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BUSTER CRABBE, O REI DO SERIADOS

Se ele não tivesse necessitado de alguns dólares extras para ajudar a pagar seus estudos na Faculdade de Direito, eu estaria falando agora de Clarence Linden Crabbe, o advogado, e não Buster Crabbe, o ator. Nascido em Oakland, Califórnia, em 7 de fevereiro de 1908, Crabbe foi levado por seus pais alguns meses depois para o Havaí, onde passou a maior parte de sua juventude e desenvolveu suas consideráveis habilidades de natação. Seu excelente recorde de natação no ensino médio garantiu-lhe um lugar na Seleção Olímpica de Natação dos Estados em 1928. Em 1932 ele voltou ao time novamente e ganhou a Medalha de Ouro nos 400 metros nado livre. Antes das Olimpíadas de 1932, Crabbe se matriculou como estudante de Direito na University of Southern California. Enquanto estudava, trabalhava de vez em quando como dublê e figurante (v. g. ele dublou Joel McCrea nas cenas arriscadas de Zaroff, o Caçador de Vidas / The Most Dangerous Game / 1932). Precisando de dinheiro, deixou a faculdade por um tempo que ele achava que seria apenas um ano, mas logo se viu integrando o elenco na produção da Paramount de O Homem-Leão / King of the Jungle / 1933, que contava uma história parecida com a de Tarzan: O jovem Kaspa, criado na selva por animais, capturado em um safari, é levado para a civilização como atração de um circo.

Buster Crabbbe em O Homem-Leão

Crabbe fez um bom trabalho na sua estréia no cinema e no mesmo ano, assinou contrato com a Principal Picture para fazer seu primeiro seriado, Tarzan, o Destemido / Tarzan, the Fearless, aventura na selva nada emocionante que girava em torno da procura do pai da heroína e de um tesouro na cidade perdida de Zor. Aumentando o tédio geral estava o fato de que não deram nenhum diálogo para Crabbe. Ele não falava, apenas emitia um grunhido. Este papel virtualmente destruiu a possibilidade de Crabbe se tornar um astro e ele passou os próximos três anos fazendo uma longa sequência de filmes modestos (entre eles três westerns B da série Zane Grey, estrelados por Randolph Scott e dirigidos por Henry Hathaway para a Paramount: Maldade / The Thundering Herd; O Homem da Floresta / Man of the Forest e Rixa Antiga / To The Last Man, todos de 1933).

Buster Crabbe em Tarzan, o Destemido

Finalmente, em 1936, Crabbe obteve o papel principal no seriado Flash Gordon / Flash Gordon, produzido pela Universal. Muitos atores fizeram testes para o papel título (inclusive Jon Hall que seria o astro de seis filmes technicoloridos com Maria Montez na Universal nos anos quarenta). Porém Crabbe, depois de concordar em embranquecer seu cabelo para louro, foi escolhido, e começou seu caminho para a imortalidade cinematográfica. No enredo de Flash Gordon, o planeta Mongo está viajando pelo espaço em rota de colisão com a Terra. Flash Gordon, sua namorada Dale Arden (Jean Rogers) e o Professor Zarkovv (Frank Shannon) voam até Mongo no foguete de Zarkov e ali entram em conflito com o Imperador Ming (Charles Middleton) e vivem aventuras inusitadas em uma terra estranha. Parte do encanto de Flash Gordon era o fato de que a maior parte do roteiro foi baseada nas histórias em quadrinhos criadas por Alex Raymond. Crabbe estava em excelente forma enquanto lutava contra Os Homens-Leão, Homens -Tubarão ou Gocko, um dragão dinossauro com garras que pareciam ser as de uma lagosta.

Buster Crabbe no seriado Flash Gordon no Planeta Marte

O sucesso comercial e artístico de Flash Gordon tornou quase obrigatório uma continuação em Flash Gordon no Planeta Marte / Flash Gordon´s Trip to Mars / 1938. Crabbe se encontrou mais uma vez voando pelo espaço, desta vez para Marte, para combater seu velho inimigo, Ming, o Impiedoso, que se aliou a Rainha Azura de Marte (Beatrice Roberts). Ming estava desenvolvendo uma grande lâmpada com a finalidade de drenar o nitrogêneo da atmosfera da Terra e a Rainha Azura usava seus poderes de desintegração para escravizar o Povo de Homens de Barro e outros que descumpriram suas ordens. Finalmente, Flash consegue destruir a lâmpada e Ming é jogado em uma câmera de desintegração.Ainda em 1938, Crabbe interpretou outro personagem popular dos quadrinhos em Red Barry / Red Barry, tendo como herói um detetive particular criado por Will Goul, cuja intriga, envolvendo a procura de dois milhões de dólares em títulos ao portador cobiçados por várias pessoas, transcorria principalmente em Chinatown e num velho teatro de vaudeville.

Buster Crabbe no seriado Buck Rogers

O seriado não deixou saudades e diante do êxito retumbante dos dois seriados de Flash Gordon, a Universal decidiu repetir o feito com outro seriado futurístico baseado nos quadrinhos de Dick Calkins e Phil Nowlan, Buck Rogers / Buck Rogers / 1939. Com Crabbe como Buck e o jovem Jackie Moran como Buddy Wade, Buck Rogers tentou capturar o sabor dos seriados de Flash Gordon. Entretanto, até o uso de espaçonaves recém-projetadas e de super-vilões como Henry Brandon (como o Capitão Lasca) e Anthony Warde (como Killer Kane) não puderam compensar uma série de perseguições sem sentido e sequências com diálogos muito chatos. Até Constance Moore, como Wilma Deering, não conseguiu adicionar nenhum charme ao espetáculo.

A Universal esperava fazer uma continuação de Buck Rogers, mas quando o seriado não conseguiu seduzir o público, a direção do estúdio resolver trazer de volta seu herói de sucesso para um terceiro e último filme: Flash Gordon Conquista o Universo / Flash Gordon Conquers the Universe / 1940. Nenhuma explicação digna de crédito foi dada de como Ming escapou da câmera de desintegração dois anos antes, mas ele estava de volta em grande estilo. Desta vez estava despejando uma poeira mortal chamada “The Purple Death” (A Morte Púrpura) na atmosfera da Terra. Frank Shannon e Buster Crabbe continuavam como Dr. Zarkov e Flash Gordon, porém Jean Rogers foi substituída por Carol Hughes no papel de Dale Arden. Após doze episódios, Ming foi finalmente destruído quando um foguete cheio de explosivos colidiu com uma torre na qual o ditador havia sido trancado.

Buster Crabbe e Johnny Weissmuller em Chamas de Ódio

Buster Crabbe em O Filho do Sol

Buster Crabbe em O Terror dos Mares

Nos próximos anos Crabbe estrelou, entre outros, uma série de filmes de baixo orçamento como, por exemplo, os 13 filmes da série Billy the Kid; os 23 filmes da série Billy Carson; Chamas de Ódio / Swamp Fire / 1946, contracenando com Johnny Weissmuller; O Filho do Sol / Last of the Redmen / 1947, releitura do O Último dos Mohicanos, no qual fez o papel de Magua; Lagoa dos Mortos / Captive Girl /1950, filme da série Jungle Jim (Jim das Selvas) estrelada por Weissmuller. Em 1947, voltou aos seriados como o Capitão Silver em O Terror dos Mares / The Sea Hound, produzido pela Columbia e baseado numa história em quadrinhos e num seriado do rádio, com uma história de aventura passada numa ilha, onde o herói se depara com vilões que estão à procura de um tesouro espanhol escondido. Em 1950, Crabbe estava de volta em outro, seriado da Columbia, Piratas do Alto Mar / Pirates of the High Seas, como outro capitão de navio, Jeff Drake, desta vez combatendo os estranhos ataques de um navio pirata, que desaparece misteriosamente após o ataque. Tentando resolver o mistério do navio fantasma, Jeff também entra em conflito com um criminoso foragido em busca de diamantes perdidos na ilha.

Crabbe completou seu último seriado, também da Columbia, Os Mistérios da África / King of the Congo em 1952, agora como o Capitão Roger Drum da Força Aérea Americana. Dum abate um avião não identificado, cujo piloto estava a caminho da África para entregar uma mensagem em microfilme para um grupo subversivo, liderado por Boris (Leonard Penn), que está tentando localizar o depósito de um mineral mais radioativo do que urânio. Assumindo a identidade do piloto, Drum vai para África a fim de desmascarar o grupo. Quando seu avião cai na selva, ele é resgatado pelo Rock People e sua rainha Pha (Gloria Dea). Por causa de sua força, Drum é chamado de Thunda, Rei do Congo. Para complicar as coisas, outra tribo, The Cave Men, ataca regularmente tanto o Rock People como os homens de Boris. Com a chegada de outro americano da Força Aérea, Tenente Blake (Lee Roberts) e a ajuda do Povo da Rocha, os subversivos são dominados, e quando Boris e seu comparsa Alexis (Bart Davidson) fogem através da selva, eles são mortos por animais selvagens. Com os agentes inimigos descartados, Thunda e Pha olham felizes os  Cave Men e o Rock People reconciliados.

CHRISTIAN-JAQUE

Christian-Jaque (1904-1994) cujo verdadeiro nome era Christian-Albert François Naudet, estudou arquitetura e artes decorativas. Ele se aproximou do cinema desenhando maquetes para os cenários de filmes de Julien Duvivier, André Hugon e Henry Roussell, formando dupla com seu amigo Jaque Chabraison. Dessa associação nasceu o pseudônimo Christian-Jaque, que ele adotaria como diretor.

Christian-Jaque

Depois de se tornar assistente de Duvivier, o jovem cineasta realizou alguns filmes curtos, antes de fazer o seu primeiro longa-metragem, Bidon d‘or. Entre 1934 e 1939, responsabilizou-se por  muitas produções rotineiras, até que uma comédia burlesca onírico-fantástica, Valente a Muque / François Ier / 1937 – com aquela famosa cena de tortura quando Fernandel tem seus pés lambidos por uma cabra – lhe trouxe um estrondoso sucesso comercial e notoriedade, seguindo-se no mesmo ano sua colaboração com Sacha Guitry na deliciosa fantasia histórica, As Pérolas da Coroa / Les Perles de la Couronne / 1937.

Fernandel em François Ier

O Mistério do Colégio / Les Disparus de Saint-Agil / 1938, foi o primeiro filme com sua marca pessoal e a veia poética, que seria reencontrada em L’Enfer des Anges / 1939; Premier Bal / 1941; e, de maneira especial, em O Assassinato do Papai Noel / L’Assassinat du Père Noel / 1945 e Sortilégios / Sortilèges / 1945. Nesses filmes, ele mostrou que tinha perfeito conhecimento de seu ofício (levado muitas vezes ao virtuosismo), também evidente em La Symphonie Fantastique / 1941; Os Amores de Carmen / Carmen / 1942; Viagem sem Esperança / Voyage sans Espoir /1943; Anjo Pecador / Boule de Suif / 1945, Un Revenant / 1946, A Sombra do Patíbulo ou Amantes Eternos / La Chartreuse de Parme / 1947, trabalhos – principalmente os dois últimos – com os quais conquistou definitivamente um lugar destacado no cinema francês.

No início dos anos 50 seu nome ficou conhecido internacionalmente por Fanfan la Tulipe / Fanfan la Tulipe / 1952, que lhe proporcionou o prêmio de Melhor Diretor no Festival de Cannes bem como Essas Mulheres / Adorables Creatures / 1952, Os Amores de Lucrécia Borgia / Lucrèce Borgia / 1953, Madame Du Barry / Madame Du Barry / 1954 e Naná / Nana / 1955, todos estrelados por Martine Carol, com quem foi casado de 1954 a 1959. Seus outros filmes até sua despedida do cinema em 1977, embora contando com a presença de atores ou atrizes famosos, não possuem a mesma estatura artística de suas obras anteriores.

Erich von Stroheim em O Mistério do Colégio

O MISTÉRIO DO COLÉGIO

No colégio de Saint-Agil, três alunos, Beaume (Serge Grave), Sorgue (Jean Claudio) e Macroy (Marcel Mouloudji), constituíram uma sociedade secreta com a finalidade de partir para os Estados Unidos e fazer fortuna. Uma noite, Sorgue vê um homem sair de uma parede e depois sumir precipitadamente. O professor Lemel (Michel Simon) acusa seu colega estrangeiro Walter (Erich von Stroheim) de ser o responsável por esse desaparecimento. Depois, Macroy e Beaume também somem. O mistério tem a ver com uma quadrilha de falsários, chefiada por M. Boisse (Aimé Clarion, o diretor do estabelecimento. Nos corredores sombrio, nas salas de aula noturnas e ameaçadoras, nos dormitórios gelados de Saint-Agil, confrontam-se dois mundos: o mundo da infância, encantador e misterioso, e o mundo dos adultos, habitado por seres lamentáveis e nocivos. São professores que se caluniam entre si, manifestam sua xenofobia, e, enfim, o chefe do bando de malfeitores é o próprio diretor da instituição. Stroheim está magnífico como o professor de inglês que serve de bode expiatório de seus colegas, para os quais representa “o boche”. Michel Simon lhe diz: “Eu não gosto de estrangeiros”, e ouve esta réplica prévertiana (Jacques Prévert foi o autor dos diálogos); “Bons ou maus, é sempre com os estrangeiros que nós teremos a guerra!”.

Harry Baur em O Assassinato de Papai Noel

O ASSASSINATO DE PAPAI NOEL

Em uma aldeia da Savoia, o pai Cornusse (Harry Baur), fabricante de globos terrestres, se fantasia de Papai Noel durante o Natal.  Ele vive em companhia de sua filha Catherine (Rénée Faure). A jovem esconde um segredo: ela ama o barão Roland (Raymond Rouleau), um personagem misterioso que intriga a população. A igreja da aldeia possui uma relíquia preciosa: o anel de São Nicolau. Um desconhecido furta o anel e o Papai Noel é encontrado morto. Villard (Robert Le Vigan), o professor local, que suspira em vão por Catherine, acusa Roland, seu rival. Finalmente os guardas descobrem o verdadeiro criminoso e que Cornusse não morrera, mas sim, outro em seu lugar. Concebido com um espírito semelhante ao de O Mistério do Colégio – o outro filme de Christian -Jaque baseado no universo de Pierre Véry -, o filme casa o gênero fantástico com o policial. Há um crime, porém o essencial está na magia do mundo infantil, na atmosfera do vilarejo da montanha coberta de neve, nos tipos estranhos e familiares, na poesia do Natal. O diretor conseguiu criar um clima envolvente, a meio caminho entre o real e o imaginário. A neve e as superstições locais avivam o mistério das situações e das personagens. Estava aberto o caminho para aquele “maravilhoso poético” que permitiu ao cinema francês evadir-se da realidade no tempo da Ocupação.

Rénée Faure e Fernand Ledoux em Sortilégios

SORTILÉGIOS

Nas montanhas de Auvergne, Le Campanier (Lucien Coëdel), que passa por feiticeiro, faz soar o seu sino para guiar os viajantes perdidos na neve. Uma noite, ele mata um mercador para lhe roubar a bolsa cheia de ouro. A morte teve uma testemunha, Fabret (Fernand Ledoux). Le Campanie lhe dá metade do ouro como um dote para sua filha Catherine (Rénée Faure), que sofre de apatia e está sob seus cuidados. Mas Catherine ama Pierre (Roger Pigaut), o lenhador, noivo de Marthe (Madeleine Robinson), filha de um rico estalajadeiro. O cavalo do morto semeia o pânico na cidade e mostra o lugar onde Le Campanier escondera o cadáver. O ciúme de Marthe vai provocar uma catástrofe. Melodrama campesino com uma história realista, mas banhada por uma atmosfera estranha. Cenas como aquela do inquietante cavalo negro aterrorizando a região com suas aparições fantasmagóricas na paisagem ranca conferem ao filme um clima insólito muito próximo do fantástico, graças aos procedimentos que Christian-Jaque pediu emprestado ao gênero e que uma admirável fotografia em preto e branco sublinhou corretamente. Percebem-se ainda rastros de poesia, como naquele momento em que Catherine, encolhida nos braços de seu amado Pierre, canta “Aux marches du palais” com uma voz muito pura durante um passeio na neve.

Louis Jouvet e Gaby Morlay em Un Revenant

UN REVENANT

Jean-Jacques (Louis Jouvet), de volta à sua cidade natal como diretor de uma companhia de balé, pretende se vingar dos Nisard e dos Gonin que, vinte anos antes, tentaram suprimí-lo, para evitar seu casamento com Geneviève NIsard (Gaby Morlay) agora casada com Edmond Gonin (Louis Seigner). No teatro, se presenta um jovem cenógrafo, François (François Périer), filho de Jerome (Jean Brochard), irmão de Geneviève, que havia atirado em Jean-Jacques para matá-lo. Ao mesmo temo em que empurra François para os braços de sua dançarina-estrela Karina (Ludmilla Tchérina), Jean-Jacques finge um amor eterno por Geneviève e depois a abandona.  François, desiludido com Karina, tenta se suicidar. Após ter contemplado a cidade coberta de bruma (“Ah, meu horizonte! Bela natureza morta. As lembranças e as nuvens. Tudo isto passa, tudo isto passa, eu debaixo deste céu, fico bem na paisagem”), Jean-Jacques vai saborear friamente sua vingança.  Primeiro, procurar Geneviève, acusá-la aos poucos sadicamente e depois deixá-la perdida, humilhada, no pátio da estação ferroviária. Ao partir, Jean-Jacques leva consigo o filho de seu agressor, depois de lhe ensinar, por uma encenação cínica, que toda relação com uma mulher é um logro. Sempre cáustico e amargo, com uma máscara impenetrável, Louis Jouvet tem um de seus melhores desempenhos, no qual se expande a sua extrema sensibilidade.

Gérard Philipe e Maria Casarès em A Sombra do Patíbulo

A SOMBRA DO PATÍBULO ou AMANTES ETERNOS

Em Parma, Fabrice del Dongo (Gérard Philipe), conquistador impenitente, apaixona-se por Clélia Conti (Renée Faure), enquanto sua bela tia, La Sanseverina (Maria Casarès) arde de um amor secreto pelo sobrinho. Ocorrem muitas peripécias, envolvendo ainda: o primeiro-ministro, Conde Mosca (Tullio Carminati), amante de La Sanseverina; o sinistro chefe de polícia Rassi (Lucien Coëdel, que quer ocupar o lugar de Mosca; o monarca Ernest VI (Louis Salou), interessado em La Sanseverina; e o anarquista Ferrante Palla (Attilio Dottesio, que durante uma revolução assassina Ernest. Finalmente, Fabrice se interna para o resto de sua existência em um convento. Christian-Jaque adaptou com muita liberdade a obra de Stendhal, transformando um grande romance em um mero filme de aventuras. Concentrado no simples jogo das intrigas, o espetáculo é muito bom, graças aos acontecimentos rocambolescos – aos quais o diretor deu bastante vivacidade -, aos magníficos cenários, ao cuidado com que foram compostas as imagens e aos serviços prestados por intérpretes experientes. Entre eles, destaca-se a presença de Gérard Philipe, um Fabrice ardente e romântico, à altura do herói stendhaliano.

Gérard Philipe e Gina Lollobrigida em Fanfan la Tulipe

FANFAN LA TULIPE

A bela cigana Adeline (Gina Lollobrigida) revela a Fanfan (Gérard Philipe) que ele se cobrirá de glória no exército e se casará com a filha do rei. Fanfan consegue salvar de uma emboscada a marquesa de Pompadour (Geneviève Page) e a própria Henriette de France (Sylvie Pelayo). Desejoso de rever Henriette, Fanfan penetra clandestinamente no castelo, mas é preso e condenado à forca. Adeline, que o ama, obtém a graça do rei. Mas como ela se recusa a “agradecer” o gesto do monarca, este encarrega seu homem de confiança, Fier-a-bras (Nöel Roquevert), de raptá-la. Mas Fanfan vai salvá-la. Seguindo a fórmula de Alexandre Dumas, Christian-Jaque entrecruza personagens da história da França, em particular Luís XV (Marcel Herrand) e madame de Pompadour, com criaturas de ficção, em um redemoinho de peripécias cheias de charme, fantasia e humor. Fanfan torna-se, graças ao talento de Gérard Philipe, uma espécie de herói saltitante à maneira de Douglas Fairbanks, pronto para enfrentar o irascível ferrabrás (magnificamente composto por Nöel Roquevert). com uma agilidade e um entusiasmo que eletrizam o público. É preciso render homenagem ao diretor, que impôs ao espetáculo uma animação que não se enfraquece em nenhum momento, seja nas cenas de ação ou nas passagenes mais intimistas.

TRÊS CINEASTAS A SERVIÇO DO TERCEIRO REICH

Ao lado de Leni Riefenstahl, Hans Steinhoff, Karl Ritter e Veit Harlan são sempre lembrados como diretores dos filmes de propaganda nazista mais notórios.

Hans Steinhoff

Hans Steinhoff (1882-1945) nasceu em Marienberg, Alemanha. Filho de um caixeiro viajante, cresceu em Leipzig, onde aos quinze anos de idade entrou para uma companhia de teatro local. Subsequentemente trabalhou como ator / diretor em mais de uma dúzia de companhias e em 1902/03 se tornou co-diretor de uma trupe de cabaré sediada em Munich. Um ano depois, excursionou pela Europa com uma produção baseada na famosa encenação de Max Reinhardt da peça Ralé de Gorki. De 1904 em diante, ele se concentrou em operetas, inicialmente como cantor, depois como diretor. Após sua associação com Jean Gilbert, então o compositor principal da Alemanha no gênero, Steinhoff tornou-se diretor-chefe do teatro de revista mais conhecido do país, o Metropol em Berlim. Pouco antes de irromper a Primeira Guerra Mundial, mudou- se para Viena.

Motivado pelo declínio do teatro de variedades tradicional após a guerra, Steinhoff fundou sua própria companhia de cinema em 1921. Apesar do fracasso de público do seu filme de estréia, Kleider machen Leute / 1921, o apoio crítico resultou em um convite pela Gloria Film para dirigir o espetáculo épico Der falsche Dimitry / 1922, baseado em acontecimentos relacionados com o usurpador russo Boris Godunov. Após desentendimentos com o gerente geral da companhia e das dificuldades com a censura de sua adaptação do romance de Norbert Jacques, Mensch gegen Mensch / 1924, Steinhoff foi trabalhar na companhia produtora Terra em 1925, onde se firmou como um diretor eficiente e confiável, cobrindo uma ampla variedade de gêneros para o mercado de massa. Seu profissionalismo e capacidade fazer filmes financeiramente exitosos dispondo de orçamentos moderados fez com que se tornasse um diretor procurado por companhias de pequeno e médio porte.

Cena de Mocidade Heróica

Em 1932, foi contratado para uma unidade B da Ufa onde realizou Mocidade Heróica / Hitlerjunge Quex / 1933, filme que marcou sua reputação como propagandista nazista, contando a história de um jovem assassinado pelos comunistas quando cumpria uma missão para o Partido, que se tornava um mártir da Juventude Hitlerista. Embora fosse um admirador ardente de Hitler, Steinhoff nunca se filiou ao partido. Descrito por pessoas que o conheciam pessoalmente como “totalmente apolítico”, ele era de fato mais um oportunista do que um ativista político. Sua posição como um dos principais diretores do Terceiro Reich baseia-se principalmente nas suas cinebiografias: Der alte und der junge König / 1935, Robert Koch / Robert Koch, der Bekämpfer der Todes / 1939, Ohm Kruger / 1941, todos estrelados por Emil Jannings e Rembrandt / 1942 com Edwin Balser no papel título.

Emil Jannings em Ohm Kruger

Steinhoff dirigiu também Die Geierwally / 1940, drama rural passado nos Alpes tiroleses e Tanz auf dem Vulkan / 1938, no qual Gustaf Grundgens assumia a figura do mímico boêmio-francês Debureau, que entusiasmava as massas no Thêatre des des Funambules e que foi retratado por Jean-Louis Barrault no filme de Marcel Carné O Boulevard do Crime / Les Enfants du Paradis / 1945.

Gustaf Grundgens em Tanz auf dem Vulkan

Steinhoff morreu nos últimos dias da guerra, quando o avião que o conduzia para Praga, onde estava fazendo um filme com Hans Albers, foi alvejado pelo fogo antiaéreo russo.

Karl Ritter

Karl Ritter (1888-1977) nasceu em Würzburg, Alemanha e estava entre os diretores e produtores mais comprometidos ideologicamente com o cinema do “Terceiro Reich”. Membro ativo do partido nazista desde meados dos anos vinte, muitos de seus filmes promoveram explicitamente os valores e as virtudes militares, genericamente embalados como filmes de guerra e de aventura. Filho de uma cantora de ópera e de professor de música, Ritter seguiu uma carreira militar antes de estudar arquitetura em Munique.  Voltando-se para a arte gráfica e pintura, ele se envolveu com a indústria cinematográfica como agente de relações públicas para a Südfim em 1926 e editando um livro sobre os desenhos de Walt Disney. Subsequentemente, trabalhou como gerente de produção e roteirista, dirigindo também um filme curto com o comediante Karl Valentin em 1932.

Devido à sua filiação ao partido Nazista, a carreira cinematográfica de Ritter progrediu rapidamente, depois de ser contratado pela Ufa em 1933. Seu primeiro filme como produtor foi Mocidade Heróica, dirigido por Hans Steinhoff, glorificando abertamente a agremiação hitlerista. O primeiro filme de Ritter como diretor foi uma farsa bucólica Weiberregient / 1936. Embora ele continuasse a dirigir divertimentos leves ocasionais – por exemplo, a comédia musical Capricho / Capriccio / 1938 com Lilian Harvey -, um número considerável de seus filmes era mais determinantemente propagandístico. Foi o caso de uma série de filmes militares que glorificavam o auto-sacrifício inquestionável e outras “virtudes” corajosas como Entre Duas Bandeiras / Patrioten / 1937 e Stukas / 1940

Muitos dos filmes de Ritter eram destinados a incitar ódio aos inimigos do Estado. Honra ao Mérito / Pour le Merite / 1938, contando a ascenção da Força Aérea Alemã (“Luftwaffe”), era anti-democrátco e anti-francês; Kadetten / 1939, narrando o drama de um grupo de cadetes do exército prussiano do século dezoito capturados por soldados russos, era racista e anti-russo; G.P.U. / 1940 envolvendo uma refugiada russa do terror bolchevique que ingressa na polícia secreta soviética (G.P.U.) para descobrir o homem que matou seus pais, era anti-soviético  enquanto Besatzung Dora / 1943, focalizando a tripulação de um avião de reconhecimento (o Dora) e a campanha da África, promovia sentimentos anti-britânicos.

No final da guerra, Ritter foi convocado para a Força Aérea. Embora tivesse sido feito prisioneiro pelo exército soviético, conseguiu fugir para a Bavaria. Quando a guerra terminou, no seu processo de desnazificação, ele foi classificado como “seguidor” (Mitläufer) do regime nazista e proibido de fazer filmes na zona da Alemanha ocupada pelos francêses. Em 1949, Ritter emigrou para a Argentina, onde Winifred Wagner ajudou-o fundar uma companhia produtora. Juntamente com outros alemães sediados na Argentina, e com seus filhos, ele fez El Paraiso / 1951, mas o filme foi um fracasso. Ritter retornou para a Alemanha Ocidental, onde dirigiu o melodrama Staatsanwältin Corda sobre uma promotora, Dra. Corda, que se apaixona por um réu e Ball Der Nationen / 1954, comédia musical estrelada por Gustaf Frölich e Zsa Zsa Gabor; porém nenhum dos dois foi bem recebido pelo público.  Apesar de sua intenção de “restaurar a força do cinema alemão”, Ritter não   conseguiu se afirmar na indústria cinematográfica da Alemanha Ocidental e voltou para a Argentina, onde se aposentou.

Veit Harlan

Veit Harlan (1899-1964) tornou-se um dos realizadores propagandistas mais infames do Terceiro Reich, expressando a ideologia Nazista sob o disfarce de melodramas e épicos luxuosos. Depois do fim da guerra, continuou sendo um símbolo controvertido de um artista dividido entre carreira e oportunismo político. Após um treinamento como ourives, o filho do dramaturgo Walter Harlan (1867-1931) estudou com Max Reinhardt e começou a assumir pequenos papéis no palco e como figurante nos filmes de Max Mack. Em 1916, ele se voluntariou para o serviço militar e passou algum tempo lutando na frente ocidental na França. Após a Primeira Guerra Mundial atuou em vários teatros em Berlim e nas províncias. Durante o período até 1933, trabalhou com vários diretores importantes como Erich Engel e Erwin Piscator. Harlan fez sua estréia no cinema como ator em 1926 e apareceu em vários filmes silenciosos até 1929, por exemplo, como o cabelereiro judeu Mandelstam na sátira Die Hose (1927) e depois em diversos filmes sonoros. Em 1933, Harlan, que se casara com a atriz judia Dora Gerson, declarou publicamente seu apoio ao Nacional Socialismo. Com sua carreira de ator estagnada, ele teve sua primeira oportunidade de trabalhar atrás das câmeras como assistente de diretor não creditado em Um Sonho que passou / Die Pompadour / 1935 e se tornou diretor em 1936, assumindo inicialmente comédias como Der Müde Theodor, Maria, die Magd e Krach in Hinterlaus este, estrelado pela veterana Henny Porten, que ele conseguiu filmar em dez dias por um custo ínfimo, obtendo sucesso de audiência.

Emil Jannings em Crepúsculo

Cena de Jud Süss

Adquirindo a reputação de ser um diretor rápido e econômico, Harlan chamou ainda mais atenção com uma adaptação fiel do romance de Tolstoi Sonata de Krautzer / Der Krautzersonate / 1937 um drama sobre um poderoso industrial contendo uma exortação disfarçada de Hitler, Crepúsculo / Derr Herrscher / 1937 e Com O Coração Imortal / Das unsterbliche Herz / 1939, adaptação de uma peça de seu pai, Harlan ganhou reputação por sua encenação habilidosa de grandes cenários envolvendo um grande número de figurantes. Esta habilidade fez dele uma escolha natural para assumir filmes de propaganda de maior prestígio, e ele foi designado para dirigir o antisemítico Jud Süss / 1940, seu filme mais notório.

Cena de A Cidade da Ilusão

Cena de Immensee

Com o seu próprio grupo de produção na Ufa Harlan subsequentemente trabalhou em diversos projetos de filme em Agfacolor, incluindo os melodramas românticos Praga, A Cidade da IIusão / Die goldene Stadt / 1942 (o maior êxito de bilheteria do período de guerra), Immensee /1943, adaptação de uma história de Theodor Storm e Opfergang / 1944 (todos com Kristina), realizando ainda (também  com Kristina) dois filmes de propaganda com ambiente histórico e grande movimentação de massas, que era a sua especialidade: O Grande Rei / Der grosse König / 1942, biografia de Frederico, o Grande da Prússia e Kolberg / 1945, mostrando a resistência de uma cidade da Prússia contra o exército de Napoleão em 1807.

Cena de O Grande Rei

Cena de Kolberg

Harlan foi o único diretor do Terceiro Reich processado por crimes contra a humanidade, principalmente por ter feito Jud Süss.  Depois de dois interrogatórios,  foi absolvido das acusações por falta de provas suficientes e voltou a exercer a sua profissão dirigindo, entre outros, Unsterbliche Geliebte / 1951, Verrat an Deutschland / 1955, Anders als du und ich / 1957, os dois primeiros com Kristina e o terceiro com Paula Wassely.

RENÉ CLEMENT

René Clément (1913-1996) nasceu em Bordeaux, França, estudou arquitetura, fez um filme de animação (César chez les gaulois), vários curtas-metragens, entre eles, Soigne ta gauche / 1936, escrito e interpretado por Jacques Tati, e documentários no Oriente Médio em a África. Em 1946, realizou seus primeiros longas-metragens tendo como tema a Resistência (A Batalha dos Trilhos / La Bataille du Rail e Le Père Tranquille) e atuou como consultor técnico no filme de Jean Cocteau A Bela e a Fera / La Belle et la Bête. No ano seguinte, ainda tratou de outro drama de guerra em Os Malditos / Les Maudits, estranhamente premiado. como Filme de Aventura no Festival de Cannes.

René Clement

Daí em diante, tornou-se um diretor respeitado, recebendo vários prêmios em festivais, inclusive dois Oscar de Melhor Filme Estrangeiro por Três Dias de Amor / Au-delà des Grilles ou La Mura di Malapaga / 1949 e Brinquedo Proibido / Jeux Interdits / 1952.   Nos anos cinquenta também importantes foram Um Amante sob Medida / Monsieur Ripois / 1954, Gervaise, a flor do lodo / Gervaise / 1956 e O Sol por Testemunha / Plein Soleil / 1959, realizados com o esmero técnico que sempre distingue sua obra.

Jacques Tati em Soigne ta Gauche

Nos anos sessenta e setenta, merecem destaque: os dramas de guerra O Dia e a Hora / Le Jour et l’Heure / 1963 e Paris Está em Chamas? / Paris brûle-t-il? / 1966 e o drama criminal psicológico, O Passageiro da Chuva / Le Passager de la Pluie / 1970 com Marlène Jaubert e Charles Bronson.

Clément fazia parte daquele grupo de realizadores atacados pelos críticos da Cahiers du Cinéma, e um dos argumentos levantados contra ele era a sua frieza, que, segundo alguns, dava certo em filmes policiais, mas não em dramas de conteúdo humano.  De fato, o que caracteriza mais os seus filmes   é um senso de distanciamento, colocando-o mais no papel de um espectador casual do que como um autor com uma visão do mundo.   Entretanto, mesmo sem ter o que dizer, seu estilo era de uma eficácia e inventividade deslumbrantes, e, em cada um de seus filmes, ele tentava fazer uma experiência nova, decifrando incessantemente linguagem do cinema.

Meia dúzia de grandes filmes de René Clement:

A Batalha dos Trilhos

A BATALHA DOS TRILHOS

Na região de Chalon-sur-Saône, Athos (Lucien Desagneaux), chefe da estação ferroviária, e seu adjunto Camargue (Tony Laurent) organizam a resistência. Sabotagens múltiplas começam. Reféns são presos e fuzilados. Após o desembarque, os alemães querem enviar reforços e munições para a Normandia e preparam um comboio de doze trens, batizado de Apfelkern. Os resistentes impedem o prosseguimento do comboio, provocando descarrilamentos e danificando o sistema elétrico. A aviação aliada, advertida, intervém, e logo os alto-falantes das estações anunciam a libertação. René Clemet utiliza os meios e os métodos do neorealismo para construir uma epopéia hagiográfica da resistência nas estradas de ferro da França. O elenco foi formado por atores pouco conhecidos e por ferroviários. Não existe uma intriga unitária, mas, sim, uma sucessão de episódios ligados entre si somente pelo fio cronológico da história. O aspecto de documentário afirma-se não somente pelos fatos, mas pela técnica, que se aproxima frequentemente dos jornais cinematográficos. O fuzilamento com uma vítima em primeiro plano, vendo-se cair, no fundo, um a um de seus companheiros; a sanfona que rola após o descarrilamento do trem; o trem-grua correndo desgovernado pela linha férrea são as cenas mais relevantes do filme.

Nöel-Nöel em Le Père Tranquille

 

LE PÈRE TRANQUILLE

Durante a Ocupação, o quinquagenário senhor Martin (Noël-Noël) vive em Moisson, pequena cidade das Charentes, ao lado de sua esposa e de seus filhos, Monique (Nadine Alari) e Pierre (José Artur), preocupado apenas em cultivar orquídeas, que despertam a admiração dos oficiais alemães. Sua existência é tão pacífica em um período tão conturbado, que os vizinhos o apelidaram de “o pai tranquilo”. Na realidade, Martin é o chefe da Resistência e esconde sob suas orquídeas as armas destinadas ao atentado contra a fábrica de pequenos submarinos próxima de sua residência. Logo após a Libertação, esse verdadeiro “herói de chinelos”, modesto e corajoso, enganando os ocupantes com malícia, obteve um triunfo de público colossal.  O pai tranquilo sob os traços de Noël-Noël, encarna o espírito de resistência das pessoas comuns na imensa tragédia da guerra. O filme é mais do popular ator, que escreveu o roteiro e os diálogos e concebeu as personagens, do que de René Clement, simplesmente encarregado da supervisão técnica. Há uma boa cena de suspense, quando dois oficiais inspecionam as orquídeas e Martin com muito sangue-frio, explica como elas devem ser tratadas.

Brigitte Fossey e Georges Poujoly em Brinquedo Proibido

BRINQUEDO PROIBIDO

Em junho de 1940, os aviões alemães metralham as vias de êxodo. No meio da desordem, a menina Paulette (Brigitte Fossey) vê seus pais e seu cahorrinho serem mortos. Aterrorizada, ela foge com o cachorro morto nos braços. Um pequeno camponês, Michel Dollé (Georges Poujoly), descobre a menina e a leva para a fazenda de seus pais. Para consolar Paulette, Michel enterra seu cachorrinho e depois, como isso parece divertí-la, ele cria para ela, em uma granja abandonada, um verdadeiro cemitério de animais, ornado com cruzes roubadas um pouco em toda a parte, dos túmulos ao carro fúnebre. Nesta espécie de crônica de um tempo conturbado, se misturam imagens reais (as cenas do êxodo e a metralhada dos civis), oníricas (o cachorrinho morto flutuando nas águas do rio, o pintinho agonizante, a coruja um olhar investigador) e satíricas (caricatura da vulgaridade, egoismo e estupidez dos adultos, não somente os do meio rural, mas de toda a humanidade neles representada). O centro do filme é a figura de Paulette. Ela é inocente e insensível: não tomou ainda consciência do mundo. Quando esse mundo e toda a sua ignomínia tornam-se perceptíveis para ela, então a menina começa a perder a inocência e insensibilidade. Ela se tornaráfraca, quer dizer, humana.

Gérard Philipe e Natasha Parry em Um Amante Sob Medida

UM AMANTE SOB MEDIDA

Cansada das infidelidades de seu marido, André Ripois (Gérard Philipe), Catherine (Valerie Hobson), uma inglesa rica, pede o divórcio. Enquanto isso, Ripois tenta seduzir Patricia (Natasha Parry), amiga de Catherine, contando-lhe seus amores passados – Anne (Margaret Johnston), Norah (Joan Greenwood), Marcelle (Germaine Montero), Catherine – e manifestando o desejo de se regenerar.  A confissão de Ripois não produz sobre Patricia o efeito desejado. Ele faz uma última tentativa para conquistá-la simulando uma tentativa de suicídio, mas cai de fato de de uma varanda. Catherina pensa que o gesto do marido foi provocado pelo seu pedido de divórcio e resolve ficar ao lado dele, imobilizado para sempre em uma cadeira de rodas. História de um Don Juan moderno abatido pelo golpe de uma justiça imanente e tardia. Vítima de sua última manobra, ele chama para si o castigo. E não haveria nada de mais cruel para esse homem sedento de liberdade, sempre em busca de alguma aventura, do que ficar prisioneiro de uma cadeira de rodas, enfraquecido e, por sua vez à mercê de todos. Clément filmou GérardPhilipe às escondidas nas locações em Londres, mostrando aspectos da cidade raramente vistos no cinema inglês, e lhe retirou os atributos trágicos do Cid (que ele interpretou brilhantemente no palco), para transformá-lo em espécie de anti-herói pré-Nouvelle Vague.

Maria Schell em Gervaise, a Flor do Lodo

GERVAISE, A FLOR DO LODO

Na Paris do Segundo Império, Lantier (Armand Mestral), companheiro de Gervaise (Maria Schell), abandona-a com seus dois filhos. Ela se casa com Coupeau (François Périer), um pedreiro, com quem tem uma filha, Nana (Chantal Gozzi. Gervaise é lavadeira e está a ponto de abrir seu próprio negócio) quando Coupeau cai de um telhado. Para custear o tratamento do marido, ela gasta suas economias. Um ferreiro, Goujet (Jacques Harden), amigo de Coupeau e secretamente apaixonado por Gervaise, empresta-lhe dinheiro. Ela abre uma lavanderia e tudo corre bem. Mas Coupeau se entrega à bebida, Goujet é preso por causa de uma greve, e Lantier reaparece. O filme é a história de uma lavandeira que tentou se evadir da condição proletária no Segundo Reinado. Assim, Gervaise, querendo a todo preço ser dona de uma lavanderia, forjou o instrumento de sua ruína. O diretor reintroduziu em sua própria linguagem o determinismo de Zola. Todo o drama de Gervaise é o de uma luta impossível, porque desigual. De que valem suas pobres pequenas forças confrontadas com a ordem monstruosa do seu meio? Aurenche e Bost assinaram uma de suas melhores adaptações, respeitando ao mesmo tempo a intriga bastante conhecida do romance e as intenções que o haviam ditado. Clément conseguiu realizar uma extraordinária pintura da época. Maria Schell é uma Gervaie perturbadora com aquele sorriso encharcado de lágirmas, do qual nunca esqueceremos.

Alain Delon, Marie Laforet e Muarice Ronet em O Sol por Testemunha

 O SOL POR TESTEMUNHA

Tony Ripley (Alain Delon) é encarregado por um industrial americano, Greenleaf,  de trazer seu filho Philippe (Maurice Ronet)da Itália, onde este leva uma vida ociosaem companhia da amante, Marge (Marie Laforet). Tom mata Philipe quando estão a sós no iate deste e assume a identidade dele. Um amigo de Philippe descobre tudo. Tom o mata, fazendo crer que foi Philippe o assassino. Tom reencontra Marge e se torna seu amante, após convencê-la de que Philippe a esquecera. Porém, o iate, içado do mar, faz surgir o cadáver de Philippe, que ficara preso no casco. Tom é desmascarado e preso. A história (baseada no romance de Patricia Highsmith) desse crime supostamente perfeito serve de pretexto para um drama policial de suspense muto bem-feito, um passeio turístico por uma Itália admiravelmente fotografada em cores, e cenas ambíguas, nas quais os protagonistas parecem jogar um eterno jogo de gato e rato. Philippe compreende logo as intenções de Tom, mas não acredita realmente que esse ser que ele despreza esteja à altura dessas intenções. Ele mesmo provoca a morte e cai, surpreso. O assassino Tom fica fascinado pela personalidade de Philippe e, mais do que tomar posse de sua fortuna e de seus bens pessoais, quer se apoderar de sua identidade. É um indivíduo obcecado pelo desejo de ser um outro.

FILMES DE EXPLORAÇÃO TENDO COMO TEMA A JUVENTUDE

Filme de exploração é um filme que tenta obter sucesso financeiro explorando tendências atuais, o gôsto de um público específico ou conteúdo chocante. Os filmes refletindo as expectativas e os anseios da juventude (teenpics ou juve movies) eram de três tipos: musicais, filmes sobre delinquentes juvenis e os chamados filmes de praia (beach movies). Quando a indústria do disco lançou o rock (uma frenética combinação da country-music e do boogie-woogie brancos com o rhythm and blues negro) foi tiro e queda: excitados principalmente pela sua batida enfática e potente, os jovens aderiram em massa à nova músicaEm essência o rock proporcionou aos jovens adolescentes da classe média não só uma forma de excitação, mas também a oportunidade de manifestar o seu descontentamento contra alguns princípios da cultura dominante e, adquirindo um senso de identidade grupal, atacar muitas das instituições que ajudavam a controlá-los.

Entretanto, os jovens tinham um problema. Pais, professores e párocos todos diziam que o rock era ruim para eles. A maioria dos adultos, acostumada com a estrutura hierárquica do local de trabalho e do lar e com o clima social conformista, achava que esta música produzia uma reação espontânea e sensual alarmante em seus filhos. O antagonismo dos adultos contra a música de rock também refletia o racismo inerente da época. Tendo percebido que a música de rock era fundamentalmente negra, tanto em sua origem como em sua natureza, a maioria dos pais brancos julgaram-na bestial e subumana. Muitos porta-vozes governamentais, religiosos e educacionais compartilharam desses sentimentos, caracterizando a música como imoral e pecaminosa – e seus adeptos como incapazes e indolentes delinquentes juvenis. Porém os jovens desconfiavam da infalibilidade dos mais velhos e sabiam que, ouvindo a música do rock, se sentiam bem.

Sementes de Violência

Ao Balanço das Horas

O cinema se aproveitou disso e, após ter surgido pela primeira vez na tela como um ingrediente incidental de um filme sério, Sementes de Violência / The Blackboard Jungle / 1955 (Dir: Richard Brooks), onde foi usado para simbolizar a rebelião juvenil contra a autoridade escolar, o rock foi tema do primeiro filme musical de exploração da juventude, Ao Balanço das Horas / Rock Around the Clock / 1956 (Dir: Fred F. Sears), produzido por Sam Katzman para a Columbia. Imediatamente imitado pela AIP por Roger Corman (Rock All Night) e Edward L. Cahn (Shake, Rattle and Roll), o filme da Columbia estimulou a produção de vários outros sobre o assunto (v. g. Curvas e Requebros / Rock, Pretty Baby (Dir: Richard Bartlett), Ritmo Alucinante / Rock, Rock, Rock (Dir: Will Price), Música Alucinante / Don’t Knock the Rock (Dir: Fred F. Sears), todos esses filmes realizados em 1957. Os filmes de rock enlouqueceram a mocidade de todo o mundo. Em várias cidades, a polícia foi obrigada a intervir: na saída das sessões os “fãs” dançavam nas ruas e pareciam tomados de histeria.  Os artistas que interpretavam a música alucinante se tornaram os símbolos da juventude. Sua atitude apaixonada e furiosa em cena, o ritmo envolvente de suas músicas e uma sábia propaganda contribuíram para impor a novidade.

O Selvagem

Juventude Transviada

Menos de um ano após o aparecimento dos musicais de rock, surgiu um segundo gênero que mostrava uma juventude mais selvagem, envolvida em sexo e drogas: o filme de exploração sobre delinquentes juvenis. Em todos os filmes deste tipo nota-se a influência de O Selvagem / The Wild One / 1954 (Dir: Laslo Benedek), o filme de motocicleta original com Marlon Brando e Lee Marvin, e de Juventude Transviada / Rebel Without a Cause / 1955 (Dir: Nicholas Ray), imortalizado pela interpretação fértil de James Dean; porém não havia tanta preocupação com o conteúdo. Raramente os realizadores procuravam explicar as causas da delinquência – lares desfeitos, pais hipócritas etc. -, pois tal protocolo não era exigido pela AIP (American International Pictures) e pela Allied, as companhias produtoras que mais fizeram esta espécie de filme. Nos filmes B de exploração sobre jovens transviados, o moço mau não vende drogas para crianças na escola ou atropela pessoas idosas com o seu carro porque seu pai não o compreende. Ele faz isto simplesmente porque é mau, e é isso que se espera que os rapazes maus façam.

Escola do Vício

O primeiro exemplar do gênero, Escola do Vício / High School Confidential / 1958 (Dir: Jack Arnold), tratando dos estragos causados pela marijuana (e pelo rock) em uma universidade americana, no entanto não foi feito pelas produtoras mencionadas, mas sim pelo produtor Albert Zugsmith para a MGM, e era um pouquinho melhor do que os congêneres, apesar de certos aspectos irreais da história. A AIP fez, por exemplo, Hot Rod Girl / 1956 e Reform School Girl / 1957 e a Allied, também por exemplo, Hot Rod Rumble / 1956 e Sangue na Estrada / Hot Car Girl / 1957.

A Praia dos Amores

Em 1963, a AIP encontrou um novo filão com A Praia dos Amores / Beach Party, inaugurado o ciclo dos chamados filmes de praia, verdadeiras minas de ouro quando exibidos nos drive-ins durante o verão. Quando perguntaram a William Asher, diretor do primeiro e de vários outros filmes de praia (A Praia dos Biquínis / Bikini Beach / 1964, Quanto Mais Músculos Melhor / Muscle Beach Party / 1964, Folias na Praia / Beach Blanket Bingo / 1965, Como Rechear um Biquíni / How to Stuff a Wild Bikini / 1965), porque a companhia trocou as guerras de bandos de transviados pelas arruaças menos selvagens na praia, ele respondeu: “O nosso público está cansado da delinquência juvenil. Ninguém quer ver desordem e confusão nos guetos da cidade se pode ver a mesma coisa na praia de Malibu”.

Gidget

Os grandes estúdios já haviam demonstrado que os chamados clean teenpics como Primavera do Amor / April Love / 1957 (Dir: Henry Levin) ou Maldosamente Ingênua / Gidget / 1959 (Dir: Paul Wendkos), proporcionando um divertimento mais ingênuo debaixo do so, eram indubitáveis campeões de bilheteria, e não levou muito tempo para a AIP entrar nesta jogada.

Em uma entrevista, Arkoff explicou: “Nos velhos tempos, até o final dos anos 50, não havia filmes de juventude, como nós o entendemos. Fundamentalmente eram filmes do tipo Disney para crianças e havia também os filmes para a família.  Um filme de juventude típico teria sido um filme de Andy Hardy. Veja só. O pai de Andy (Mickey Rooney) era interpretado por Lewis Stone, uma figura paterna impressionante que, por acaso, também era um juiz. Pense nisso. Andy diz para o pai: ‘Vou fazer tal e tal coisa’. O pai aconselha: ‘É melhor você não fazer, vai se meter em uma encrenca’. Andy e seus amigos partem, metem-se em uma encrenca e agora Andy volta à presença do pai e fala: ‘Papai você disse para não fazermos isso. Agora estamos em apuros e eu espero que você nos ajude’. E então o juiz diz, em um tom severo, mas simpático: ‘Está certo, vou livrá-lo dessa encrenca’, o que ele faz.’Papai, diz Andy, olhando para os olhos de seu progenitor, ‘nunca mais vou fazer isso’. E toda a platéia adulta exulava.

Conclusão de Arkoff: “Isto é o que era um filme de juventude essencialmente – uma lição de moral, uma preleção. Mas no final da década de 1950, os garotos estavam além das preleções … Quando fizemos os filmes de praia, tais filmes não eram basicamente sobre a praia.  Eles se passavam na praia, mas basicamente eram sobre os garotos que não tinham pais. Por quê? Porque eram filmes de juventude feitos para a juventude. Não a juventude de Disney, não a juventude para a qual todos esses moralistas, estas solteironas queriam que fossem os filmes “família”.  Fundamentalmente o que estávamos fazendo eram filmes para adolescentes que não queriam ter uma lição de moral enfiada em suas gargantas. Isto era verdade não apenas com relação aos nossos filmes, mas na própria vida, porque foi nos anos 60 que a juventude começou a agir por conta própria”.

EUGEN SCHÜFFTAN

Nascido em 1893 na cidade de Breslau, Silesia (hoje Wroclaw, Polônia) e falecido em 1977 na cidade de Nova York, USA, ele emprestou seu nome para uma técnica de efeitos especiais que utilizava miniaturas e espelhos para criar a ilusão de cenários em tamanho real. O “efeito Schüfftan”, usado com êxito em Metrópolis / Metropolis / 1927 de Fritz Lang precedeu e foi substituído pela moderna tela azul. Schüfftan depois tornou-se um diretor de fotografia muito procurado na Europa e Hollywood.

Eugen Schüfftan

Metrópolis

Filho de um operário de fábrica, ingressou numa escola de arte em Breslau e começou como pintor Impressionista em Berlim. Ele se voltou para o Expressionismo, trabalhando como arquiteto e como pintor de cenários, antes de seu envolvimento em filmes. Depois, entrou em contato com a indústria cinematográfica através de professor da escola de arte, o arquiteto e cenógrafo Hans Poelzig. Juntamente com o técnico Ernst Kunstmann, Schüfftan patenteou um equipamento de câmera para combinar objetos reais e atores com modelos. O “efeito Schüfftan” foi vendido internacionalmente – enquanto a Ufa o comprava na Alemanha, em Hollywood a Universal adotou o conceito. Shüfftan passou muito tempo supervisionando o uso de suas técnicas ao redor do mundo. Nesta capacidade, trabalhou com Abel Gance na sua obra-prima Napoleão / Napoleon / 1927.

Napoleão

No término dos anos vinte Schüfftan perdeu o interesse pela sua invenção e se tornou um diretor de fotografia. Ligado a círculos de filmes de arte, filmou o semi-documentário de Robert Siodmak Menschen Am Sonntag / 1929 em locação, parcialmente com uma câmera escondida. Ele contribuiu com imagens deslumbrantes para uma série de filmes no final dos anos vinte e início dos anos trinta, inclusive Abschied / 1930 de Siodmak, que visualmente antecipava o estilo dos filmes franceses do encerrar da década de trinta, e a fantasia do deserto de G.W.Pabst Atlântida / Die Herrin Von Atlantis / 1932.

Abschied

Seu único filme de longa-metragem como diretor, Das Ekel / 1931 era uma sátira sobre o modo de vida da classe média. Em 1933, Schüfftan deixou a Alemanha, trabalhando principalmente na França, onde foi fundamental na criação do estilo do realismo poético de filmes como Cais das Sombras / Quai des Brumes / 1938 de Marcel Carné e Sem Amanhã / Sans Lendemain / 1939 de Max Ophuls.

Jean Gabin e Michèle Morgan em Cais das Sombras

Edwige Feuillère em Sem Amanhâ

Emigrando para os Estados Unidos em 1940, Schüfftan teve dificuldade de arrumar emprego como cinegrafista devido aos regulamentos rigorosos da American Society of Cinematographer. Diretores alemães no exílio, como Douglas Sirk (Detlef Sierck) e Robert Siodmak muitas vezes o empregaram sob outra descrição de trabalho, tal como “camera supervisor”. Por exemplo em: O Capanga de Hitler / Hitler´s Madman  / 1943; Uma Voz na Tormenta / Voice in the Wind / 1944; O Que Matou por Amor / Summer Storm / 1944; O Tempo é uma uma Ilusão /  It Happened Tomorrow / 1944,   etc.

Os Olhos sem Rosto

Paul Newman em Desafio à Corrupção

Após a Segunda Guerra Mundial, Schüfftan tornou-se cidadão americano, mas preferiu trabalhar na Europa, particularmente na França, onde dirigiu uma série de documentários curtos; porém trabalhou também na Itália, Suiça e Alemanha Ocidental. Entre seus derradeiros filmes, de particular importância foram suas imagens atmosféricas para o filme de horror de Georges Franju Os Olhos Sem Rosto / Les Yeux Sans Visage / 1960. Em1961 ele ganhou um Oscar por sua fotografia preto e branco em Cinemascope para o filme de Robert Rossen Desafio à Corrupção / The Hustler. Ele se aposentou no final dos anos sessenta.

 

RAYMOND CHANDLER

Ele foi um dos mestres do romance policial, talvez o que melhor conseguiu a síntese entre o policial clássico e o detetive hard boiled, insolente e esquentado. O modelo de investigador superdotado intelectualmente, de postura britânica mesmo quando não era inglês (v. g. Sherlock Holmes, Poirot), que circula em ambientes fechados, dominou a ficção detetivesca até os anos 30, quando Dashiell Hammett revolucionou a substância e a forma do romance policial inserindo-lhe ação, sexo, violência e escrevendo em uma prosa coloquial, rápida e objetiva, tipicamente americana. Interessando-se mais pela caracterização e atmosfera do que pela intriga, pôs de lado esquema artificial do quebra-cabeça e trouxe o crime para as ruas sórdidas da cidade grande, onde geralmente ocorre. Verbalmente mais ousado do que Hammett, Chandler produziu uma prosa sombriamente lírica que transformou suas histórias em “metáforas do pesadelo urbano”. Ele colocou esses “pesadelos urbanos” no sul da Califórnia, onde seu herói, Philip Marlowe, apresentado em The Big Sleep e reaparecendo em Farewell my Lovely e The Lady in the Lake, embrenha-se em uma selva de criaturas predatórias, obcecadas pela busca do dinheiro e do poder, que procuram obter através da violência e da corrupção.

Raymond Chandler

Filho de um quaker americano e de uma irlandesa igualmente quaker, Raymond Thorton Chandler (1888-1959), após o divórcio de seus progenitores, partiu aos oito anos de idade com sua mãe para Londres. Sólidos estudos que ele completou na França e na Alemanha o conduziram para um emprego no Foreign Office. Foi a época em que frequentou a casa de Virginia Woolf e escreveu no The Spectator. A guerra irrompeu quando ele voltou para os Estados Unidos. Ele alistou no exército canadense e combateu na frente francesa. De retorno aos Estados Unidos, exerceu diversas profissões, casou-se com Pearl Bowen, dezessete anos mais velha do que ele, mas, em 1932, durante a Depressão, perdeu seu posto na indústria petrolífera. Desde então, pôs-se a escrever. Sua primeira novela, Blackmailers Don’t Shoot, com o detetive Mallory, apareceu na revista Black Mask em 1933. Chandler se tornou colaborador assíduo da Black Mask e da Detective Monthly. Em 1939, publica seu primeiro romance, The Big Sleep. O Mallory das novelas tornou-se Philip Marlowe, herói de um romance que causou sensação pelo seu tom e pela sua construção.

As obras-primas vão se sucedendo entre 1940 (Farewell my Lovely) e 1943 (The Lady in the Lake). Depois, Chandler parte para Hollywood. Ele escreve o roteiro original de A Dália Azul / The Blue Dahlia / 1946, adapta James M. Cain no roteiro de Pacto de Sangue / Double Indemnity / 1944 e Patricia Highsmith no roteiro de Pacto Sinistro / Strangers on a Train / 1951. As transposições cinematográficas de suas obras se multiplicam:  Farewell my Lovely  feita por Edward Dmytryk para Até à Vista Querida / Murder my Sweet / 1944; The Big Sleep feita por Howard Hawks para À Beira do Abismo / The Big Sleep /1946; The Lady in the Lake feita por Robert Montgomery para A Dama no Lago / The Lady in the Lake / 1947; The Brasher Doubloon feita por John Brahm para A Moeda Trágica / The High Window / 1947; The Long Goodbye / 1973 feita por Robert Altman para O Perigoso Adeus / The Long Goodbye / 1973.

Dick Powell e Claire Trevor em Até à Vista Querida

Outra cena de Até à Vista Querida

Em Até à Vista Querida, o noir look aparece, pela primeira vez, completamente realizado. A intriga é um tanto complicada contém muitas pistas falsas e reviravoltas, para fazer com que o público fique tão desnorteado quanto o investigador, porém o maior fascínio do filme não está no enredo delirante, mas nos diálogos e na atmosfera. Captando maravilhosamente o espírito da ficção de Raymond Chandler e conservando uma porção satisfatória de sua prosa excepcional, o diretor Edward Dmytryk e seu roteirista John Paxton escolheram a melhor construção narrativa (narração na primeira pessoa, voz over, retrospecto) e forma visual (expressionista) para acentuar a intensa subjetividade do protagonista e cria o clima mais adequado à história, obtendo uma mistura perfeita da tradição hard-boiled como o estilo germânico. Chandler considerava Dick Powell o equivalente cinematográfico mais próximo de sua concepção de Philip Marlowe. O ator está surpreendentemente bem no papel, abandonando sua personalidade jovial e alegre dos musicais, para se transformar em um detetive tough guy clássico. Na pele de Marlowe, ele faz comentários sobre personagens, ambientes e acontecimentos, expressando sua visão dark por meio de piadas sarcásticas e descrições hiperbólicas de muito sabor. Quando Marlowe leva uma pancada na cabeça, a voz over do detetive recorda como “um poço negro se abriu diante dos meus pés. Caí nele. Não tinha fundo” e, ao mesmo tempo, uma mancha preta inunda toda a tela, escurecendo a cena. Em outro instante, ao recordar do torpor provocado pela droga, ele fala de uma fumaça e de uma teia tecida por mil aranhas”, que obscurecem sua visão enquanto o observamos através deum vidro embaciado. Um pouco adiante, estica as mãos em direção à câmera e vemos seus dedos deformados, parecendo “uma penca de bananas com jeito de dedos”. Nessas tomadas, o diretor emprega todo o vocabulário fílmico – montagem rápida, sobreimpressões, cortinas giratórias, lente grande angular, filtro fosco, primeiríssimo plano (v. g. a seringa do doutor), justaposição de personagens em escalas diferentes- para expressar o estado mental confuso e paranóico do protagonista. A atmosfera de pesadelo, as sombras ameaçadoras e os fortes contrastes de iluminação dão a Até a Vista Querida uma qualidade visual que se tornou característica nos filmes noirs do período áureo. E não falta a presença da fêmea fatal, Velma (interpretada por Caire Trevor).

RUDOLPH MATÉ

Rudolf Matheh (1898 -1964) nasceu na Cracóvia, Polonia, formou-se pela Universidade de Budapeste e iniciou sua carreira no cinema como assistente de cameraman para Alexander Korda em Budapeste. Depois trabalhou em Viena e Berlim como aprendiz de Karl Freund e assistente de Erich Pommer.

Rudolph Maté

Sua carreira cinematográfica pode ser dividida quase que em três partes: na primeira parte ele trabalhou na Europa como cameraman em grandes filmes como por exemplo O Martírio de Joana D’Arc / La Passion de Jeanne d’Arc / 1928 e O Vampiro / Vampyr / 1932 de Carl Theodor Dreyer; O Último Milionário / Le Dernier Milliardaire / 1934 de René Clair; Coração de Apache / Liliom / 1934 de Fritz Lang. Então, em 1935, foi para Hollywood e, na mesma função, ganhou cinco indicações para o Oscar consecutivas entre 1940 e 1944 (fotografias de Correspondente Estrangeiro / Foreign Correspondent; Lady Hamilton, a Divina Dama / That Hamilton Woman / Ídolo, Amante e Herói / Pride of the Yankees; Sahara / Sahara; Modelos / Cover Girl), distinguindo-se também seu trabalho em Endereço Desconhecido / Address Unknown / 1944, Gilda / Gilda / 1946 e sua participação não creditada em A Dama de Shanghai / The Lady from Shanghai /  1947. Na terceira fase, Maté passou para a direção, principalmente de filmes “B” de 1947 até sua morte em 1964.

Cena de Correspondente Estrangeiro

Em 1935 Maté deixou a Alemanha Nazista e foi para os Estados Unidos. William Wyler deu-lhe a primeira grande chance em Hollywood, contratando-o para fotografar Fogo de Outono / Dodsworth / 1936 e Meu Filho é Meu Rival / Come and Get It / 1936. Em pouco tempo Maté alcançou o topo dos diretores de fotografia de Hollywood sob as ordens de Alfred Hitchcock em Correspondente Estrangeiro / Foreign Correspondent / 1940.

Após a Segunda Guerra Mundial tornou-se diretor. Em 1947 ele entrou para a terceira fase de sua carreira dirigindo a comédia romântica Tem Que Ser Você / It Had to Be You. Seguiram-se, distinguindo-se entre filmes de qualidade artística variada, o drama criminal Passado Tenebroso / The Dark Past / 1948; a aventura de ficção científica O Fim do Mundo / When Worlds Collide / 1951 premiado com o Oscar de Melhores Efeitos Especiais e hoje considerado um clássico no gênero); o western Um Pecado em Cada Alma / The Violent Men / 1955 e, principalmente, seus dois filmes noirs, Com As Horas Contadas / D.O.A. / 1949 e Rastro Sangrento / Union Station / 1950. Considero estes dois últimos os melhores de sua filmografia.

Edmond O’Brien em Com as Horas Contadas

COM AS HORAS CONTADAS

Bigelow (Edmond O´Brien) chega cambaleante em uma delegacia de polícia, para dar parte de seu próprio homicídio. Os policiais ouvem sua história. Ele é um perito-contador e tabelião que exerce seu ofício na cidade desértica de Banning. Bigelow decide tirar férias em San Francisco para fugir do tédio e também de um comprometimento mais sério com a namorada e secretária Paula Gibson (Pamela Britton). Após passar uma noite divertida em uma festa, entra em um bar, onde um indivíduo misterioso despeja algo em um copo, trocando-o com o dele. No dia seguinte, sente-se mal. Os médicos lhe dizem que sofreu um envenenamento por radiação e tem apenas poucos dias de vida. Bigelow deixa o hospital com a firme determinação de encontrar seu assassino.

O filme abre com a câmera seguindo Bigelow através de uma sucessão de escuros e intermináveis corredores de uma delegacia. Não vemos seu rosto, somente suas costas exaustas e passos firmes. Com aquela força que as pessoas parecem adquirir quando estão perto da morte ele consegue chegar ao Departamento de Homicídios. “Quero dar parte de um assassinato”, diz para o delegado de plantão. “Quem é que foi morto?”, pergunta o policial. Bigelow, em close-up, responde: “Fui eu”. Bigelow não sabe como, quando, onde ou por que foi morto e se torna, ao mesmo tempo, o investigador e a vítima de seu próprio assassinato.  Usa as últimas energias que lhe restam para descobrir o assassino, porém trata-se de um esforço inútil, porque seu trinfo como herói-detetive coincide com sua morte e o motivo do crime foi arbitrário e impessoal.

Em nenhum outro filme noir estiveram tão presentes o absurdo e o caos emocional. Bigelow é um homem desnorteado com a notícia de sua morte e acabou de descobrir que o mundo não tem sentido. Quando os médicos anunciam o diagnóstico, ele os chama de loucos e não quer encarar a realidade. Então, corre como um louco pelas ruas de San Franciso, como se houvesse algum lugar para onde pudesse ir. Ao terminar sua história, Bigelow cai da cadeira tentando pronunciar o nome de Paula e morre. Um policial arquiva o caso, carimbando as iniciais D.O. A. (Dead on Arrival / Morto ao Chegar).

William Holden em Rastro Sangrento

RASTRO SANGRENTO

Viajando para Chicago, Joyce Willecombe (Nancy Olson) nota que um passageiro está armado e comunica o fato ao chefe do trem. O tenente Wiliam Calhoun do Serviço de Segurança da Union Station e o inspetor Donnelly da polícia são avisados. O suspeito, Joe Beacom Lyle Betger), guarda uma mala em um dos armários da estação. Mais tarde, Calhoun manda abrir a mala e Joyce reconhece as roupas de Lorna Murchison (Allene Roberts), a filha cega de seu patrão, Henry Murchison (Herbert Heyes). Tudo indica que se trata de um sequestro e a caça aos sequestradores tem início.

Perfeitamente ritmada e bastante precisa, a ação transcorre quase exclusivamente na grande estação ferroviária de Chicago, incluindo uma complexa rede de túneis subterrâneos com quilômetros de tubos e fios eletrificados, dos quais os usuários não têm conhecimento. Utilizando a fórmula dos filmes de procedimentos policiais, no caso as atividades conjuntas dos seguranças da estra de ferro e da polícia, o espetáculo tem muitas cenas de brutalidade, que lembram as dos melhores filmes noirs: a morte de um dos  bandidos sob as patas dos animais alvoraçados; o interrogatório de outro (“Faça com que pareça um acidente”, diz o inspetor Donnelly, ameaçando jogá-lo na frente de um trem); o instante em que Beacom tira  amordaça da boca de Lorna, enrola a mão com o pano e esmurra a pobre cega; o corpo de sua amante  Marge (Jan Sterling) rolando da calçada para a rua depois deter sido cruelmente abandonada pelo amante. Nos momentos culminantes, Maté constrói um bom suspense quando, na estação totalmente vigiada pelos detetives, Beacom, disfarçado de ferroviário, usa um mensageiro para apanhar a mala com o dinheiro, seguindo-se depois uma formidável perseguição pelos túneis subterrâneos enquanto a cega se arrasta pelos trilhos perigosos, gritando por socorro.

CLIFTON WEBB

Webb Parmalee Hollenbeck (1889-1966,) nasceu em Indianápolis,Indiana, filho único de Jacob Grant Hollenbeck e Mabel A. Parmalee. Seus pais se separaram em 1891, pouco depois do nascimento de seu filho. Em 1892, a mãe de Webb, apresentando-se agora como Maybelle, foi para Nova Yok com seu “pequeno Webb”, como ela o chamou pelo resto de sua vida.

Clifton Webb

Aos treze anos de idade, Webb largou a escola primária para estudar pintura e música. Aos dezenove anos, usando seu novo nome profissional, Clifton Webb, tornou-se um dos principais dançarinos de salão em casas noturnas de Nova York, dançando muitas vezes em parceria com Bonnie Glass (que depois o trocaria por Rudolph Valentino); eles atuariam em cerca de uma dúzia de operetas. A partir de 1913  Webb participou de musicais da Broadway, peças teatrais (The Importance of Being Earnest de Oscar Wilde e Blithe Spirit e Present Laughter de Noel Coward), vaudeville, e como coadjuvante em seis filmes: dançando uma pavana em National Red Cross Pageant / 1917, filme de propaganda de 50 minutos para o esforço de guerra (Dir: Christy Cabanne); Polly With a Past / 1920 (Dir: Leander De Cordova); Let Not Man Put Asunder / 1924 (Dir: J. Stuart Blackton); New Toys / 1925 (Dir: J. Stuart Blackton); The Heart of a Siren / 1925 (Dir: Phil Rosen); o short da Vitaphone de 10 minutos, The Still Alarm / 1930 (Dir: Roy Mack), reproduzindo na tela um esquete da Broadway no qual contracenava com Fred Allen.

Clifton Webb e Gene Tierney em Laura

Após vários anos de ausência, ele retornou à tela no filme Laura / Laura / 1944 (Dir: Otto Preminger) como o vilão Waldo Lydecker, influente jornalista quinquagenário, mentor de Laura Hunt (Gene Tierney), diretora de uma agência de propaganda, que é assassinada. Lydecker considerava Laura, não apenas como sua maior “criação!”, mas também propriedade pessoal. Frágil e refinado, com senso de humor perverso, sempre adorou Laura à distância, contentando-se em afastar os possíveis rivais. Como todo psicótico quer ter controle absoluto sobre o objeto de sua paixão. Prefere ver a amada morta, do que viva nos braços de outro homem. Webb, conscientemente ou não, dá um toque efeminado ao personagem, transmitindo seu narcisismo (“No meu caso, auto-absorção é plenamente justificada. Nunca descobrí um assunto tão digno de minha atenção”) e insolência (“Não uso caneta. Escrevo com uma pena de ganso embebida de veneno”). Webb foi escalado para o filme por Otto Preminger sob a objeção do produtor Darryl F. Zanuck e acabou sendo agraciado com uma indicação para o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante.

Clifton Webb em Envolto nas Sombras

Assinou então um contrato de longa duração com a Fox, e só trabalharia para este estúdio pelo resto de sua carreira. Seu primeiro filme sob este novo contrato foi Envolto nas Sombras / The Dark Corner / 1946 (Dir: Henry Hathaway), no qual faz novamente um vilão suave, o mercador de arte Hardy Cathcart que, tal como Waldo Lydecker, exprime seu sarcasmo por meio de frases saborosas. Dirigindo-se a sua mulher Mari (Cathy Dows), ele diz: “Meu amor por você é a única enfermidade que contraí desde as doenças normais de criança. E é incurável”. Observando os convidados na sua festa, comenta com desdém: “É uma nauseante mistura de Park Avenue e Broadway – isto prova que sou um liberal”. Ao contemplar um quadro, exclama pedantemente: “O prazer da arte é o único êxtase restante que não é ilegal nem imoral”.

John Payne, Herbert Marshal, Gene Tierney e Webb em O Fio da Navalha

No mesmo ano, Webb voltou a se reunir com Gene Tierney em O Fio da Navalha / The Razor’s Edge / 1946 (Dir: Edmund Goulding), baseado no romance homônimo de Somerset Maugham, e foi indicado mais uma vez para o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante. Webb faz o papel de Elliott Templeton, o tio esnobe de Isabel, protagonista feminina interpretada por Tierney. Elliott é um americano rico que adora viver em Paris porque acredita que é único lugar para um homem civilizado morar. É um socialite que valoriza aparências, classe e prestígio. Festeiro inveterado, dá grande importância em ser convidado para uma festa da qual vale a pena participar. Webb compôe o personagem de forma admirável, sendo inesquecível aquela cena em que,  no seu leito de morte, desabafa para Herbert Marshal, que faz o papel de Somerset Maugham no filme: “Eu não sou um homem que as pessoas ignoram. Aquela velha bruxa. Ela não me convidou para a maior festa da minha carreira”. E cai no chôro.

Webb em Ama-Sêca por Acaso

Webb foi subsequentemente estereotipado como um solteirão atrevido e pedante e conquistou grande popularidade como o pomposo ama-sêca, Mr. Belvedere, na comédia muito divertida Ama-Sêca por Acaso / Sitting Pretty / 1948 e suas continuações (o Gênio vai para a Escola / Mr. Belvedere Goes to College / 1949; Mr. Belvedere, o Gênio no Asilo / Mr. Belvedere Rings the Bell / 1951). Pela sua atuação em Ama-Sêca por Acaso Webb foi indicado desta vez para o Oscar de Melhor Ator num papel principal.

Clifton Webb em O Homem Que Nunca Existiu

Webb fez mais 15 filmes: Papai Batuta / Cheaper by the Dozen / 1950; Apuros de um Anjo / For Heaven’s Sake / 1950; O Gênio e os Fugitivos / Elopment / 1951; A Família do Gênio / Belles on their Toes / 1952 (breve aparição de Webb, não creditado); O Gênio na Televisão / Dreamboat / 1952; A Marcha Triunfal / Stars and Stripes Forever  / 1953 (cinebiografia do compositor John Philip Souza); Náufragos do Titanic / Titanic / 1953; Duro na Queda / Mr. Scoutmaster / 1953; A Fonte dos Desejos / Three Coins in the Fountain / 1954); O Mundo é da Mulher / Woman´s World / 1954; O Homem Que Nunca Existiu / The Man Who Never Was / 1956; A Lenda da Estátua Nua / Boy on a Dolphin / 1957; Tudo Azul com o Barba Azul / The Remarkable Mr. Pennypacker / 1959; Amantes em Férias / Holiday for Lovers / 1959; Tentação Diabólica / Satan Never Sleeps / 1962. O melhor de todos foi O Homem Que Nunca Existiu, thriller de espionagem, dirigido por Ronald Neame, baseado na história verídica de um plano da Inteligência Militar Britânica engendrado pelo Tenente Comandante Ewen Montagu, para enganar os alemães, fazendo-os crer que a invasão da Sicília ocorreria em outro lugar. No papel do comandante Montagu, Webb brilha com sua classe e inteligência habituais, predicados que ele sempre manifestou mesmo nos seus filmes menos significativos.