Philip N. Karlstein (1908-1982) nasceu em Chicago, filho da atriz Lillian O´Brien do teatro Yddish. Após completar seu curso secundário, frequentou o curso de pintura no Chicago’s Art Institute e tentou seguir uma carreira de cantor e dançarino, acedendo finalmente ao desejo do pai, que desejava que ele fosse advogado. Enquanto estudava Direito na Loyola Marymount University na Califórnia, trabalhou em várias funções no estúdio da Universal e gradualmente passou de aderecista a assistente de direção (começando em A Volta de Tom / Destry Rides Again / 1932, estrelado por Tom Mix), montador, e finalmente diretor em 1944. Depois Lewis fez filmes para a Monogram (v. g. da série Charlie Chan, Bowery Boys, The Shadow), Columbia (entre eles um western interessante envolvendo a figura do escritor Robert Louis Stevenson, O Filão de Prata / Adventures in Silverado / 1948), Edward Small Productions, e outras companhias menores.
Seus melhores filmes foram os dramas criminais violentos e visualmente insinuantes, narrados em um estilo seco e objetivo: Os Quatro Desconhecidos / Kansas City Confidential / 1952, A Morte Ronda o Cais / 99 River Street / 1953, A Ilha do Inferno / Hell’s Island / 1954 e Cidade do Vício / The Phenix City Story / 1955. Karlson especializou-se nas cenas de ação brutais e no uso eficiente do close up para causar impacto nos momentos apropriados. Gostava de colocar em primeiro plano os rostos esmurrados e ensanguentados, porque achava que a violência devia ser mostrada tal como acontece na realidade (“Quando as pessoas são alvejadas, elas sangram”) e, depois de uma luta filmada pelo diretor, o público realmente tinha a noção de como duas pessoas podiam ser tão destrutivas. Seus heróis sofriam os danos físicos e psicológicos durante algum tempo, até que não aguentavam mais e reagiam com um furor irracional – para Karlson, os criminosos são a escória da sociedade e o crime deve ser totalmente destruído, daí a necessidade da contraviolência sempre presente nos seus filmes.
Em Os Quatro Desconhecidos desgostoso com os escassos proventos de sua aposentadoria e por ter sido compelido a requerê-la, Timothy Foster (Preston Foster), um policial de Kansas City, faz chantagem com três delinquentes – Harris (Jack Elam), Kane (Neville Brand) e Tony (Lee Van Cleef) – obrigando-os a executar seus planos para o assalto a um carro forte. Foster mantém o anonimato e os homens usam máscaras para que um não conheça a identidade do outro. Os ladrões utilizam uma van na fuga. Os policiais prendem o motorista de um carro idêntico, um ex-presidiário chamado Joe Rolfe (John Payne), interrogam-no brutalmente sobre o roubo e, depois o soltam, ao verificarem o engano. Rolfe obtém uma pista e chega à presença de Foster, desmascarando-o. Foster e Rolfe são homens amargurados. Foster define claramente os motivos pelos quais se tornou um criminoso: aposentou-se com proventos irrisórios, após passar vinte anos combatendo o crime, “vendo os bandidos sempre subindo na vida. Agora, quer uma compensação e vingança, inconformado com seu afastamento compulsório. Rolfe, por sua vez, foi formado pela guerra. Acusado injustamente de assalto, interrogado sob as luzes fortes da delegacia, ouve o comentário do Promotor Público sobre sua pessoa para um dos guardas: “Ele ganhou uma Medalha de Bronze e uma de Púrpura”. E responde rapidamente: “Tente comprar uma xícara de café com elas”. Tal como outros heróis noir. Rolfe é vítima do destino. Ao ser confrontado por ele, Harris lhe diz: “Não tínhamos nada contra você. Nem o conhecíamos. Apenas aconteceu assim”. Karlson teve em mãos uma história original e soube conduzí-la com o vigor exigido, explorando muito bem os primeiros planos como naquelas cenas em que Foster contrata seus cúmplices e nas de violência de uma maneira geral.
Em A Morte Ronda o Cais o ex-pugilista Ernie Driscoll (John Payne) dirige um táxi para sobreviver. Sua esposa, Pauline (Peggie Castle), é amante de Victor Rawlings (Brad Dexter), que acabara de roubar umas jóias. Rawlings vai com Pauline à loja de um receptador, Christopher (Jay Adler) para vender as jóias. Rawlings mata Pauline e esconde o corpo no táxi de Ernie. Com o auxílio de uma amiga, Linda (Evelyn Keyes), Ernie localiza o assassino e, mesmo ferido, consegue dominá-lo. A polícia chega a tempo de impedir que Ernie mate Rawlings de pancada. O que dá qualidade noir ao espetáculo, além do tema do herói acusado injustamente, são as obsessões e as frustrações dos seus personagens, a confusão entre aparência e realidade, a amargura, o desespero. Ernie queria ser um campeão, e o fato de não ter sido o deixa angustiado. Pauline trabalha em uma loja de flores e tem um problema semelhante. Na sua mente, casou-se com um pugilista, em vez de se dedicar à vida artística. “Poderia ter sido uma estrela”, lamenta. Linda e Rawlings também sonham com o sucesso. Linda julga-se uma grande atriz. Rawlings deseja partir para a França. Todos fracassam. Ernie diz a Pauline: “Uma chance para chegar ao topo. É a coisa mais importante do mudo”. Esta é uma fantasia que o filme destrói. Linda e Ernie só adquirem o direito a uma nova vida, quando reconhecem que suas fantasias são impossíveis de serem realizadas, quando aceitam seus limites. A ambiguidade se manifesta desde a primeira cena, quando a tela mostra uma luta de boxe. A câmera recua e vemos que se trata apenas de um videotape do combate realizado há três anos. Ela recua mais um pouco e notamos a cabeça de Ernie, assistindo a transmissão atentamente, quase sem ouvir a voz de Pauline que o chama para jantar. Mais adiante, vemos a performance de Linda no teatro, enganando Ernie e a platéia, fazendo-os crer que matou um homem.
Em A Ilha do Inferno o ex-promotor público Mike Cormack (John Payne), que perdeu o emprego por ser alcoólatra e agora trabalha em um cassino, é contratado por Barzland (Francis L. Sullivan, um senhor aleijado de reputação duvidosa, para encontrar um rubi desaparecido. O motivo da escolha foi o fato de que sua ex-namorada Janet Martin (Mary Murphy) está envolvida com o homem que teria sabotado o avião que transportava a pedra preciosa. O filme começa de maneira original, com uma cena do final congelada, seguindo-se, depois de um corte também inusitado, o longo retrospecto. Se não fosse em cores, seria um filme noir, pois apresenta vários elementos típicos: trama complicada, narração em flashback e voz over, mulher fatal, violência, paixão. Alguém diz para o herói: “O amor é uma droga peculuar. Leva muito tempo para sair do seu sangue”.
Cidade do Vício é um dos filmes mais selvagens de Karlson, baseado em situações reais que ocorreram em Phenix City no Alabama, quando a cidade estava totalmente controlada por um sindicato de jogatina. A atmosfera de documentário dá aos fatos narrados uma impressão de autenticidade horripilante. O crime e a corrupção são mostrados com tanta crueza, são tão repulsivos (uma criança morta é jogada de um carro em movimento, um aleijado leva um tiro na boca), que o diretor não precisa fazer nenhum comentário explícito. A situação retratada no filme é uma metáfora para a apatia e o conformismo do cidadão americano médio. Apesar de uma vitória em pequena escala do jovem advogado John Patterson (Richard Kiley), o único que resolveu enfrentar os gângsteres, o filme termina com uma nota de desesperança e desespero. Além dos filmes citados também merecem destaque outro drama criminal, Escândalo / Scandal Sheet / 1952, e um western, Sangue de Pistoleiro / Gunman´s Walk / 1958.
No primeiro, após uma discussão com Charlotte (Rosemary DeCamp), a esposa que a abandonou anos atrás, Mark Chapman (Broderick Crawford), editor de um jornal de escândalos, agride-a, ela cai de mau jeito e morre. Steve Mc Cleary (John Derek), um jovem repórter discípulo de Chapman, e sua colega, Julie Allison (Donna Reed) cobrem o caso e, graças a um velho jornalista alcoólatra, Charlie Barnes (Henry O´Neill), que vem a ser assassinado por Chapman, acabam encontrando as provas de sua culpabilidade. Tal como no filme noir O Relógio Verde / The Big Clock / 1948 de John Farrow, um editor de publicação sensacionalista deixa seu principal repórter procurar um assassino que vem a ser ele próprio. No filme em questão, há uma outra ironia: Chapman ensinou tão bem seu método de jornalismo investigativo (embora marrom) para McCleary, que o dedicado discípulo acabou se tornando o instrumento de sua punição. O veterano homem de imprensa pode apenas observar com apreensão como a engrenagem que ele criou é manipulada pelo dinâmico pupilo e voltada contra si mesmo. Talvez este seja. O único traço noir no espetáculo, pois seu estilo é totalmente realista. Quando o cerco se fecha sobre o criminoso, temos a sensação de ter assistido a um fato real sem excessos sentimentais. A montagem concisa evidencia uma direção eficaz do princípio ao fim. Karlson soube também tirar bom proveito dos detalhes e do jogo fisionômico dos intérpretes, principalmente na cena da entrevista do mendigo com Chapman e na cena da morte de Barnes, esta última agraciada por um belo contraste de luz e sombra.
No segundo, Lee Hackett (Van Heflin), rancheiro poderoso e brutal, tem dois filhos, Ed (Tab Hunter) e Davey (James Darren), que ele tenta forjar à sua imagem. Enquanto Davey é avesso à violência, Ed se torna progressivamente um fora-da-lei. Todo começa quando, durante uma perseguição de uma égua selvagem, Ed causa a morte de um mestiço., irmão de Clee Chouard (Kathryn Grant), a moça por quem Davey se apaixonara. Acusado de assassinato pelo agente dos índios, Ed consegue se livrar de uma condenação graças ao falso depoimento de um chantagista, Silverts (Ray Teal). Porém, comete outros crimes e acaba sendo morto pelo próprio pai que, a essa altura, compreendera os erros cometidos na educação dos filhos. Antigo pioneiro, Lee manteve sua confiança nas armas de fogo e seu ódio dos índios. Um dos filhos herdou seu orgulho e sua pontaria, mas não o senso de honra: o outro, jovem pacífico, atraiu o desprezo paterno por ter se interessado por uma mestiça. Esse drama familiar é retratado com vigor por Karlson, sempre atento para que a ação seja movimentada.
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