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RAMON NOVARRO

Ele foi um dos atores mais populares dos anos vinte e início dos anos trinta e o primeiro grande astro latino-americano de Hollywood. Regiamente pago pela Metro, adorado pelas fãs de todo o mundo, sua popularidade no Brasil entre o público feminino era imensa, tendo sido aclamado pela imprensa como “o príncipe do romance”.

Em Beyond Paradise – The Life of Ramon Novarro (Ed. St. Martin´s Press, 2002) André Soares nos ofereceu o registro definitivo sobre a trajetória artística e a vida íntima de seu famoso biografado até a sua morte trágica. De modo que, neste artigo, vou apenas reproduzir a filmografia de Ramon elaborada por Soares acrescentando os títulos em português, apontar aqueles que considero seus melhores filmes e fornecer mais alguma informação sobre o artista ou os filmes dos quais participou.

Ramon Novarro

José Ramón Gil Samaniego (1899-1968) nasceu em Durango, México. Ele apareceu na tela pela primeira vez como um bandido mexicano no filme Nas Garras do Jaguar ou Nas Garras to Tigre / The Jaguar´s Claws / 1917, seguindo-se mais oito presenças breves em outras produções: 1917 – A Mulher Que Deus Esqueceu / The Woman God Forgot; A Intrépida Americana / The Little American; Em Refem / Hostage. 1918 – Mania de Cinema / The Goat. 1921 – Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse / The Four Horsemen of the Apocalypse; O Azar de Casimiro / A Small Town Idol; Homem-Mulher-Matrimônio; O Concerto / The Concert. Em Os Quatro Cavaleiros do Apocalipse, o mais famoso dos filmes citados, Ramon é um dos oficiais na cena em que uma mulher canta a Marselhesa enrolada na bandeira bleu-blanc-rouge.

Em 1922, ele finalmente conseguiu um papel de verdade no filme da Goldwyn Paixões Humanas / Mr. Barnes of New York (Dir: Victor Schertzinger), recebendo crédito (com o sobrenome Samaniego) pela primeira vez como o jovem córsego Antonio Paoli, que morria logo no início da trama. No mesmo ano, em O Prisioneiro do Castelo de Zenda / The Prisoner of Zenda, produzido pela Metro, Ramon obteve papel mais importante, qual seja o do vilão Rupert of Hentzau (que seria mais tarde vivido por Douglas Fairbanks Jr. e James Mason respectivamente nas versões de 1937 e 1952) e desta vez foi creditado como Ramon Novarro. Deu-se aí o encontro entre Novarro e o diretor Rex Ingram, o descobridor e verdadeiro mestre do ator. Sob orientação de Ingram na Metro Ramon fez em seguida: Frívolo Amor / Trifling Women / 1922, Apsará / Where the Pavement Ends / 1923 e Scaramouche / Scaramouche / 1923, no qual Ramon brilhou intensamente como André-Louis Moreau, papel mais tarde interpretado por Stewart Granger na refilmagem de 1952. Curiosamente, quem fez o papel de Napoleão neste filme foi Slavko Vorkapic, o grande especialista das sequências de montagem.

O Prisioneiro de Zenda

Scaramouche é um dos melhores filmes de Novarro. O romance de Rafael Sabatini já continha os ingredientes básicos para um grande sucesso popular e Rex Ingram – com o auxílio do fotógrafo John F. Seitz e do montador Grant Wytock – soube transportá-lo para a tela de maneira magnífica. O filme reflete realisticamente um período histórico particularmente dramático, possui grande beleza visual nos figurinos, nos cenários e na composição das cenas e é interpretado por um elenco brilhante, no qual sobressaem Lewis Stone e Ramon Novarro. Stone está maravilhoso no papel do aristocrata cínico e impiedoso e Novarro perfeito no jovem indignado com a injustiça, que se torna um orador eloquente e exímio espadachim. A reconstituição de época é muito bem feita, destacando-se as imagens da aldeia e do castelo de Gravillac; a praça de Rennes onde André discursa para o povo em frente de uma estátua equestre e se dá a repressão da cavalaria; o luxuoso teatro no qual se representa a peça Figaro-Scaramouche e André do tablado avista no camarote o marquês, Aline e a condessa; o ambiente superlotado da Assembléia Nacional; os salões da nobreza ricamente decorados; o duelo entre André e o marquês sob o arco fotogênico; e finalmente o movimento do povo enfurecido que o marquês, debilitado, enfrenta sem temor.

Ramon Novarro e Lewis Stone em Scaramouche

Prosseguindo seu percurso hollywoodiano, Ramon foi visto em: 1924 – Teu Nome é Mulher! / Thy Name is a Woman (Dir: Fred Niblo); O Arabe / The Arab (Dir: Rex Ingram); Fogo, Cinzas … Nada! / The Red Lily (Dir: Fred Niblo). 1925 – Juramento de um Amante / A Lover´s Oath (Dir: Ferdinand Pinney Earle); O Guarda-Marinha / The Midshipman (Dir: Christy Cabanne), este último exibido em sessão especial em homenagem à Marinha Brasileira no Cinema Imperio do Rio de Janeiro, antecedido por um prólogo (emoldurado por um excelente cenário de Angelo Lazary) com Jaime Costa interpretando com sua voz de barítono uma romanza de Schubert, contracenando com a atriz Eugenia Brazão. No papel do cadete Dick Randall, Ramon interpretou pela primeira vez um personagem tipicamente americano e atuou como um verdadeiro astro, tendo seu nome sido colocado nos créditos acima do título do filme.

Ramon em O Guarda- Marinha

No mesmo ano, irrompeu nas telas a superprodução da MGM Ben-Hur / Ben-Hur (Dir: Fred Niblo), que o tornou ainda mais famoso. Os momentos mais excitantes do espetáculo foram a batalha naval e a corrida de bigas, ainda hoje impressionantes, trabalho primoroso do diretor de segunda unidade B. Reaves Eason com a ajuda de 62 assistentes, entre eles os então desconhecidos Henry Hathaway e William Wyler (o diretor da refilmagem de 1959). Outros diretores assistiram a filmagem no Circus Maximus: George Fitzmaurice, Henry King, Reginald Barker, Sidney Franklin, Rupert Julian e Clarence Brown. Quarenta e dois cameramen foram contratados para o evento. Suas câmeras foram escondidas em cada posição que poderia render um ângulo efetivo. Novarro foi dublado pelo stuntman Buster Gallagher. Lloyd Nosler foi o principal responsável pela montagem empolgante. Infelizmente, após a cena climática da excitante corrida de bigas, a narrativa se estende demasiadamente para acentuar o aspecto religioso do enredo e o seu ritmo, até então bem fluente, se afrouxa.

Francis X. Bushman e Ramon Novarro em Ben-Hur

Bushman e Novarro em outra cena de Ben-Hur

Outra cena de Ben-Hur

Ainda no cinema silencioso e na MGM, Novarro apresentou-se em: 1927 – Amantes / Lovers (Dir: John M. Stahl; O Príncipe Estudante / The Student Prince in Old Heidelberg (Dir: Ernst Lubitsch); Romance / The Road to Romance (Dir: John S. Robertson). 1928 – Procelas do Coração / Across to Singapore (DIr: William Nigh); Galante Conquistador / A Certain Young Man (Dir: Hobart Henley); Horas Proibidas / Forbidden Hours (Dir: Harry Beaumont). 1929 – Asas Gloriosas / The Flying Fleet (Dir: George W. Hill); O Pagão / The Pagan (Dir: W. S. Van Dyke). Neste filme, ainda mudo, ouvia-se a voz de Ramon cantando “The Pagan Love Song” (música de Nacio Herb Brown e letra de Arthur Freed) e alguns efeitos sonoros. O Príncipe Estudante e O Pagão são os outros dois melhores filmes de Ramon.

Novarro e Norma Shearer em O Príncipe Estudante

Lubitsch dirige Ramon e Norma em O Príncipe Estudante

O Príncipe Estudante é uma delicada história de amor, finalmente frustrado, que transforma as duas pessoas que a viveram, sobretudo o rapaz sensível e retraído, que só teve em sua vida uma pequena oportunidade para sair dessa teia real, tecida pelas Instituições, pelo Estado e pela Tradição. Karl Heinrich (Ramon Novarro) é o príncipe herdeiro de um reino da Europa Central. A sua vida de criança é solitária e sujeita aos constrangimentos impostos pelo protocolo da corte. O seu único amigo é o velho preceptor, Dr. Juttner (Jean Hersholt). Quando atinge a idade própria, Karl parte com Juttner para a Universidade de Heidelberg, onde conhece finalmente a camaradagem estudantil, a alegria de viver e o amor, na pessoa de Kathi (Norma Shearer), a filha de um estalajadeiro. Mas quando o rei morre, Karl é chamado para subir ao trono e obrigado a se casar com uma princesa. Para realizar este precursor silencioso (e melancólico) dos seus musicais do período sonoro, Lubitsch contratou os serviços de Ali Hubert (seu colaborador na maioria de seus filmes alemães) para desenhar os figurinos, os de Andrew Marton (que depois se tornaria diretor de segunda unidade) para ser o montador do filme e também do fotógrafo John Mescall com quem já havia trabalhado em Paris é Assim / So This is Paris / 1926. Destaco duas cenas entre tantas admiráveis deste filme brilhantemente roteirizado por Hans Kraly. A primeira é a do encontro de Karl e Kathi num jardim coberto de flores sob as estrelas brilhantes. Quando eles se deitam sobre a relva, o vento começa a soprar, primeiro lentamente e depois com força, num crescendo que acompanha a manifestação de amor entre eles, para acalmar depois do beijo. A outra, ou melhor, as outras,  são os planos que mostram o mesmo comentário dito por gerações diferentes:  o menino vendo o retrato do príncipe ainda criança na vitrine de uma loja e afirmando que “deve ser ótimo ser príncipe”; depois as meninas contemplando o retrato do príncipe já adulto na mesma vitrine e exclamando que “deve ser ótimo ser príncipe” (com ênfase na palavra ótimo); e, no desfile final do casamento, velhos na janela murmurando que “deve ser ótimo ser rei”, todas estas frases contrapondo-se ironicamente ao que se passa no íntimo de Karl.

Renée Adoree e Novarro em O Pagão

Dorothy Janis e Novarro em O Pagão

O Pagão é um drama romântico cujo personagem central, Henry Shoesmith Jr. (Ramon Novarro), filho de pai branco e mãe polinésia, herdou a maior plantação de côco do Taiti e uma loja cujas prateleiras estão quase vazias, porém prefere ficar relaxando ao sol do que administrar sua propriedade. Henry conhece uma linda jovem, Tito (Dorothy Janis), nativa mestiça como ele, cujo guardião, o comerciante Roger Slater (Donald Crisp), que se diz “cristão devoto”, está tentado criar como branca e cristã, mas também a cobiça. Slater vê Henry como um pagão indolente, mas ele é também um jovem de bom coração e permite que o comerciante colha gratuitamente os cocos de suas terras para extrair a copra. Slater adverte Henry a se manter afastado de Tito, a menos que ele faça algo de si mesmo. Depois que Slater e Tito deixam a ilha, Henry leva a observação de Slater a sério e pede dinheiro emprestado ao banco para alavancar sua loja. Ele é bem-sucedido, mas concede demasiado crédito aos ilhéus e não consegue pagar seus empréstimos. Slater se aproveita disso para se apoderar de suas terras. Ao saber que Slater quer obrigar Tito a se casar com ele, Henry leva-a para sua casa na montanha. Slater tenta raptar Tito, Henry a resgata enquanto o comerciante é morto por um tubarão. Madge (Renée Adoree), uma prostituta de bom coração que vive à margem da sociedade, ajuda Henry a enfrentar o vilão. “White men fight for their women – natives ‘take’ their women”, diz ela.

É uma história simples e cândida, narrada de maneira encantadora, que transcorre numa paisagem esplêndida nos Mares do Sul, captada magnificamente pelas lentes de Clyde de Vinna (vencedor do Oscar pela direção de fotografia de Deus Branco / White Shadows of the South Sea), filme com tema semelhante: os efeitos negativos causados pela intromissão do homem branco em um paraíso tropical. A meu ver foi o melhor papel de Novarro na tela, compondo com perfeição e naturalidade aquele rapaz formoso, ingênuo e despreocupado, cuja voz macia e doce como a sua própria personalidade canta permanentemente aquela canção de amor (The Pagan Love Song) para a namorada, melodia lânguida e maviosa que ajuda a manter o clima romântico do espetáculo. “Your song is nice.  Your face is nice too”, diz Tito, exprimindo o mesmo sentimento que as fãs de Novarro sentiam na platéia.

Em 1931, o cineasta brasileiro Luiz de Barros realizou O Babão, longa-metragem sonoro satirizando a produção americana, colocando Genésio Arruda (um dos pioneiros na representação de personagens caipiras em peças e filmes) no papel de Ramon Novarro e nos das moças da ilha dos Mares do Sul, Rina Weiss e Irene Radner, destacando-se no elenco também Tuffy Coury e Arthur Friedenreich, famosos jogadores de futebol (cf. Dicionário Jurandyr Noronha de Cinema Brasileiro, ed. EMC, 2008).

Depois de O Pagão, a carreira de Novarro no cinema – apesar do êxito de bilheteria de Mata-Hari – foi geralmente decepcionante, desperdiçado em produções inferiores ao seu talento ou escalado para interpretar papéis que eram obviamente inapropriados para ele.

Greta e Novarro em Mata Hari

Greta Garbo e Ramon Novarro em Mata Hari

O Bem-Amado / Devil-May-Care / 1929 (Dir: Sidney Franklin) foi o primeiro filme falado de Novarro (pois em O Pagão, ouvia-se apenas música sincronizada e efeitos sonoros), seguindo-se na década de trinta: 1930 – Céu de Amores / In Gay Madrid (Dir: Robert Z. Leonard); Sevilha de Meus Amores / Call of the Flesh (Dir: Charles Brabin), com adaptações em língua espanhola e francesa dirigidas por Novarro). 1931 – Alvorada / Daybreak (Dir: Jacques Feyder); Filho do Oriente / Son of India (Dir: Jacques Feyder); Mata-Hari / Mata-Hari (Dir: George Fitzmaurice). 1932 – Juventude Triunfante/ Huddle (Dir: Sam Wood); Amor de Mandarim / The Son-Daughter (Dir: Clarence Brown). 1933 – Uma Noite no Cairo / The Barbarian (Dir: Sam Wood). 1934 – O Gato e o Violino / The Cat and the Fiddle (Dir: William K. Howard); Amor Selvagem / Laughing Boy (Dir: W. S. Van Dyke). 1935 – Uma Noite Encantadora / The Night is Young (Dir: Dudley Murphy), último filme de Novarro na MGM. 1937 – O Sheik Conquistador / The Sheik Steps Out (Republic, Dir: Irving Pichel). 1938 – Aventura Desesperada / A Desperate Adventure (Republic, Dir: John H. Auer).

Helen Chandler e Ramon Novarro em Alvorada

Novarro e Jeanette MacDonald em O Gato e o Violino

Em 1934, Novarro fez uma tourné pela América do Sul acompanhado de sua irmã Carmen Samaniego, de seu primo Jorge Gavilán e do diretor e roteirista chileno Carlos Borcosque (então correspondente em Hollywood de revistas de cinema do Chile e Argentina). Na sua passagem pelo Brasil, ele se apresentou em um recital no Cine Palácio-Teatro (depois denominado Cine Palácio). Um jornal da época resumiu assim o espetáculo: “A orquestra impecavelmente regida pelo maestro Eduardo Armani e composta de 30 professores executou a ‘ouverture’ constante do programa e, a seguir, tivemos Ramon e o corpo de baile num arranjo de O Gato e o Violino que arrancou fortes aplausos. Carmencita executou dois bailados magistrais, mostrando toda a sua técnica na arte da dansa. Ramon Novarro cantou depois “Charming” do filme O Bem-Amado e também a “Serenata del Pastor” do mesmo filme, recebendo estrondosa salva de palmas. Mas, a casa quase veio abaixo, quando Ramon Novarro cantou, tendo de bisar “Se a Lua Contasse” em português, a que o artista de Hollywood deu uma expressão inteiramente nova para gaudio da platéia, que quase o obrigou a repetir pela terceira vez a linda canção. Distinguiu-se no bailado a “Escrava” a senhorita Maryla Gremo. Por último, Ramon, Carmencita e o corpo de baile se exibiram na canção mexicana “Cielito Lindo” e a pedido Ramon cantou finalmente “O Pagão”, merecendo fortes aplausos. A platéia chamou-o três ou quatro vezes à cena”.

Ramon no Rio de Janeiro

Logo depois de seu regresso para Hollywood, Gilberto Souto, então representante de Cinearte na terra do cinema, entrevistou Novarro, e este lhe contou o gesto de Adhemar Leite Ribeiro (naquele tempo com a empresa exibidora do Palácio), que fez abrir uma passagem num muro, ao lado do cinema, para que o ator entrasse pelos fundos do teatro, a fim de evitar-lhe atropelos. Louvava o cavalheirismo de Leite Ribeiro, de Adolfo Judall e Waldemar Torres, da Metro; das amizades que aqui deixara com o ator Procópio Ferreira, o dramaturgo Joracy Camargo, a bailarina Maryla Gremo, com a gente da Radio Mayrink Veiga, com Carmen Miranda e Custodio Mesquita (ele incluira “Se a Lua Contasse” no recital) que o ajudaram a ensaiar e aprender a letra brasileira.

Em 1936, Novarro formou a R.N.S. (Ramon Novarro Samaniego) para produzir um filme falado em espanhol, intitulado Contra la Corriente, com a intenção de introduzir um novo astro, o nadador argentino José Caraballo; mas não conseguiu encontrar distribuidor e acabou vendendo por um preço nominal os direitos de distribuição para a RKO.

O diretor Julio Bracho, Ramon e o fotógrafo Gabriel Figueroa em A Virgem que forjou uma Pátria

Em 1939, a carreira de Novarro estava numa situação de impasse. Após passar onze anos na MGM, não conseguia se adaptar a um estúdio da Poverty Row  e acabou saindo da Republic. Assim, na década de quarenta, começou trabalhando fora de Hollywood:  em uma coprodução franco-italiana, La Comédie du Bonheur / 1940 (Dir: Marcel L’Herbier) e no México em A Virgem que forjou uma Pátria / La VIrgen que forjó uma pátria / 1942 (Dir: Julio Bracho). Este foi seu filme derradeiro como astro.

No final de 1948, haviam se passado seis anos desde sua última aparição em frente das câmeras. Ele já não tinha aquele rosto e corpo bonito, pois desde os meados dos anos trinta o excesso de álcool já vinha deteriorando sua aparência. Seu alcoolismo o envolveu em vários processos judiciais – por ter causado acidentes de trânsito e avançado o sinal vermelho – e pode ser atribuído não somente à sua decadência física como também ao conflito entre sua fervorosa fé católica e seu homossexualismo.

John Garfield e Ramon Novarro em Resgate de Sangue

Entretanto, a partir de 1949, ele conseguiu retornar às telas, agora como ator coadjuvante (tal como havia sido em O Prisioneiro de Zenda no início de sua carreira), participando de cinco produções: 1949 – Resgate de Sangue / We Were Strangers (Dir: John Huston, Horizon / Columbia); O Cais da Maldição / The Big Steal (Dir: Don Siegel, RKO). 1950 – Sangue Bravo / The Outriders (Dir: Roy Rowland, MGM); Terra em Fogo / Crisis (Dir: Richard Brooks, MGM). 1960 – Jogadora Infernal / Heller in Pink Tights (Dir: George Cukor, Paramount). Embora suas aparições durassem pouco tempo em cena, Novarro marcava sempre sua presença nestes filmes, pois sabia muito bem incorporar seus personagens. Nos anos cinquenta, ele apareceu como convidado em programas e séries de televisão (Thriller / Thriller, Combate / Combat, Rawhide / Rawhide, Dr. Kildare / Dr. Kildare, Bonanza / Bonanza, James West / The Wild Wild West, Chaparral /The High Chaparral).

Sophia Loren e Novarro em Jogadora Infernal

Na manhã de 31 de outubro de 1968, os noticiários do rádio e da televisão anunciaram a descoberta do cadáver espancado e ensanguentado do ator Ramon Novarro na sua residência em Hollywood Hills. Esta notícia terrível chocou, não somente aqueles que o conheceram pessoalmente, como também os milhares de espectadores mais idosos que décadas atrás haviam admirado o astro tão popular dos anos vinte e início dos anos trinta. Além do choque causado pela morte tão violenta de Novarro, seus fãs e amigos tiveram que enfrentar a descoberta, não somente de que aquele senhor religioso era atraído por homens, mas também que ele havia frequentemente pago por favores sexuais. Aos 69 anos de idade, Novarro foi torturado e assassinado por dois garotos de programa, que acreditavam que havia uma grande quantia de dinheiro escondida em sua casa.

E.A. DUPONT E JOE MAY NÃO FORAM BEM SUCEDIDOS EM HOLLYWOOD

E. A. Dupont

Após se tornar conhecido como crítico de cinema e roteirista, Edwald Andreas Dupont (1891-1956) nascido em Zeitz, Alemanha, tornou-se um dos diretores de maior sucesso do Cinema de Weimar, antes de iniciar uma carreira internacional, que incluiu alguns dos primeiros filmes sonoros europeus.

E. A. Dupont

Filho de um editor de jornal, trabalhou como jornalista em vários periódicos de Berlim desde 1911 e, a partir de 1915, escreveu regularmente uma coluna de cinema no jornal diário “B. Z. am Mittag”. Em 1916, concebeu seu primeiro roteiro de cinema, um episódio da série dirigida por Rudolf Meinert, com o detetive Harry Higgs (Hans Mierendorff), intitulado Mein Ist Die Rache. Depois teve mais onze de seus scripts filmados, entre eles episódios dirigidos por Joe May da série com o detetive Joe Deebs (Max Landa) e as duas primeiras continuações de Es Werde Licht! (Dir: Richard Oswald), filme de esclarecimento sexual abordando temas como o aborto e a sífilis. Foi então contratado pela Stern-Film e, no final de 1919, havia escrito mais onze episódios para outra série de detetive estrelada por Max Landa.

No final de 1919, ingressou na Gloria Film como diretor de melodramas de luxo, e em vários deles – tais como Der Weisse Pfau, Patiente e Kinder Der Finsternis – colaborou com o então diretor de arte Paul Leni. Dupont chamou mais atenção com seus filmes Die Geier-Wally / 1921, primeira das diversas adaptações cinematográficas do romance muito popular Heimat e com o filme de tema judaico, Das Alte Gesets / 1923.

Em 1925, realizou Varieté / Variety, melodrama de paixão e perdição envolvendo um trio de acrobatas, produzido por Erich Pommer na Ufa, com Emil Jannings, Lya de Putti e Warwick Ward nos papéis principais e excepcional trabalho de câmera de Karl Freund.

Diante do sucesso internacional do filme, o diretor germânico recebeu convite de Hollywood. Após um único trabalho, Ama -me e o Mundo Será Meu / Love Me and the World Is Mine / 1926, voltou para a Europa e se tornou diretor geral de produção no recém-inaugurado Elstree Studios em Londres.

Trabalhando como roteirista, diretor e gerente de produção na British International Pictures (B.I.P) até o final de 1930, seus melodramas sofisticados Moulin Rouge / Moulin Rouge / 1927-28) e Picadilly / Picadilly / 1928, não somente proporcionaram o estrelato para suas respectivas atrizes Olga Tschechowa e Anna May Wong, mas também ajudaram o diretor de alemão Alfred Junge e o cinegrafista Wernes Brandes a iniciar suas carreiras na Indústria Cinematográfica Britânica.

Desempenhando papel fundamental na mudança da Elstree para a produção de filmes sonoros, Dupont filmou Atlantic / Atlantic / 1929, drama inspirado no naufrágio do Titanic, em versões inglesa e alemã, sendo que a segunda foi aclamada com “o primeiro filme todo-falado alemão” e obteve um êxito financeiro colossal no continente europeu. Em 1930, alcançou novo sucesso com Two Worlds, drama de guerra (com versões inglêsa, francêsa e alemã) mostrando o romance trágico entre uma mulher judia e um oficial austríaco e Cape Forlorn / 1931, mais um drama, desta vez passado em um farol em uma costa solitária na Nova Zelândia, cujo faroleiro se casa com uma dançarina de cabaré que se relaciona com outros homens.

De volta para a Alemanha, realizou um melodrama de circo, Salto Mortale / 1931 e, aproveitando as Olimpíadas em Los Angeles, o filme esportivo Der Laufer Von Marathon, que despertou novamente a atenção de Hollywood sobre sua pessoa. Entretanto, uma vez lá, foi considerado como uma pessoa “difícil” e, tanto a Universal como a MGM e a Paramount lhe confiaram projetos sem brilho, que tinham poucas chances de sucesso (As Quatro Sabichonas / Ladies Must Love / 1933; Aventuras de uma Noite/ The Bishop Misbehaves / 1935; Armadilha Perfumada / Forgotten Faces / 1936; Por Culpa Alheia / A Son Comes Home / 1936; Night of Mystery / 1937; O Morto-Vivo / On Such a Night / 1937; Amor Nâo é Sopa / Love on Toast / 1937; Sucursal do Inferno / Hell´s Kitchen / 1939).

As Quatro Sabichonas

Sucursal do Inferno

 

Após uma briga com um dos astros juvenis durante a filmagem de Sucursal do Inferno, ele foi despedido e não lhe ofereceram nenhuma tarefa por mais de uma década. Com o apoio financeiro de seu colega diretor William Dieterle, tentou por um breve período voltar para o jornalismo como editor do “The Hollywood Tribune” e então passou a trabalhar como assessor de imprensa a partir de 1940.

Em 1951, Dupont dirigiu o prólogo e outros sete diretores (Luciano Emmer, Enrico Gras, Alain Resnais, Robert Hessens, Marc Sorkin, Olga Lipska, Lauro Venturi) também contribuíram para a realização do documentário Pictura – Adventure in Art; mas seu eventual retorno ao filme de ficção com Evidência Trágica / The Scarf / 1951 foi um fracasso nas bilheterias e ele foi posteriormente relegado para os filmes B (Problem Girls /1953; O Homem-Fera / The Neanderthal Man / 1953; O Tesouro do Califa / The Steel Lady / 1953; A Volta à Ilha do Tesouro / Return to Treasure Island / 1954.

Dupont ainda conseguiu escrever e dirigir alguns episódios da série criminal de televisão da CBS, Big Town / 1952-53, porém foi despedido como diretor de Miss Robin Crusoe / 1953 por embriaguez, sendo substituído por Eugene Frenke. Finalmente, despediu-se do cinema com um crédito de co-roteirista da cinebiografia de Richard Wagner, Chama Imortal / Magic Fire / 1955, dirigida por William Dieterle e fornecendo a história original de Mata-me por Favor / Please Murder Me / 1956, dirigido por Peter Godfrey.

Joe May

Filho de uma rica família industrial, Julius Otto Mandl (1880-1954) desperdiçou a fortuna da família com sua vida de playboy, casando-se com a cantora Hermine Pfleger em 1902. Ela subsequentemente adotou o nome artístico de Mia May, e então ele se autodenominou Joe May.

Joe May

Após filmar um prólogo curto para uma revista teatral em Hamburgo, na qual Mia era a atriz principal, Joe estreou no longa-metragem na Continental-Kunstfilm em Berlim com o romance trágico In Der Tiefe Des Schachtes / 1912, que marcou também a primeira aparição de Mia na tela. Ele inaugurou a série de detetive Stuart Webbs da companhia com Die Geheimnisvolle Villa / 1913-14 e em 1915 fundou sua própria produtora, May-Film, lançando uma série concorrente com o detetive Joe Debbs. Simultaneamente, impulsionou a carreira de Mia como atriz dramática e deu chances para novos talentos incluindo Thea von Harbou, Fritz Lang e Ewald André Dupont nos seus estúdios nos subúrbios de Berlim Weissensee e Woltersdorf. O sucesso de seu espetáculo histórico luxuoso de três horas de duração Veritas Vinci – A Verdade Vence / Veritas Vincit / 1918-19) em três episódios (o primeiro tendo lugar na Roma Antiga, o segundo na Idade Média e o terceiro na Atualidade) e estrelado por Mia May, levou-o a empreender um exótico seriado de aventura novamente com Mia, A Soberana do Mundo / Die Herrin Der Welt / 1919, em oito episódios, outro grande êxito,  inclusive no Brasil. Em nosso país o seriado foi exibido com os seguintes títulos dos episódios: 1 – A Amiga do Homem Amarelo 2. A História de Maud Gregaard 3. A procura do Rabino de Kuan-Fu 4. O Rei Macombe 5. Ophir, a Cidade do Pecado 6. A Senhora Milliardaria 7. A Benfeitora da Humanidade 8. A Vingança de Maud Gregaard.

A Verdade Vence

A Soberana do Mundo

Joe frequentemente atuava como supervisor artístico, designando seus assistentes para assumir a direção. Afiliado à Ufa durante três anos, ele se transferiu para a Europäische Film Allianz (EFA) em 1921 e se tornou o maior realizador de filmes de prestígio da companhia depois de Ernst Lubitsch. Seus trabalhos para a EFA incluíram Dono e Senhor / Das Indische Grabmal / 1921, roteirizado por Thea von Harbou e Fritz Lang e o drama criminal na alta sociedade A Divina Comédia do Amor / Tragödie Der Liebe / 1922-23).

Dono e Senhor

A Divina Comédia do Amor

Face à inflação desenfreada em 1923,  Mia, que administrava a May-Film, foi obrigada a reestruturar a companhia e se retirou da tela após o suicídio da filha do casal, Eva May, também atriz. Uma tentativa de fazer sucesso internacional, O Fazendeiro do Texas / Der Farmer aus Texas / 1924-25, tornou-se um desastre financeiro e, depois disso, ele realizou uma série de filmes menores.

Flor do Asfalto

Um retorno ao primeiro plano profissional seguiu-se sob os auspícios da unidade de produção de Erich Pommer na Ufa, com Joe dirigindo sucessivamente alguns dos clássicos da última fase do cinema mudo e início do período sonoro, incluindo O Canto do Prisioneiro / Heimkehr / 1928 e Flor do Asfalto / Asphalt / 1928-29, e escrevendo o roteiro com Hans Székely de Rapsódia Húngara / Ungarische Rhapsodie / 1928, dirigido por Hanns Schwarz. Além disso, produziu o musical de Gustav Ucicky, Der Unsterbliche Lump e a balada militar de Kurt Bernhardt, O Último Batalhão / Die Letzte Kompagnie, ambos de 1929-30, antes de sua estréia sonora com Sua Majestade, o Amor / Ihre Majestät Die Liebe / 1930, considerado um ápice da comédia cinematográfica germânica.

Após a pré-estréia do musical de Jan Kiepura, Uma Canção para Você / Ein Lied Für Dich / 1932-33, Joe emigrou via Paris e Londres para Hollywood, onde Pommer designou-o para fazer Música no Ar / Music in the Air / 1934 na Fox. Primeira produção cujo elenco e equipe técnica foi composta principalmente por emigrados da Alemanha nazista, o filme fracassou terrivelmente, assim como seu drama de tribunal Confession / 1937, refilmagem de Mazurka / Mazurka (Dir: Willi Forst) que a Warner não trouxe para o Brasil.

A Casa das Sete Torres

Depois disso, Joe dirigiu filmes B na Universal como: 1939 – Os Mandamentos Sociais / Society Smugglers; Casa Mal-Assombrada / The House of Fear. 1940 – A Volta do Homem Invisível / The Invisible Man Returns; A Casa das Sete Torres / The House of the Seven Gables; Valente de Ocasião / You´re Not So Tough; Hit the Road. 1944 – Agarre Seu Homem / Johnny Doesn´t Live Here Anymore.

Ele ganhou a reputação de ser uma pessoa “difícil” quando foi despedido como diretor do filme anti-nazista A Estranha Morte de Adolf Hitler / The Strange Death of Adolph Hitler / 1943. Com a ajuda financeira de amigos, Joe e Mia May abriram um restaurante vienenense em Los Angeles em 1949, que fechou depois de apenas algumas semanas.