COELHO PERNALONGA E O HOMEM DAS MIL VOZES

junho 26, 2024

No decorrer das décadas de 30, 40 e 50, a Warner Bros. organizou uma equipe de talentosos artistas, que produziram centenas de excelentes “cartoons”, divididos em dois grupos: os “Looney Tunes” e os “Merry Melodies”, dando-lhes uma feição diferente da que faziam suas concorrentes. Estas duas séries de desenhos animados foram iniciadas por Hugh Harman e Rudolf Ising, sob a supervisão do produtor Leon Schlesinger, aproveitando as fórmulas usuais de Walt Disney com quem havia trabalhado.

Quando saíram da Warner, a maioria dos “Merry Melodies” passou a ser dirigida por Fritz Freleng, que, no entanto, não lhes deu maior expressão do que os antecessores, seguindo a mesma linha artística. Porém os novos principais diretores das “Looney Tunes”, Tex Avery e, depois, Robert Clampett, foram inventivos e não se deixaram influenciar pelo pai do Mickey Mouse. Assim, criaram “gags” mais surrealistas, deram um ritmo rapidíssimo à movimentação dos personagens e usaram de modo sofisticado as distorções, para acentuar o estado de espírito deles, conferindo-lhes uma vivacidade incomum e ampliando os horizontes emocionais da animação cinematogrática.

O coelho Pernalonga (Bugs Bunny) apareceu a partir de 1938 em alguns desenhos realizados por vários diretores, com um aspecto diferente daquele que tomou depois: era um animalzinho meio felpudo, com olhos rasgados e o rabo em forma de floco de algodão. Ele surgiu primeiro com esta forma em três desenhos: Porky´s Hare Hunt / 1938, Presto-O Change-O / 1939 e Hare-Um Scare Um / 1939.

O Pernalonga de McKimson

Foi Robert McKimson, um dos colaboradores de Clampett, quem lhe deu os traços pelos quais o conhecemos hoje: esguio sorridente, sempre petulante de cenoura em punho a atormentar o pobre do Hortelino Trocaletra (Elmer Fudd), seu enfezado vizinho, que costuma ameaçá-lo com uma espingarda de dois canos quando o surpreende no quintal roubando o alimento predileto. Bugs, indiscutivelmente, um tremendo gozador, com aquela voz inconfundível que lhe emprestava o animador Mel Blanc, arrebatou o Oscar de 1958 com o desenho Knighty Knight Bugs, no qual comparece seu outro arqui-inimigo, o bigodudo Yosemite Sam.

Mel Blanc e Robert McKimson

Clampett contou que se inspirara no modo de falar do ator Humphrey Bogart para criar a voz do coelho Pernalonga e que a conhecida frase do Bugs, “What´s up, doc?” é a variação de outra, “What´s up, duke?” com a qual Carole Lombard interpelava William Powell no filme Irene, a Teimosa / My Man Gidfrey / 1936, um dos êxitos de Gregory LaCava. Revelou também que os traços do Piu -Piu (Tweety Bird), aquele passarinho sempre perseguido pelo gato Frajola (Sylvester) em outro desenho animado da Warner, foram tirados de uma foto dele, Clumpett, quando era apenas um bebê e que, a princípio, existiam dois gatos Frajolas, cujas atitudes lembravam muito as da dupla de comediantes Bud Abbott e Lou Costello

Mel Blanc e suas vozes

Val a pena dizer algumas palavras sobre Mel Blanc. Em Hollywood eles o chamavam de The Man of a Thousand Voices (O Homem das Mil Vozes). Nasceu na Califórnia e seu verdadeiro nome é Melvin Jerome Blanc. Iniciou-se na vida artística como músico e maestro: somente a partir de 1937 entrou para a Warner e se dedicou a imitar as vozes das figuras dos cartoons.  Entre suas criações se destacaram, entre outras, a voz do coelho Pernalonga, Gaguinho (Porky Pig), Hortelino Trocaletra (Elmer Fudd), o gato Frajola (Sylvester), Ligeirinho (Speedy González), Patolino (Daffy Duck), Papa-Léguas (Road Runner), Coiote (Wile E. Coyote), Piu Piu (Tweety Bird), o galo antropomórfico Frangolino (Foglorn Leghorn), e do robozinho Twiki na versão original da série de TV Buck Rogers no Século 25 / Buck Rogers in the 25th Century / 1979. Mel chegou a fazer (sem ser creditado) as vozes de Hitler e Stalin no short de animação colorido Historical Reel: Broken Treaties / 1941 da série da Columbia This Changing World, apresentado pelo comentarista do rádio Raymond Gram Swing.

Mel Blanc e Jack Benny

Na televisão, participou como ator coadjuvante em alguns programas como o de Jack Benny, no qual fazia o professor de violino de Jack, emprestou sua voz para o Barney de Os Flintstones e para outras séries televisivas de animação como Os Jetsons, Speed Buggy e Os Monstros (era o Corvo, sem ser creditado). Apareceu ainda como ator de apoio em A Filha de Netuno / Neptune´s Daughter / 1949 (como Pancho) e Beija-me Idiota / Kiss me Stupid / 1964 (como Dr. Sheldrake), mas seu grande talento estava mesmo na laringe.   Uma laringe legendária.

 

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