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JOHN FARROW

JOHN FARROW

O australiano John Villiers Farrow (1904-1963) chegou em Hollywood no final dos anos vinte e lá ficou, iniciando carreira como roteirista, primeiramente escrevendo os subtítulos de A Tragédia da Alcova / White Gold / 1927 e A Noiva do Mar / The Wreck of the Hesperus / 1927. Depois escreveu outro subtítulo e roteiros, adaptações ou diálogos até 1935, quando atuou como assistente de direção da versão em língua inglesa de Don Quichotte de G. W. Pabst. Em seguida co-dirigiu, sem ser creditado, A Fuga de Tarzan / Tarzan Escapes / 1936, casando-se com Maureen O’Sullivan, a atriz que fazia o papel de Jane., com quem teve sete filhos, entre eles, Mia Farrow. Seu único filme com algum interesse na década de trinta, entre os quinze que fez neste período, foi Cinco Devem Voltar / Five Came Back / 1939, produzido pela RKO, contando a história de um grupo de pessoas preso num ambiente isolado, no caso as selvas da América do Sul habitadas por canibais, e como eles lidam com esta situação.

John Farrow e Maureen O`Sullivan

Nos anos quarenta, entre filmes insignificantes, destacaram-se os filmes de guerra Nossos Mortos Serão Vingados / Wake Island / 1942 (indicado ao Oscar … provavelmente por motivo patriótico e única indicação de Farrow como Melhor Diretor), Os Comandos Atacam de Madrugada / Commandos Strike at Dawn / 1942 e A Quadrilha de Hitler / Hitler’s Gang / 1944; dois filmes noirs, O Relógio Verde / The Big Clock / 1948 e A Noite Tem Mil Olhos / Night Has a Thousand Eyes / 1948; e uma mistura de fantasia com drama político, O Enviado de Satanás / Alias Nick Beal / 1949.

Nos anos cinquenta, sobressaíram entre outras realizações de pouca envergadura artística, o filme noir Trágico Destino / Where Danger Lives / 1950; Seu Tipo de Mulher / His Kind of Woman / 1951, drama criminal que, a certa altura, torna-se uma aventura farsesca deleitosa animada pela interpretação exuberante de Vincent Price como o ator shakespeareano canastrão e fanfarrão; e o western Caminhos Ásperos / Hondo / 1953, entremeando boas cenas de ação, como a perseguição e o aprisionamento de Hondo (John Wayne), a luta de faca entre Hondo e o apache Silva (Rodolfo Acosta), e o ataque ao comboio, instalando-se momentos de relacionamento, marcados por um percuciente estudo psicológico do personagem central. A meu ver, os melhores filmes de John Farrow foram os três filmes noirs.

Charles Laughton e Ray Milland em O Relógio Verde

O RELÓGIO VERDE

George Stroud (Ray Milland) é o editor da revista Crimeways, uma das várias publicações de Earl Janoth (Charles Laughton). Stroud é abordado por Pauline Delos (Rita Johson), sem saber que ela é a amante de Janoth. Janoth chega no prédio de Pauline justamente no momento em que Stroud está saído, mas não reconhece seu empregado. Enciumado, interroga Pauline e esta admite que recebeu a visita de um amigo imaginário “Jefferson Randolph”. Em um acesso de raiva, Janoth mata Pauline. Tomado de pânico, relata o ocorrido a seu assistente, Steve Hagen (George Macready). Os dois planejam incriminar o homem que esteve no apartamento de de Pauline. Necessitando da experiência de Stroud, com quem se desentendera, Janoth pede-lhe desculpas e o convoca para ajudá-lo a encontrar “Randolph”.

O filme se abre com um elemento noir clássico: a câmera faz uma panorâmica sobre a cidade noturna, chega em um edifício passando pelo letreiro que identifica as “Publicações Janoth” e entra em um corredor escuro, onde uma figura misteriosa, ocultando-se nas sombras, começa a contar em voz over como acabou naquela situação, caçado pela polícia e pelos seus próprios companheiros de trabalho. A maior parte da história é narrada em retrospecto, composições assimétricas, iluminação contrastada e angulações dramáticas, outros itens do estilo noir. O tom é sombrio e melancólico, porém há alguns momentos de humor (a cargo da artista plástica excêntrica interpretada por Elsa Lanchester), que servem de contraste para o magnata de comportamento mecânico, uma versão decidamente mais dark de loucura. O magnata é um pomposo psicótico que cultua a si mesmo (“Todos me conhecem”), controla obsessivamente o seu tempo e trata os empregados como se fossem escravos. O relógio gigantesco é o símbolo de sua egolatria e do seu poder corporativo. A história se desenrola em um clima de crescente expectativa e o cinegrafista John Alton faz uma série de planos sequência com complicados movimentos de câmera.

John Lund, Gail Russell e Edward G. Robinson

 

A NOITE TEM MIL OLHOS

Em uma noite estrelada, Elliott Carson (John Lund) impede que sua namorada, Jean Courtland (Gail Russell) cometa suicídio, atirando-se de uma passarela sobre a linha ferroviária. Eles entram em um bar e se encontram com John Triton (Edward G Robinson), que lhe conta a sua história. Triton fazia um espetáculo de clarividência, assistido por sua noiva Jenny (Virginia Bruce) e seu melhor amigo Whitney Courtland (Jerome Cowan), que viriam a ser os pais de Jean. Triton passou a ter premonições, inclusive a da morte de Jenny e, angustiado, passou vinte anos sem se comunicar com ninguém. Jean tentou o suicídio porque Triton reapareceu e, depois de prever a morte de seu pai, teve uma visão de que ela iria morrer de noite sob aluz das estrelas.

Este thriller que poderíamos classificar de parapsicológico, conta a tragédia de um homem, amaldiçoado pelo seu dom de prever acontecimentos fatídicos (“Comecei a ter a sensação maluca de que estava fazendo as coisas acontecer como um feiticeiro de vodu que mata as pessoas espetando bonecas com um alfinete”), sem ter poderes para impedi-los. Os temas da fatalidade implacável e do sentimento de culpa que atormenta o protagonista, o uso de retrospectos e da voz over, o score lúgubre e a fotografia contrastada “enegrecem” o filme. Particularmente notável é toda a sequência inicial, quando Elliott surge no meio da fumaça de um trem. Ele acha uma luva de Jeane depois sua bolsa aberta com os objetos caídos no chão. Avista Jean no alto de uma passarela e outro trem que se aproxima. Sobe correndo uma escada em espiral e chega a tempo de agarrá-la, no momento em que ia se atirar sobre a linha férrea.

Robert Mitchum, Claude Rains e Faith Domergue em Trágico Destino

 

TRÁGICO DESTINO

Após tentar o suicídio, Margo Lannington (Faith Domergue) é atendida pelo médico Jeff Cameron (Robert Mitchum). Embora comprometido com Julie (Maureen O´Sullivan), Jeff sai com sua paciente. Ela diz que seu pai, o milionário Frederick Lannington (Claude Rains), pretende levá-la para Nassau. Apaixonado, Jeff decide ir à sua casa para dizer ao pai da moça que a ama e fica sabendo da verdade. Frederick não é pai, mas sim marido da Margo. Jeff sai furioso e Frederick bate em Margo. Ao ouvir os gritos de Margo, Jeff volta correndo. Frederick golpeia-o na cabeça com um atiçador, porém Jeff ainda consegue atingi-lo com um soco, deixando-o desfalecido. Enquanto Jeff vai ao banheiro molhar um pouco a testa, a jovem mata Frederick, sufocando-o com um travesseiro. Jeff desmaia de dor. Quando volta a si, pensa que foi ele quem matou Frederick. Margo é uma mulher fatal esquizofrênica. O médico fica atraído por ela instantaneamente quando a vê, com seus lindos cabelos negros, deitada na cama do hospital. “Você me salvou”, diz Margo. E ele responde: “Você me agradece amanhã de manhã!”. “Eu o agradeço agora”, e a câmera corta para o rosto de Julie, que já percebe o que está acontecendo. Jeff é um dos protagonistas mais masoquistas do filme noir. Ao confrontar-se com ele, Frederick explica as bases de seu casamento: “Margo casou-se comigo por dinheiro. Eu me casei com ela por sua juventude. Ambos obtivemos o que desejávamos”. Esta revelação dá a Jeff a chance de recuperar o seu bom senso e voltar para Julie. Mas ele fica, e é arrastado para a degradação. No auge de sua forma, Farrow cria (com o grande fotógrafo Nicholas Musuraca) um estilo visual dark apropriado para o clima de sofrimento, neurose e corrupção que predomina durante toda a narrativa.

 

 

ANÁLISE DE PACTO SINISTRO DE ALFRED HITCHCOCK

Guy Haines (Farley Granger), tenista famoso, encontra um estranho, Bruno Anthony (Robert Walker), num trem, e trocam confidências. Guy quer se livrar de sua esposa infiel Miriam (Laura Elliot), para poder se casar com Anne Morton (Ruth Roman), filha de um senador, mas não está conseguindo obter o divórcio. Bruno lhe propõe um pacto: ele mata a mulher de Guy e, em troca, Guy mataria seu pai. Como os dois são estranhos, seria um crime perfeito. Guy não leva a sério a proposta de Bruno, mas este executa a sua parte do plano, estrangulando Miriam em um parque de diversões. Depois, assedia Guy para que ele cumpra a sua.

O nome de Raymond Chandler, um dos mais famosos escritores de romances policiai, como um dos autores do roteiro (baseado num romance de Patricia Highsmith), bastaria para classificar este filme como um drama criminal de suspense. Só que o suspense aqui é mais moral do que dramático, um suspense que nasce da conjunção dos dois temas principais.

O primeiro tema é o da transferência de identidade. Para o Bruno, mais importante do que trocar os assassinatos é tomar o lugar de Guy, identificar-se com ele. O Bruno é um rapaz atormentado e complexado (sua atitude edipiana é mostrada no relacionamento com o pai e a mãe). Ele fica seduzido pela personalidade de Guy, ele admira o Guy – e quer também dominar o Guy.

Farley Granger e Robert Walker em Pacto Sinistro

O segundo tema é o da transferência de culpa. O Guy tem interesse em se desembaraçar de Miriam, que é o único obstáculo para o seu casamento com a filha do senador. No fundo, ele deseja se livrar dela e do mundo de desordem e vulgaridade que ela representa, para penetrar no mundo ordenado e respeitável dos políticos de Washington. Ele tem inconscientemente o desejo de matá-la. Quando o Bruno mata a Miriam, o Guy descobre sua culpabilidade moral. É como se ele próprio a tivesse matado. Então o Bruno realiza o que o Guy deseja. Ele é o sósia ou o duplo de Guy, ou talvez fosse melhor dizer, a sombra do Guy. Ele mostra o lado escuro, dark, dos desejos do Guy.

O Bruno habita um mundo de trevas. O Guy, um mundo de luz. Vejam, por exemplo, aquele encontro em frente à casa do Guy. O Bruno escondido na sombra, seu rosto coberto pelas barras da grade. A Mansão onde ele mora é triste e escura, cheia de sombras, e até o barco que ele escolhe para entrar no túnel escuro do parque de diversões tem o nome de Plutão, o Deus dos Infernos na mitologia grega. Já o Guy vive no mundo da luz, representado pelas quadras de tênis claras, pelas suas roupas leves, pelos jantares nos salões iluminados de Washington. Há uma cena visualmente interessante, quando vemos, num plano geral, o Bruno aparecendo de longe como uma mancha maligna em contraste como o branco do memorial de Thomas Jefferson. O contraste simbólico entre a luz e a escuridão é forjado por uma magnífica fotografia expressionista que ajuda a criar o clima noir de inquietude e perversão, porque, de fato, o que temos aqui é uma variante do drama criminal: um filme noir.

O assassinato visto pelas lentes do óculos da vítima

Quanto à parte técnica há duas sequências notáveis: a da morte de Miriam vista através das lentes e dos óculos e a sequência final no carrossel, depois de uma montagem paralela entre o jogo de tênis e Bruno tentando apanhar o isqueiro no bueiro. O cuidado com que Hitchcock preparou a cena da morte de Miriam, justifica aquela observação de François Truffaut. Ele disse que o Hitchcock filmava as cenas de assassinato como se fosse cenas de amor e as cenas de amor como se fossem cenas de assassinato. Nesta cena, Hitchcock mandou fazer uma lente enorme e distorcida e depois fotografou os dois atores refletidos nela num ângulo de 90 graus. Na cena do carrossel, quando ele quebra, o Hitchcock usou uma miniatura, que foi explodida com uma pequena carga de dinamite. Depois, ele projetou a imagem ampliada disto numa tela e colocou pessoas em volta e na frente.

O quase estrangulamento

Eu gosto ainda de duas outras sequências: a da visita do Guy à mansão do Bruno e a da festa, quando Bruno quase estrangula a velha, ao olhar para Barbara, a irmã da noiva do Guy (interpretada por Patricia Hitchcock, filha de Hitchcock), lembrando-se de Miriam. Na visita do Guy à casa do Bruno, o Hitchcock cria primeiro o suspense com o cão ameaçador e depois uma surpresa, como o Bruno parecendo no lugar do pai. Vocês devem ter notado nesta cena a influência da iluminação germânica.

Farley e Walker na luta final no carrossel

Pode-se notar ainda o som usado no parque de diversões, onde os ruídos estão todos reunidos. Nós temos realmente a impressão de ar livre. E também a maneira visual com que o Hitchcock define o caráter dos dois personagens principais, pelos seus sapatos e suas roupas. Por exemplo: os sapatos de duas cores do Bruno e sua gravata espalhafatosa (aliás, foi o próprio Hitchcock que desenhou aquelas garras de lagosta na gravata, que sugerem um estrangulador). Já o Guy é bem esportivo. Outra cena marcante é o clímax no carrossel descontrolado onde Guy e Bruno lutam entre os cavalos de pau montados por crianças apavoradas enquanto o velho empregado se arrasta por debaixo do maquinismo para desligá-lo.

O personagem que domina todo o filme é, sem dúvida, o psicopata, maravilhosamente interpretado por Robert Walker, que foi escolhido para o papel against the type, como se diz na gíria dos estúdios, porque ele sempre foi o modelo do simpático garotão americano. Walker tem um desempenho brilhantes. Ele é um vilão elegante e sedutor. A gente não esquece facilmente a expressão do seu olhar, um olhar de louco. Nós acreditamos na sua loucura. Ele é o alter ego (o outro eu) assustador do Guy. É um dos vilões mais carismáticos e diabólicos da obra do diretor.  O Bruno herdou a loucura da mãe. Há uma cena deliciosa, na qual o Hitchcock aproveita para gozar a arte moderna, quando ela mostra ao filho o quadro cubista horrendo, e diz que é o pai dele. É o humor que Hitchcock sempre insere nos seus filmes.

HOMENAGEM A JACQUES BECKER

Jacques Becker (1906-1960) nasceu em Paris. Em Marlotte, onde sua família passava as férias e frequentava a casa dos Cézanne, o jovem Jacques – tinha então 14 anos de idade – descobriu o cinema na pessoa de Jean Renoir. O filho do grande pintor conhecia os Cézanne e foi assim que Becker entrou em contato com ele. Quando as férias acabaram, o rapaz continuou seus estudos na École Bréguet e depois arrumou alguns empregos, inclusive na Compagnie Générale Transatlantique. Entre Havre e Nova York, Becker conheceu King Vidor, que lhe ofereceu emprego nos EUA como ator e assistente de direção. Becker estava prestes a permanecer na América, porém não conseguiu obter o visto de residência. Foi Jean Renoir que o levou para o cinema, como seu assistente, amigo e discípulo.

Jacques Becker

Em 1935, Becker se aventurou brevemente na produção independente dirigindo dois filmes curtos, Tête de Turc e Le Commissaire est bon enfant, le gendarme sans pitié, neste último dividindo a direção com Pierre Prevert. Em 1939 começou a dirigir L’Or du Cristobal / 1940, mas após três semanas de filmagem, deixou a produção a cargo de Jean Stelli.

Em 1942, após passar um ano em um campo de prisioneiros de guerra alemão, ele voltou para a França e fez seu primeiro longa-metragem, Dernier Atout, filme policial cuja ação se passa num país indeterminado da América do Sul. A partir do ano seguinte, começaram a chegar às telas suas realizações mais importantes.

Apaixonado pelos seres humanos – como seu mestre Jean Renoir -, ele os observava nos ambientes mais diversos e procurava traduzir o seu comportamento e o que eles traziam no fundo de si mesmos, captando sempre a realidade viva. Isso ocorreu nos seus melhores filmes, passados sucessivamente no meio rural (Mãos Vermelhas / Goupi Mains Rouges / 1943; da alta costura (Nas Rendas da Sedução (na TV) / Falbalas / 1945); no ambiente operário (Antonio e Antonieta / Antoine et Antoinette / 1947); da pequena burguesia (Eterna Ilusão / Rendez-vous de Juillet / 1949) e da alta burguesia (Vivamos Hoje! / Édouard et Caroline / 1951); dos apaches da Belle Époque (Amores de Apache / Casque D’or / 1952); dos gângsteres (Grisbi, Ouro Maldito / Touchez pas Au Grisbi / 1954); dos artistas da Montmartre do início do século XX (Os Amantes de Montparnasse / Montparnasse 19 / 1958); da prisão (A Um Passo da Liberdade / Le Trou / 1959). Seus outros trabalhos – Brincando de Ciúmes (na TV) / Rue de L’Estrapade / 1953; Ali Baba e os 40 Ladrões / Ali Baba et les Quarante Voleurs / 1954; As Aventuras de Arsène Lupin / Les Aventures d’ Arsène Lupin / 1957 – foram produtos meramente comerciais, mas, tal como todos os filmes do diretor, impressionaram pela clareza e autenticidade.

No meu livro Uma Tradição de Qualidade O Cinema Clássico Francês (1930-1959) (ed. PUC Rio-Contraponto, 2010) selecionei 150 filmes representativos do cinema clássico francês, entre eles estes oito filmes mais importantes de Jacques Becker, cujas sinopses e comentários reproduzo aqui, mencionando apenas os nomes dos artistas principais.

Robert Le Vigan em Mãos Vwrmelhas

Mãos Vermelhas. Em uma aldeia do Charente, vive a família Goupi: Tisane, Mes Sous, Dicton, La Loi, L´Empereur. Dois Goupi ficam à margem: Tomkin (Robert Le Vigan), um neurótico obcecado com a Indochina e Mains Rouges (Fernand Ledoux), um caçador que mora em uma cabana na floresta. Os outros membros do clã são a jovem Goupi Muguet e Eugène, filho de Mes Sous, chamado de Goupi Monsieur; porque todos pensam que ele tem uma boa situação em Paris. Quando Eugène chega à aldeia, Tisane é encontrada morta e uma valiosa quantia desaparece.

Crônica social impregnada de poesia fantástica, focalizando um clã agrícola que resolve sozinho seus próprios problemas. Becker conseguiu dar vida a quase uma dezena de personagens complexos e todos desempenhando um papel importante na trama. Desde o início, a família Goupi é apresentada de maneira a fazer com que os espectadores compreendam bem as manias, as paixões e a estranha humanidade daqueles camponeses solidamente arraigados às suas tradições, ao gosto pelo dinheiro e pela propriedade. É também um filme de atores cuidadosamente escolhidos, entre os quais avulta Robert Le Vigan, um Tomkin completamente alucinado.

Raymond Rouleau e Micheline Presle em Nas Rendas da Sedução

Nas Rendas da Sedução. Philippe Clarence (Raymond Rouleau), grande costureiro parisiense, apaixona-se por Micheline Lafaurie (Micheline Presle), noiva de Daniel Rousseau, seu amigo e fornecedor de tecidos. Philippe decide fazer o vestido de noiva e seduz Micheline, conquistada ao mesmo tempo pelo homem e pelo criador. Mas rapidamente a jovem se revolta diante de seu egoísmo e frivolidade e se afasta dele. Phillipe não consegue esquecê-la. No dia da apresentação de sua coleção, ele se tranca no escritório e, em um acesso de loucura, se precipita pela janela, abraçado ao manequim com o vestido da noiva.

Drama passado no meio da moda, tendo como personagem central um famoso costureiro que esvoaça de mulher em mulher, para nutrir sua inspiração. Quando uma delas lhe escapa, ele enlouquece abruptamente e acaba se matando de forma inesperada.  Escolha de começar o filme pelo fim, anunciando-nos a morte de Philippe, mostra que Jacques Becker já se interessava mais pelos personagens e pela descrição dos ambientes do que pelos enredos. Neste filme, ele nos apresenta, por meio de um longo retrospecto, a caminhada autodestrutiva de um artista nervoso e retrata, com veracidade, a vida em um ateliê de costura parisiense no tempo da Ocupação. Raymond Rouleau apresenta uma atuação magistral, principalmente quando a loucura toma conta de Philipe e o devasta, destruindo-o.

Claire Maffei e Roger Pigaut em Antonio e Antonieta

Antonio e Antonieta. Antoine Moulin (Roger Pigaut) empregado de uma tipografia, e sua jovem esposa Antoinette (Claire Maffei), vendedora em uma loja de departamentos, se amam. Um dia a sorte lhes sorri. Antoine acha na bolsa da mulher um bilhete premiado. Mas quando ele se apresenta na casa lotérica, não encontra o devido comprovante do prêmio. A felicidade do casal transforma-se em desespero. Todo o bairro compartilha do seu sofrimento, até que chega a boa notícia: a caixa da estação do metrô encontrou o bilhete perdido.

Abordando um assunto simples, extraído da vida cotidiana, Jacques Becker fez um filme encantador. Ele reconstruiu com precisão o pequeno universo banal e simpático onde se desenrola a história, através de uma infinidade de detalhes exatos sobre o lugar onde o casal vive, suas relações com os vizinhos e as pessoas do bairro, o modo como se vestem, a linguagem que usam etc., lembrando o método neorealista. Essa fiel observação da realidade transcorre em um ritmo que, sustentado por uma montagem eficiente, não retarda nem por um instante, e a presença de atores pouco conhecidos dá veracidade às personagens.

Nicole Courcel e Daniel Gélin em Eterna Ilusão

Eterna Ilusão. Lucien Bonnard (Daniel Gélin) se reúne com um grupo de amigos frequentadores das boates de Saint-Germain-des-Prés, decidido a montar uma expedição etnográfica. Ele gosta de Christine Courcel (Nicole Courcel), aluna de um curso de arte dramática que está disposta a tudo para triunfar nos palcos. Um  grande diretor, Guillaume Rousseau, vai montar a peça de seu irmão François. Sua amiga, Thérèse (Brigitte Auber), que também quer ser atriz, ama Roger Moulin (Maurice Ronet), ex-aluno do Idhec, que toca trompeta na orquestra de Claude Luter. Pierre Rabut é outro que sonha em ser ator. Todos se mobilizam em torno do projeto de Lucien.

Testemunho sobre o imediato pós-guerra parisiense, focalizando um grupo de jovens da pequena burguesia, que confrontam suas ilusões, suas ansiedades, suas iniciativas, na busca de um futuro profissional e sentimental. Becker traça o retrato dessa juventude com sede de viver e o desejo de se afirmar, com uma atenção minuciosa para o real. Está tudo ali: a moda existencialista, as ruas do Quartier Latin, as boates animadas pela música de jazz, o jipe dos rapazes, os vestidos leves das moças … No final, Lucien , que surpreendeu Christine no leito de Rousseau, embarca no avião sem um olhar para o passado, que surgiu entretanto no fim da pista de decolagem: logo Christine não será mais que um minúsculo ponto melancólico e desiludido, perdido no aeroporto.é

Daniel Gélin e Anne Vernoé em Vivamos Hoje!

Vivamos Hoje! À tardinha no apartamento de Edouard (Daniel Gélin) e Caroline (Anne Vernon). Eles estão se preparando para ir para a casa do tio de Carolina, um socialaite riquíssimo que convidou muitos amigos para fazê-los conhecer o talento de pianista de Edouard. Ambos estão muito tensos e não demora muito para uma discussão começar. Será uma longa noite de disputas e reconciliações.

Comédia sofisticada com um argumento muito bem escrito por Annette Wademant e interpretada com sutileza, na qual aflora igualmente uma sátira à sociedade, no caso uma casta de aristocratas ridículos e hiperbólicos. Dispondo de poucos recursos, Becker soube compor sua encenação, ela também muito simples (a ação se passa somente em dois lugares e o filme se desenrola quase em tempo real), recriando toda paixão e candura de seus personagens.

Simone Signoret em Amores de Apache

Amores de Apache. Na Paris de 1898, Marie, apelidada de Casque d´Or (Simone Signoret), atrai o olhar de Georges Manda (Serge Reggiani), um marceneiro. Em uma taberna, o par dança uma valsa e um grande amor começa. Mas Marie tem um “protetor”, Roland, que faz parte dobando de Félix Leca (Claude Daupin). Este, que deseja Marie, provoca um duelo entre os dois homens. Roland é morto por G. Manda. Ao saber que seu amigo de infância, Raymond, foi denunciado por Leca pela morte de Roland, G.Manda se entrega à polícia. Depois foge e elimina o miserável Leca. Alguns meses mais tarde, sobe ao cadafalso.

Os dois amantes vivem em um mundo cruel, do qual Becker quis fazer uma descrição sóbria, desprovida da futilidade e do pitoresco dos romances populares. Sua história trágica, contada sem sentimentalismos, se insere uma reconstituição precisa e atraente dos subúrbios de Paris da Belle Époque e propicia uma análise irrepreensível dos tipos que intervêm na intriga. Becker ama seus personagens. Ele observa como eles vivem e sofrem, com respeito, com ternura, e nos faz compartilhar desses sentimentos. Amores de Apache é, antes de tudo, um filme humano, e os intérpretes exprimem muito bem essa humanidade.

À direita Jean Gabin e.René Dary em Grisbi, Ouro Maldito

Grisbi, Ouro Maldito. Max (Jean Gabin) e Ritton (René Dary), dois gângsteres amigos de longa data, roubam cinquenta milhões em barras de ouro. Ritton comete a imprudência de revelar o roubo para sua amante, Josy (Jeanne Moreau), que se apressa em informar Angelo (Lino Ventura), seu mais recente protetor, um traficante de drogas. Angelo rapta Riton.  Max aceita trocar o ouro pelo seu amigo em uma estrada nacional do subúrbio parisiense. Mas Angelo planeja matar Max e seus amigos após a troca.  Um acerto de contas se segue, no qual Riton fica gravemente ferido e Max é obrigado a abandonar o ouro no carro de Angelo em chamas.

Como acontece em todos os filmes de Jacques Becker, os personagens lhe interessam mais do que a intriga. Aqui temos dois gângsteres unidos pela amizade do “ofício”, dos riscos que correram juntos no passado. Essa amizade, para Max, vale mais do que o dinheiro.  Ela vale o que ele nunca pôde encontrar antes: o repouso. Este é o tema oculto do filme: mais do que um drama da amizade, é um drama da lassitude. O cansaço de um quinquagenário, que já realizou tudo o que queria e agora só quer tranquilidade, o isolamento consigo mesmo. Mas, para salvar o amigo, ele volta a se engajar em “histórias sujas”. Este tema se soma ao tema da amizade e eles dão à obra uma ressonância profundamente amarga, desesperada.

Anouk Aimé e Gérard Philipe em Os Amantes de Montparnassse

Os Amantes de Montparnasse. Amedeo Modigliani (Gérard Philipe) tem um relacionamento coma escritora inglesa Beatrice Hastings (Lili Palmer) e depois conhece Jeanne Hebuterne (Anouk Aimée), uma estudante que abandona sua família burguesa para ir morar com ele. Léopold Sborowsky, amigo de Modi, tenta em vão vender os quadros do pintor. Após um período de felicidade ao lado de Jeanne, Modi, alcoólatra, tuberculoso e miserável, morre em um hospital. O mercador de quadros Morel (Lino Ventura) procura Jeanne imediatamente e compra todas as telas do pintor.

A cinebiografia de Modigliani ia ser filmada por Max Ophuls, porém a morte de Ophuls pôs fim ao projeto. Escolhido para substituí-lo, Jacques Becker não poderia trabalhar com um roteiro que não era dele, pois seu estilo cinematográfico não tinha nenhuma afinidade com o de Ophuls. Becker despojou sua encenação ao extremo, preocupando-se mais com o ângulo humano e suprimindo todo o pitoresco tradicional do gênero – o cineasta recusou-se inclusive a usar a cor, o que parece a priori um contrassenso em um filme sobre pintura, o que levou André Bazin a dizer que esse é o filme mais bressoniano do diretor.

Cena de A Um Passo da Liberdade

A Um Passo da Liberdade.

Claude Gaspard (Marc Michel) é encarcerado na prisão de la Santé por causa de um falso testemunho de sua mulher. Ele é colocado em uma cela já ocupada por quatro detentos – Jo (Michel Constantin), Roland (Jean Kéraudy), Manu (Philippe Leroy) e Monseigneur (Raymond Meunier) -, que preparam uma fuga.  Os quatro a princípio não vêem com bons olhos a chegada de um novo companheiro, mas as circunstâncias os obrigam a fazer de Claude um cúmplice. Com uma energia incrível, eles cavam um túnel, que deverá conduzí-los à liberdade. Na véspera do dia escolhido para pôr o projeto em execução, Claude trai seus amigos e revela o plano de evasão.

O filme mostra etapa por por etapa os preparativos minuciosos da fuga. Becker nos comunica seu amor pelo trabalho e pela engenhosidade humana: nas mãos de Roland um pedaço de ferro torna-se uma chave, duas pequenas garrafas tornam-se uma ampulheta. Essa espécie de detalhe solicita mais sua atenção do que a intriga. O diretor reproduz com justeza a atmosfera do universo carcerário, faz-nos compreender nuanças do relacionamento entre os detentos, faz-nos viver literalmente as suas inquietudes e as suas esperanças. A câmera gruda nos fatos, nos gestos e nas personagens, recriando a vida com naturalidade. Os atores não interpretam; eles são eles mesmos.

 

O FILME DE GÂNGSTER NA SUA ÉPOCA ÁUREA

O filme de gângster é, tal como o filme de prisão e o filme noir, um subgênero do drama criminal, ambientado no meio das gangues e do crime organizado.  Existem muitos antecedentes do filme de gângster nos primeiros dramas criminais do cinema tais como A Daring Daylight Burglary / 1903, filme de Frank Mottershaw, produzido pela Sheffield Photo Company, do Reino Unido); The Moonshiners / 1904, filme de Wallace McCucheon, produzido pela American Mutoscope & Biograph, EUA; e Desperate Encounter Between Burglars And Police / 1905, filme de Edwin S. Porter produzido pela Edison Manufacturing Company, EUA).

The Musketeers of Pig Alley / 1912 de David Wark Griffit e Regeneração / The Regeneration / 1915 de Raoul Walsh, estão entre os filmes de gângster primitivos mais conhecidos da década de dez. Nos anos vinte, houve um ciclo de filmes de gângster que incluiu Paixão e Sangue / Underworld / 1927 de Josef von Sternberg; A Lei dos Fortes / The Racket / 1928 de Lewis Milestone ; Os Predestinados / The Way of the Strong / 1928 de Frank Capra;  Amar para Morrer / Dressed to Kill / 1928 de Irving Cummings;  O Peso da Lei / Alibi / 1929 de Roland West; Regeneração / Weary River / 1929 de Frank Lloyd; O Gângster / The Racketeeer / 1929 de Howard Higgin.

George Bancroft em Paixão e Sangue

Thomas Meighan  em A Lei dos Fortes

Paixão e Sangue  proporcionou ao ex-reporter Ben Hetch o Oscar de melhor História Original e anunciou a chegada de um ciclo de filmes de gângster produzidos por Hollywood entre1930 e 1932, do qual fizeram parte Alma no Lodo / Little Caesar / 1930 de Mervyn LeRoy, Inimigo Público / The Public Enemy / 1931 de William Welman e Scarface, A Vergonha de uma Nação / Scarface / 1932 de Howard Hawks, Estes filmes eram populares entre o público e rapidamente estabeleceram uma iconografia distintiva da paisagem urbana (Chicago, Nova York), ruas escuras, pensões sombrias, apartamentos de cobertura, mansões, bares, clubes, delegacias, automóveis rápidos, a garota glamorosa (namorada do gângster), e metralhadoras. Nos anos 30, a Depressão e a contínua expansão do gangsterismo, aliados ao advento do som, deram um novo impulso ao subgênero. A introdução do som sincronizado garantiu que a violência explosiva, simbolizada pelo ritmo staccato das metralhadoras ou o estrondo das bombas espatifando as vitrines das lojas se tornassem suas características centrais.

Alma no Lodo com Edward G. Robinson

Inimigo Público com James Cagney

Scarface com Paul Muni

O comportamento físico, robusto, masculinizado do gângster foi marcado pelos estilos de interpretação de astros como Edward G. Robinson, James Cagney e Paul Muni. Os protagonistas dos filmes do ciclo clássico como Alma no Lodo, Inimigo Público e Scarface – Cesare “Rico” Bandello (Edward G. Robinson em Alma no Lodo), Tom Powers (James Cagney em Inimigo Público) e Tony Camonte (Paul Muni em Scarface) – foram inspirados em homens notórios da época, Rico e Tony por Al Capone e Tom Powers por Earl “Hymie” Weiss, rival de Capone.

James Cagney em Contra o Império do Crime

James Cagney e Pat O´Brien em Anjos de Cara Suja

O ciclo clássico de gângster floresceu por pouco tempo. Com a implementação do Código de Produção (conjunto de diretrizes estipulando o que era permissível no campo da representação da Hollywood clássica, particularmente no que se referia a assuntos sexuais e criminais), a violência dos filmes de gângster foi substancialmente reduzida após1934, v.g.  a transformação do herói gângster no G-Man ou promotor público, pondo toda a energia e dinamismo dos gângsteres do lado da lei. Os estúdios transformaram o gângster em um agente federal, por exemplo colocando James Cagney do lado da lei em Contra o Império do Crime / G-Men / 1935 (Dir: William Keighley) e Edward G. Robinson como um detetive da polícia infiltrado num bando em Balas e Votos / Bullets or Ballots / 1936. A Warner Bros. continuou com o ciclo até o final da década, mas outras majors diminuíram a produção de filmes criminais para um ou dois no máximo por ano. Surgiram assim, até o final do decênio, Beco Sem Saída / Dead End / 1937 (Dir: William Wyler); Anjos de Suja / Angels with Dirty Faces / 1938 (Dir: Michael Curtiz); Heróis Esquecidos / Roaring Twenties / 1939 (Dir: Raoul Walsh); Homens Marcados / Invisible Stripes / 1939 (Dir: Lloyd Bacon); Contra A Lei / King of the Underworld / 1939 (Dir: Lewis Seiler) / 1939, nos quais estava – em papéis secundários – um outro ator relacionado com o filme de gangster: Humphrey Bogart.

 

O ataque de loucura no refeitório da prisão

O final apocalíptico de Fúria Sanguinária

Nos anos quarenta surgiram alguns filmes de gângster produzidos por companhias menores (v. g. Dillinger / Dillinger / 1945 ((Dir: Max Nossek) / King Brothers Production; Bandidos do Cais / Gangs of the Waterfront / 1945 (Dir: George Blair) / Republic; Crime S/A / Crime Inc. / 1945 (Dir: Lew Landers) / PRC ou pela unidade B de uma grande companhia (v. g. O Último Gangster / Roger Touhy, Gangster / 1944 (dir: Robert Florey) / Twentieth Century Fox e uma obra-prima produzida pela Warner Bros. e dirigida por Raoul Walsh: Fúria Sanguinária / White Heat / 1949, no qual James Cagney voltou a ser gângster, enérgico como sempre, mas desta vez como um psicopata perverso com uma adoração patológica pela mãe. Sua atuação como Cody Jarret é eletrizante, principalmente na cena do ataque de loucura de Jarret quando fica sabendo no refeitório da prisão que sua mãe foi morta e o final apocalíptico, quando ele atira num tanque cheio de gás explosivo e, enquanto ele explode em chamas, grita para sua mãe morta: “Look Ma, top of the world!”. São momentos cinematográficos inesquecíveis.

A partir dos anos quarenta, ocorreu uma intromissão noir no filme de gangster como, por exemplo, em Último Refúgio / High Sierra / 1941, também dirigido por Raoul Walsh, que proporcionou a Humphrey Bogart um papel de primeiro plano. Seu personagem, Roy Earle, não é um criminoso autoconfiante e impetuoso como aqueles gângsteres dos anos 30. Parece mais um herói noir, alienado e solitário, consumido pelo seu drama emocional. Em vez de um assassino frio, temos um homem de bons sentimentos, cuja esperança de felicidade foi cortada pelo destino. Walsh cria um clima quase insuportável de desilusão e inevitabilidade e Bogart transmite toda a amargura do seu personagem. Nos anos cinquenta, temos os exemplos desta intromissão, por exemplo, em O Segredo das Jóias / The Asphalt Jungle / 1950 (Dir: John Huston); Sindicato do Crime / 711 / Ocean Drive / 1950 (Dir: Joseph N. Newman); O Amanhã Que Não Virá / Kiss Tomorrow Goodbye / 1950 (Dir: Gordon Douglas); O Império do Crime / The Big Combo / 1955 (Dir: Joseph H. Lewis).

 

COELHO PERNALONGA E O HOMEM DAS MIL VOZES

No decorrer das décadas de 30, 40 e 50, a Warner Bros. organizou uma equipe de talentosos artistas, que produziram centenas de excelentes “cartoons”, divididos em dois grupos: os “Looney Tunes” e os “Merry Melodies”, dando-lhes uma feição diferente da que faziam suas concorrentes. Estas duas séries de desenhos animados foram iniciadas por Hugh Harman e Rudolf Ising, sob a supervisão do produtor Leon Schlesinger, aproveitando as fórmulas usuais de Walt Disney com quem havia trabalhado.

Quando saíram da Warner, a maioria dos “Merry Melodies” passou a ser dirigida por Fritz Freleng, que, no entanto, não lhes deu maior expressão do que os antecessores, seguindo a mesma linha artística. Porém os novos principais diretores das “Looney Tunes”, Tex Avery e, depois, Robert Clampett, foram inventivos e não se deixaram influenciar pelo pai do Mickey Mouse. Assim, criaram “gags” mais surrealistas, deram um ritmo rapidíssimo à movimentação dos personagens e usaram de modo sofisticado as distorções, para acentuar o estado de espírito deles, conferindo-lhes uma vivacidade incomum e ampliando os horizontes emocionais da animação cinematogrática.

O coelho Pernalonga (Bugs Bunny) apareceu a partir de 1938 em alguns desenhos realizados por vários diretores, com um aspecto diferente daquele que tomou depois: era um animalzinho meio felpudo, com olhos rasgados e o rabo em forma de floco de algodão. Ele surgiu primeiro com esta forma em três desenhos: Porky´s Hare Hunt / 1938, Presto-O Change-O / 1939 e Hare-Um Scare Um / 1939.

O Pernalonga de McKimson

Foi Robert McKimson, um dos colaboradores de Clampett, quem lhe deu os traços pelos quais o conhecemos hoje: esguio sorridente, sempre petulante de cenoura em punho a atormentar o pobre do Hortelino Trocaletra (Elmer Fudd), seu enfezado vizinho, que costuma ameaçá-lo com uma espingarda de dois canos quando o surpreende no quintal roubando o alimento predileto. Bugs, indiscutivelmente, um tremendo gozador, com aquela voz inconfundível que lhe emprestava o animador Mel Blanc, arrebatou o Oscar de 1958 com o desenho Knighty Knight Bugs, no qual comparece seu outro arqui-inimigo, o bigodudo Yosemite Sam.

Mel Blanc e Robert McKimson

Clampett contou que se inspirara no modo de falar do ator Humphrey Bogart para criar a voz do coelho Pernalonga e que a conhecida frase do Bugs, “What´s up, doc?” é a variação de outra, “What´s up, duke?” com a qual Carole Lombard interpelava William Powell no filme Irene, a Teimosa / My Man Gidfrey / 1936, um dos êxitos de Gregory LaCava. Revelou também que os traços do Piu -Piu (Tweety Bird), aquele passarinho sempre perseguido pelo gato Frajola (Sylvester) em outro desenho animado da Warner, foram tirados de uma foto dele, Clumpett, quando era apenas um bebê e que, a princípio, existiam dois gatos Frajolas, cujas atitudes lembravam muito as da dupla de comediantes Bud Abbott e Lou Costello

Mel Blanc e suas vozes

Val a pena dizer algumas palavras sobre Mel Blanc. Em Hollywood eles o chamavam de The Man of a Thousand Voices (O Homem das Mil Vozes). Nasceu na Califórnia e seu verdadeiro nome é Melvin Jerome Blanc. Iniciou-se na vida artística como músico e maestro: somente a partir de 1937 entrou para a Warner e se dedicou a imitar as vozes das figuras dos cartoons.  Entre suas criações se destacaram, entre outras, a voz do coelho Pernalonga, Gaguinho (Porky Pig), Hortelino Trocaletra (Elmer Fudd), o gato Frajola (Sylvester), Ligeirinho (Speedy González), Patolino (Daffy Duck), Papa-Léguas (Road Runner), Coiote (Wile E. Coyote), Piu Piu (Tweety Bird), o galo antropomórfico Frangolino (Foglorn Leghorn), e do robozinho Twiki na versão original da série de TV Buck Rogers no Século 25 / Buck Rogers in the 25th Century / 1979. Mel chegou a fazer (sem ser creditado) as vozes de Hitler e Stalin no short de animação colorido Historical Reel: Broken Treaties / 1941 da série da Columbia This Changing World, apresentado pelo comentarista do rádio Raymond Gram Swing.

Mel Blanc e Jack Benny

Na televisão, participou como ator coadjuvante em alguns programas como o de Jack Benny, no qual fazia o professor de violino de Jack, emprestou sua voz para o Barney de Os Flintstones e para outras séries televisivas de animação como Os Jetsons, Speed Buggy e Os Monstros (era o Corvo, sem ser creditado). Apareceu ainda como ator de apoio em A Filha de Netuno / Neptune´s Daughter / 1949 (como Pancho) e Beija-me Idiota / Kiss me Stupid / 1964 (como Dr. Sheldrake), mas seu grande talento estava mesmo na laringe.   Uma laringe legendária.

 

FAY WRAY

Ela ficou famosa contracenando com um macaco apaixonado em King Kong / King Kong / 1933. Graças a este papel, assegurou um lugar permanente na História do Cinema., tendo ficado famoso o seu grito de horror nas mãos do tremendo gorila.

Fay Wray

Vina Fay Wray (1907-2004) nasceu na cidade de Cardston em Alberta no Canadá e se mudou com os pais e cinco irmãos para os Estados Unidos quando tinha três anos de idade. Criada em Los Angeles, ainda na adolescência começou a frequentar casting offices (agências de elenco) e, a partir de 1919, começou a participar ocasionalmente como figurante em vários filmes curtos. Depois, foi a protagonista de alguns westerns na Universal com caubóis como Hoot Gibson, Jack Hoxie, Art Accord, Fred Humes. Em 1926, a Western Association of Motion Picture Advertisers selecionou treze jovens estrelinhas consideradas mais prováveis de terem sucesso nas telas. Fay era uma delas juntamente com Janet Gaynor e Mary Astor. As escolhidas eram conhecidas como Wampas Baby Stars.

Fay Wray e Erich von. Stoheim em A Marcha Nupcial

Fay alcançou um estrelato prematuro em 1928, quando foi escolhida como a principal atriz feminina no papel de Mitzi em Marcha Nupcial / The Wedding March / 1928 de Erich von Stroheim. Em seguida, trabalhou ao lado de atores como Gary Cooper em A Legião dos Condenados /  Legion of the Condemned / 1928; Emil Jannings em Rua do Pecado / Street of Sin/ 1928; Jardim do Pecado / The Unholy Garden / 1931 com Ronald Colman e em produções de destaque como As Quatro Penas / Four Feathers / 1929 de Merian C. Cooper e Ernest B. Schoedsack (os diretores de King Kong); O Homem de Mármore / Thunderbolt de Joseph von Sternberg); Dirigível / Dirigible /1931 de Frank Capra; O Bamba da Zona / The Bowery / 1933 de Raoul Walsh; Os Crimes do Museu / The Mystery of the Wax Museum / 1933 de Michael Curtiz … no qual ela gritou tão bem quanto em King Kong. No começo da década de trinta esteve à frente no elenco de filmes de horror como Doutor X / Doctor X, O Vampiro / The Vampire Bat e Zaroff, o Caçador de Vidas / The Most Dangerous Game e, em 1934, em Viva Villa! / Viva Villa como a linda Teresa, que o célebre revolucionário mexicano tenta conquistar. Em 1935, Fay fez quatro filmes na Inglaterra, Come Out of the Pantry com Jack Buchanan, Bulldog Jack com Jack Hulbert, When Knights Were Bold novamente com Buchanan e O Clarividente / The Clairvoyant com Claude Rains. Depois disso, seus filmes em Hollywood foram menos significativos.

Fay Wray e Gary Cooper em A Legião dos Condenados

George Raft e Fay Wray em O Bamba da Zona

Fay Wray e Joel McCrea em Zaroff, o a de Vidas

Wallace Beery e Fay Wray em Viva Vila!

Fay foi casada como dois roteiristas proeminentes, John Monk Saunders e Robert Riskin. Seu casamento de 1928 com Monk Saunders acabou em 1939, e ele cometeu suicídio no ano seguinte. Com seu casamento com Riskin em 1942, ela se retirou da tela. Entretanto, quando Riskin ficou seriamente doente e impedido de trabalhar em 1950, Fay foi obrigada a retomar sua carreira, o que ocorreu em1953 em O Tesouro do Condor de Ouro / The Treasure of the Golden Condor…. porém sempre em segundo plano. Após participar de várias séries de TV, ela se aposentou definitivamente em 1980, atuando ao lado de Henry Fonda, José Ferrer e John Houseman no telefilme As Trombetas de Gedeão / Gideon’s Trumpet.

Fay Way em King Kong

Em 10 de agosto de 2004, dois dias após sua morte, as luzes do Empire State Building em Nova York (cena do clímax do seu filme mais popular, King Kong)  foram apagadas durante 15 minutos em sua memória.

O INSPETOR MAIGRET NO CINEMA E NA TV

Jules Maigret é o comissário de polícia criado por Georges Simenon, escritor prolífico, apelidado de “O Balzac do Romance Policial”.  Ao contrário de Hercule Poirot ou Sherlock Holmes, é um funcionário sério e disciplinado, que leva uma vida burguesa em um apartamento modesto da avenida Richard-Lenoir em Paris. Sua esposa lhe prepara pequenas refeições, cujas receitas o crítico gastronômico Robert Courtine transcreveu em um livro, Le Cahiers des Recettes de Madame Maigret publicado em 1974. Porém o comissário gosta também da cozinha das brasseries e sabe se satisfazer com uma cerveja e um sanduiche. É de origem modesta e sua infância nos é revelada em L´Affaire Saint-Fiacre. Desejava ser médico. No Quai des Orfèvres n° 36, ele tem sua equipe, os inspetores Lucas, Janvier, Torrence …  e consulta o Dr. Paul para os problemas que necessitam da polícia científica. Seu método não se baseia nem na dedução nem na violência. Ele gosta de absorver uma atmosfera e penetrar nos segredos das almas – gosta de encontrar o “homem nu” segundo a fórmula de Simenon. Não tem pressa, passeia, aspira o ar, acumula informações; depois, apanhando o culpado num erro, o faz confessar. Fisicamente, é corpulento, imponente, mas em última análise gentil.  Frequentemente fuma um cachimbo de tabaco.

GEORGES SIMENON (1903-1989)

Georges Simenon

Nasceu em Liège, Bélgica num meio pequeno burguês. Quando tinha 15 anos de idade, teve que deixar a escola e procurar trabalho, porque seu pai cai doente. Começou a trabalhar na Gazette de LIège e a frequentar um grupo de jovens artistas e intelectuais anarquistas   ao qual pertencia a pintora Régine Ronchon, com a qual se casou. Em 1920 publicou seu primeiro romance: Au pont des Arches. Em 1922 mudou-se para Paris. Foi então que escreveu centenas de contos e romances sentimentais ou de aventura sob os pseudônimos de Georges Sim e Christian Brulls. Ele criou Maigret (ainda não é bem Maigret) em Train de nuit em 1929. Por ocasião de uma passeio de barco, foi no porto holandês de Delfzijl, e setembro de 1929, que ele escreveu a primeira investigação de Maigret: Pietr le Letton.

Entre 1931 e 1934, ele é o autor de destaque da Fayard. Os melhores Maigret aparecem então. Simenon viaja muito como repórter (África, América). Como escritor, ele vai depois de 1934 para a Gallimard. Denunciado durante a Ocupação por supostas origens judaicas, torna-se novamente após a Libertação como suspeito de simpatias vichysistas. Simenon decide emigar para os Estados Unidos. Sua fecundidade não sofre. Agora é publicado pela Presses de la Cité. É na América que ele se casa com Denyse Ouimet e é com ela que se instala na Suiça em 1955, na região de Lausannne. Sua produção se reduz em 1966 e para em 1972 após Maigret et Monsieur Charles.

ATORES QUE PERSONIFICARAM MAIGRET NO CINEMA. 

Pierre Renoir em A Noite da Encruzilhada / La Nuit du Carrefour / 1932 (Dir: Jean Renoir).

Pierre Renoir

Abel Tarride em Le Chien Jaune / 1932 (Dir: Jean Tarride).

Harry Baur em A Cabeça de um Homem / La Tête d’ um Homme / 1932 (Dir: Julien Duvivier).

Albert Préjean

Albert Préjean em Picpus / 1934 (Dir: Richard Pottier), Cécile est Morte / 1944 (Dir: Maurice Tourneur) e Les Caves du Majestic / 1945 (Dir: Richard Pottier).

Charles Laughton

Charles Laughton em Fugitivo da Guilhotina / The Man on the Eiffel Tower / 1949 (Dir: Burgess Meredith; Charles Laughton dirigiu as cenas em que Meredith aparece como ator.

Michel Simon em um dos episódios de Brelan d’as / 1952 (Dir: Henri Verneuil).

Maurice Manson em Maigret dirige l’ênquête / 1956 (Dir: Stany Cordier).

Jean Gabin

Jean Gabin em Assassino de Mulheres / Maigret Tend um Piège (Dir: Jean Delannoy), O Castelo do Medo / Maigret et l’ Affaire Saint-Fiacre / 1959 (Dir: Jean Delannoy) e Inspetor Maigret Acerta / Maigret Voit Rouge / 1963 (Dir: Gilles Grangier).

Gino Cervi

Gino Cervi em Maigret em Pigalle / Maigret a Pigalle / 1966 (Dir: Mario Ladi).

Gérard Depardieu em Maigret e a Jovem Morta / Maigret / 2022 (Dir: Patrice Leoconte).

ATORES QUE PERSONIFICARAM MAIGRET NA TELEVISÃO. 

 Basil Sidney na série britânica BBC Sunday-Night Theatre / 1951-1959.

Rupert Davies na série Maigret / 1960-1963 e como anfitrião da série Detective / 1964-1969, ambas da TV britânica.

 Henri Norbert no telefilme Maigret et la grande perche / 1964 da TV canadense.

 Jan Teulings na série de TV belgo-holandesa Maigret / 1964-1968.

 Kees Brusse na série de TV holandesa Maigret / 1964-1965 e no telefilme Maigret – De Kruideniers / 1964.

Jean Richard

Jean Richard na série de TV francesa Les Enquêtes du Comissaire Maigret / 1967- 1990 e uma aparição como Maigret no filme Signé Furax / 1981.

Richard Harris no telefilme britânico Maigret /1988.

Bruno Cremer

Bruno Cremer na série de TV franco-belga-suiça- checoslovaca Maigret / 1991-2005.

Michael Gambon

Michael Gambon na série de TV britânica Maigret / 1992-1993.

Sergio Castellitto na minissérie ítalo-espanhola Maigret / 2004.

Rowan Atkinson

Rowan Atkinson na série de Tv britânica Maigret / 2016-2017.

OS TRIOS DO WESTERN B

Durante os anos 30 e 40, houve um aumento espantoso de westerns B. Estes eram produzidos em grupos de seis ou mais filmes e comercializados de acordo com o aluguel por pacote. Isto é, os exibidores alugavam não somente um filme de Ken Maynard ou Hoot Gibson, mas todos os seus filmes produzidos em uma temporada.

A partir de 1930, tornou-se uma prática comum identificar um ator como um personagem e construir uma série em torno dele. Assim William Boyd começou aparecendo como Hopalong Cassidy em 1935 e nunca mais interpretou outro papel. Semelhantemente a série de Charles Starrett como Durango Kid, iniciada em 1945, continuou com seis ou mais filmes por ano até 1952. Outros atores identificados com seus personagens: Buster Crabbe / Billy Carson; Eddie Dew e depois Robert Livingston / John Paul Revere; Buster Crabbe e depois Bob Steele / Billy the Kid; George Houston e depois Robert Livingston / The Lone Rider; James Newill / Renfrew of the Mounted; Bill Elliott e depois Allan Lane e Jim Bannon / Red Ryder etc.

Três sobre a Pista

Em 1935, o primeiro trio de cowboys, constituído por William Boyd, Jimmy Ellison e George Hayes, cavalgou na tela no filme Vida e Aventura / Hop-a-Long Cassidy. O quinto filme da série, Três sobre a Pista / Three on a Trail / 1936, foi o primeiro a estabelecê-los com um trio: William Boyd como Hopalong Cassidy, George Hayes como Windy Haliday e James Ellison como Johnny Nelson. James Ellison ficou na série até 1936 e, em 1937, Russell Hayden ocupou seu lugar assumindo o papel de Lucky Jenkins em A Sombra da Lei / Hills of Old Wyoming. Este trio ficaria junto até 1940 quando, em The Man from Texas, no lugar de Lucky Jenkins apareceu um novo personagem, California Carlson, interpretado por Andy Clide. Em 1948, o trio chegaria ao fim em Galope Selvagem / Strange Gamble, o último dos 66 filmes da série, lembrando que outros atores (Brad King, Jay Kirby, Jimmy Rogers, Britt Woods e Rand Brooks) também assumiram papéis no trio. Os filmes da série foram distribuídos pela Paramount Pictures e depois pela United Artists.

Outro grande trio foi The Texas Rangers, estrelado por quatro cowboys diferentes em momentos diversos. A série começou com Dave O´Brien, James Newill e Guy Wilkerson. Mais tarde, Tex Ritter substituiu James Newill e os outros dois permaneceram. Dave interpretou o papel de Dave Wyatt e Wilkerson atuou como Panhandle Perkins. Newill assumiu os traços de Jim Steele e Ritter o de Tex Haines. De 1943 a 1945 foram 22 filmes nesta série da PRC Pictures.

Os Três Mosqueteiros

Os 53 westerns da série Os Três Mosqueteiros ou Os Três Sertanejos / The Three Mesquiteers produzida pela Republic, exibidos entre 1936 e 1943, tinha como personagens principais, Stony Broke, Tucson Smith e Lullaby Joslin, que foram interpretados por vários atores: Stony Broke (Bob Livingston em 29 filmes, John Wayne em 8 filmes e Tom Tyler em 13 filmes); Tucson Smith (Ray Corrigan em 24 filmes e Bob Steele em 20 filmes); Lullaby Joslin (Syd Saylor em 1 filme, Max Tehrune em 21 filmes, Rufe Daves em 14 filmes e Jimmie Dodd em 6 filmes). Em alguns filmes da série, Raymond Hatton interpretou o personagem Rusty Joslin e Duncan Renaldo o de Rico. Antes da série houve um filme da RKO, Duelo de Valentes / Powdersmoke Range / 1935 com Harry Carey como Tucson Smith, Hoot Gibson como Stony Broke e Guinn “Big Boy” Williams como Lullaby Joslin.

Os Três Valentes ou Três Destemidos

Nos 24 filmes da série Os Três Valentes ou Os Três Destemidos / The Range Busters, produzida entre 1940-1943 e distribuída pela Monogram, trabalharam Ray Corrigan e Max Terhune, que haviam interpretado personagens da série Os Três Mosqueteiros. Desta vez eles eram Crash e Alibi, compondo o trio com Dusty, vivido por John King. Corrigan deixou temporariamente a série e foi substituído pelo excelente stuntman David Sharpe. Depois, Sharpe e King alistaram-se no exército, Corrigan voltou, e entrou Rex Lease, que depois cedeu lugar para Dennis Moore.

The Frontier Marshals

Em 1941-1942, a PRC reuniu Lee Powell com os cantores Bill “Cowboy” Rambler Boyd e Art Davis, para formar a série The Frontier Marshals composta por seis filmes Powell havia sido o primeiro Lone Ranger no seriado O Guarda Vingador / 1938 da Republic. Durante a Segunda Guerra Mundial, alistou-se Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA e morreu em combate no Pacífico.

A série The Trail Blazers da Monogram, formada por 8 filmes, tinha como astros três grandes cowboys: Hoot Gibson, Ken Maynard e Bob Steele. No início dos filmes os três vinham andando pela trilha a galope. Ken Maynard montado no seu cavalo Tarzan, Hoot Gibson no seu Midnight, e Bob Steele no seu Zane. Posteriormente, Ken Maynard foi substituído por Chief Thundercloud.

Uma série da Universal reuniu Johnny Mack Brown, Tex Ritter e Fuzzy Knight em 7 filmes: Homens Heróicos / Deep in the Heart of Texas, Corações Palpitantes / Little Joe the Wrangel, Vingança Sangrenta / The Old Chisholm Trail, A Senda da Morte / Tenting Tonight The Old Camp Ground, O Preço da Perfídia / Cheyenne Round Up, Cavaleiros Foragidos / Raiders of San Joaquin, Trilha Solitária / The Lone Star Trail.

Buck Jones, Tim McCoy e Raymond Hatton

A série The Rough Riders da Monogram era composta por 8 filmes estrelados por um trio de astros famosos do western B: Buck Jones, Tim McCoy e Raymond Hatton. Buck Jones era Buck Roberts, Tim Mc Coy interpretava Tim McCall e o personagem de Hatton chamava-se Sandy Hopkins. A série terminou em À Margem da Lei / West of the Law / 1942, quando Tim McCoy se alistou nas forças armadas. Buck Jones continuou com Raymond Hatton em Amanhecer na Fronteira / Dawn on the Great Divide / 1942, no qual entrou o personagem Jack Carson interpretado por Rex Bell.

Antes do filme estrear, Buck morreu tragicamente no incêndio da boate Cocoanut Grove em Boston.

 

PRIMEIRAS MULHERES CINEASTAS NO CINEMA AMERICANO

Não havia nada de incomum na existência de diretoras na indústria de cinema americana desde os seus primórdios.  A primeira mulher diretora do mundo foi Alice Guy. Ela fez seu primeiro filme para a Gaumont nos anos 1890 e, com seu marido Herbert Blaché, foi para os Estados Unidos em 1907, fundando juntamente com George A. Magie, a Solax Company em 7 de setembro de 1910. Trabalhou como diretora até 1920. Seu primeiro filme, lançado em outubro de 1910, intitulava-se A Child’s Sacrifice, a história de uma menina de oito anos filha de um operário que está de greve. Os primeiros estúdios Solax estavam localizados em Flushing, Nova York, mas, em 1912, a companhia construiu um novo complexo de estúdios em Fort Lee, New Jersey. Alice Guy Blaché dirigiu as produções mais importantes da companhia, inclusive o seu primeiro filme de 3 rolos, Fra Diavolo / 1912, sobre o chefe de bando que resistiu à ocupação francesa de Nápoles. Antes ela dirigiu também The Pit and the Pendulum / 1911, baseada na obra de Edgar Alan Poe, muito elogiada pelos comentaristas da época, apesar de certas liberdades tomadas na adaptação do conto de horror imaginado pelo autor.

Alice Guy

Roteiristas como Frances Marion, Anita Loos, June Mathis, Beulah Marie Dix, Bess Meredith and Lenore Coffee dominaram a indústria do filme silencioso. Frances Marion dirigiu três filmes – The Love Light (com Mary Pickford), Just Around the Corner (com Margaret Seddon), The Song of Love (com Norma Talmadge) – entre 1921 e 1923, e outras roteiristas como Marguerite Bertsch, Mrs. George Randolph Chester, Julia Crawford Ivers, Marion Fairfax, Jane Murfin, e Elizabeth Pickett também tentaram a sorte na direção.

Lois Weber

A mulher diretora de cinema mais importante na América foi Lois Weber, ex-evangelista de rua cuja carreira se estendeu dos anos dez até o início dos anos trinta. Realizadora intransigente, suas produções lidavam com problemas sociais, tais como aborto, alcoolismo, controle de natalidade, pena de morte, prostituição e antissemitismo. Ela estreou atrás das câmeras em Heroine of ’76 / 1911, que codirigiu com o ator Phillips Smalley, seu marido na época, e o diretor pioneiro Edwin S. Porter. Em 1914, ano em que fez 27 filmes, Weber codirigiu com Smalley, The Merchant of Venice, baseado na peça de William Shakespeare, tornando-se a primeira mulher diretora a realizar um filme de longa-metragem nos EUA. Ela e Smalley atuaram também como intérpretes, ele no papel de Shylock e ela no papel de Portia.

Mabel Normand

Margery Wilson, uma das protagonistas de D. W. Griffith em Intolerância / Intolerance / 1916 (ela fazia o papel de Brown Eyes) esteve em atividade como diretora (além de atriz) no início dos anos vinte em That Something / 1920, Insinuation / 1922, The Offenders /1924. Também estrela de Griffith, Lillian Gish, dirigiu um filme, Remodeling Her Husband / 1920. Outras atrizes que tentaram a direção foram Gene Gauntier, Kathlyn Wiliams e Mabel Normand. Mabel dirigiu dez filmes, entre eles Caught in a Cabaret / 1914, atuando também como atriz ao lado de Charles Chaplin. Em um momento ou outro, nove mulheres diretoras estavam em atividade na Universal, entre elas, Ida May Park, Ruth Annn Baldwyn, Grace Cunard, Cleo Madison, e Ruth Stonehouse. Com a morte de seu marido Wallace Reid em 1923, Dorothy Davenport (mais conhecida como Mrs. Wallace Reid) tornou-se produtora e diretora e se manteve em atividade até os anos cinquenta.

Dorothy Azner

A única mulher diretora americana que fez uma transição bem-sucedida dos filmes mudos para os falados foi Dorothy Arzner, que começou sua carreira diretorial em 1927 com A Mulher e a Moda / Fashions for Women e realizou seu último filme, Crepúsculo Sangrento / First Comes Courage em 1943. Em 1919, Arzner foi contratada por William DeMille como estenógrafa no departamento de roteiros da Famous Players e depois promovida a montadora. Sua montagem das cenas de tourada em Sangue e Areia / Blood and Sand / 1922, estrelado por Rudolf Valentino, foi tão imaginativa que o diretor James Cruze a encarregou de montar seu famoso Os Bandeirantes / The Covered Wagon / 1923.  Além de Arzner, apenas uma outra mulher dirigiu um filme americano nos anos trinta, e ela foi Wanda Tuchock, que codirigiu (com George Nicholls Jr.) Escola de Elegância / Finishing School em 1934.

Ida Lupino

As mulheres não se destacaram como diretoras novamente até Ida Lupino codirigir (com Elmer Clifton) Mãe Solteira / Not Wanted / 1949.  Nascida em Londres, descendente de uma família de atores, apareceu pela primeira vez na tela em The Love Race / 1931, dirigido por seu primo Lupino Lane. No ano seguinte, aos 14 anos de idade, trabalhou sob as ordens do diretor Allan Dwan em Her First Affaire / 1932. Em 1933, protagonizou cinco filmes britânicos nos estúdios Teddington, comprados pela Warner Bros. e, mais tarde, foi uma das grandes estrelas desta companhia. Até que, em 1949, ela e seu marido Collier Young abriram uma empresa independente, The Filmakers, para produzir filmes de baixo orçamento. Ida dirigiu seis filmes: Mãe Solteira / Not Wanted /1949; Quem Ama Não Teme / Never Fear / 1950; O Mundo é o Culpado / Outrage / 1950; Laços de Sangue / Hard, Fast and Beautiful / 1951; O Mundo Odeia-me / The Hitchhiker / 1953; O Bígamo / The Bigamist / 1953. Em 1966, dirigiu Anjos Rebeldes / The Trouble with Angels e seu último filme como atriz foi My Boys Are Good Boys / 1979. Esteve também ativa na televisão como atriz ou diretora em várias séries, inclusive na famosa Além da Imaginação / The Twilight Zone) no episódio The Sixteen Millimeter Shrine / 1959, dirigido por Mitchel Leisen.

Shirley Clarke

Susan Seidelman

Barbara Kopple

Kathryn Bigelow e seus dois Oscar

A partir dos anos 50, foram surgindo novas diretoras como Shirley Clarke; Stephanie Rothman (especializada em exploitation films como O Mundo dos Biquinis / It´s a Wild Bikini / 1967); Ruth Orkin, que dirigiu dois filmes com seu marido Morris Engel (O Pequeno Fugitivo / The Little Fugitive / 1953 e Lovers and Lollipops / 1956); Elaine May, responsável por dois filmes, O Caçador de Dotes / A New Leaf / 1971 e Corações em Alta / Heartbreak Kid / 1972;  e muitas outras, entre elas, Mary Ellen Bute, Penny Marshall, Susan Seidelman, Nora Ephron, Joan Micklin Silver, Barbara Loden, Joan Rivers,  Francine Parker, Faith Hubley, Kathleen Dowdey, Mary Lambert, Julia Dash, Mira Nair, Lizzie Borden, Bette Gordon, Joyce Chopra, Claudia Weill, Diane Keaton, Barbra Streisand etc., inclusive duas que ganharam o Oscar: Barbara Kopple, Oscar de Melhor Documentário por Harlan County:  Tragédia Americana / Harlan County U.S.A. / 1976  (sobre uma greve de trabalhadores. em minas, no Kentuycky) e por American Dream / 1990 (sobre uma greve contra a Hormel Foods Corporation em Minnesota) e Kathryn Bigelow, Oscar de Melhor Direção por Guerra ao Terror / The Hurt Locker / 2008 (sobre um esquadrão anti-bombas do exército americano em ação na Guerra do Iraque).

MARIKA ROKK

Ela estava entre as estrelas mais famosas e queridas do Cinema do Terceiro Reich, compensando sua capacidade interpretativa limitada com uma energia ilimitada e atletismo enquanto seus filmes ofereciam outras atrações como cenários e figurinos luxuosos e fotografia em cores.

Marika Rökk

Marie Karoline Rökk (1913-2004) nasceu em Cairo no Egito, filha de um arquiteto e empreiteiro húngaro. Passou a segunda infância em Budapest, onde teve aulas de dança e, em 1924, sua família mudou-se para Paris. Juntando-se ao conjunto de dança “The Hoffman Girls” quando tinha onze anos de idade, sua primeira apresentação pública foi no Moulin Rouge. Marika passou os anos vinte excursionando por Nova York, Berlim, Monte Carlo, Cannes, Londres e Paris. Em Budapest e Viena ganhou as manchetes atuando em operetas e comédias musicais.

Sua primeira experiência no cinema foi como uma dançarina, aparecendo em duas comédias britânicas sob a direção de Monty Banks, Kiss me Sergeant e Why Sailors Leave Home, ambas de 1930. Subsequentemente estrelou dois filmes húngaros Csókolj meg, édes! / 1931 e Kisértetek vonata /1933, antes de ser contratada pela Ufa em 1935. Seu primeiro filme alemão foi o drama passado num circo dirigido por Werner Hochbaum, Cavalaria LIgeira / Leichte Kavallerie / 1935, seguido pela sua primeira colaboração com o diretor Georg Jacoby na comédia Rapsódia Húngara / Heisses Blut / 1936.

Marika em Gasparone

Marika em Eine Nacht im Mai

Marika em Kora Terry

Marika e Willy Fritsch em Frauen sind doch bessere Diplomaten

Jacoby se tornou o diretor favorito de Marika e também seu primeiro marido. Eles formaram uma parceira criativa até o final dos anos cinquenta. Jacoby dirigiu mais 16 de seus filmes: O Estudante Mendigo / Der Bettelstudent /1936; Ritmo Ardente / Und du mein schatz fährst mit / 1937; Gasparone / Gasparone / 1937; Eine Nacht im Mai / 1938; Kora Terry / 1940; Frauen sind doch bessere Diplomaten / 1941; Tanz mit dem Kaiser / 1941; Die Frau meiner Träume / 1944; Férias no Danúbio / Kinder der Donau / 1950; Sensation in San Remo / 1951; Die Czardasfürstin / 1951; Maske in Blau / 1953; Die geschiedene Frau / 1953; Noites no Papagaio VerdeNachts im grünen Kakadu / 1957; A Rainha do Palco / Bühne frei für Marika / 1958; Adorável Mentirosa / Die Nacht vor der Premiere / 1959. Seus filmes geralmente reciclavam a mesma fórmula básica dos musicais de Hollywood, terminando sempre com um número final espetacular.

Marika em Alô, Janine!

O parceiro mais agradável de Marika foi o ator neerlandês Johannes Heesters, especialmente em O Estudante Mendigo, Gasparone e Alô Janine! / Hallo Janine / 1939, este último dirigido por Carl Boese. Ela interpretou um papel duplo como duas irmãs gêmeas em Kora Terry e contracenou com Willy Fritsch no primeiro filme alemão em cores (Agfacolor) Frauen sind doch bessere Diplomaten. Ocasionalmente Marika foi vista em filmes de outros gêneros ou papéis mais sérios como, por exemplo, no drama de amor totalmente imaginário envolvendo Tchaikovsky, Noite de Baile / Es war eine rauschende Ballnacht / 1939, ao lado de Zarah Leander e Hans Stuwe (Tchaikovsky).

Inicialmente proibida de trabalhar na Alemanha e Austria após a Segunda Guerra Mundial, Marika retomou sua carreira em Viena em 1948. Com Jacoby como diretor e muitas vezes dividindo o estrelato com Heesters, ela fez filmes na Alemanha Ocidental a partir de 1951, revivendo sua personalidade na tela em Die Czardas fürstin e A Rainha do Palco. Jacoby faleceu em 1964 e, em 1968, Marika contraiu matrimômino com o ator austríaco de etnia húngara, Fred Raul (que estava no elenco de trê filmes dela, Noites do Papagaio Verde, A Rainha do Palco e Adorável Mentirosa) e os dois ficaram juntos até a morte dele em 1985.

Marika ainda em forma em Hello, Dolly!

Embora sua carreira tivesse declinado em grande parte no final dos anos 50 e definitivamente encerrada no início dos anos 60, ela continuou mantendo sua presença nos palcos em numerosas operetas e musicais, destacando-se sobretudo o papel principal no musical de Jerry Herman, “Hello, Dolly!”. Nunca abandonando seu forte sotaque húngaro, que era uma marca registrada dela, Marika anunciou cosméticos em comerciais e apareceu em vários programas de televisão.

Parodiando sua imagem alegre de estrela, Marika fez uma última aparição cinematográfica na comédia Schloss Königswald / 1987, ao lado de outras divas veteranas do cinema alemão como Camila Horn, Marianne Hoppe e Carola Höhn.