Rudolf Matheh (1898 -1964) nasceu na Cracóvia, Polonia, formou-se pela Universidade de Budapeste e iniciou sua carreira no cinema como assistente de cameraman para Alexander Korda em Budapeste. Depois trabalhou em Viena e Berlim como aprendiz de Karl Freund e assistente de Erich Pommer.
Sua carreira cinematográfica pode ser dividida quase que em três partes: na primeira parte ele trabalhou na Europa como cameraman em grandes filmes como por exemplo O Martírio de Joana D’Arc / La Passion de Jeanne d’Arc / 1928 e O Vampiro / Vampyr / 1932 de Carl Theodor Dreyer; O Último Milionário / Le Dernier Milliardaire / 1934 de René Clair; Coração de Apache / Liliom / 1934 de Fritz Lang. Então, em 1935, foi para Hollywood e, na mesma função, ganhou cinco indicações para o Oscar consecutivas entre 1940 e 1944 (fotografias de Correspondente Estrangeiro / Foreign Correspondent; Lady Hamilton, a Divina Dama / That Hamilton Woman / Ídolo, Amante e Herói / Pride of the Yankees; Sahara / Sahara; Modelos / Cover Girl), distinguindo-se também seu trabalho em Endereço Desconhecido / Address Unknown / 1944, Gilda / Gilda / 1946 e sua participação não creditada em A Dama de Shanghai / The Lady from Shanghai / 1947. Na terceira fase, Maté passou para a direção, principalmente de filmes “B” de 1947 até sua morte em 1964.
Em 1935 Maté deixou a Alemanha Nazista e foi para os Estados Unidos. William Wyler deu-lhe a primeira grande chance em Hollywood, contratando-o para fotografar Fogo de Outono / Dodsworth / 1936 e Meu Filho é Meu Rival / Come and Get It / 1936. Em pouco tempo Maté alcançou o topo dos diretores de fotografia de Hollywood sob as ordens de Alfred Hitchcock em Correspondente Estrangeiro / Foreign Correspondent / 1940.
Após a Segunda Guerra Mundial tornou-se diretor. Em 1947 ele entrou para a terceira fase de sua carreira dirigindo a comédia romântica Tem Que Ser Você / It Had to Be You. Seguiram-se, distinguindo-se entre filmes de qualidade artística variada, o drama criminal Passado Tenebroso / The Dark Past / 1948; a aventura de ficção científica O Fim do Mundo / When Worlds Collide / 1951 premiado com o Oscar de Melhores Efeitos Especiais e hoje considerado um clássico no gênero); o western Um Pecado em Cada Alma / The Violent Men / 1955 e, principalmente, seus dois filmes noirs, Com As Horas Contadas / D.O.A. / 1949 e Rastro Sangrento / Union Station / 1950. Considero estes dois últimos os melhores de sua filmografia.
COM AS HORAS CONTADAS
Bigelow (Edmond O´Brien) chega cambaleante em uma delegacia de polícia, para dar parte de seu próprio homicídio. Os policiais ouvem sua história. Ele é um perito-contador e tabelião que exerce seu ofício na cidade desértica de Banning. Bigelow decide tirar férias em San Francisco para fugir do tédio e também de um comprometimento mais sério com a namorada e secretária Paula Gibson (Pamela Britton). Após passar uma noite divertida em uma festa, entra em um bar, onde um indivíduo misterioso despeja algo em um copo, trocando-o com o dele. No dia seguinte, sente-se mal. Os médicos lhe dizem que sofreu um envenenamento por radiação e tem apenas poucos dias de vida. Bigelow deixa o hospital com a firme determinação de encontrar seu assassino.
O filme abre com a câmera seguindo Bigelow através de uma sucessão de escuros e intermináveis corredores de uma delegacia. Não vemos seu rosto, somente suas costas exaustas e passos firmes. Com aquela força que as pessoas parecem adquirir quando estão perto da morte ele consegue chegar ao Departamento de Homicídios. “Quero dar parte de um assassinato”, diz para o delegado de plantão. “Quem é que foi morto?”, pergunta o policial. Bigelow, em close-up, responde: “Fui eu”. Bigelow não sabe como, quando, onde ou por que foi morto e se torna, ao mesmo tempo, o investigador e a vítima de seu próprio assassinato. Usa as últimas energias que lhe restam para descobrir o assassino, porém trata-se de um esforço inútil, porque seu trinfo como herói-detetive coincide com sua morte e o motivo do crime foi arbitrário e impessoal.
Em nenhum outro filme noir estiveram tão presentes o absurdo e o caos emocional. Bigelow é um homem desnorteado com a notícia de sua morte e acabou de descobrir que o mundo não tem sentido. Quando os médicos anunciam o diagnóstico, ele os chama de loucos e não quer encarar a realidade. Então, corre como um louco pelas ruas de San Franciso, como se houvesse algum lugar para onde pudesse ir. Ao terminar sua história, Bigelow cai da cadeira tentando pronunciar o nome de Paula e morre. Um policial arquiva o caso, carimbando as iniciais D.O. A. (Dead on Arrival / Morto ao Chegar).
RASTRO SANGRENTO
Viajando para Chicago, Joyce Willecombe (Nancy Olson) nota que um passageiro está armado e comunica o fato ao chefe do trem. O tenente Wiliam Calhoun do Serviço de Segurança da Union Station e o inspetor Donnelly da polícia são avisados. O suspeito, Joe Beacom Lyle Betger), guarda uma mala em um dos armários da estação. Mais tarde, Calhoun manda abrir a mala e Joyce reconhece as roupas de Lorna Murchison (Allene Roberts), a filha cega de seu patrão, Henry Murchison (Herbert Heyes). Tudo indica que se trata de um sequestro e a caça aos sequestradores tem início.
Perfeitamente ritmada e bastante precisa, a ação transcorre quase exclusivamente na grande estação ferroviária de Chicago, incluindo uma complexa rede de túneis subterrâneos com quilômetros de tubos e fios eletrificados, dos quais os usuários não têm conhecimento. Utilizando a fórmula dos filmes de procedimentos policiais, no caso as atividades conjuntas dos seguranças da estra de ferro e da polícia, o espetáculo tem muitas cenas de brutalidade, que lembram as dos melhores filmes noirs: a morte de um dos bandidos sob as patas dos animais alvoraçados; o interrogatório de outro (“Faça com que pareça um acidente”, diz o inspetor Donnelly, ameaçando jogá-lo na frente de um trem); o instante em que Beacom tira amordaça da boca de Lorna, enrola a mão com o pano e esmurra a pobre cega; o corpo de sua amante Marge (Jan Sterling) rolando da calçada para a rua depois deter sido cruelmente abandonada pelo amante. Nos momentos culminantes, Maté constrói um bom suspense quando, na estação totalmente vigiada pelos detetives, Beacom, disfarçado de ferroviário, usa um mensageiro para apanhar a mala com o dinheiro, seguindo-se depois uma formidável perseguição pelos túneis subterrâneos enquanto a cega se arrasta pelos trilhos perigosos, gritando por socorro.