uma senhora rica, Mrs. Tremayne (Barbra O´Neil) de morrer asfixiada por gás e é contratado como motorista particular da família. Frank apaixona-se por Diane, (Jean Simmons), a enteada de Mrs. Tremayne, que odeia a madrasta. A jovem planeja um acidente, ocasionando não só a morte da madrasta, mas também a de seu pai (Herbert Marshall), que estava no carro sem que ela soubesse. Frank prepara-se para deixar Diane, porém ocorre um desenlace trágico. A personagem central tem traços que a relacionam com o arquétipo da mulher fatal. Ela manipula, e eventualmente mata, para obter o que deseja; porém o que motiva seu comportamento não é a ambição pelo dinheiro, mas uma obsessiva fixação pelo pai e o ódio patológico da madrasta. A cena final é uma das mais chocantes do cinema, não só pela maneira horrível como os personagens morrem como também pela sua absoluta imprevisibilidade. Diane se oferece para levar Frank até o ponto de ônibus, pensando que vai conseguir convencê-lo a ficar. De repente, põe a mudança do carro em marcha a ré, fazendo-o recuar para um penhasco, matando Frank e a si própria.

Após a filmagem de Cartas Venenosas e antes de filmar Alma em Pânico, aproveitando a cláusula de seu contrato com a Fox que lhe permitia permanecer em Nova York por seis meses durante o auge da temporada teatral, Preminger encenou três peças (Four Twelves Are 48, The Moon is Blue, Modern Primitive) e participou como o comandante de um campo de prisioneiros nazista em Inferno nº 17 / Stalag 17 de Billy Wilder.  Depois deste intervalo teatral, Preminger preparou a adaptação cinematográfica de Ingênua Até Certo Ponto / The Moon is Blue, sua estréia como como produtor-diretor independente.

A SÉRIE BLONDIE

A série Blondie originou-se das histórias em quadrinhos de Murat (Chic) Young, criada em 15 de setembro de 1930 para o King Features Syndicate. Nas tiras de Chic Young, Blondie Boopadoop era inicialmente uma melindrosa fútil e despreocupada, cortejada por Dagwood Bumstead, filho de um rico industrial. Em 17 de fevereiro de 1933, Blondie casa-se com Dagwood, que é prontamente deserdado pelo pai. O ex-playboy então tem que trabalhar para sustentar a família enquanto Blondie torna-se uma esposa doce e devotada da classe média americana, que assume as rédeas do lar e, com paciência e sensatez, aguenta as palermices do marido, tenta todos os esquemas para reforçar a posição profissional do esposo e se mete em uma série de confusões nos seus esforços para complementar o orçamento familiar.

Penny Singleton, Daisy e Arthur Lake

Esta reviravolta na personalidade de Dagwood e Blondie foi talvez o fator preponderante para a sua popularidade internacional, traduzida em várias línguas e publicada simultaneamente em mais de dois mil jornais do mundo. Nos quadrinhos publicados no Brasil Blondie virou Belinda e Dagwood recebeu o nome de Alarico. Já o Jornal do Comércio publicou Blondie, mantendo o nome original americano.

As aventuras e desventuras do casal Bumstead e sua prole (que incluía o bebê Dumpling, depois chamado de Alexander, quando adolescente, e Cookie, a filha caçula) foram transportadas para o cinema em 28 filmes de orçamento modesto (com duração entre 65 a 70 minutos), produzidos pela Columbia Pictures entre 1938 e 1950.

Blondie era interpretada por Penny Singleton, Dagwood por Arthur Lake, Baby Dumpling e Alexander por Larry Simms e Cookie por Marjorie Kent. Nas cópias distribuídas em nosso país Blondie se chamava Florisbela; Dagwood, Pancrácio. e Baby Dumpling atendia pelo nome de Jujuba. A sensação que se sente vendo os filmes é que Florisbela, Pancrácio, Jujuba são reais, pessoas que podemos encontrar a qualquer momento. Em cada filme da série o cão Daisy, canino de raça híbrida (Cocker Spaniel-Poodle-Terrier), muito bem treinado por Rudd Weathermax e auxiliado por alguns truques de câmera, quase rouba o espetáculo. No Brasil Daisy recebeu o nome de Faísca.

Muito  fiel à sua fonte original, os espetáculos tinham um elenco bem escolhido e suas histórias foram desenvolvidas com  bom humor e ternura, gags verbais e visuais inteligentes e compreensão das excentricidades domésticas, destacando-se ainda outros personagens fixos: J. C. Dithers (Jonathan Hale), o irascível patrão de Dagwood, dono de uma construtora (personagem depois chamado de Mr. Radcliffe, interpretado por Jerome Cowan); o carteiro apressado (Irving Bacon) que sempre colide com Dagwood de manhã; Alvin Fuddle (Danny Mummet), amigo de infância de Dagwood.

Jujuba, Florisbela, Pancrácio e … Rita Hayworth

O elenco foi praticamente o mesmo nos 28 filmes – envelhecendo tanto na tela como na vida real. Sempre que um dos personagens contínuos era interpretado por um ator diferente, sua aparência diferente era cuidadosamente explicada no roteiro. Vários artistas contratados do estúdio podem ser vistos nos filmes da série, entre eles alguns que se tornariam grandes astros como Rita Hayworth e Glenn Ford ou se destacariam em produções A como Larry Parks, Anita Louise, Peggy Ann Garner, Adele Jergens, Janet Blair, Hans Conried, Adele Mara, Lloyd Bridges, James Craig. Em um dos filmes da série, A Família do Barulho, foi utilizado o samba “Solteiro é Melhor” de autoria de Rubens Soares e Felisberto Silva (gravado por Francisco Alves em 1939), Penny Singleton se solta, dançando uma conga com Tito Guizar e Lake (travestido de mulher) toca bateria na banda do ator mexicano.

Penny Singleton (1908- 2003), cujo verdadeiro nome era Mariana Dorothy McNulty, nasceu em Filadélfia, Pennsylvania. Seu pai era um jornalista e seu tio Diretor-Geral dos Correios. Quando criança interpretava illustrated songs (canções ou hinos patrióticos ilustrados por slides coloridos de lanterna mágica, mostrando as letras das canções e poses de modelos representando trechos das mesmas) nos primeiros cinemas e fazia alguns números de mímica. Após cursar a Universidade de Columbia, ela voltou para o teatro, aparecendo como cantora e acrobata em musicais da Broadway. Em meados dos anos trinta assinou contratos com a Warner Bros. e MGM, obtendo papéis insignificantes. Uma boa participação neste período foi em A Comédia dos Acusados / After the Thin Man / 1936 como uma cantora de boate (creditada como Dorothy McNulty). Em 1937 ela se casou com um dentista, Dr. Lawrence Singleton, e pintou seu cabelo preto para conquistar o papel da loura Blondie, quando a atriz Shirley Deane teve que abdicar do mesmo em virtude de doença. Em 1941, Penny já divorciada, casou-se com o produtor Robert Sparks. Desde que entrou para a série Blondie, Penny teve dificuldade de obter outros papéis, mas conseguiu aparecer em A Amazona Apaixonada / Go West Young Lady / 1941, dividindo o estrelato com Glenn Ford e Ann Miller.  Em 1951, quando a série Blondie terminou, Penny voltou para o circuito de boates. Em 1960, tornou-se líder sindical, cumprindo dois mandatos como presidente do American Guild of Variety Artists.

Arthur Lake e Penny Singleton

Arthur Lake (1905 – 1987), cujo verdadeiro nome era Arthur Silverlake Jr., nasceu em Corbin, Kentucky. Seu pai e o tio faziam um número de acrobacia aérea e eram conhecidos como “The Flying Silverlakes”. A mãe de Lake, Edith Goodwin, era atriz. Quando a família mudou do circo para o circuito do vaudeville, Lake e sua irmã juntaram-se a eles. O grupo viajou pelo Sul dos EUA, anunciado como “Family Affair”. Lake apareceu no cinema pela primeira vez em João, o Matador de Gigantes / Jack and the Beenstalk / 1917, produzido pela Fox Corporation. Durante os anos vinte ele participou de comédias curtas da Universal e, nos períodos de folga, trabalhou no vaudeville. O primeiro filme falado dele foi Conquistadores do Ar / Air Circus / 1920. Os espectadores ouviram sua voz pela primeira vez como Harold Astor, o papel principal que ele teve no musical de bastidor Toca a Música / On With the Show! / 1929. Nos anos trinta, os fãs veteranos devem se lembrar de Lake como o ascensorista na divertida comédia sobrenatural A Dupla do Outro Mundo / Topper / 1937. Uma vez que entrou para a série Blondie, ele se tornou tão tipificado pelo personagem abobalhado, que raramente teve oportunidade de aparecer em papéis diferentes como (v. g. Amores de Folga / Sailor´s Holiday / 1944, O Crime do Fantasma / The Ghost That Walks Alone / 1944 e Três é Demais / Three is a Family / 1944). Em 1954 ele participou, com sua esposa Patricia Van Cleve e seus dois filhos, de um telefilme piloto, Meet the Family, baseado em uma idéia de Marion Davies. Lake frequentava a mansão dos Hearst, onde conheceu Patricia que, segundo consta, era filha ilegítima de Marion e do famoso magnata da imprensa.

Em 1943, após os quatorze filmes iniciais, a Columbia perdeu o interesse pela série, porém os espectadores escreveram para o estúdio com tanto entusiasmo, que os responsáveis pela produção resolveram reativá-la em 1945 e ela continuou até 1950.

Blondie na TV

Blondie chegou ao rádio transmitido pela CBS em 1939. A série radiofônica apresentava todos os elementos familiares aos leitores da história em quadrinhos e aos espectadores da série cinematográfica e obteve o mesmo sucesso. No ar foi ouvida de 1939 a 1951 com as vozes de Penny Singleton e depois sucessivamente Ann Rutherford, Alice White e Patricia Van Cleve como Blondie; Arthur Lake como Dagwood; Leone Ledoux (especialista em papéis infantís) como Baby Dumpling e Cookie quando crianças; Larry Simms e Bobby Ellis, Jefffrey Silver como Alexander; Marlene Aames e depois Norma Jean Nilsson, Joan Rae como Cookie; Hanley Stafford como J.C. Dithers; Dix Davis como Alvin Fuddle, etc. Cada programa começava com a famosa “Uh-uh-uh- don´t touch that dial! Listen to …  (Nâo toque naquele botão de contrôle! Ouça – Blondie!). Voz de Dagwood: B-l-o-o-o-o-n-d-i-e!!! Uma sequência sempre repetida no programa de rádio era aquela de Mr. Dithers gritando por Dagwood “Come into my office” (Entre no meu escritório) contrapontuada por um obbligato de trombeta em surdina.

Na televisão, Blondie mereceu duas séries. A primeira, transmitida pela NBC, tinha 26 episódios e foi ao ar de janeiro a junho de 1957 com Pamela Britton como Blondie, Arthur Lake como Dagwood, Florenz Ames como J. C. Dithers, Ann Barnes como Cookie e foi ao ar de setembro de 1968 e janeiro de 1969 de 1968 (exceto o 14º que não chegou a ser programado) com Patricia Harty como Blondie, Will Hutchins como Dagwood, Pamelyn Ferdin como Cookie, Peter Robbins como Alexander, Jim Backus como J.C. Dithers., etc.

FILMOGRAFIA

Dirigidos por Frank Strayer:

1938 Florisbela / Blondie.

1939 Florisbela Secretária / Blondie Meets the Boss

Florisbela em Férias / Blondie Takes a Vacation.

Florisbela Domestica o Baby / Blondie Brings Up Baby

1940 Florisbela Quer o Divórcio / Blondie On a Budget

Florisbela Boa-Vida/ Blondie Has Servant Trouble

Cupido Perigoso / Blondie Plays Cupid

1941 Família do Barulho / Blondie Goes Latin

Bancando a Grã-fina / Blondie in Society

1942 Blondie Goes to College

Um Papai em Apuros / Blondie´s Blessed Event

Esposas em Pé de Guerra/ Blondie for Victory

1943  It´s a Great Life

Footlight Glamour

Dirigidos por Abby Berlin:

1945 Donativo Desastroso / Leave it to Blondie

Life with Blondie.

1946 Blondie Knows Best

Blondie´s Lucky Day

1947 Blondie’s Big Moment

Blondie’s Holiday

Bondie in. the Dough

Blondie´s Anniversary

Blondie’s Reward

1948 Blondie ´s Secret

1949 Blondie’s Big Deal

Blondie Hits the Jackpot

1950 Blondie’s Hero.

Beware of Blondie

O CINEMA DE MARCEL PAGNOL E SACHA GUITRY

Menosprezados durante muito tempo pelos críticos e pouco conhecidos pelo público brasileiro (todos os filmes de Pagnol, menos um, não foram exibidos comercialmente em nosso país e dos 27 filmes de Guitry apenas 9 passaram em nossas telas), eles foram recentemente reabilitados graças a várias retrospectivas de suas obras e uma maior divulgação por meio da televisão e dos dvds; hoje, são considerados grandes cineastas.

MARCEL PAGNOL

Marcel Pagnol (Aubagne, 1895 – Paris, 1974) defendeu a causa do “cinema teatral” e expôs os princípios que ele chamou de Cinematurgie na revista Les Cahiers du Film. Na sua síntese: “O filme falado devia reinventar o teatro”. Os críticos diziam que Pagnol não fazia cinema mas “teatro em conserva, porém ele sabia que fazia um cinema à sua maneira (e com o seu dinheiro, pois, a partir de certa época, abriu a sua produtora, o seu estúdio e até o próprio cinema).

Seguindo os passos do pai, Pagnol exerceu a profissão de professor de inglês nos arredores de Marselha. Em 1922 lecionou no Lycée Condorcet em Paris, mas logo abandonou o magistério para se dedicar exclusivamente ao teatro. O sucesso de Topaze, e depois de Marius, revelou ao público francês que ele era um escritor de verdade. Em seguida vieram Fanny, César e finalmente Pagnol decidiu entrar no novo mundo do filme sonoro. Marius / 1931 e Fanny / 1932, os primeiros filmes baseados em suas peças, foram respectivamente realizados, sob sua orientação, por Alexander Korda e Marc Allégret. Mas ele próprio completaria com César / 1936, a trilogia marselhesa, comédias de costumes impregnadas de um calor humano inimitável, que asseguraram a glória de seu autor e de seus intérpretes (Raimu – César, Pierre Fresnay – Marius, Orane Demazis – Fanny, Charpin – Panisse).

Em 1933 Pagnol estreou na direção com Le Gendre de Monsieur Poirier, adaptação de uma comédia de costumes de Emile Augier e Jules Sandeau e logo depois Angèle e Joffroi, ambos realizados em 1934, iniciaram uma série de filmes baseados nos contos e novelas de Jean Giono, destacando-se, Regain / 1937 e A Mulher do Padeiro / La Femme du Boulanger / 1938. Servindo-se de atores excepcionais, tendo à frente Raimu e Fernandel, Pagnol mostrava os habitantes do Midi tais como eram, gente simples de espírito franco e bem-humorado com um gosto especial pelas réplicas espirituosas, e os fazia falar a própria língua, com a impetuosidade verbal e o sotaque que era um dos encantos do pequeno mundo provençal, embora em certos trechos desses filmes eles falassem demais. Ninguém descreveu melhor o universo campestre, recriado em cenários naturais com simplicidade e absoluta fidelidade, o que levou De Sica e Rosselini a reconhecê-lo como inventor do neorrealismo italiano.

Outros filmes de Pagnol produzidos nos anos 1930 (Merlusse / 1935; Le Schpountz / 1938) ou nas décadas posteriores (La Fille du Puisatier / 1940; Naïs / 1945; Manon des Sources / 1952) têm algum encanto por seus tipos humanos sobretudo o palerma que acredita ser um artista de Le Schpountz e o corcunda comovente de Naïs, duas admiráveis interpretações de Fernandel; Manon no entanto é cansativo com suas quatro horas de projeção e verbosidade incontida. Quanto aos demais, Cigalon / 1935 é uma fábula provençal muito palavrosa; Topaze / 1936 vale apenas pela interpretação de Fernandel; La Belle Meunière / 1948 é uma experiência frustrada inclusive na aplicação do processo de cor Rouxcolor testado na ocasião; Les Lettres de Mon Moulin / 1954, último filme do cineasta baseado em quatro contos de Alphonse Daudet, peca pela loquacidade e estaticidade.

Em 1957, Pagnol publica suas memórias de infância, “La Gloire de Mon Père” e “Le Chateau de Ma Mère” (transportadas para o cinema anos em 1990 por Yves Robert). Em  1986, Claude Berri filmou “L’Eau des Collines”, epopéia romanesca em duas  partes,  “Jean de Florette“ e “Manon des Sources”, espetáculo esplêndido que reproduz magnificamente o universo do cineasta com atuações notáveis de Gerard Depardieu, Yves Montand e Daniel Auteuil. Pagnol reuniu sob o título “L’Eau des Collines” o roteiro de seu filme Manon des Sources (tema da segunda parte do livro) e Jean de Florette, (tema da primeira parte, a história do corcunda, pai de Manon, sua chegada nas colinas com a mulher e a filha, sua obstinação, seu calvário, sua ruína e sua morte).

No meu livro “Uma Tradição de Qualidade: O Cinema Clássico Francês 1930-1959” (Editora PUC / Contraponto, 2010) incluí três filmes de Marcel Pagnol e dois de Sacha Guitry entre os 150 filmes representativos do cinema clássico francês:

MARIUS

Pierre Fresnay e Orane Demazis em Marius

 

O jogo de cartas

No velho porto de Marselha, o Bar de la Marine é mantido por César (Raimu), que ali vive com seu filho Marius (Pierre Fresnay). Honorine (Alida Rouffe), vizinha e comerciante, tem uma filha, Fanny (Orane Demazis), apaixonada por Marius. Porém o rapaz só sonha com o mar e com os grandes veleiros, que poderão levá-lo para lugares longínquos. Panisse (Fernand Charpin), viúvo e rico, embora bem mais velho que Fanny, quer se casar com ela. Fanny torna-se amante de Marius, mas constata a amargura dele, contrariado nos seus projetos de evasão, e o incita a se engajar como marinheiro em um navio que está partindo. Primeiro exemplar da trilogia Marius-Fanny-Céar, comédias de costume meridionais que revelaram o mundo de Pagnol com sua humanidade simples e calorosa, seu folclore marselhês, imposto na tela pelo texto e por atores maravilhosos. A cena na qual Raimu tenta trapacear no jogo de cartas, dizendo para seu parceiro “tu me partes o coração” é apenas um dos vários momentos antológicos do espetáculo, filmado em exteriores bastante fotogênicos. Pierre Leprohon tinha razão:  o teatro convinha a Pagnol por causa do seu gôsto pelo verbo, pela eloquência, mas o cinema também lhe convinha porque o liberava da cena, do cenário, do pano de fundo. Pagnol precisava do ar livre, do sol, do espaço. O cinema foi para o jovem autor o desejo de evasão que atormentava Marius.

REGAIN

Fernandel e Orane Demazis em Regain

Orane Demazis e Fernandel

Aubignane é uma aldeia perdida na montanha, que está morrendo. Seus últimos habitantes são Panturle (Gabriel Gabrio), o caçador, e La Mamèche (Marguerite Moreno), uma velha italiana meio louca. Esta sugere a Panturle que procure uma mulher, a fim de dar vida às ruínas. Chegam Arsule (Orane Demazis), uma jovem miserável, e Gédémus (Fernandel), um amolador de facas itinerante sórdido e egoísta. Arsule abandona Gédémus e vai morar com Panturle. E enquanto La Maméche morre despedaçada pelas aves de rapina, Panturle e Arsule, unidos pelo amor e ardor pelo trabalho, vão enfim regenerar aquele solo árido.

História de uma aldeia abandonada por seus habitantes que vai reviver graças ao amor, à coragem e à esperança de um casal de deserdados. Os símbolos são simples e diretos. O sulco nos campos, o nascimento de uma criança, o azul do céu, a fecundidade do solo … a vida ganhando da morte. Panturle e Arsule são personagens de coração puro que vivem no ritmo das estações em comunhão com uma Provença bucólica e profundamente verdadeira. Uma cena particularmente comovente e poética ocorre quando os amigos das aldeias vizinhas vêm em ajuda ao casal: uns lhe emprestam o trigo, um outro a relha do arado, que é o seu único bem na terra.

A MULHER DO PADEIRO

Raimu e Ginette Leclerc em A Mulher do Padeiro

Cena de A Mulher do Padeiro

Aimable Castanet (Raimu), o novo padeiro da aldeia de Sainte-Cécile, na Provença não tem rival para fazer um bom pão branco. Um dia, sua mulher, Aurélie (Ginette Leclerc), foge com Dominique (Charles Moulin), o pastor de ovelhas do marquês de Monelles (Fernand Charpin). O infortúnio do padeiro a princípio diverte a comunidade, mas Aimable, desesperado, não tem mais ânimo para o trabalho. Ele se embriaga, abandona o forno e quer se enforcar. Os aldeões então se organizam para trazer a infiel Aurélie de volta.

Crônica camponesa tão rica de verdade humana quanto os outros filmes provençais do diretor. É um estudo preciso das reações que a infelicidade provoca em um homem simples do coração. O filme trata também da solidariedade de um grupo, que estava oculta e se manifesta em razão do desespêro pela inação do padeiro. Toda a intriga gravita em torno de Raimu e ele nos proporciona uma de suas melhores composições: vejam a longa cena de embriaguez na qual ele ri, canta em italiano, diz obscenidades, se afoga em lágrimas e adormece, evocando com lirismo o dor dos braços de sua mulher. Fica-se com vontade de chorar quando Aimable, sem ousar se dirigir a Aurélie no retorno de sua fuga, expressa toda a sua dor, dirigindo-se à gata, que também fugira.

SACHA GUITRY

Sacha Guitry

Filho do ator de teatro Lucien Guitry, Alexandre-Pierre Georges “Sacha” Guitry (São Petersburgo, 1885 – Paris,1957) passou a infância entre celebridades artísticas (Claude Monet, Auguste Renoir, Sarah Bernhardt, Anatole France etc.), que figuraram no seu curta-metragem amador Ceux de Chez Nous, realizado em 1915. No ano seguinte, estreou os palcos e depois se tornou um ator aclamado pelo público e um dos dramaturgos mais fecundos e espirituosos do teatro de boulevard parisiense. Apesar de seu ceticismo inicial com relação ao cinema falado, Guitry ingressou nesse meio com Pasteur / Pasteur / 1935, adaptação palavra por palavra de sua peça sobre o ilustre sábio francês. Desde então, continuou escrevendo, dirigindo e interpretando alguns dos filmes mais inventivos e livres das regras sacrossantas da  “gramática” cinematográfica, como Bonne Chance /  1935; O Novo Testamento / Le Nouveau Testament / 1936; O Romance de um Trapaceiro / Le Roman d´um Tricheur / 1936; Mon Père Avait Raison / 1936; Vamos Sonhar / Faisons um Rêve /1936; sua primeira fantasia histórica,  As Pérolas da Corôa / Les Perles de la Couronne / 1937; A Palavra de Cambronne / Le Mot de Cambronne / 1937, Madame e seu Mordomo / Desiré /1937; Remontons les Champs Elysées / 1938; Quadrille / 1938; Eram Nove Solteirões / Ils étaient Neuf Celibataires / 1939.

A liberdade com a qual Guitry lida com as formas cinematográficas é espantosa. Seus créditos vivos, espontâneos nos quais ele apresenta seus atores e cita cada um dos técnicos, por exemplo, são algo de original nos anais da Sétima Arte. O teatro-cinema de Guitry é também interessante pela crítica de costumes corrosiva presente na maioria de seus filmes e pela participação nos seus filmes de intérpretes admiráveis bastando mencionar Fernandel, Raimu e Michel Simon além dele próprio com sua dicção característica. É verdade que ele gostava de se ouvir falando e falava muito, mas sem dúvida com que elegância de espírito!

Dos grandes diretores veteranos que ficaram na França durante a Ocupação, alguns se sentiram à vontade no novo regime. Sacha Guitry, que circulou nesses anos negros como vedete na vida mundana, onde se misturavam celebridades parisienses e os uniformes dos oficiais alemães, realizou três filmes nesta época: Le Destin Fabuleux de Desirée Clary / 1941; Donne-moi tes Yeux / 1943 e La Malibran / 1943. Com a libertação da França foi preso sob a acusação de colaboracionismo, tendo sido posteriormente inocentado. Depois da guerra, ainda na década de quarenta, ele nos ofereceu: Le Comédien / 1948; Le Diable Boiteux / 1948; Aux Deux Colombes / 1949; Toâ / 1949.

Nos anos cinquenta, continuou trabalhando com a sua habitual liberdade de expressão, surgindo então: Le Trésor de Cantenac / 1950; Tu m´as Sauvé la Vie / 1950; Debureau / 1951; Adhémar ou Le Jouet de la Fatalité / 1951; La Poison / 1951; Je l´ai été Trois Fois / 1952; La Vie d´un Honnête Homme / 1953; suas três versões da História da França, Se Versailles Falasse / Si Versailles m ´était Conté / 1954, Napoleão / Napoléon / 1955 e Si Paris nous était Conté / 1956; Amantes e Ladrões / Assassins et Voleurs / 1957; Les Trois font la Paire / 1957; La Vie a Deux / 1958.

La Poison e La Vie d´un Honnête Homme, ambos interpretados por Michel Simon, se destacam. O primeiro filme instala uma situação dramática no centro da qual está um homem que, para se desembaraçar de seu “veneno”, ou seja, sua esposa, consulta um advogado, antes de assassiná-la, para saber qual a melhor maneira de pôr fim aos dias de sua companheira, e obtém efetivamente sua absolvição pelo crime cometido. No segundo filme, Simon interpreta dois irmãos gêmeos que, após duas vidas separadas, se reencontram. O irmão pobre e marginal, mas despreocupado e feliz morre nos braços do irmão rico e mesquinho, mas infeliz, sem o amor até de sua família; daí a idéia, para este, de mudar de vida assumindo a identidade do outro. Excelente oportunidade para verificar a mentira e a superficialidade de sua antiga existência.

Guitry não era o cineasta de um dogma, ou de um sistema; ele era, antes de tudo, um experimentador. Sua carreira aborda ou inventa os gêneros: biografias, crônicas subjetivas, fantasias históricas, peças filmadas, melodrama e documentário. Como escreveu Jean Tulard (Dictionnaire du Cinéma: les réalisateurs, 2003), nada resume melhor a obra filmada de Sacha Guitry como a definição que ele dava do cinema: “É uma lanterna mágica. Dela não deveriam ser excluídas a ironia e a graça “.

O ROMANCE DE UM TRAPACEIRO.

Sacha Guitry em O Romance de um Trapaceiro

Jacqueline Delubac e Sacha Guitry em O Romance de um Trapaceiro

Por ter roubado oito centavos do cofre de seus pais, um menino fica probido de comer cogumelos no almoço. Os onze membros de sua família morrem envenenados. Daí ele conclui que deve a vida à sua desonestidade, uma vez adulto (Sacha Guitry), torna-se croupier e depois trapaceiro profissional. O homem que lhe salvou a vida na Primeira Guerra mundial faz dele um jogador, e o nosso herói perde jogando honestamente tudo o que havia ganho trapaceando.

Em vez de decupar seu livro em cenas dialogadas, Sacha Guitry teve a idéia de se servir do texto – inteiramente escrito na primeira pessoa – como um comentário, as imagens vindo simplesmente em apoio às palavras. Somente uma vez o herói, que está escrevendo suas memórias, interrompe a narração para conversar cm uma velha conhecida. O autor, com sua voz nasal e modulada, fala sem parar, mas as idéias que exprime são inteligentes, espirituosas e vêm sempre acompanhadas de achados visuais muito interessantes. No filme só há um ponto de vista: o seu. O cinema de Guitry é um cinema singular, descontraído, que esperou o tempo de uma geração para ser reconhecido.

El: Jacqueline Delubac (a mulher) / Marguerite Moreno (a aventureira) / Rosine Deréna (a ladra) / Pauline Carton (Mme. Moriot,a tia) / Fréhel (a cantora) / Sacha Guitry (o trapaceiro  Serge Grave (ele, garoto)/ Pierre Assy( (ele, rapaz)/ Henri Pfeiffer (M. Charbonnier) / Pierre Labry (M. Moriot, Gaston Dupray (garçom do café).

AS PÉROLAS DA CORÔA

Jacqueline Delubac e Sacha Guitry em As Pérolas da Coroa

Guitry dirige Arletty em As Pérolas da Coroa

Um escritor francês, Jean Martin (Sacha Guitry), um ajudante-de-ordens do rei da Inglaterra, John Russell (Lyn Harding), e um camareiro do papa, Giovanni Riboldi (Enrico Glori), evocam a história de sete pérolas valiosas, que o papa Clemente VII reuniu para dar de presente de casamento à sua sobrinha Catarina de Médicis, das quais quatro figuram na coroa real britânica. Percebendo que ignoram tudo a respeito das outras três pérolas, eles unem seus esforços e descobrem o paradeiro das jóias que estão faltando.

Sacha Guitry revive, do século XV até à época contemporânea, personagens famosos da história, interpretados por renomados atores, alguns vivendo mais de um papel. Com essa obra, ele aborda pela primeira vez e simultaneamente, dois gêneros que lhe valeram seus maiores sucessos comerciais: o filme de grande espetáculo e a fantasia histórica. Dotado de fertilíssima imaginação e fina ironia, Guitry mistura realidade e ficção, comédia e drama, comentários espirituosos e frases célebres (mais ou menos autênticas), ritmo rápido e lento, além de abolir as fronteiras geográficas e de tempo. Mas o que aconteceu com as pérolas? A última caiu no mar e reencontra seu habitat inicial em uma ostra aberta.

El: Jacqueline Delubac (Françoise Martin, Maria Stuart, Josefina de Beauharnais / Yvette Pienne (Elisabeth, Maria Tudor e rainha Vitória idosa) / Arlety (rainha Etíope) / Simone Renant (Madame Du Barry) / Barbara Shaw (Ana Bolena) / Marguerite Moreno (Catarina de Médicis e Imperatriz Eugenia idosa) / Germaine Aussey (Gabrielle d´Estrées) / Raymonde Allain (Imperatriz Eugenia) / Lisette Lanvin (rainha Vitória jovem) /  Cecile Sorel (a Francesa do Grande Século) / Huguette Duflos (rainha Hortensia) / Pauline Carton (uma camareira) / Rosine Dérean (uma jovem e Catarina de Aragão) / Renée Saint-Cyr (Madeleine de la Tour d´Auvergne) /  Lynn Harding (Henrique VIII e ajudante de ordens do rei da Inglaterra) / Sacha Guitry (Jean Martin, Francisco I , Barras, Napoléon III) / Raimu (o meridional) / Jean-Louis Barrault (Bonaparte) / Claude Dauphin (prisioneiro italiano) / Marcel Dalio (abissínio) / Robert Pizani (Talleyrand), etc.

A SÉRIE O CRIME NÃO COMPENSA

Uma série de shorts de dois rolos produzida pela MGM entre 1933 e 1947, O Crime Nâo Compensa / Crime Does Not Pay, recebeu várias indicações ao Oscar, conquistando duas estatuetas da Academia e deu chance para atores e diretores aprenderem seu ofício. A tônica era a denúncia de crimes e desonestidades que afetaram a vida dos cidadãos americanos e a demonstração da eficiência do trabalho dos policiais. Muitas das histórias foram escritas por um policial aposentado, Karl Kamb, e mereceram o aplauso das autoridades, inclusive do próprio chefão do FBI, J. Edgar Hoover.

Os assuntos abordados na série incluíam todos os tipos de delitos e crimes porém, com exceção de um short que expunha a exploração nacional de máquinas de caça-níqueis, nenhuma referência foi feita ao crime organizado.  A partir dos anos 40 a série voltou-se para a propaganda de guerra, alertando contra os contrabandistas estrangeiros, operadores do mercado negro, espiões nazistas e a sabotagem

Jack Chertok recebe seu Oscar das mãos de Walt Disney

Produzida inicialmente por Jack Chertok, O Crime Não Compensa beneficiou-se do uso de cenários e material filmado das produções mais custosas da MGM bem como da possibilidade de utilização de jovens atores contratados (v. g. Robert Taylor, Van Johnson, Laraine Day, Cameron Mitchell) e diretores novatos (v. g. Jacques Tourneur, Fred Zinnemann, David Miller, Joseph Losey) todos no limiar de carreiras de sucesso. A pedido do Departamento de Justiça, um curta de dois rolos dirigido por Jacques Tourneur, foi expandido para sete rolos e se tornou um longa-metragem sobre as prisões federais, intitulado Escravos do Mal / They All Come Out / 1939.

Em muitos episódios da série um ator identificado como “Seu Repórter Criminal da MGM”, apresentava um juiz ou um capitão de polícia ou um agente do FBI, que dava uma palestra diretamente para o público.

No seu apogeu, meados e final dos anos trinta, os shorts foram considerados tão eficientes na contenção do crime, que a Metro pôde se orgulhar não só do endosso de Hoover e do procurador geral, mas também dos dois prêmios da Academia para The Public Pays em 1936 e Torture Money em 1937.

FILMOGRAFIA

1935.

Tesouro Enterrrado

Tesouro Enterrado / Buried Loot. Dir: George B. Seitz. Robert Taylor, Robert Livingston, Richard Tucker, James Ellison, Al Hill. O bancário Al Douglas (Robert Taylor) comete um desfalque, e enterra o produto do furto. Em seguida prossegue com seu plano de confessar o crime, dizer que perdeu todo o dinheiro no jogo, cumprir sua pena e recuperar a quantia enterrada, quando for libertado.

Alibi Infalível / Alibi Racket. Dir: George B. Seitz. Edward Norris, Al Bridge, Granville Bates, Eddie Dunn, Irene Hervey. O gângster Joe Rinelli (Edward Norris), acusado de um assassinato, tem um álibi perfeito: ele estava no cinema na noite do crime e a lanterninha e o gerente são testemunhas a seu favor.

Crime no Deserto / Desert Death. Dir: George B. Seitz. Raymond Hatton, Harvey Stephens, Erville Alderson, Richard Carlson, John Hyams. O velho George Lesh (Raymond Hatton) mata seu primo no deserto, assume sua identidade e tenta receber a indenização do seguro.

Castigos de Thelma / A Thrill for Thelma. Dir: Edward L. Cahn. Irene Hervey, Robert Livingston, Robert Warwick, William Tannen, Alice Moore. Jovem presidiária, Thelma Black (Irene Hervey), conta como foi parar na cadeia. Desejando uma vida de luxo e riqueza, casou-se com Steve Black (Robert Livingston), sem saber que ele era um assaltante. Mas gostou da riqueza fácil associada à emoção de assaltar pessoas.

Covardes do Volante / Hit and Run Driver Dir: Edward L. Cahn. Morgan Wallace, Carl Stockdale, Jonathan Hale, Irene Hervey, William Tannen. Motorista embriagado atropela um casal de jovens em uma estrada deserta e tenta encobrir o incidente.

1936

Plano Perfeito

Plano Perfeito / Perfect Set-Up. Dir: Edward L. Cahn. Allen E. Saunders (William Henry), jovem e brilhante engenheiro, mas frustrado na sua profissão, usa seus conhecimentos técnicos para ajudar um amigo a desmontar alarmes, tornando-se cúmplice de seus roubos.

Foolproof. Dir: Edward L. Cahn. Niles Welch, Alonzo Price, Donrue Leighton, William Tannen, John Marsden. O casal Anderson é encontrado amarrado, anestesiado e roubado em sua residência, porém o marido também havia sido estrangulado. A polícia acaba descobrindo a trama entre a mulher e seu amante para assassinar seu esposo.

The Public Pays

The Public Pays. Dir: Errol Taggart. Richard Alexander, Barbara Bedford, Harry C. Bradley, Russ Clark, John Dilson. Extorcionistas exigem propina de empresas de laticínios de uma pequena cidade.

1937

Torture Money

Torture Money. Dir: Harold S. Bucquet. Edwin Maxwell, George Lynn, Murray Alper, King Baggot, Raymond Hatton. Quadrilha encena acidentes de carro, usando inclusive testemunhas falsas, para receber indenização pelo sinistro.

It May Happen to You. Dir: Harold S. Bucquet. J. Carroll Naish, King Baggot, William Bailey, Barbara Bedford, Frank Dae. Bando sequestra caminhões de firmas de empacotamento de carne e vende o produto roubado para açougues.

Soak the Poor. Dir: Harold S. Bucquet. Leon Ames, Leslie Fenton, Ted Billings, John Butler, Byron Foulger. Gângsteres forçam donos de pequenas mercearias a transferir para eles por uma fração de seu valor, os tíquetes-refeição distribuídos para os famintos ou necessitados durante a Depressão.

Give Till It Hurts. Dir: Felix Feist. Janet Beecher, Clay Clement, Howard Hickman, King Baggot, Virginia Brissac. Embusteiros fingem-se de filantropos, a fim de angariar fundos para uma clínica médica, e ficam com o dinheiro arrecadado.

Behind the Criminal. Dir: Harold S. Bucquet. Edward Emerson, Walter Kingsford, Joe Sawyer, Anna Q. Nilsson, John Butler. Advogado inescrupuloso suborna testemunhas, para cometerem perjúrio, com a finalidade de forjar um álibi para seus clientes criminosos.

1938

O Preço da Segurança / What Price Safety. Dir: Harold S. Bucquet. John Wray, George Huston, Lionel Royce, John Butler, Harvey Clark. Gângsteres se intrometem no negócio de construção civil, utilizando material de qualidade inferior, a fim de obterem maior lucro, pondo em perigo a segurança pública.

Miracle Money. Dir: Leslie Fenton. John Miljan, Claire DuBray, Frederick Vogeding, Robert Middlemass, Boyd Crawford. Médico charlatão convence as pessoas de que seu  Raio Volta cura o câncer.

Come Across. Dir: Harold S. Bucquet. Bernard Nedell, Donald Douglas, Bernardene Hayes, Rita LeRoy, Barbara Bedford. Ladrão de banco gasta quase todo o produto do assalto, para se esconder da polícia com a ajuda de “amigos” do mundo do crime, porém  estes o abandonam quando o dinheiro acaba. 

Nasce um Criminoso / A Criminal is Born. Dir: Leslie Fenton. George Breakston, David Durand, Norman Phillips, Warren McCollum, Joseph Crehan. Quatro adolescentes da classe média, negligenciados por seus pais, cometem uma série de contravenções, chegando finalmente ao crime.

Tudo se Descobre / They´re Always Caught. Dir: Harold S. Bucquet. Stanley Ridges, John Eldredge, Charles Waldron, Louis Jean Heydt, May Beatty. A importância da polícia científica para prender criminosos e como um detalhe mínimo pode levar a uma captura. Este short foi indicado ao Oscar.

They´re Always Caught

Pense Primeiro / Think It Over. Dir: Jacques Tourneur. Lester Mathews, Dwight Frye, Donald Barry, Robert Emmet Kane, Frank Orth. Uma gangue incendeia lojas que estão à beira da falência e cobram dos proprietários uma percentagem sobre a indenização pelo seguro.

Desatinos da Juventude / The Wrong Way Out. Dir: Gustav Machaty. Linda Terry, Kenneth Howell, William Bailey, George Meeker, Esther Muit. Desprezando os conselhos de seus respectivos pais, dois jovens se casam e fogem, porém logo percebem como é difícil ganhar a vida. Quando surge uma oportunidade, eles enveredam pelo caminho do crime.

1939

Dinheiro de Empréstimo / Money to Loan. Dir: Joseph M. Newman. Alan Dinehart, Paul Guilfoyle, Truman Bradley, Tom Collins, Warren McCollum.  As atividades de um agiota corrupto que cobra juros exorbitantes e usa a extorsão e a fraude, para obter o máximo de lucro nos seus empréstimos.

Enquanto a América Dorme / While America Sleeps. Dir: Fred Zinnemann. Dick Purcell, Roland Varno, Frederick Vogeding, Egon Brecher, Lenita Lane. Como os espiões operam dentro dos Estados Unidos.

Agência de Empregados / Help Wanted. Dir: Fred Zinneman. Tom Neal, Jo Ann Sayers, Arthur Hohl, Truman Bradey, Clem Bevans. Trabalhador temporário (Tom Neal) ajuda o promotor público a pôr um fim nas atividades de uma agência de emprego, criada por uma quadrilha, para explorar a mão de obra não qualificada.

É Melhor Refletir / Think First. Dir: Roy Rowland. Laraine Day, Ann Morris, Jo Ann Sayers, Marc Lawrence, Sara Haden. Margie Smith (Laraine Day) trabalha como garçonete em um restaurante drive in. Um amigo mostra como é fácil roubar e ela envereda pelo caminho do crime, porém acaba sendo presa e processada.

Drunk Driving. Dir: David Miller. Dick Purcell, Jo Ann Sayers, Richard Lane, King Baggot, Granville Bates. A tragédia que pode ocorrer quando alguém dirige um carro após ter ingerido bedida alcoólica. Este short foi indicado ao Oscar.

1940

Pound Foolish. Dir: Felix Feist. Neil Hamilton, Lynne Carver, Victor Varconi, Gertrude Michael, John Hamilton. As tentativas de pessoas ricas para evitar o pagamento de impostos aduaneiros.

Know Your Money. Dir: Joseph M. Newman. Dennis Moore, Noel Madison, Adrian Moriss, John Wray, William Edmunds. Esforços do Serviço Secreto para descobrir dinheiro falsificado e processor os responsáveis por este crime.

Jack Pot. Dir: Roy Rowland. Tom Neal, Ann Morris, Jean Rouverol, Edwin Maxwell, Joe Downing. Como a exploração ilegal de caça-níqueis feita por gângsteres alimenta o crime organizado.

Women in Hiding

Women in Hiding. Dir: Joseph M. Newman. Marsha Hunt, C. Henry Gordon, Jane Drummond, Mary Bovart, Granville Bates. Perigos que mulheres grávidas correm procurando clínicas de maternidade inseguras.

Buyer Beware. Dir: Joseph M. Newman. Charles Arnt, Hugh Beaumont, Margaret Bert, Egon Brecher, Charles D. Brown. Comerciantes de varejo negociam com mercadorias roubadas.

Soak the Oak. Dir: Sammy Lee. Ralph Morgan, Cathy Lewis, George Lessey, George Cleveland, Hugh Beaumont. Estelionatários assumem um movimento honesto de arrecadação de fundos de pensão para idosos. 

You the People. Dir: Roy Rowland. C. Henry Gordon, Byron Shore, Paul Everton, Matt McHugh, Raymond Bailey. Chefão do crime organizado de uma grande cidade usa práticas ilegais para garantir a reeleição de um prefeito corrupto.

1941

Respect the Law. Dir: Joseph M. Newman. Moroni Olsen, Richard Lane, Frank Orth, William Forrest, Hugh Beaumont. Infratores menores podem causar mais danos do que grandes criminosos. Em uma cidade costeira o dono de um cais suborna um inspetor sanitário, para que ignore uma infestação de ratos, ocasionando um surto de praga.

 Caminho Proibido / Forbidden Passage. Dir: Fred Zinnemann. Addison Richards, Wolfgang Zilzer, Hugh Beaumont, George Lessey, George Cleveland. Contrabandistas convencem imigrantes desesperados aguardando a entrada no país, de que têm influência sobre o Serviço de Imigração, e poderão ajudá-los, desde que paguem uma determinada taxa. Este short foi indicado ao Oscar.

Coffins on Wheels. Dir: Joseph M. Newman. Darryl Hickman, Tommy Baker, Allan Lane, Cy Kendall, Raymond Bailey. Revendedores de carros sem escrúpulos negociam com automóveis defeituosos e perigosos, enganando os compradores e causando tragédias. 

Sucker List. Dir: Roy Rowland. Lynne Carver, John Archer, Noel Madison, George Cleveland, Norman Willis.  Espertalhões vendem para pessoas endividadas indicações falsas sobre um vencedor certo em determinado páreo de uma corrida de cavalos, tirando o pouco dinheiro que ainda lhes resta.

1942

Unidos na Defesa / For the Common Defense. Dir: Allan Kenward. Van Johnson, Horace McNally, Steven Geray, John Litell, Johnny Arthur. Agente do governo americano viaja para o Chile e a Colombia e, com a ajuda das autoridades locais, frustra um plano do Eixo, para transportar munição roubada.

 Avante Navios da Vitória / Keep´em Sailing. Dir: Basil Wrangell. Jim Davis, Ian Keith, George Travell, Frederick Worlock, Hugh Beaumont. Agente do FBI infiltra-se em uma rede de sabotagem, para investigar a destruição de navios cargueiros americanos.

1943

Plano de Destruição / Plan for Destruction. Dir: Edward L. Cahn. Lewis Stone (narrador), Frank Reicher, George Lynn, George Hoagland, Frederick Giermann.  Os conceitos geopolíticos do Professor Karl Haushofer (Frank Reicher) e sua influência sobre Rudolf Hess (George Lynn).

1944

Patrulhando o Espaço

Patrulhando o Espaço / Patrolling the Ether. Dir: Paul Burnford. Emmett Vogan, Hazel Brooks, Marc Crammer, Richard Crane, Donald Curtis. Radio amadores ajudam a Federal Communications Commission a monitorar as transmissões de radio dos espiões nazistas.

Easy Life. Dir: Walter Hart. Bernard Thomas, Steven Geray, Willie “Bill” Phillips, William Challee, Willian Tannen. Aluno que abandonou o curso secundário descobre que seguir uma vida de crime não era o que ele pensava.

Dark Shadows. Dir: Walter Hart, Paul Burnford. Henry O´Neill, Morris Ankrum, Paul Guilfoyle, Arthur Space, William Tannen. Psiquiatra é convocado para ajudar a polícia a capturar um assassino.

1945

Fall Guy

Fall Guy. Dir: Paul Burnford. Leon Ames, Marjorie Davies, Morris Ankrum, Paul Langton, Will Wright. Caixa de banco dá um desfalque, mata um fiscal, e incrimina pessoa inocente.

The Last Installment. Dir: Walter Hart. Cameron Mitchell, Walter Sande, George Lynn, Herbert Lytton, William “Bill” Phillips. Jovem criminoso fica fascinado pela história da vida de um gângster dos anos vinte publicada por uma revista, ignorando que seu herói teve um fim trágico

Phantoms, Inc. Dir: Harold Young. Frank Reicher, Ann Shoemaker, Arthur Shields, Dorothy Adams, Ralph Dunn.  Mãe ansiosa por informações sobre seu filho desaparecido no campo de batalha, entrega todas suas economias a um charlatão, que se faz passar por espiritualista.

A Gun in his Hand

A Gun in His Hand. Dir: Joseph Losey. Anthony Caruso, Tom Trout, Richard Gaines, Hugh Beaumon, William Challee. Homem entra para a força policial, pensando que agora tem um álibi perfeito para uma vida de crimes. Este short foi indicado ao Oscar.

Purity Squad. Dir: Harold F. Kress. Morris Ankrum, William Bailey, Paul E. Burns, Edward Earle, Dick Elliott. O esforço da U.S. Food and Drug Administration para garantir que medicamentos sejam plenamente testados antes de serem vendidos aos consumidores.

1947

Luckiest Guy in the World. Dir: Joseph M. Newman. Barry Nelson, Eloise Hardt, Milton Kibbee, Harry Cheshire, George Travell.  O destino dita a vida de um corretor de seguros viciado em corridas de cavalo, que comete vários crimes. Por sorte tem sempre um álibi perfeito, ficando sempre livre e intocável pela lei, mas acaba morrendo, atingido por uma bala perdida, destinada a outra pessoa por um crime, que nada teve a ver com ele. Este short foi indicado ao Oscar.

OS WESTERNS DE RANDOLPH SCOTT

Nenhum outro ator fez mais westerns no cinema sonoro do que Randolph Scott. Entre Herança das Estepes / Heritage of the Desert / 1932 e Pistoleiros do Entardecer / Ride the High Country / 1962, ele participou de 60 filmes deste gênero, além de transitar por vários outros, incluindo comédia, drama, guerra, musical, horror e fantasia. A partir de 1946, passou praticamente a fazer somente o “cinema americano por excelência”, porque se sentia mais à vontade personificando os heróis do Oeste, e fazia isto muito bem.

Randolph Scott

Alto (1,89 cm), forte e boa pinta, passando uma imagem de integridade e coragem, ele se tornou, um dos astros-cowboys mais populares de Hollywood, principalmente nos anos cinquenta, quando se firmou como uma das grandes atrações de bilheteria.

George Randolph Scott (1898-1987) nasceu em Orange, Virginia, filho de George Grant e Lucy Crane Scott. Seu pai trabalhava como engenheiro administrativo em uma firma de tecidos e sua mãe descendia de uma família rica da North Carolina. Graças à boa situação financeira de seus progenitores, Scott estudou em escolas particulares inclusive a Woodberry Forest School, onde ele se destacou no basebol, futebol americano e matemática.

Aos dezenove anos de idade, alistou-se no Exército, e serviu como observador de artilharia na França durante o Primeiro Conflito Mundial. Neste período de guerra, aprendeu a cavalgar a todo galope e a usar armas, habilidades que utilizaria na sua futura carreira cinematográfica. De volta a América, matriculou-se na University of North Carolina para estudar engenharia têxtil, mas não terminou o curso, e foi trabalhar como contador na firma onde seu pai era empregado.

Randolph Scott em um de seus primeiros westerns

Por volta de 1927, Scott decidiu partir para Los Angeles na companhia de seu amigo de infância, Jack Heath, não se sabe bem se para simplesmente desfrutarem do passeio ou se um ou outro esperava entrar para a indústria cinematográfica. Certo dia, eles estavam jogando golfe a poucos metros de distância de Howard Hughes, quando eles se aproximaram do milionário e lhe perguntaram sobre a possibilidade de eles visitarem um palco de filmagem. Hughes sugeriu que eles trabalhassem como figurantes em um filme que George O’Brien estava fazendo na Fox, O filme chamava-se Rumo ao Amor / Sharp Shooters e, nos próximos dois anos, Scott trabalhou como extra em pelo menos cinco filmes, inclusive o primeiro filme falado de Cecil B. DeMille, Dinamite / Dynamite. Scott contaria mais tarde que fez um teste para o papel de Hagon Derk (que foi interpretado por Charles Bickford), mas DeMille rejeitou-o, dizendo que ele não tinha experiência suficiente, e recomendou que fosse adquirí-la na Pasadena Playhouse. Assim, Scott passou boa parte dos anos de 1929 e 1930 nos palcos dos teatros de Los Angeles até que, finalmente, estreou como ator principal em Esposas Alegres / Women Men Marry / 1931, filme da Headline Pictures, uma das companhias muito modestas que surgiram no início da era sonora e que faliu logo após o lançamento desta produção.

No final de 1931, Scott assinou contrato de sete anos com a Paramount onde, no período 1932-1935, fez seus primeiros westerns como astro de uma série típica de programmers (filmes que podiam preencher tanto a primeira como a segunda parte do programa duplo) baseada nas histórias de Zane Grey. Foram ao todo onze filmes: Herança das Estepes / Heritage of the Desert / 1932 (Dir: Henry Hathaway), Audácia entre Adversários / Wild Horse Mesa / 1932 (Dir: Henry Hathaway), Maldade / The Thundering Herd / 1933 (Dir: Henry Hathaway) Na Pista do Criminoso / Sunset Pass / 1933, (Dir: Henry Hathaway) O Homem da Floresta / Man of the Forest / 1933 (Dir: Henry Hathaway), Rixa Antiga / To The Last Man / 1933 (Dir: Henry Hathaway), O Último Assalto / The Last Round-Up / 1934 (Dir: Henry Hathaway); Amor em Trânsito / Wagon Wheels / 1934 (Dir: Charles Barton), Vencer ou Morrer / Home on the Range / 1934 (Dir: Arthur Jacobson), O Inválido Poderoso / Rocky Mountain Mystery ou The Fighting Westerner / 1935 (Dir: Charles Barton). Alguns desses filmes eram refilmagens de produções realizadas nos anos vinte a saber: Ódios e Afeições / To The Last Man / 1923 (Dir: Victor Fleming com Richard Dix, Lois Wilson); A Herança do Deserto / Heritage of the Desert / 1924 (Dir: Irvin Willat com Lloyd Hughes, Bebe Daniels); Almas Bravias / The Thundering Herd / 1925 (Dir: William K. Howard com Jack Holt, Lois Wilson) e O Homem da Floresta / Man of the Forest / 1926 (Dir: John Waters com Jackie Holt e Georgia Hale), À Margem do Rio Tonto / Under the Tonto Rim / 1928 (Dir: Herman C. Raymaker com Richard Arlen e Mary Bryan). Por serem remakes, muitas tomadas de arquivo dos filmes mudos foram utilizadas por medida de economia. Quando Scott atuou na refilmagem de Man of the Forest, que havia sido estrelado por Jack Holt, ele teve que usar um bigode fino tal qual Holt, para haver um perfeito entrosamento com as cenas nas quais este aparecia.

Os filmes dessa série eram todos de qualidade satisfatória (levando-se em conta as condições técnicas da época), sobressaindo os dirigidos por Henry Hathaway, que deu mais importância a interação humana entre os personagens principais do que ao espetáculo, e pelo tratamento que deu às heroínas, mostrando sua inocência, sua coragem e também sua sensualidade vibrante, mas sem ser vulgar. Nos seus primeiros westerns Scott era um rapaz bonito, afável e cortês (embora sugerindo a força necessária para enfrentar seus opositores) e este charme de cavalheiro sulista o ajudava a disfarçar suas limitações como ator.

Antes de se desligar da Paramount em 1938, Scott fez mais um western neste estúdio, A Heroína do Texas / The Texans (Dir: James Hogan) e, no período 1939 -1945, como free lancer, continuou dividindo filmes de outros gêneros com mais 10 westerns, nos quais atuou às vezes como coadjuvante: Jesse James / Jesse James / 1939 (Dir: Henry King); Suzana / Suzanna of the Mounties / 1939 (Dir: William A. Seiter); A Lei da Fronteira / Frontier Marshal / 1939 (Allan Dwan); Caravana do Ouro / Virginia City (Dir: Michael Curtiz); A Vingança dos Dalton / When the Daltons Rode (Dir: George Marshall); Os Conquistadores / Western Union (Dir: Fritz Lang) A Formosa Bandida / Belle Starr (Dir: Irving Cummings); A Indomável / The Spoilers (Dir: Ray Enright); Império da Desordem / The Desperadoes  (Dir: Charles Vidor); A Bela do Yukon / Belle of the Yukon (Dir: William A. Seiter).

No período 1946-1955 Scott fez apenas dois filmes de outros gêneros e mais 28 westerns: Rua dos Conflitos / Abilene Town (Dir: Edwin L. Marin); Terra dos Homens Maus / Badman´s Territory (Dir: Tim Whelan); O Passo do Ódio / Trail Street (Dir: Ray Enright); Terra de Paixões / Gunfighters (Dir:  George Waggner); O Romântico Defensor / Albuquerque (Dir: Ray Enright); Águas Sangrentas / Coroner Creek (Dir: Ray Enright); A Volta dos Homens Maus / Return. of the Bad Men (Dir: Ray Enright);  Devastando Caminho / Canadian Pacific (Dir: Edwin L. Marin) ; O Lutador / Fighting Man of the Plains (Dir: Edwin L. Marin) ; A Lei é Implacável / The Doolins of Oklahoma (Dir: Gordon Douglas); O Tesouro dos Bandoleiros / The Nevadan (Dir: Gordon Douglas); Colt 45 / Colt 45 (Dir: Edwin L. Marin); Terra Virgem / The Cariboo Trail (Dir: Edwin L. Marin); Talhado em Granito / Sugarfoot (Dir: Edwin L. Marin); Santa Fé / Santa Fe (Dir: Irving Pichel); Domador de Motins / Forth Worth (Dir: Edwin L. Marin); Terra do Inferno / Man in the Saddle (Dir: Andre De Toth); Ouro da Discórdia / Carson City (Dir: Andre De Toth); O Laço do Carrasco / Hangman´s Knot (Dir: Roy Huggins); De Arma em Punho / Man Behind the Gun (Dir: Felix Feist);  O Pistoleiro / The Stranger Wore a Gun (Dir: Andre De Toth); Torrentes de Vingança / Thunder Over the Plains (Dir: Andre De Toth); Alma de Renegado / Riding Shotgun (Dir: Andre De Toth); Feras Humanas / The Bounty Hunter (Dir: Andre De Toth); Arizona Violenta / Ten Wanted Men  (Dir; Bruce Humberstone); Homens Que São Feras / Rage at Dawn (Dir: Tim Whelan); Nas Garras do Homem Alto / Tall Man Riding (Dir: Lesley Selander); Obrigado a Matar / A Lawless Street (Dir: Joseph H. Lewis). Nesta fase da carreira de Randolph Scott foram fatos marcantes a sua associação com o produtor Harry Joe Brown de parceria com a Columbia e os seis filmes que fez sob a direção de Andre De Toth. De Toth tinha uma noção precisa de economia narrativa e posicionamento de câmera e um cuidado especial com o detalhe, tendo sido um dos cineastas importantes no gênero western nos anos 50.

Entre 1956-1962 Scott fez: 7 Homens Sem Destino / Seven Men From Now (Dir: Budd Boetticher); O Fantasma do General Custer / 7th Cavalry (Dir: Joseph H. Lewis); O Resgate dos Bandoleiros / The Tall T (Dir: Budd Boetticher); Entardecer Sangrento / Decision at Sundown (Dir: Budd Boetticher); Fibra de Herói / Buchanan Rides Alone (Dir: Budd Boetticher); O Homem Que Luta Só / Ride Lonesome (Dir: Budd Boetticher); Um Homem de Coragem / Westbound (Dir: Budd Boetticher); Cavalgada Trágica / Comanche Station (Dir: Budd Boetticher); Pistoleiros do Entardecer / Ride the High Country (Dir: Sam Peckinpah). Dos sete westerns maravilhosos dirigidos por Budd Boetticher com seu estilo sóbrio e conciso, cinco (O Resgate do Bandoleiro, Entardecer Sangrento, Fibra de Herói, O Homem Que Luta Só e Cavalgada Trágica) foram produzidos por Scott e Harry Joe Brown e distribuídos pela Columbia. O primeiro filme da série, Sete Homens e um Destino, foi produzido por John Wayne para a sua companhia Batjac e Um Homem de Coragem, por Henry Blanke para a Warner que, tal como havia feito com Sete Homens sem Destino, se encarregou da distribuição. Entretanto, costuma-se denominar o ciclo pelo nome da companhia de Scott e Brown, a Ranown, alusão ao nome do ator (Ran) e ao de Harry Joe Brown (Own), porque existem múltiplos elementos repetitivos ou semelhantes nos sete filmes.

Randolph Scott e Joel McCrea

Na medida em que Scott foi envelhecendo, sua capacidade interpretativa foi melhorando, seus traços fisionômicos foram ficando mais rígidos (como se tivessem sido talhados em granito tal qual William S. Hart) e seus papéis mudaram: ele se tornou um herói silencioso e estoico que sofreu dores, perdas e provações. Aos 63 anos de idade o ator fechou sua carreira com chave de ouro, dividindo as honras do estrelato com Joel McCrea em Pistoleiros do Entardecer, grande western nostálgico e crepuscular no qual dois antigos guardiães da lei que sobreviveram à invasão do Oeste pela civilização, encontram juntos a oportunidade de viver sua última aventura, seu último duelo, e de readquirir o respeito próprio. O tom triste e nostálgico e as cores outonais da paisagem celebram a agonia de uma época e dão ao filme não somente grandeza, mas também poesia.

Nos meus artigos Os Westerns de Budd Boetticher (4 de setembro de 2014) e Os Westerns de André de Toth (18 de janeiro de 2021) encontram-se comentários sobre os filmes que Randolph Scott fez com estes diretores.

PRIMÓRDIOS DO CINEMA PORTUGUÊS

A primeira sessão de cinema em Portugal ocorreu no dia 18 de junho de 1896 no Real Colyseu na Rua da Palma em Lisboa quando, por iniciativa do empresário Antonio Manuel dos Santos Junior, foi apresentado o “Animatógrafo Rousby”, que era na verdade o projetor de filmes Theatographe, inventado pelo pioneiro do cinema britânico Robert William-Paul, do qual Edwin Rousby era representante.

Real Colyseu

Depois de uma temporada no Porto, Rousby voltou a Lisboa, desta vez para apresentar cenas filmadas em Portugal pelo operador Harry Short, que Robert William-Paul mandara para o Sul da Europa a fim de captar imagens destinadas aos seus catálogos. Entre os filmes com motivos portugueses rodados por Short estavam: A boca do inferno em Cascais, a Praia de Algés na ocasião dos Banhos, o mercado do peixe na Ribeira Nova, Na Avenida da Liberdade, Jogo do Pau, Praça de D. Pedro, Fado Batido, O cais das Colunas, A Praça do Município. Como informou o eminente crítico e historiador de cinema Luís de Pina no seu livro História do Cinema Português (Produções Europa-América, 1986), que consultamos para escrever este artigo, outros motivos portugueses foram exibidos nos programas de Rousby, misturados com filmes estrangeiros, sempre com grande afluência de público e destacada notícia na imprensa.

Aurélio Paes dos Reis

Conforme L. de Pina, uma das pessoas que não perdeu uma única sessão no Porto foi o fotógrafo e floricultor Aurélio Paes dos Reis que, após ter tentado em vão obter dos irmãos Lumière um dos seus cinematógrafos, conseguiu filmar (talvez com um aparelho da marca Bedtz, eventualmente adaptado por ele para cumprir as mesmas funções do invento francês), imagens dos mais variados assuntos. Com seus amigos Antonio da Silva Cunha, proprietário da Camisaria Confiança, e o fotógrafo Francisco Magalhães Basto Junior, Aurélio Paes dos Reis organizou, em 12 de novembro de 1896, o primeiro espetáculo de cinema feito por portugueses e o chamou de “Kinetógrapho Português”; porém, por falhas técnicas, não obteve o resultado esperado.

Em janeiro de 1897, Paes dos Reis levou o seu Kinetógrapho ao Brasil, para apresentar um programa selecionado no Teatro Lucinda, situado no centro do Rio de Janeiro; mas não teve êxito e regressou desiludido para Portugal onde, segundo L. de Pina, pouco mais teria filmado. Quatro de seus filmes, Saída do Pessoal Operário da Camisaria Confiança, O Vira, Feira de Gado na Corujeira e O Jardim foram recuperados pela Cinemateca Portuguesa em 1982.

Após investigações do historiador Videira Santos (História do Cinema Português I, 1990) e diversas notícias recolhidas por Antonio J. Ferreira  (A Fotografia Animada em Portugal (1894-1897), ambos os livros publicados pela Cinemateca Portuguêsa, a prioridade de Paz dos Reis como primeiro cineasta português – já suspeitada por Luís de Pina – foi contestada e hoje parece não haver mais dúvidas de que antes dele, em 27 de agosto de 1896, teve lugar no Teatro Príncipe Real do Porto a exibição de algumas vistas promovida pelo empresário Francisco Pinto Moreira. O cartaz do evento anunciava a “Estréia do Animatographo portuguez” com 12 quadros, mas não mencionava quais os títulos destes quadros.  Foi informado apenas que os filmes agradaram bastante, em especial Dança Serpentina, cuja exibição foi bisada a pedido do público.

Manuel da Costa Veiga

Manuel Maria da Costa Veiga, empresário interessado em mecânica e eletricidade, seguiu os passos de Paz dos Reis, iniciando sua atividade como exibidor em Lisboa no Eden Concerto da Praça dos Restauradores e em Cascais na Esplanada D. Luis Filipe, onde fazia projeções ao ar livre. Adquirindo uma máquina de filmar Urban em um leilão em Londres, aproveitou a presença do rei D. Carlos em Cascais no verão de 1899 e filmou o soberano na praia. Com mais algumas imagens do local, ele exibiu seu primeiro filme Aspectos da Praia de Cascais / 1900 e daí em diante filmou eventos cotidianos (v. g. Uma Tourada a Antiga portuguesa / 1901 e principalmente visitas de soberanos estrangeiros (v. g. Chegada a Lisboa de Sua Majestade El-Rei Eduardo VII de Inglaterra / 1903, Visita do Rei Afonso XIII de Espanha / 1903, Visita do Imperador Guilherme II da Alemanha / 1905). Mais tarde Costa Veiga fundou a Portugal Film, primeira empresa cinematográfica portuguesa.

João Freire Correia

Os Crimes de Diogo Alves

Outro pioneiro lisboeta foi o fotógrafo João Freire Correia que em 1909 abriu com Manuel Cardoso Pereira a Portugália Film em Lisboa.  A Portugália produziu Os Crimes de Diogo Alves / 1911, espetáculo de grande sucesso. Segundo L. de Pina, espetáculo, dirigido por João Tavares, interpretado por Alfredo de Sousa (Diogo Alves) e realizado com grande cuidado técnico, rigor de reconstituição histórica e certo entusiasmo nas cenas de ação, tinha o seu ponto alto na famosa sequência em que o criminoso atirava as vítimas do alto do Aqueduto das Águas Livres. Apresentado como “versão falada”, ao filme foi exibido com vozes por trás da tela e acompanhamento musical da orquestra da Guarda Nacional Republicana. João Freira e Manuel Cardoso dedicaram-se também ao filme documentário e de atualidades (v. g. Batalha de Flores, Artilharia Portuguesa, Bombeiros Portugueses, O Terramoto de Benavente). A Portugália fechou em 1912.

Rainha Depois de Morta

Também em 1909 Julio Martins Costa, filho de um comerciante de fazendas, de sociedade com João Almeida, adquiriu o cinema mais antigo de Lisboa, o Salão Ideal, e fundou a Empresa Cinematográfica Ideal – Manufactura Portuguesa de Película, que funcionou como distribuidora, produtora e exibidora (lembrando que até 1910 o austríaco Carlos Stella estava sozinho no ramo da distribuição com a sua Empresa Cinematográfica, Lda). Enquanto não ficava concluído um estúdio, um laboratório e um escritório de distribuição, a empresa empreendeu a realização de atualidades e depois filmes de ficção (v.g. Chantecler Atraiçoado, Rainha Depois de Morta, O Casamento do Zé Gordo, todos de 1910). Rainha Depois de Morta contava o romance de D. Pedro e D. Inêz de Castro e foi dirigido por Carlos Santos, ator respeitado no meio artístico nacional, que interpretou o papel de D. Pedro ao lado de Eduardo Brazão (D. Afonso IV) e Amélia Vieira (Inês de Castro). O filme é também importante por ter marcado a estréia cinematográfica de Antonio Silva, que viria a ser um dos mais populares atores do teatro e do cinema português do século vinte. Em setembro de 1911, um incêndio de grandes proporções ocasionou o fechamento da empresa que, pelo fato de reunir os três ramos fundamentais da atividade cinematográfica, tinha todas as condições de triunfar.

Malmequer

Em 1918 Celestino Soares e Luis Reis Santos constituem a Lusitânia Filmes, que ocupou, após uma remodelação, o estúdio da Portugália Film na Rua de São Bento em Lisboa, e teve uma vida efêmera, terminando logo em 1919. O que sobrou de mais importante na sua atividade foram dois curta-metragens de enredo, Mal de Espanha e Malmequer ambos dirigidos por Leitão de Barros, então um jovem de vinte e um anos.

Ernesto de Albuquerque

Quim e o Manecas na história em quadrinhos

Pratas o Conquistador

Pioneiro lisboeta foi ainda Ernesto de Albuquerque, responsável por uma outra firma denominada Portugália de existência breve na qual foram realizadas atualidades (Cidade de Tomar / 1908, A Cultura de Cacau / 1908, A Festa da Flor / 1912) e alguns filmes de ficção dos quais se destacam Quim e o Manecas / 1916, baseado em uma dupla de heróis de história em quadrinhos;  Uma Conquista de Cardo ou Charlot no Jardim Zoológico de Lisboa /  1916, com um imitador de Chaplin que se intitulava Cardo mas era na realidade o ator espanhol Héctor Quintanilha. Por curiosidade, Cardo esteve no Brasil estreando no Rio de Janeiro no Teatro República e se apresentando posteriormente no Teatro Phoenix. E. de Albuquerque teve participação como fotógrafo em uma farsa produzida pela Pratas Film de Emídio Ribeiro Pratas, intitulada Pratas, O Conquistador / 1917, versando sobre um inveterado conquistador, mas desajeitado e sempre se metendo em encrenca, interpretado pelo próprio Emídio, que foi também o argumentista e diretor do filme.

O Naufrágio do Veronese

A Lusitânia Filmes competia diretamente com a Invicta Film, companhia de produção fundada em 1910 no Porto por Alfredo Nunes de Matos com a denominação de Nunes de Matos & Cia. à qual acrescentou a designação Invicta Film em 1912. Nesta primeira fase de sua existência a Invicta dedicou-se sobretudo à realização de reportagens e atualidades (v. g. Manobras Navais Portuguesas / 1912, O Naufrágio do “Veronese” / 1913).

Georges Pallu

Rosa do Adro

Barbanegra

Os Fidalgos da Casa Mourisca

O Primo Basilio

Depois de uma reestruturação levada a efeito em 1917, quando ela passou a ser designada como Invicta Film, a empresa investiu na construção de estúdios e laboratórios e contratou dois cineastas estrangeiros: o francês Georges Pallu (Frei Bonifácio / 1918, A Rosa do Adro / 1919, O Comissário de Polícia / 1919, O Mais Forte / 1919, Amor Fatal / 1920, Barbanegra / 1920, Os Fidalgos da Casa Mourisca / 1920, Amor de Perdição / 1921, O Primo Basilio / 1923) e Rino Lupo, nascido em Roma mas com carreira construída em outros países europeus (As Mulheres da Beira / 1922) -,  privilegiando os filmes de ficção com temas geralmente baseados em romances clássicos da literatura portuguesa e folhetins. A Invicta Film encerrou suas atividades em 1928 após uma crise financeira.

Rino Lupo

Mulheres da Beira

Roger Lion

A Sereia de Pedra

Os Olhos da Alma

O Fado

Na década de vinte nova companhias cinematográficas são fundadas:  a Caldevilla Film   pelo publicitário Raul de Caldevilla, que contratou o  cineasta francês, Maurice Mariaud (Os Faroleiros / 1922, As Pupilas do Sr. Reitor / 1923); a meteórica  Fortuna Films, com sede em Paris e escritórios em Lisboa, pela escritora Virgínia de Castro e Almeida, que também contratou um realizador francês, Roger Lion (A Sereia de Pedra / 1922, Os Olhos da Alma / 1923 ); a Patria Film por Henrique Alegria, antigo diretor artístico da Invicta Film  onde Mariaud dirigiu O Fado /  1923; Enigma Film pelo antigo operador de câmera Ernesto de Albuquerque que após a realização de dois filmes, O Rei da Força / 1922 e O Suicida da Boca do Inferno / 1923, partiu com sua esposa para o Brasil, onde trabalhou como repórter em várias revistas e ela como modista, logo afamada. Ele morreu no Rio de Janeiro em 1940; Iberia Film formada por Rino Lupo depois de ser despedido da Invicta Film com financiamento do Banco Pinto da Fonseca & Irmão. Nesta empresa, como sócio minoritário e diretor artístico, Lupo realizou Os Lobos / 1923; Lisboa Film, Braga Film na qual Ernesto de Albuquerque e Erico Braga realizaram Morgadinha de Val-Flor / 1923.

Morgadinha do Val-Flor

Manuel Luiz Vieira

O Fauno das Montanhas

Resta mencionar a ECA – Empresa Cinegráfica Atlântida, criada na Ilha da Madeira em 1926 por Manuel Luís Vieira, fotógrafo natural de Funchal, onde realizou seus primeiros documentários (v. g. Festa de São Pedro na Ribeira Brava, Tosquia de Ovelhas no Paul da Serra) e filmes de enredo (v. g. A Calúnia, O Fauno das Montanhas) antes de se fixar em Lisboa em 1928, iniciando uma longa carreira como diretor de fotografia.

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O SABONETE EUCALOL E OS COMIC COLORS DE PAT POWERS

Quem viveu nos anos 30,40 e 50 pode se lembrar do sabonete Eucalol, cujas embalagens vinham acompanhadas de estampas, impressas em cartão formato 6×9, apresentando na frente desenhos com temas variados e no verso um texto explicativo.

O sabonete Eucalol era um dos produtos de higiene pessoal fabricado pela firma Paulo Sterne Cia Ltda, fundada em 1917 pelo imigrante alemão Paulo Stern, para exercer a atividade de venda de essências. Após o fim da Primeira Guerra Mundial seu irmão Ricardo veio para o Brasil e ajudou a dinamizar a sociedade, iniciando as obras de construção de uma fábrica, inaugurada em 1924, onde foi lançado o sabonete cor de eucalipto e mais tarde a pasta de dentes e o talco. Em 1932, um terceiro irmão, Erich, ingressou na sociedade e a razão social passou a ser Perfumaria Myrta S/A.

Inicialmente os irmãos Stern tentaram conquistar o público com um concurso de poemas tendo por tema o sabonete, porém as vendas do produto não aumentaram. Inspirados nas estampas dos produtos Liebig Bilder Caldo e Extrato de Carne, editadas pela tradicional firma alemã entre 1875 e 1940, resolveram lançar as Estampas Eucalol, incentivando os fregueses a colecioná-las. A estratégia obteve grande êxito aumentando as vendas do sabonete e impulsionando o crescimento da empresa.

As estampas tinham temas brasileiros e / ou universais (v. g. A Vida de Santos Dumont, Jogos Olímpicos, Danças Através do Mundo, História do Brasil, Fatos Decisivos da História Mundial, Índios do Brasil, Lendas da Antiguidade, Uniformes do Brasil, Escotismo, Compositores Célebres bem como Celebridades da Tela e Histórias Infantís (v. g. João e Maria, Branca de Neve, Gato de Botas, Chapeuzinho Vermelho, A Bela Adormecida).

Pat Powers

Patrick Anthony “Pat” Powers (1870-1948) nasceu em Buffalo, Nova York. Associado a Joseph A. Schubert, Sr., ele vendeu fonógrafos de 1900 a 1907 e então formou a Buffalo Film Exchange que comprava filmes dos produtores e os alugava para os nickelodeons. Em 1910, Powers foi para a cidade de Nova York, onde fundou a Powers Moving Picture Company, também anunciada e creditada nos seus filmes como “Powers Picture Plays”.

Em 1912 a companhia de Powers fundiu-se com a Independent Moving Pictures Company (IMP) de Carl Laemmle e juntamente com outras companhias (Bison, Rex, Nestor, Champion) foram depois absorvidas pela Universal Film Manufacturing Company, que começou a operar dois estúdios em Los Angeles, um em Edendale e o antigo Nestor Studio no Sunset Boulevard com Gower Street. Mais tarde, em 1916-1917 Powers a produziu nove desenhos animados reunidos em uma série intitulada Fuller Pep.

Ub Iwerks

Em 1927, após ter feito sem êxito uma oferta para a compra da DeForest Phonofilm, Powers contratou um ex-técnico da DeForest, William Garity para produzir uma versão clonada do sistema de som Phonofilm que se tornou o Powers Cinephone. Em 1928 Powers vendeu a Powers Cinephone para Walt Disney para que ele pudesse fazer seus desenhos animados falados tais como Steamboat Willie / 1928 com o Mickey Mouse. Sem conseguir um distribuidor para seus desenhos animados sonoros, Disney distribuiu-os através da companhia de Powers, Celebrity Pictures. Em 1930 os dois se desentenderam por questão de dinheiro e Powers ajudou Ub Iwerks, animador principal de Disney a criar seu próprio estúdio, que realizou os Comi Color Cartoons, os quais foram distribuídos pela Celebrity Pictures. Iwerks dirigiu estes desenhos animados de 1933 a 1936, produzidos em Cinecolor, um processo de duas-cores combinando vermelho e azul. Entre os colaboradores de Iwerks distinguiram-se Shamus Culhane e Al Eugster, os roteiristas Otto Englander, Ben Hardaway, George Manuell e o músico Carl Stalling. O primeiro filme da série, Jack and the Beanstalk estreou em 1933. Em 1934 Iwerks utilizou a sua invenção de maior prestígio, câmera multiplana, mecanismo que permite à câmera se deslocar, passando por diversos “Planos” (folhas de celofane ou camadas de vidro com os desenhos) colocados a várias distâncias da câmera. Fotografando-os à medida em que avança, a câmera multiplana propicia a ilusão de profundidade e perspectiva. Ele inaugurou o seu uso em The Headless Horseman, baseado no conto “The Legend of Sleepy Hollow” de Washington Irving.

A maioria dos exemplares dos Comi Color Cartoons foram baseados em histórias infantís como aquelas representadas nas Estampas Eucalol e, provavelmente por causa disso, os filmes da série exibidos no Brasil receberam o título de Historietas Eucalol.

                                                                     FILMOGRAFIA

1933

João Pé de Feijão / Jack and the Beanstalk. 8 min.

1934

Pequena Galinha Vermelha / The Little Red Hen. 7 min.

The Brave Tin Soldier. 8 min.

O Gato de Botas/ Puss in Boot. 7 min.

The Queen of Hearts.  8 mn.

 

Aladim e a Lâmpada Maravilhosa / Aladdin and the Wonderful Lamp.  8 min.

The Headless Horseman. 9 min.

The Valiant Taylor ou The King´s Taylor. 8 min.

Don Quixote. 8 min.

João Geada / Jack Frost. 9 min.

1935

Sambô, o Negrinho / Little Black Sambo. 8 min.

The Brementown Musicians. 9 min.

A Velhinha e o Cão / Old Mother Rubbard. 8 min.

A Pequena Ovelha de Maria / Mary´s Little Lamb. 8 min.

Tempo de Verão / Summertime. 8 min.

Sinbad, o Marujo / Sinbad, the Sailor. 7 min.

Os Três Ursos / The Three Bears. 8 min.

Balloonland ou The Pincushion Man. 7 min.

Simão Simplório / Simple Simon. 7 min.

Ovos Mágicos / Humpty Dumpty. 7 min.

1936

Ali Baba. 7 min.

O Pequeno Polegar / Tom Thumb. 7 min.

O Gato de Dick Wittington / Dick Wittington´s Cat.  8min.

O Rapazinho de Azul / Little Boy Blue. 7 min.

Dias Felizes / Happy Days. 9 min.

PRIMÓRDIOS DO CINEMA ITALIANO

Em 11 de novembro de 1895, Filoteo Alberini patenteou um aparelho denominado Kinetografo Alberini, mas esta invenção rudimentar foi rapidamente ultrapassada pelo Cinematógrafo dos irmãos Lumière, máquina usada como câmera, projetor e copiadora, portátil, e acionada manualmente, não dependendo de uma fonte de eletricidade.

Filoteo Alberini

 O primeiro representante dos Lumière na Itália foi Vittorio Calcina, treinado pelo chefe dos operadores de câmera da fábrica de Lyon, Jean Alexandre Louis Promio, que viajou por vários países da Europa para divulgar o Cinematógrafo, inclusive na Itália, onde filmou a cidade de Veneza de uma gôndola em movimento. Enquanto Promio continuava suas viagens pela Europa, Vittorio Calcina registrava eventos e visitas reais e ajudava a enriquecer o catálogo dos Lumière.

Em 1896 um imitador dos Lumière, Italo Pacchioni, inventou uma máquina semelhante ao cinematógrafo, com a qual filmou um inevitável Arrivo del treno ala Stazione di Milano, algumas “vistas” cômicas (v. g. La Gabbia dei Matti, Il Finto Storpio, La Bataglia di Neve) e atualidades como I funerali de Umberto I e I funerali di Giuseppe Verdi a Milano.

Ainda em 1896, Leopoldo Fregoli, o famoso transformista (muito popular em nosso país onde se apresentou em 1895 no Teatro Lyrico, em 1915 no Palace-Theatre e em 1925 no Teatro Recreio) encontrou-se com Louis Lumière e obteve alguns filmes deste último para usá-los como parte de seus espetáculos. O sucesso destes encorajou-o a filmar seus próprios números no palco. Ele usou muitos truques e teve ainda a idéia de projetar seus filmes ao contrário. Além disso criou um acompanhamento vocal dos bastidores imitando as vozes dos personagens na tela.

Arturo Ambrosio

Porém o primeiro sinal de uma atividade cinematográfica mais significativa veio de Turim, para onde o fotógrafo Edoardo Di Sambuy trouxe uma câmera que havia comprado na França. Ele a repassou para um revendedor de equipamentos óticos e fotográficos, Arturo Ambrosio, sob cuja égide Roberto Omegna filmou os primeiros cinejornais italianos (v. g. La prima corsa automobilista Susa Moncenisio, Manovre degli alpini Colle Ranzola). Em 1904 a Società Anonima Ambrosio ergueu o primeiro estúdio cinematográfico italiano.

No mesmo ano, Filoteo Alberini abriu o Cinema Moderno em Roma e em 1905 fundou com Dante Santoni o “Primo Stabilimento Italiano di Manufattura Cinematografica Alberini e Santoni”. No final deste ano, Alberini e Santoni construiram na via Appia Nuova um estúdio, que diziam ter o equipamento mais avançado importado da França e da Alemanha, e nele produziram um filme com enredo, La Presa di Roma. Este filme, uma evocação da conquista de Roma pelas tropas italianas em 1870 (com sete cenas, 250 metros) teve a colaboração do renomado ator Carlo Rosaspina e, mais importante ainda, a cooperação do Ministro da Guerra “para uniformes, artilharia e armamento”.

La Presa di Roma

De repente o cinema italiano começou a se tornar uma indústria e, no início de 1906, Alberini e Santoni tornou-se uma sociedade anônima, Società Anonima per Azioni Cines, administrada pelo engenheiro Adolfo Pouchain, tendo como secretário o Barão Alberto Fassini, magnata da indústria têxtil. Santoni deixou a empresa pouco tempo depois e Alberini passou a ocupar o cargo de diretor técnico. No mesmo ano, a Cines contratou um dos melhores técnicos da Pathé, Gaston Velle, que trouxe vários assistentes consigo. Como diretor artístico, Velle realizou filmes de vários gêneros entre eles Viaggio in una Stella, La malia dell’oro, Pierrot innamorato. Em 1907, Mario Caserini, que havia entrado para a Cines como ator, iniciou suas atividades como diretor e Velle retornou para a França. A Cines começou então a se especializar na produção de dramas shakespereanos e filmes históricos.

Inspirado nesses filmes históricos da Cines e com o êxito da Ambrosio Film em Turim com Os Últimos Dias de Pompéia / Gli Ultimi Giorni di Pompei / 1908, os industriais Carlo Rossi e Guglielmo Remmert, o sogro deste, Carlo Sciamengo, e o inventor Lamberto Pineschi, fundaram a Carlo Rossi & C. Oito meses depois, por divergências entre os sócios, a empresa entrou em liquidação. Com a ajuda do então jovem contador, Giovanni Pastrone, Sciamengo reavivou-a e, em setembro de 1908, ela foi transformada em Itala Film, que obteve muitos triunfos com O Conde Ugolino / Il Conte Ugolino / 1908 e Máscara de Ferro / La Mascara de Ferro / 1909 e se saiu muito bem nas comédias de Cretinetti e Tontollini, respectivamente interpretadas pelos cômicos franceses André Deed e Ferdinand Guillaume. Quanto a Rossi, ele foi contratado pelo Barão Fassini para ocupar um cargo de direção na Cines. Em 1913 a Cines absorveu a Celio Film, fundada em 1912 pelo advogado (e depois deputado) Gioacchino Mecheri, o diretor Baldassare Negroni e o marquês Alberto Del Gallo.

O sucesso das primeiras “fábricas de filme” em Turim e Roma logo atraíram a atenção em outros lugares, surgindo várias firmas em 1908, notadamente em Milão onde se distinguiu a Saffi-Comerio (depois Milano Film) presidida por Luca Fortunato Comerio, ex-fotógrafo oficial da Casa Real e do Rei Vittorio Emanuelle III. Em Turim foi fundada a Aquila Film do empresário Camilo Ottolenghi e a Pasquali Film do ex-jornalista e empregado da Ambrosio Film, Ernesto Maria Pasquali. Em Roma, os irmãos Azaglio e Lamberto Pineschi organizaram uma companhia que em 1909 tornou-se a Latium Film. Em Nápoles surgiu a Fratelli Troncone (Partenope Film). Em outras cidades como Veneza, Florença, Velletri, Palermo, companhias mais ou menos efêmeras, filmaram eventos locais. No começo da Primeira Guerra Mundial novas produtoras foram fundadas: Caesar Film, Palatino-Film, Medusa-Film, Tiber Film, Nova-Film em Roma; Lombardo Film em Nápoles; Armenia Film em Milão etc.

Esta grande expansão da indústria de cinema italiana foi marcada por um florescimento precoce do drama de época extraído da literatura ou da história, emergindo diretores importantes: Luigi Maggi (Os Últimos Dias de Pompéia / Gli Ultimi GIorni di Pompei / 1908, La Gioconda / 1911), Giuseppe De Liguoro (Il Conte Ugolino / 1909, O Inferno / L´Inferno / 1909); Giovanni Pastrone (Giordano Br uno / 1908, A Queda de Tróia / La Caduta di Troia / 1910, Cabiria / Cabiria / 1914); Mario Caserini (Romeu e Julieta / Romeo e Giuletta / 1908, Os Três MosqueteirosI Tre Moschettieri / 1909); Enrico Guazzoni (Brutus / Brutus / 1910, Agrippina / 1910, Jerusalem LIbertada / La Gerusalemme LIberata / 1911, Quo Vadis? / Quo Vadis? / 1912, Marco Antonio e Cleópatra / Marcantonio e Cleopatra / 1913, Grandeza e Decadência de Roma ou No Tempo dos Césares / Caius Julius Caesar / 1914; Nino Oxilia (Joana D ´Arc – A Donzela D´Orleans / Giovanna d´Arco / 1913, Com Este Sinal Vencerás / In Hoc Signo Vinces / 1913).

O filme mais famoso foi Cabiria, superprodução dirigida por Giovanni Pastrone com cenografias espetaculares que teriam influenciado David Wark Griffith na realização do seu monumental Intolerência / Intolerance / 1917 e lançado o personagem de Maciste, o gigante de uma força hercúlea e bom coração, visto depois em uma série de filmes de aventura interpretado por Bartolomeo Pagano.

Preocupado com a competição italiana, Charles Pathé decidiu enfrentá-la no seu próprio terreno e fundou uma subsidiária, a F.A.I. (Film d´Arte Italiano), para funcionar nos moldes da Le Film D´Art francêsa (companhia criada para realizar, com o concurso de eminentes escritores e atores e filmes de qualidade artística capazes de interessar a um público mais exigente), nomeando o empresário teatral Adolfo Re Riccardi, como diretor geral e com Gerolamo Lo Savio e Ugo Falena exercendo função administrativa e funcionando também como diretores ou argumentistas. Este triunvirato contratou atores famosos do palco como Ettore Berti, Ermete Novelli, Ruggero Ruggeri, Cesare Dondini, Ferrucio Garavaglia, Vittoria Lepanto etc. e lançou as jovens atrizes Francesca Bertini e Maria Jacobini, que se tornariam duas das mais famosas “divas” do cinema italiano mudo. Entre os filmes incluíam-se Otello / 1909, Carmen / Carmen / 1909, A Dama das Camélias /  La Signora delle Camelie / 1909, Rei Lear / Re Lear / 1910, Lucrécia Borgia / Lucrezia Borgia / 1912 etc. Em 1917, a maioria das ações da F.A.I. foi adquirida por Gioacchino Mecheri, que a afiliou à Tiber Films, companhia cinematográfica romana que ele havia fundado em 1914.

Francesca Bertini

Pina Mennichelli

No período 1909-1916, além do filme histórico-literário e da linha cômica podemos apontar o divismo e a tendência realista. Assim como Cabiria instalou a tradição do super-espetáculo cinematográfico, o divismo italiano precedeu e provocou o estrelismo hollywoodiano. Entre as grandes divas podemos citar os nomes de Francesca Bertini, Lyda Borelli, Maria Jacobini, Lina Cavalieri, Hesperia, Pina Menichelli, Rina de Liguoro Italia Almirante Manzini etc. e, para serví-las, apareceram novos diretores como por exemplo: o roteirista Baldassare Negroni (História de um Pierrot / Histoire d´un Pierrot / 1913 com Francesa Bertini) e os atores Emilio Ghione (Esposa na Morte / Sposa nella morte / 1915 com Lina Cavalieri), Gustavo Serena (Assunta Spina ou Sangue Napolitano / Assunta Spina / 1915 com Francesca Bertini) e Febo Mari. Outra diva, mas do teatro, Eleonora Duse, que estava ausente dos palcos há sete anos, aceitou o convite da Ambrosio Film para atuar em Cinzas / Cenere / 1916 ao lado de Febo e dirigida por ele. Os dois escreveram o roteiro e a grande atriz dramática esperava que esta experiência lhe abrisse uma nova carreira no cinema, porém ficou desapontada tanto com a produção quanto com sua interpretação. Já Perdidos nas Trevas / Sperdutti nel Buio / 1914 e Teresa Raquin / Thérèse Raquin / 1915, realizados pelo jornalista, poeta, autor e produtor teatral Nino Martoglio, representam a corrente realista, geralmente ignorada de uma produção paralela à dos filmes colossais e grandiloquentes e que mais tarde inspiraria o neorealismo.

Eleonora Duse 

Outro gênero, chamado commedia brillante (alta comédia), revelou Lucio D´Ambra, roteirista que se tornou diretor, cuja obra mais estimada parece ter sido a opereta Echec ao Rei ou Cheque Ao Rei! / Il Re, le Torri, gli Alfieri / 1916. As comédias silenciosas de D´Ambra suscitaram comparações com os filmes de seu contemporâneo alemão Ernst Lubitsch e ele foi cognominado “o Goldoni do Cinema Italiano”.

Il Re, le Torri, gli Alfieri

Entre os diretores que fizeram sua estréia antes do ínicio da Primeira Guerra Mundial ainda estavam Gennaro Righelli (vários filmes estrelados por Maria Mauro, sua esposa na época), Carmine Gallone (O Beijo de Cyrano / Il Bacio di Cirano / 1913, A Mulher Nua / La Donna Nuda / 1914) e Augusto Genina (La Moglie di sua eccelenza / 1913, A Palavra que Mata / La Parola qui uccide / 1914) cujas carreiras prosseguiriam com vigor no cinema sonoro. Outro ator, Mario Bonnard, parceiro das divas mais famosas, progrediria para a direção um pouco mais tarde,.

Nos primeiros tempos do cinema as empresas francesas, italianas e dinamarquesas dominavam o mercado internacional sem que existisse uma colisão frontal de interesses. Foi exatamente o oposto que ocorreu com a importação massiva de filmes americanos que tomaram o velho mundo de assalto a partir dos anos 1916-1917. Apesar desta nova situação, o cinema italiano tentou continuar como antes. Em 1916 Guazzoni filmou São Sebastião, O Mártir ou Fabiola / Fabiola, drama edificante da Roma Cristã; Caserini, um Ressureição / Resurrezione, baseado no romance de Tolstoi; Negroni, A Princesa de Bagdad / La Principessa di Bagdad, e Febo Mari, após o realismo de Cenere, rodou um ambicioso Attilla – Flagellum Dei / Attila, flagello di Dio seguido por Judas em 1917. Ainda neste ano, a Tespi Film de Roma, recentemente fundada por Eugenio Sacerdotti, produziu A Vida de São Francisco de Assis / Frate Sole, a vida de São Francisco de Assis em quatro episódios, dirigida por Mario Corsi e Ugo Falena.

Porém o cinema americano havia conquistado o mercado mundial, que pretendia manter.

 

BASIL DEARDEN

Ele não possuía o prestígio de um Alfred Hitchock, David Lean, Carol Reed ou Michael Powell, mas realizou uma quantidade considerável de bons filmes e sucessos de bilheteria, primeiramente como diretor contratado nos estúdios da Ealing, depois com produtor independente de parceria com Michael Relph, participando ainda de produções de Hollywood e da Televisão. Profissional competente, abordou os mais variados gêneros (drama de guerra, romântico, histórico, social e criminal, comédia, fantástico, ficção científica), manifestando sempre senso visual e inventividade fílmica.

BASIL DEARDEN

Basil Dearden (1911 – 1971) nasceu em Westcliffe-on-Sea com o nome de Basil Clive Dear, filho de James Dear e Florence Tripp. Seu pai faleceu prematuramente e sua mãe assumiu sozinha o sustento da família, que incluía mais quatro filhos e uma filha. Nesse tempo difícil a educação de Basil teve que ser interrompida e ele foi colocado em um orfanato onde ficou por algum tempo até arrumar seu primeiro emprego aos quatorze anos de idade como office boy de uma companhia de seguros de Londres.

Inspirado pelo sucesso de seu irmão mais moço Peter como modelo e ator infantil tanto no teatro como em filmes mudos, Basil ingressou como intérprete na Ben Greet Company, tornando-se depois assistente de gerente de palco no Fulham´s Grand Theatre. Em 1932 foi trabalhar como gerente de produção para o produtor teatral Basil Dean, passando depois a lhe prestar serviço também nos filmes que Dean realizava na Associated Talking Pictures (ATP), primeiramente como assistente junior do estúdio, mas logo sendo promovido a assistente de direção, tendo ainda recebido momentaneamente outras incumbências. Nesta oportunidade Basil mudou seu nome de Dear para Dearden para evitar confusão com o patrão.

Na ATP Dearden, funcionou como assistente de produção de uma comédia de Will Hay (The Ghost of St. Michaels / 1941), assistente de direção de duas comédias de George Formby (It´s in the Air /1938 e Come on George /1939) e produtor associado de três outras (Spare a Copper / 1941, Let George Do It /1941 e Tudo Acabou Bem? / Turned Out Nice Again / 1941), nesta última já quando Michael Balcon assumiu os estúdios da ATP e mudou sua denominação para Ealing. Sua carreira como diretor (compartilhando esta função com o astro Will Hay) teve início em três comédias (Detetive à Força / The Black Sheep of Whitehall / 1941, Professor Astuto / The Goose Steps Out / 1942 e My Learned Friend / 1943). Nos anos quarenta Dearden foi ainda um dos roteiristas de Now You´re Talking (12 min.), dirigiu Did You Ever See a Dream Talking (7 min.) e participou sob a supervisão de Alberto Cavalcanti de Trois Chansons de la Résistance (8 min.), shorts de propaganda de guerra produzidos pela Ealing.

O primeiro trabalho dele como único diretor foi The Bells Go Down / 1943, filme de ficção que prestava tributo ao heroísmo da Auxiliary Fire em tempo de guerra. O diretor de arte era Michael Relph e seu encontro com Dearden marcou o início de uma colaboração notável que iria durar quase trinta anos. Quando a Ealing fechou as portas em 1958 a dupla Dearden-Relph continuou produtivamente até a morte trágica de Dearden em um acidente de carro em 1971.

Michael Relph e Basil Dearden

Depois de sua estréia sózinho atrás das câmeras, Dearden fez mais cinco filmes compartilhando a direção com outros colegas: Na Solidão da Noite / Dead of Night / 1945 (episódios com Alberto Cavalcanti, Charles Crichton e Robert Hamer), Train of Events / 1949 (episódios com Sidney Cole e Charles Crichton), Confio Em Ti / I Believe in You / 1952 e Punhos Traiçoeiros / The Square Ring / 1953 (ambos com Michael Relph).

Os filmes restantes dirigidos somente por Dearden incluem: 1944 – The Halfway House; They Came to a City. 1946 – Corações Aflitos / The Captive Heart; 1947 – Frieda / Frieda. 1948 – Sarabanda / Saraband for Dead Lovers. 1950 – A Lâmpada Azul / The Blue Lamp; Do Amor a Ódio / Cage of Gold. 1951 – Beco do Crime / Pool of London. 1952 – O Ódio Era Mais Forte / The Gentle Gunman. 1954 – The Rainbow Jacket. 1955 – Out of the Clouds; A Morte de um Herói / The Ship That Died of Shame. 1956 – Who Done It. 1957 – The Smallest Show on Earth. 1958 – Seduzidos pela Maldade / Violent Playground. 1959 – Safira, A Mulher sem Alma / Sapphire. 1960 – Os Sete Cavalheiros do Diabo / The League of Gentlemen; Um Homem na Lua / Man in the Moon. 1961 – O Sócio Secreto / The Secret Partner; Meu Passado me Condena / Victim. 1962 – All Night Long; Escravo de uma Obsessão / Life for Ruth. 1963 – The Mind Benders; A Place to Go. 1964 – A Mulher de Palha / Woman of Straw. 1965 – Oriente Contra Ocidente / Masquerade. 1966 – Khartoum / Khartoum. 1968 – No Mundo dos Escroques / Only When I Larf. 1969 – Sindicato do Crime / The Assassination Bureau. 1970 – O Homem Que Não Era (na TV) / The Man Who Haunted Himself.

Entre os que pude ver, eis os dez que mais me agradaram, todos com histórias muito interessantes.

THE HALFWAY HOUSE / 1944

Em junho de 1943 dez pessoas precisando muito de um descanso chegam a uma estalagem, The Halfway House, perdida na região campestre do País de Gales. Eles são recebidos pelo proprietário Rhys (Mervyn Johns) e sua filha Gwyneth (Glynis Johns). Os hóspedes compreendem: um casal  de meia idade(Tom Walls, Françoise Rosay) de luto pela morte de seu filho em serviço ativo na guerra; um par mais jovem (Richard Bird, Valerie White) prestes a se divorciar e sua filha (Sally Ann Howes) tentando reconciliá-los; um militar (Guy Middleton) degradado por ter dado um desfalque nos fundos de seu regimento; um traficante do mercado negro (Alfred Drayton); um maestro famoso (Esmond Knight) com poucos meses de vida, um rapaz irlandês (Pat McGrath)  e sua noiva (Philippa Hiatt) com pontos de vista conflitantes sobre a guerra. Pouco após sua chegada os hóspedes começam a perceber que algo está errado. Os jornais e o calendário estão um ano desatualizados. Rhys não mostra nenhum reflexo em um espelho e Gwyneth não projeta sombra quando sai de casa. É como se o dono da estalagem e sua filha fossem fantasmas. Depois de ouvirem uma transmissão radiofônica de 1942 os hóspedes ficam surpresos ao perceber que eles foram levados de volta exatamente a um ano no tempo, para a hora exata em que a estalagem foi destruída por um bombardeio aéreo.

Cena de The Halfway House

Drama com um toque sobrenatural e uma mensagem patriótica no seu desfecho tendo como escopo a unidade nacional em tempo de guerra. Espetáculo continuadamente absorvente graças a uma direção segura e desempenho correto e homogêneo do elenco. Apesar de seu tema sombrio é uma história de fantasmas com elementos de um humor suave, na qual o horror é substituido pela melancolia. A câmera de Wilkie Cooper capta muito bem a paisagem campestre encantadora onde se desenrola a ação.

CORAÇÕES AFLITOS / THE CAPTIVE HEART / 1946.

Em 1940 o Capitão Karel Hasek da Exército Tcheco (Michael Redgrave) escapa do campo de concentração de Dachau e assume a identidade de um oficial britânico morto, Capitão Geoffrey Mitchell. Quando é capturado, ele se junta a milhares de prisioneiros de guerra. Seus companheiros do campo suspeitam que ele seja um espião companheiros porque fala bem o alemão, porém o oficial britânico superior, Major Dalrymple (Basil Radford), acredita na sua história. Procurado pela Gestapo, Hasek mantém a correspondência com a viúva de Mitchell, Celia (Rachel Kempson). Antes da guerra Mitchell tinha abandonado sua mulher e seus dois filhos, mas as cartas reacendem seu amor pelo marido. Ao ser repatriado, Hasek vai visitar Celia. Ele lhe dá a notícia da morte de Mitchell e revela que se apaixonou por ela. Passado um primeiro está gostando dele.

Michael Redgrave em Corações Aflitos

Drama de guerra com uma história de amor expondo com realismo, vigor emocional e riqueza cinematográfica, a vida em um campo de prisioneiros alemão. Nomentos marcantes são a chegada dos soldados britânicos ao campo de Marlag; a leitura da carta de um prisioneiro relatando sua vida no campo e a câmera mostrando as imagens dela; a visita noturna ao arquivo para a substituição dos nomes; o retorno dos soldados ingleses para as suas casas; os close-ups de Celia e Hasek falando-se pelo telefone no meio de uma Paris em festa.

FRIEDA / FRIEDA / 1947.

Quando a Segunda Guerra Mundial se aproxima do fim, uma jovem enfermeira alemã, Frieda (Mai Zetterling), ajuda um aviador da R.A.F., Robert (David Farrar), a escapar de um campo de prisioneiros alemão. Para impedir que ela seja punida por sua deslealdade ao Reich, casa-se com ela e eventualmente chegam na casa da família dele em Oxfordshire. Frieda conhece sua mãe (Barbara Everest), sua cunhada Judy (Glynis Johns), seu meio-irmão Tony (Ray Jackson), a empregada Edith (Gladys Henson) e tia Eleanor (Flora Robson), figura de destaque na política local e veementemente anti-germânica.

Judy é mais tolerante com Frieda embora sendo viúva do irmão de Robert, morto em um combate aéreo. A mãe de Robert permanece sem julgamento, mas Tony e a criada sentem-se ambos incomodados com a presença de uma estranha. A princípio a população da cidade hostiliza Frieda e Robert é obrigado a desistir de seu emprego como professor. Mas aos poucos a jovem ganha a confiança de todos – com exceção de Eleanor – até que aparece seu irmão Richard (Albert Lieven), ex-soldado alemão vestido com um uniforme polonês. Inicialmente, pensando que ele morrera, Frieda fica muito feliz, mas logo verifica que Richard continua fiel à ideologia nazista. Entrementes Richard é denunciado em um bar como um dos guardas de um campo de concentração e, para Robert em particular, admite a verdade desta acusação acrescentando que Frieda aprova seu plano neonazista. Sentindo-se comprometida, Frieda joga-se de uma ponte em um rio caudaloso, mas Robert chega a tempo de salvá-la, levando-a de volta para casa, onde Eleanor admite que seu preconceito anti-germânico é errôneo.

David Farrar e Mai Zetterling em Frieda

Drama social sobre o problema das atitudes no pós-guerra em relação aos alemães e a difícil passagem de uma família da classe média e de uma comunidade – lidando com seu preconceito raivoso e seus temores – para a aceitação de uma jovem alemã doce e inocente. Dearden mantém a atmosfera tensa, conduzindo a ação com sobriedade, armando algumas cenas agitadas mais para o desfecho melodramático.

SARABANDA / SARABAND FOR DEAD LOVERS / 1948.

Em 1862 na Alemanha a jovem Sophie-Dorothea (Joan Greenwood) se vê obrigada a desposar o Príncipe George Louis de Hanover (Peter Bull). Enquanto George se ocupa com suas amantes, Sophie fica sozinha com sua sogra a Eleitora Sophia (Françoise Rosay), que tem pouca afeição por ela. Solitária e deprimida, Sophie se consola com o soldado mercenário sueco Conde Philip Christoph von Königsmark (Stewart Granger). Os dois pretendem fugir do país, mas a Condessa Platen (Flora Robson), a nova amante de George, tendo sido rejeitada pelo conde, descobre o plano dos dois e conta tudo ao rei. Descoberta a infidelidade de Sophia, Kögnismarck é assassinado e a princesa encarcerada no Castelo de Ahlden onde permaneceu trinta e dois anos até sua morte. E George se torna George I, Rei da Inglaterra.

Joan Greenwood e Stewart Granger em Sarabanda

Drama romântico baseado vagamente em acontecimentos históricos, realizado com apreciável senso plástico, notadamente na sequência da festa carnavalesca na qual vemos a princesa perdida e em pânico no meio da multidão que se diverte histericamente. É uma sucessão de cortes interrompidos, panorâmicas rápidas e esplêndidos close-ups de máscaras sucedendo-se em uma montagem rápida ao ritmo de uma partitura palpitante. Dearden deixou o fotógrafo Douglas Slocombe utilizar o technicolor à sua maneira, ou seja, com contraste, por exemplo, naquele claro-escuro ameaçador da luta de espadas no final.

A LÂMPADA AZUL / THE BLUE LAMP / 1950.

Na área de Paddington, George Dixon (Jack Warner), guarda veterano da Polícia Metropolitana de Londres, prestes a se aposentar, supervisiona um novo recruta, Andy Mitchell (Jimmy Hanley). Apesar da relutância inicial de sua esposa, ele oferece hospedagem a Andy, que tem a mesma idade do filho que perderam na guerra e acabam formando uma família feliz. Em uma ronda, Dixon se vê face a face com o jovem delinquente Tom Riley (Dirk Bogarde) roubando a bilheteria de um cinema. Dixon tenta convencer Riley a se render, mas ele atira e foge. Dixon morre no hospital algumas horas depois e a Scotland Yard inicia a busca do criminoso. Após vários incidentes Riley é localizado quando tenta se esconder entre a multidão em um hipódromo de corrida de galgos, mas com a ajuda da administração do estádio, o criminoso é cercado pelos policiais e é Andy quem vai prendê-lo.

Dirk Bogarde em A Lâmpada Azul

Drama criminal com rigor documentário sobre o cotidiano de uma delegacia da Guarda Metropolitana de Londres (simbolizada pela lâmpada azul) e a colaboração que lhe é prestada pela Scotland Yard, colocando em foco o caso de um assassinato cometido por jovem delinquente  desesperado e perigoso porque imprevisível. Após uma exposição meticulosa do aspecto trabalhoso e metódico das investigações, Dearden constrói uma última parte bastante nervosa que termina com uma perseguição frenética do criminoso pelas ruelas londrinas até o final ofegante no lugar onde ele é capturado.

DO AMOR AO ÓDIO / CAGE OF GOLD / 1950.

A jovem pintora Judith Moray (Jean Simmons) desfaz seu noivado com o Dr. Alan Kearn (James Donald) e se casa com um antigo namorado, o ex-piloto militar Bill Glennon (David Farrar), aventureiro sem escrúpulos. Decepcionado porque seu plano incluía a presuntiva herança da esposa e esta herança não existe mais, ele a abandona, levando suas jóias e dinheiro, e volta para a amante, Marie Jouvet (Madeleine Lebeau) cantora do cabaré “A Gaiola de Ouro” em Paris.  Em Londres, Judy pede auxílio a Alan, mas ele recusa seu pedido para fazer um aborto. Depois que a criança nasce, sai uma notícia no jornal listando Bill entre os mortos em um acidente aéreo. Alain e Judith se casam até que Bill reaparece e exige uma enorme quantia para não acusar o casal de bigamia, o que importaria na perda da guarda da criança. Armada de um revólver, Judith confronta-o no seu apartamento. Alan descobre onde ela foi e corre para lá cruzando com Judith correndo agitada no meio do nevoeiro. Ele segue para o apartamento e descobre Bill morto, sendo surpreendido com a arma na mão por um policial. Para proteger Judith, Alan admite ter matado Bill. Porém o Inspetor Grey (Bernard Lee) recebe a confissão do verdadeiro assassino, a amante parisiense de Bill, que na viagem de volta para Paris comete suicídio.

Jean Simmons em Do Amor ao Ódio

Drama criminal com todos os ingredientes típicos de um melodrama, exposto por Dearden com muita habilidade e valorizado pela soberba iluminação dramática de Douglas Slocombe. No desenrolar da narrativa encontram-se lances cinematográficos como, por exemplo, o grito de Judith chamando pelo marido que a abandonou e este grito e o seu rosto fundindo-se como apito da locomotiva avançando velozmente em direção à câmera. Nota-se o contraste entre a gaiola do cabaré em cujo centro vemos Madeleine, encarnação do desejo feminino e a casa dos Kearn, na verdade outra gaiola, onde Judith expia seu erro inicial de ter sido seduzida por Robert, tornando-se enfermeira de seu sogro inválido, mãe de seu filho, esposa conformada com a serenidade da vida familiar.

A MORTE DE UM HERÓI / THE SHIP THAT DIED OF SHAME / 1955.

Durante a Segunda Guerra Mundial, a lancha torpedeira 1087 – cuja tripulação comandada pelo Capitão Bill Randall (George Baker) incluía mais dois homens, George Hoskins (Richard Attenborough) e Coxwain Birdie (Bill Owen) – realizou com êxito várias missões perigosas ao longo da costa da França ocupada pelos nazistas. Após o fim do conflito, Hoskins convence Randall e Birdie a comprar e restaurar a lancha e usá-la para contrabandear mercadorias de luxo como uísque, meias de sêda e chocolate através do Canal da Mancha. Porém quando Hoskins se associa a uma organização criminosa liderada pelo Major Fordyce (Roland Culver), eles passam a transportar dinheiro falsificado e armas. A partir daí a embarcação começa a apresentar defeitos como se estivesse com vergonha desta carga. Em uma viagem, Hoskins aceita levar um passageiro misterioso e quando a lancha se aproxima do porto, para se livrar dos guardas alfandegários, ele joga o passageiro no mar, deixando-o morrer afogado. Depois os três parceiros ficam sabendo pelos jornais que o tal passageiro era um assassino de criança fugitivo da justiça, surgindo discordância entre eles e incidentes violentos, que culminam na autodestruição da lancha chocando-se contra os rochedos e ocasionando   a morte de Hoskins enquanto Randall e Birdie conseguem se salvar.

George Baker e Richard Attenborough em A Morte de um Herói

Misturando três gêneros – drama de guerra, criminal e fantástico – o filme aborda a questão da sobrevivência no pós-guerra, retratando especificamente a frustração de ex-combatentes que não conseguem se adaptar ao tempo de paz e se afundam cada vez mais no mundo do crime. As qualidades antropomórficas da lancha ajudam a tornar a história mais excitante que Dearden conduz exemplarmente ajudado pela esplêndida fotografia atmosférica de Gordon Dines, servindo como exemplo a sequência em que o criminoso fugitivo, no meio de intenso nevoeiro, fica rondando o convés da lancha apavorado, ouvindo cegamente as vozes do alto falante e o apito do barco da polícia que se aproxima até ser empurrado para a morte por Hoskins.

SAFIRA, A MULHER SEM ALMA / SAPPHIRE / 1959.

O superintendente da polícia londrina, Robert Hazard (Nigel Patrick) e o inspetor Phil Learoyd (Michael Craig) – que tem preconceito contra negros -, investigam o assassinato de uma jovem estudante de música, Sapphire Robbins (Yvonne Buckingham). Um médico de Birmingham, Dr. Robbins (Earl Cameron), revela que ele e Sapphire eram filhos de pai branco e mãe negra, mas como ela tinha a pele clara, fazia-se passar por branca. Os investigadores descobrem que Sapphire levava uma vida dupla, estudando de dia e frequentando boates suspeitas nas áreas habitadas por negros. Os investigadores interrogam David Harris (Paul Massie), estudante de arquitetura namorado de Sapphire, seus pais (Bernard Miles, Olga Lindo), sua irmã Mildred (Yvonne Mitchell) e inspecionam as boates que a moça frequentava. Em um desses locais eles questionam um amiguinho de Sapphire, Johnny Fiddle (Harry Baird), sobre um lençol e uma faca com manchas de sangue encontradas no seu quarto e que ele alega ter sido o resultado de uma briga com outro sujeito, fato depois confirmado. Hazard reúne toda a família e convida o Dr. Robbins para comparecer. Duante o encontro, o Dr. Robbins brinca inadvertidamente com uma boneca encontrada e o ódio racista de Mildred vem à tona. Arrancando a boneca das mãos de Robbins, ela confessa que matou Sapphire enfurecida por ela se gabar de sua gravidez e pensando como a raça de seu bebê iria afetar a família. Mildred é presa e Hazard e um arrependido Learoyd desejam ao Dr Robbins uma boa viagem de volta a Birmingham.

Nigel Patrick em A Mulher Sem Alma

Drama criminal sociológico com um libelo discreto mas vigoroso contra o preconceito racial ao descrever detalhadamente as tensões étnicas na Londres dos anos cinquenta.  Articulando sabiamente as suspeitas sobre diferentes personagens, Dearden mantém o interesse do espectador o tempo todo, auxiliado por uma boa fotografia de cores neutras em perfeita harmonia com a história.

OS SETE CAVALHEIROS DO DIABO / THE LEAGUE OF GENTLEMEN / 1960.

Tenente coronel reformado após vinte e cinco anos de serviço, John George Norman Hyde (Jack Hawkins), decide se vingar. Utilizando informações que possui sobre eles, Hyde reune um grupo de sete oficiais, todos expulsos do exército – Major Peter Graham Race (Nigel Patrick), Mycroft (Roger Livesey), Edward Lexy (Richard Attenborough) Martin Porthill (Bryan Forbes), Stevens (Kieron Moore), Rupert Rutland-Smith (Terence Alexander), Frank Weaver (Norman Bird) – e os treina para a “Operação Tosão de Ouro”, cada qual seguindo sua especialidade militar. Por uma manobra inteligente, eles saqueiam um depósito de armas e munições desviando as suspeitas sobre os revolucionários irlandeses. Sob a cobertura de uma empresa de mudanças, Hyde e seus comparsas dispõem seu material em pleno centro de Londres nas proximidades de um banco. Na hora certa uma nuvem de fumaça inunda os arredores, os telefones são cortados, as emissões de rádio da polícia embaralhadas. Protegidos por máscaras contra gás eles penetram no banco e se apoderam de um milhão de libras. Eles se retiram estrategicamente e se reencontram mais tarde na casa de campo de Hyde para dividir o saque. A polícia consegue rastreá-los graças um erro ínfimo em um plano aliás, impecável. Eles serão todos presos.

Cena de Os Sete Cavalheiros do Diabo

Drama criminal combinando com incontestável originalidade assalto e estratégia militar. Após a apresentação dos diferentes personagens o filme ganha intensidade, acumulando surpresas e reviravoltas, sempre com uma nota de humor, mas em tom voluntariamente sério, culminando com um roubo espetacular com duração de vinte minutos, filmado com rigor e eficácia. Todos os atores que personificam os oito assaltantes atuam com muita convicção, contribuindo enormemente para o êxito do espetáculo. 

MEU PASSADO ME CONDENA / VICTIM / 1961.

O eminente advogado Melville Farr (Dirk Bogarde), em vias de se tornar Conselheiro da Rainha, é procurado por Jack “Boy” Barrett (Peter McEnery), com o qual teve um relacionamento amoroso. Farr se recusa a falar com ele, pensando que Barrett está tentando chantageá-lo, porém o rapaz está ele próprio sendo vítima de chantagistas, que possuem uma foto dele com Farr abraçados dentro de um carro. A fim de pagar a chantagem, Barrett deu um desfalque na firma onde trabalha, está fugindo da polícia e necessita do auxílio financeiro de Farr para sair do país. Barrett finalmente é preso e, para não ser forçado a revelar os detalhes da chantagem e o papel de Farr nesse esquema, ele se enforca em sua cela; porém a polícia descobre sua relação com o advogado. Laura fica sabendo do suicídio de Barrett e, achando que seu marido não cumpriu a promessa que fizera quando se casaram de que ele não seria mais indulgente com sua atração homossexual, decide deixá-lo. Ajudado por um amigo de Barrett, Farr consegue identificar outras vítimas de chantagem e resolve ajudar a polícia a prender os chantagistas, comprometendo-se a prestar testemunho perante a côrte mesmo sabendo que isto poderá destruir sua carreira. Os criminosos são presos e Farr pede que Laura parta antes do julgamento, com a intenção de poupá-la deste constrangimento, mas que espera que ela retorne depois. Laura responde que acredita que já encontrou força para voltar para ele.

Dirk Bogarde e Sylvia Simms em Meu Passado Me Condena

Drama criminal com vocação social tendente a denunciar a legislação inglesa da época, que tipificava o homossexualismo como crime. Dearden aborda o assunto abertamente e com seriedade, mostrando os danos causados por chantagistas às vítimas de várias profissões – um operário fabril, um dono de livraria, um barbeiro, um vendedor de automóveis, um fotógrafo, um lorde, um ator de teatro famoso -, que tentam viver sua diferença nas suas respectivas profissões. Uma das muitas virtudes do filme de Dearden está em não apresentar personagens “gays” como estereótipos efeminados, mas sim como indistinguíveis de personagens “éteros”, apresentando a homosexualidade com honestidade e sem sensacionalismo.