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ELEMENTOS DE LINGUAGEM CINEMATOGRÁFICA CLÁSSICA

O Cinema, como toda arte, exige uma iniciação. É preciso conhecer a linguagem do cinema para que se possa entender bem o que o diretor do filme quís dizer, ou seja, as idéias ou os sentimentos que ele quís exprimir.

Podemos começar pela unidade fílmica, que é o Plano. O que é um plano? É a imagem vista na tela e o tempo que ela permanece diante dos nossos olhos. Se a imagem permanece muito tempo diante dos nossos olhos, temos um Plano Longo (Long Take). Se passa rapidamente diante do nosso olhar, temos um Plano Curto (Short Take). Esta distinção é importante porque, normalmente, uma sucessão de planos longos cria um ritmo lento e uma sucessão de planos curtos cria um ritmo rápido.

Entre 1930 e 1960 a maioria dos filmes de longa-metragem de Hollywood continham entre 300 e 700 planos com uma média de duração entre 8 e 11 segundos. Isto mudou consideravelmente durante os anos 1970 e no final dos anos 1980 maioria dos filmes continha 1.500 planos com uma média de duração entre 4 e

6 segundos. Este aumento continuou nos anos 1990 e 2000, gerando o que foi chamado por David Bordwell de Continuidade Intensificada (Intensified Continuity), um método de montagem que agrada ao público habituado com a televisão, vídeo games e internet. Filmes como X-Men – o filme / X-Men / 2000 de Bryan Singer tinham em média 2 a 3 segundos por plano.

Planos Ambientais:

Plano Geral (Extreme Long Shot). Quando a câmera mostra um amplo cenário sem nenhuma figura humana ou com figuras humanas vistas bem de longe, sem que se possa distinguir seus traços ou expressões faciais. Este plano serve para situar o local da ação, tendo, portanto, primordialmente, uma função descritiva. Porém às vezes pode ter uma função dramática como é o caso do final de um clássico do cinema, Ouro e Maldição / Greed / 1924 de Erich von Stroheim.

Plano de Conjunto (Long Shot). Quando a câmera mostra um cenário mais restrito, no qual já aparecem figuras humanas mais de perto. Por exemplo, um grupo de pessoas em uma praça. Este plano serve para situar os personagens no cenário.

Plano de Expressão Corporal:

Plano Médio (Full Shot). Quando a câmera mostra um personagem de corpo inteiro. Este plano serve para o ator mostrar todos os recursos de seu corpo. Por exemplo, nos filmes musicais, a câmera apanha o dançarino dos pés à cabeça.

Plano de Diálogo:

Plano Americano (Medium Shot). Quando a câmera mostra o personagem do joelho ou da cintura para cima. Este plano serve muito para as cenas de conversação e apresenta variações: o Two Shot ou Tomada de Dois, quando aparecem duas figuras, Three Shot ou Tomada de Três, quando aparecem três figuras e assim por diante.

Planos de Intimidade:

Primeiro Plano (Close-Up). Quando a câmera mostra um personagem dos ombros para cima.

Primeiríssimo Plano (Big Close-Up, Extreme Close-Up). Quando a câmera mostra um detalhe do corpo humano, o rosto, a boca, os olhos etc. Quando o primeiríssimo plano se refere a um objeto, chama-se Plano de Detalhe ou Insert. Por exemplo, um revólver, uma faca, uma chave etc. Nos filmes de suspense estes planos assumem particular importância. Ex: o plano da chave nas mãos de Ingrid Bergman em Interlúdio / Notorius / 1946 de Alfred Hitchcock.

Estes planos mais próximos têm uma função dramática ou psicológica e em geral são reservados para os momentos de alta intensidade emocional, para mostrar as reações íntimas dos personagens. Exemplo: no filme O Martírio de Joana D’Arc / La Passion de Jeanne D’Arc / 1928 de Carl Dreyer mostrando a tortura moral de Joana D’ Arc espezinhada pelos seus julgadores. O Plano de Detalhe pode ter também uma função simbólica. Por exemplo, uma panela com leite fervendo que transborda.

É precisamente esta escala de planos, a variação quase infinita de pontos de vista do espectador, que difere o Cinema do Teatro e que dá ao Cinema um poder extraordinário de análise e de impacto.

Temos ainda:

Plano Referencial (Establishing Shot ou Master Shot), que é um plano que o diretor faz para dar uma visão geral da cena, antes de começar a cortar para os planos mais próximos, a fim de que o espectador tenha a noção de onde estão os personagens ou os objetos no ambiente. E, na medida em que a narrativa se desenvolve, pode ser necessário repetir esse plano para que o espectador não perca aquela noção. É o que se chama de Reestablishing Shot.

Plano de Reação (Reaction Shot). Quando vemos um acontecimento e depois o efeito que produziu ou, alternativamente, quando vemos o efeito produzido em alguém e depois o acontecimento. Por exemplo: vemos uma cobra toda enroscada, pronta para dar o bote e depois uma jovem assustada ou então vemos a jovem assustada e depois a cobra.

Plano de Transição (Bridging Shot). Que é um plano usado para cobrir um salto no tempo ou no espaço. Por exemplo: as folhas que caem de um calendário ou a rodas de uma locomotiva em movimento.

Fazendo uma orquestração de Planos, Cenas (que são um conjunto de planos) e Sequências (que são um conjunto de cenas), é que o diretor vai organizar a construção dramática e o ritmo do filme, dando-lhe uma palpitação e uma expressão.

Vamos ver então o esquema mais amplo dos elementos estéticos que o cineasta usa para construir sua obra:

Elementos Estéticos Visuais: Plano – Angulação – Enquadramento – Movimentos de Câmera – Cenário – Iluminação – Ator – Cor. Elementos Estéticos Auditivos: Som – Música – Diálogo.

Já vimos o Plano, vejamos agora a Angulação. Existem, basicamente, oito tipos de angulação:

Câmera Normal (Eye Level Angle). Quando a câmera é colocada na altura dos personagens, seguindo a linha horizontal dos seus olhos. Ex: nos filmes de Ozu.

Câmera Alta (High Angle ou Plongé ou Plano Imergente). Quando a câmera é colocada acima do que está sendo filmado e a imagem é vista de cima para baixo. Com esta angulação costuma-se sugerir abatimento psíquico ou físico, inferioridade, humilhação, abandono, desprêzo, derrota etc. Ex: em Na Estrada da Vida / La Strada / 1954 de Federico Fellini, Zampano (Anthony Quinn) na praia chorando com saudade de Gelsomina (Giulietta Masina), um bruto adquirindo condição humana.

Câmera Baixa (Low Angle ou Contre-Plongé ou Plano Emergente).  Quando a câmera é colocada abaixo do que está sendo filmado e a imagem é vista de baixo para cima. Com esta angulação costuma-se sugerir superioridade, triunfo, exaltação, orgulho, autoridade, domínio, majestade etc. Ex: os generais do tzar nos filmes soviéticos dos anos vinte. Robert Wise no seu filme Punhos de Campeão / The Set-Up / 1948, usa a câmera baixa para ressaltar o contraste entre vencedor e o vencido.

Câmera Oblíqua, Inclinada ou Diagonal (Oblique Angle). Quando vemos tudo em plano inclinado. Ex: Julien Duvivier no filme Um Carnê de Baile / Un Carnet de Bal / 1937 usou esta angulação para mostrar que o personagem do médico epilético (Pierre Blanchar) era um desequilibrado. Em Vidas Amargas / East of Eden / 1955 Elia Kazan usou a câmera inclinada para indicar o relacionamento conturbado entre o jovem interpretado por James Dean e seu pai (Raymond Massey). Este tipo de angulação também é muito usado em sequências frenéticas de perseguição, porque as linhas inclinadas sugerem agitação, inquietação, desequilíbrio.

Câmera Diretamente do Alto (Bird´s Eye View). Quando a câmera fotografa uma cena diretamente do alto. Ex: no filme Psicose / Psycho/ 1960 de Alfred Hitchcock na cena da segunda morte, quando o detetive acaba de subir a escada casa de Norman Bates (Anthony Perkins) e é assassinado por ele vestido de mulher.

Câmera Subjetiva (Point of View Shot). Quando vemos tudo pelos olhos do personagem. No filme Vidas Sêcas / 1963 de Nelson Pereira dos Santos, há o emprego da câmera subjetiva na morte da cadela Baleia. O seu delirio mortal é visto em câmera subjetiva. Exemplo de um filme todo em câmera subjetiva: A Dama no Lago / Lady in the Lake / 1947 de Robert Montgomery.

Câmera Circular (Circular Camera). Quando a câmera faz movimentos circulares para sugerir vertigem, tontura ou mesmo paixões desenfreadas como no filme Um Corpo Que Cai / Vertigo / 1958   de Alfred Hitchcock na cena em que “Scottie” (James Stewart) e Judy (Kim Novak) se beijam apaixonadamente, depois que Judy é retransformada em Madeleine.

Câmera Invertida ou Campo e Contra-Campo (Reverse Angle, Shot-Countershot). Esta é uma angulação usada geralmente em cenas de dialogação. Ex: um casal conversando. No campo vemos o homem de frente e a mulher de costas para a câmera; no contracampo, que vem logo a seguir por meio de um corte, a mulher será vista de frente e o homem de costas para a câmera.

A angulação pode ser usada para obter um efeito cômico. Ex: em O Imigrante / The Immigrant / 1917, Charles Chaplin mostra um navio muito balouçante no qual todos os passageiros sentem-se enjoados. Vemos então Carlitos debruçado sobre a amurada, balançando as pernas e pensamos que ele está vomitando. Mas ele se vira de repente e mostra um peixe que pescou com a bengala. O diretor conseguiu este efeito cômico colocando a câmera atrás das costas de Carlitos.

É muito importante lembrar que, quaisquer que sejam as angulações, o diretor deve tomar cuidado para não cair no artificialismo, no esteticismo. Não usar as angulações apenas pelo seu aspecto formal e sim funcionalmente. Muito embora saibamos que não existem regras fixas para a criação artística. O artista pode usar sua imaginação à vontade, sua imaginação criadora. Estamos apenas estudando as regras para um filme bem-comportado, regras que, muitas vezes, podem ser brilhantemente transgredidas. A linguagem do cinema está sempre evoluindo e esta evolução se faz precisamente com a quebra das regras estabelecidas.

Prosseguindo no estudo dos elementos estéticos visuais, vejamos agora o Enquadramento, que inclui a Composição de cada plano, isto é, como o diretor distribui a imagem dentro do quadro, dando-lhe uma arquitetura, um equilíbrio e um significado. A Composição é chamada de Ritmo Interior em contraposição à Montagem, que é o Ritmo Exterior. Aí o Cinema se aproxima da pintura. As artes plásticas fornecem muitos modelos aos cineastas no que diz respeito ao jogo de proporções e movimento de linhas.

Sabemos, por uma série de experiências psicológicas que linhas verticais causam a sensação de força e estabilidade; linhas horizontais causam uma sensação de calma e repouso; linhas oblíquas ou em espiral causam uma sensação de atividade, agitação, instabilidade, inquietação, nervosismo; linhas circulares sugerem convergência ou ordem. Assim como o cruzamento de linhas verticais com linhas horizontais sugere prisão ou isolamento.

Os cineastas usam essas linhas, e as lentes, para fazer a composição. Ex: a lente grande angular aumenta o tamanho do cenário e dá maior profundidade de campo enquanto a teleobjetiva faz o contrário, diminui o tamanho do cenário e dá menor profundidade de campo. A grande angular separa a frente do fundo do quadro: a teleobjetiva os aproxima – a imagem aparece achatada na tela. Além da variação de perspectiva há uma variação de velocidade. Em uma tomada de grande angular, o personagem parece andar mais rápido; com a teleobjetiva, parece andar mais lentamente.

Um dos exemplos mais marcantes do enquadramento está no filme Pérfida / The Little Foxes / 1941 de William Wyler. Há uma cena famosa na qual o marido (Herbert Marshall) discute com a mulher (Bette Davis) e tem um ataque cardíaco. Ele pede o remédio e ela não se move. Fica sentada na frente do quadro, vendo-se ao fundo o marido subindo a escada, cambaleando, para pegar o remédio até cair. Este enquadramento transmite com intensidade a indiferença absoluta da esposa, que nem sequer vira a cabeça para trás, para ver o que está acontecendo com o marido. Nesta cena foi usada a técnica da Profundidade de Campo (Deep Focus, Pan Focus) aperfeiçoada pelo grande fotógrafo Gregg Toland. Esta técnica permite que o diretor mostre ao mesmo tempo o que ocorre na frente e no fundo do quadro com igual nitidez e sem necessidade de se fazer mudanças de planos. A profundidade de campo permite a feitura de planos mais longos com períodos maiores de ação contínua, que são chamados de Planos-Sequência (Sequence Shots). É o que o crítico francês André Bazin chamou de “democratização da mise-en-scène” e que dava também maior realismo. Um exemplo marcante de plano sequência é a abertura de A Marca da Maldade / Touch of Evil / 1958 de Orson Welles.

Em suma, em vez da decupagem clássica, analítica, baseada na fragmentação de diversos planos, temos a decupagem sintética que deixa o espectador com liberdade para escolher o foco de sua atenção. Ele não fica mais tão prisioneiro da montagem como na decupagem clássica. Foi realmente uma revolução importante para o cinema moderno.

Com relação ao enquadramento temos ainda o Estreitamento do Quadro também denominado Recorte ou Máscara, usado quando se quer chamar atenção para determinado fato. Ex: no filme Intolerância / Intolerance / 1916 de David Wark Griffith, para realçar a queda de um soldado das altas muralhas da cidade, o diretor deixou os cantos da tela no escuro e mostrou ele caindo no centro iluminado. Às vezes é um personagem que se vê no fundo de um quarto através da porta semiaberta, sendo o resto do quadro tomado pelas paredes. Ou então se mostra a ação através de um binóculo ou de um buraco de fechadura.

Os Movimentos de Câmera são:

Travelling (Dolly, Track Shot, Carrinho), que é quando a câmera se desloca, havendo travelling para a frente, para trás, lateral, circular e vertical quando a câmera se aproxima, se afasta, corre paralelamente aos objetos ou personagens filmados, circula em torno deles e sobe e desce com um elevador. Usa-se também a Lente Zoom ou Varifocal, que produz quase o mesmo efeito do travelling e por isso é chamada de Travelling Ótico. Eu disse, quase, porque há uma diferençazinha: o travelling nos aproxima ou afasta das coisas enquanto a lente zoom traz as coisas até nós ou as afasta de nós. A lente zoom chama muito atenção sobre si mesma. É muito artificial e por isso é preciso ser usada com cautela. Ex: no filme Umberto D / Umberto D / 1952 de Vittorio de Sica temos o emprego correto do zoom em uma cena em que o velho, só e desesperado, olha para fora de sua janela. O diretor faz um zoom para a frente e a calçada parece se projetar sobre nós, causando uma impressão vívida do súbito, impulsivo pensamento de suicídio. Em Um Corpo Que Cai / Vertigo / 1958 Hitchcock faz uma combinação de um zoom para trás com um travelling para a frente, para causar a impressão subjetiva da vertigem do personagem.

Panorâmica, que é quando a câmera gira sobre seu próprio eixo horizontal (Pan) ou verticalmente (Tilt). Pode ser lenta ou rápida (Zip Pan, Chicote), descritiva ou dramática. Exemplo de panorâmica dramática e rápida ocorre no filme de John Ford No Tempo das Diligências / Stagecoach / 1939, quando vemos a diligência correndo pela planície e, subitamente, a câmera passa velozmente para o alto de um monte, focalizando um grupo de índios se preparando para o ataque. Quando se realizam várias panorâmicas sucessivas isto se chama Fiadura. Ex: a partida de tênis em Pacto Sinistro / Strangers on a Train / 1951 de Alfred Hitchock ou final de Os Pecados de Todos Nós /   Reflections in a Golden Eye / 1967 de John Huston.

Pano-Travelling, que é a combinação da panorâmica com o travelling realizada com o auxílio de uma grua, isto é, a câmera em um guindaste que pode rodopiar em todas as direções (Crane Shot).

No período do final dos anos 1960 a meados dos anos 1970, que ficou conhecido como A Nova Hollywood, os realizadores utilizaram o Steadicam, um braço hidráulico preso a um colete vestido pelo cinegrafista tornando ainda mais manejável a câmera na mão e as gruas Louma e Wesscam dirigidas por controle remoto, ambas usando monitores de vídeo como visores. Nessa época, foram também utilizadas as câmeras reflex, que permitiam ao operador ver e enfocar seus planos diretamente através da lente, sem precisar de um visor e se desenvolveu cada vez mais a Video Assist Technology, ou seja, o vídeo usado primeiramente para monitorar a qualidade da produção e depois como uma espécie de “story board eletrônica”.

Roll. Quando objetos e os atores vão virando de cabeça para baixo.

Vejamos agora, de modo sucinto, os outros elementos estéticos visuais: o Cenário, a Iluminação, o Ator e a Cor.

Cenário, que os franceses chamam de Décor, para distinguir de Scenario (que em francês quer dizer Roteiro), tanto o Cenário Natural como o Cenário Artificial, isto é, o cenário construído em estúdio ou ao ar livre, ajuda a criar o ambiente, o clima, a atmosfera, dar dramaticidade a uma cena ou caracterizar um personagem. O cenário varia de acordo com o assunto tratado ou a tendência estilística do diretor, podendo ser, por exemplo, Realista ou Expressionista. Em uma outra classificação o cenário pode ser: Despojado, quando se reduz ao máximo, sendo quase abstrato (ex: nos filmes de Robert Bresson e Carl Dreyer) e Ostensivo, quando assume maior relevância (ex: nos filmes de época, históricos ou de ficção cientifica).

Além disso, um simples fenômeno da natureza ou um objeto de decoração podem se tornar altamente dramáticos. É muito comum as cenas mais dramáticas ocorrerem durante uma tempestade (ex: a batalha na chuva em Os Sete SamuraisShichinin no Samurai / 1954 de Akira Kurosawa. A lua cheia nos filmes de lobishomem é outro exemplo. E, quanto aos objetos, temos exemplos nos filmes de Hitchcock: a tesoura em Disque M Para MatarDial M for Murder/ 1954, o isqueiro em Pacto Sinistro / Strangers on a Train /1951, os pratos da orquestra em O Homem Que Sabia Demais / The Man Who Knew To Much / 1956 etc. Por outro lado, um objeto pode se tornar até um personagem (v. g. o fusca no filme Se o Meu Fusca Falasse / The Love Bug / 1968 é de fato um personagem e tem até nome, “Herbie”). E há filmes visivelmente inspirados no cenário como é o caso de O Gabinete do Dr. Caligari / Das Cabinet des Dr. Caligari / 1920 de Robert Wiene ou então os filmes de Antonioni como A Aventura / L’Avventura / 1960, A Noite / La Notte / 1961, O Eclipse / L´Eclisse / 1962, nos quais se percebe uma forte relação entre os caracteres dos personagens e a paisagem. Para dar um exemplo bem nítido do cenário caracterizando um personagem, temos o filme Herança da Carne / Home from the Hill / 1960 de Vincente Minelli, no qual o personagem principal é um fazendeiro, dono de vasta propriedade rural e caçador. O cenário reflete isto, definindo o personagem. Na sua casa ele tem uma sala, que é uma espécie de santuário, decorada com poltronas de couro, tapetes de pele de lobo, troféus de caça pendurados na parede, coleção de rifles, sem falar nos cães que, em um estalar de dedos, chegam perto do dono.

Resta mencionar o Matte Painting que é a combinação de um cenário pintado com cenas reais. Um elemento da cena filmada é ação ao vivo e o remanescente é uma imagem pintada. Ex: Em Cidadão Kane, na cena em que os empregados do Inquirer têm o primeiro vislumbre da noiva de Kane, apenas um detalhe do cenário foi realmente construído. O edifício e seus arredores foram pintados.

Mas atenção: não devemos confundir o Matte Painting com a Retroprojeção (Back ou Rear Projection) também chamada Transparência que é o processo de filmagem que permite, por exemplo, filmar cenas de exteriores dentro dos estúdios. Emprega-se para isso um telão transparente em que se projeta um findo ou uma paisagem filmada anteriormente. Diante deste telão os personagens atuam. e a câmera roda, como se tudo se desenrolasse ao ar livre.

É bom lembrar que, nos filmes coloridos, as cores claras dão a sensação de amplitude e as cores escuras condensam, apertam o cenário. Há toda uma psicologia das cores e o cenógrafo tem que ser também um psicólogo, para poder fazer o que recomendou o grande diretor de arte inglês Edward Carrick: “The design should always be the background to an emotion”, ou seja, o cenário deve sempre servir de pano de fundo para uma emoção.

Entretanto, não é somente com o cenário que o cineasta cria a atmosfera, dá dramaticidade a uma cena ou caracteriza um personagem. Ele pode fazer isto também com a Iluminação, com o jogo de luzes e sombras. É muito comum no cinema o uso do simbolismo da luz e da sombra, do contraste entre a claridade e a escuridão, do branco e do preto. No filme Sindicato de Ladrões / On the Waterfront / 1954 de Elia Kazan, por exemplo, o rosto branco e os cabelos louros de um claro luminoso da mocinha interpretada por Eva Marie Saint, fazem um contraste com as figuras pretas ou cinzentas dos estivadores e dos criminosos do sindicato. O efeito íntimo de uma paisagem ou de um interior depende completamente da luz. A luz, por exemplo, torna um quarto agradável, hospitaleiro ou frio, limpo ou sujo, conforme as proporções de claridade.

Há dois tipos de iluminação muito usados no cinema: a Chave Alta e a Chave Baixa. Chave Alta (High Key Lighting) é a técnica da iluminação difusa com poucos contrastes de luz e sombra, geralmente usada nos filmes de tom alegre, otimista, como as comédias e os musicais. Chave Alta (Low Key Lighting) é a técnica de iluminação contrastada com muito contraste de luz e sombra, geralmente usada nos filmes noir e nos filmes de horror. O caráter de um rosto pode ser transformado pela iluminação vinda de baixo, que dá um aspecto sinistro ou perverso ao ator. E quando o ator se situa entre a fonte de luz e a câmera (a câmera encarando a fonte de luz), na técnica chamada de Back Lighting (Contraluz), dá-se o efeito da silhueta ou então se forma uma auréola em torno do personagem.

As sombras, por sua vez, podem assumir valor simbólico. Quantas vezes não vimos na tela uma sombra negra simbolizando o Mal? A iluminação também pode embelezar uma estrela, geralmente por meio de filtros. Há, por exemplo, um filtro suavizador que confere à imagem um efeito flou ou de nebulosidade. As grandes estrelas de Hollywood sempre tinham seus fotógrafos prediletos (v. g. Bette Davis / Ernest Haller).

Existem ainda a Fill Light (Luz de Preenchimento ou Lateral), luz que se localiza ao lado do ator ou atriz que está sendo filmado, com a finalidade de suavizar sombras causadas no rosto dele ou dela pela luz principal (Key Light ou Luz Frontal) e de preencher os vazios que causam essas sombras, evitando um contraste excessivo; o Spot, Spotlight ou Follow Shot (Jato), luz de efeito que projeta um facho brilhante sobre uma pessoa, grupo de pessoas ou objeto por intermédio de um pequeno refletor; e os Shaft of Light, que são fachos de luzes que podem ser vistos penetrando janelas como a luz que invade a sala de projeção em Cidadão Kane.

Já com relação ao Ator, o diretor espera dele criações, mas não a criação cinematográfica. A criação cinematográfica é do diretor. O ator deve, antes de tudo, ser fotogênico, isto é, representar-se bem pela fotografia, ter boa dicção e o dom de se projetar, de ter uma presença que estala na tela, que concentra todas as atenções. Se souber representar, tanto melhor. Porém é simples objeto nas mãos do diretor, elemento de grande valor muitas vezes, mas completamente dependente do diretor.

Ficou célebre a experiência de montagem feita pelo teórico russo Leon Kulechov. Ele colocou a imagem do ator Ivan Mosjoukine sucessivamente ao lado de um prato de sopa, de uma moribunda e de uma criança sorrindo. O rosto do ator impassível parecia exprimir em cada caso, fome, pena ou ternura. Outra coisa: o ator não constrói seu papel como o ator de teatro, pois as cenas não são filmadas na ordem de desenrolar da ação do filme. Além disso, de cada cena fazem-se várias tomadas, mas apenas uma é escolhida – a critério do diretor, não pelo ator.

No final do século dezenove, o grande dramaturgo Bernard Shaw, escreveu um ensaio famoso, comparando as duas atrizes mais em evidência na época, Sarah Bernhardt e Eleonora Duse. A comparação de Shaw é muito útil para a discussão dos tipos de interpretação no cinema. Sarah Bernhardt impunha a sua grande personalidade em cada papel Era sempre ela mesma. Já a Duse, era diferente em cada papel que interpretava. Era totalmente a personagem. Está aí a diferença entre a grande estrela e a grande atriz. De acordo com as expressões usadas no teatro nós podemos dizer que a Duse era uma atriz de composição e a Sarah Bernhardt uma atriz de natureza.

A posição dos atores de cinema é bem diferente da posição dos artistas no teatro. Um ator de teatro aparece no palco e sente a primeira emoção ao ver a casa cheia ou vazia. Quando começa o espetáculo, estabelece-se uma certa ligação entre a platéia e ele, ator. À medida que a peça se vai desenrolando, o ator vai criando em si um outro personagem; há um crescendo que contribui para a sua própria emoção. No cinema, é diferente: não existe estímulo da platéia, as cenas são repetidas muitas vezes e assistidas somente pelo diretor e pelos técnicos. A continuidade da emoção é quebrada pela filmagem fora da ordem cronológica.

Para encerrar a matéria sobre os elementos estéticos visuais vamos falar sobre a Cor. E lembramos que a cor pode ser usada como decoração ou como função, isto é, empregada em função do contéudo, ajudando a sublinhar a idéia, o sentimento ou qualquer emoção expressa. Nos seus estudo teóricos Eisenstein falava de um “significado da cor” e Van Gogh, ao comentar o seu quadro “Café de Nuit” disse: “Procurei exprimir com o vermelho e o verde terríveis paixões humanas”. Enfim, há toda uma psicologia das cores que as denominações cores quentes, cores frias deixam a entender. As Cores Quentes (vermelho, amarelo, laranja) sugerem agressividade, energia, estímulo; as Cores Frias (azul, verde, cinza) sugerem tranquilidade, serenidade, calma. Podemos citar vários filmes nos quais há o emprego funcional da cor. Por exemplo, Marnie: Confissões de uma Ladra / Marnie / 1964 de Alfred Hitchcock. A heroína neste filme é tremendamente afetada pela cor vermelha. O vermelho do vestido ou do pôr do sol provocam-lhe uma crise nervosa. Em outro filme de Hitchcock, Quando Fala o Coração / Spellbound / 1945, filmado em preto e branco, há um efeito interessante com a cor na cena do suicídio do assassino, quando ele dá o tiro, e a tela é tomada por mancha vermelha. Nos filmes musicais a cor assume uma importância especial e ela também pode servir para diferenciar o presente do passado. Existem vários filmes nos quais as cenas do presente são coloridas e as do passado em preto e branco. Exemplos: Voltar a Morrer / Dead Again / 1991 de Kenneth Branagh, A Lista de Schindler / Schindler´s List / 1993 de Steven Spielberg  No filme Laranja Mecânica / A Clockwork Orange / 1971, Stanley Kubrick fez o seguinte: na primeira parte, que lida com as agressões sexuais e sociais do protagonista, ele usou cores quentes (vermelhos e laranjas); na segunda parte, quando o herói é domesticado, ele usou cores frias especialmente azuis e cinzas).

Vamos falar agora dos elementos estéticos auditivos: o Som, a Música e os Diálogos. O Som pode ser utilizado de uma maneira realista ou de uma maneira expressionista. No filme Miracolo a Milano / Milagre em Milão / 1951 de Vittorio de Sica, as palavras ditas por dois capitalistas discutindo sobre a posse de um terreno se transformam pouco a pouco em latidos. Em Cidadão Kane / Citizen Kane / 1941 de Orson Welles a lâmpada de cena que se apaga em um decrescendo sonoro delirante, exprime o esgotamento da personagem, incapaz de suportar por mais tempo a vida de cantora medíocre, imposta por seu marido. Já o som real pode ser sincrônico quando o som que ouvímos corresponde à imagem que vemos ou assincrônico, quando o som que ouvímos não corresponde à imagem que vemos. Por exemplo no filme M – O Vampiro de Düsseldorf / M – Eine Stadt Such einen Mörder / 1931 de Fritz Lang, o comissário de polícia lê um relatório sobre um roubo e nós vamos vendo as imagens do roubo que fora praticado. As palavras do comissário são assincrônicas com as imagens do roubo. Há também o silêncio. Em certos filmes de suspense como Rififi / Du rififi chez les hommes / 1955 de Jules Dassin, por exemplo, na sequência do assalto ao banco, a gente chega a “ouvir” o silêncio. E às vezes o som pode substituir as imagens com vantagem. Por exemplo, no filme Amor sem Fim / Peter Ibbetson / 1935 de Henry Hathaway, nós vemos o herói moribundo na prisão, pronunciando as suas últimas palavras A tela escurece e ouvimos o baque do corpo que cai. Com isso termina o filme e sabemos que o herói morreu. A imagem não poderia ser mais eloquente do que o baque surdo na escuridão.

A Música pode ser utilizada de várias maneiras no cinema. Geralmente é empregada apenas para acompanhar a ação ou como ambiente de fundo. É a chamada Música Incidental. E às vezes vai até o exagero, seguindo a imagem segundo por segundo. Se um personagem desce uma escada na ponta dos pés, cada passo é acompanhado por uma nota musical. Ou então, por exemplo, em uma briga, cada sôco é assinalado por um golpe de tambor. Nos anos 40 a gente ouvia muito esse tipo de música no cinema. Que era também usada nos desenhos animados. Este acompanhamento musical contínuo era sem dúvida irreal e sempre foi criticado.

A música também pode ser usada:

Na apresentação dos letreiros, para marcar a época e o espírito do filme. É o chamado Main Title.  Por exemplo, no filme As Aventuras de Tom Jones / Tom Jones / 1963 de Tony Richardson, a música legre tocada em um cravo, que se ouve na apresentação, caracteriza o século dezoito e o tom jocoso do relato.

Para caracterizar um personagem ou estado d’alma. É o chamado Leit Motiv ou Motivo Condutor, espécie de “marca sonora” do personagem. No filme de Carol Reed, O Terceiro Homem / The Third Man /1949, o som da cítara marca a presença do personagem vivido por Orson Welles. No filme de Fritz Lang, M – O Vampiro de Düsseldorf, a presença do tarado, personificado por Peter Lorre, é sugerida pelo assobio de um tema musical de Grieg. O tema de Lara recorda a personagem de Julie Christie em Doutor Jivago / Doctor Zhivago / 1965 de David Lean.

Em contraponto às imagens. Exemplo, no filme Millions Like Us / 1943 de Frank Launder e Sidney Gilliat, ficamos sabendo que o marido da heroína foi morto em combate. Depois, quando a vemos novamente, ela está no meio de uma festa barulhenta em uma cantina de operários da fábrica de munições. Enquanto a câmera se fixa na moça, que está em silêncio, completamente desligada de todo o barulho, pensando no marido morto, ouvimos o canto turbulento dos operários e este contraste realça o efeito da cena.

Como interlúdios musicais, que é quando se interrompe a narrativa com um número musical. Por exemplo, em Butch Cassidy / Butch Cassidy and The Sundance Kid / 1969 de George Roy Hill, a cena de. Paul Newman andando de bicicleta ao som da música “Raindrops Keep Fallin´on My Head”.

Um dos diretores mais criativos no uso da música no cinema foi Stanley Kubrick. Basta citar o uso da valsa Danúbio Azul em 2001, Uma Odisséia no Espaço / 2001, a Space Odyssey / 1968 e de “Singin in the Rain” em Laranja Mecânica, na cena do estupro. Nesta cena, a impropriedade do trecho musical serve para amenizar o realismo e a violência.

E para encerrar quanto à música, nós temos que deixar claro o significado de três termos usados com relação à música no cinema: Score é o fundo musical; Sound Track é a trilha sonora (incluindo música, efeitos sonoros e diálogos) e Source Music é a música que os atores escutam no filme tal como, por exemplo, a que vem de um aparelho de rádio.

Finalmente nós temos os Diálogos, abrangendo em um sentido amplo:

Monólogo Interior, quando o ator fala consigo mesmo e uma voz fora de cena traduz o pensamento de seu personagem. Pode servir para substituir o aparte do teatro como em Mentiras da Vida / Strange Interlude / 1932 de Robert Z. Leonard.

Solilóquio, quando o ator fala consigo mesmo. Exemplo: a cena do Ser ou Não Ser em Hamlet / Hamlet / 1948 de Laurence Olivier.

Narração, que vem geralmente em voice over. Há uma distinção entre Voice Off e Voice Over. A voz off é usada para um personagem que fala sem ser visto, mas está presente no espaço da cena. A voz over é usada para uma narração (de um documentário, por exemplo) ou em um flashback. A narração pode assumir a forma de comentário v. g. nos filmes de Sacha Guitry.

Diálogos Justapostos (Overlapping) quando várias pessoas falam ao mesmo tempo, um personagem interrompendo o outro a todo instante. Ex: em Cidadão Kane.

Locução e Imagem Defasada, quando o diálogo continua enquanto os personagens que conversam entre si estão em lugares a cada momento diferente. Exemplo: em Acossado / A bout de souffle / 1960 de Jean Luc Goddard.

Com relação ao diálogo surge a questão do teatro filmado, da validade de filmes como os de Marcel Pagnol, para quem o cinema era “o teatro em conserva”; das experiências shakespereanas de Laurence Olivier; dos filmes de Woody Allen nos quais se fala muito, mas não deixam de ser cinema.

 

FRANK BORZAGE NO CINEMA MUDO

Amante do melodrama romântico, que abordou sempre com delicadeza, chegando às vezes ao sublime, ele foi no cinema um dos grandes pintores do amor que a tudo transcende. Com toda razão Henri Agel (Les Grands Cinéastes que je propose, ed. Cerf, Paris, 1967) reconheceu nele “umas das almas mais maravilhosamente líricas da cena silenciosa”.

Frank Borzage e seu Oscar

Frank Borzage (1894 – 1962), era filho de Luigi Borzaga, de origem ítalo-austríaca e Maria Ruegg, de origem suíça alemã. Luigi emigrou para os EUA no início dos anos 1880 e depois trouxe sua noiva Maria. Eles se casaram em Hazleton, Pennsylvania e posteriormente se mudaram para Salt Lake City, Utah, onde Frank nasceu. A escolaridade de Frank foi breve: aos 12 anos de idade teve que abandonar os estudos para ajudar o pai, que era pedreiro. Na adolescência, descobriu uma paixão pelo teatro e decidiu ser ator.

Por intermédio de seu progenitor, encontrou emprego nas minas de prata de Silver King em Park City e, com o dinheiro que economizou, matriculou-se em uma escola de arte dramática em Salt Lake City. A escola propôs a seus alunos uma excursão por pequenas cidades do Utah, mas após algumas representações o gerente da companhia desistiu do empreendimento, não antes sem “tomar emprestado” os últimos vinténs de seu novo aluno. A companhia teatral seguinte também o deixou na mão e, desta vez, para voltar para casa, Frank teve que trabalhar como ajudante de um cozinheiro chinês em um acampamento de ferroviários, depois se juntou a uma equipe de operários da via férrea nas Montanhas Rochosas, e acabou em Denver no Colorado, doente e enfraquecido, onde um velho negro misericordiosamente o tratou na sua cabana. Ele sobreviveu graças à “sopa dos pobres” e dormia nos parques públicos ou em canos de esgoto vazios. Finalmente, ao responder a um anúncio de jornal, ele conseguiu ser aceito pelo produtor de teatro Gilmore Brown, que estava precisando de um jovem bem apessoado e com certa experiência de palco. Frank excursionou com a Gilmore Brown Stock Company por várias cidades e, quando a companhia fechou as portas, ele se dirigiu para a Los Angeles a fim de tentar a sorte na indústria cinematográfica.

Em 1912, aos 18 anos de idade, Borzage estava prestando serviço como fact totum para Thomas Ince ou para o jovem ator-diretor Wallace Reid. Em 1913 Ince promoveu-o a galã e seu talento como ator seria solicitado por outros diretores até 1917. Enquanto isso, ele dirigiu seu primeiro filme, o curta-metragem The Pitch O´Chance / 1915, seguindo-se outros curtas até sua estréia no longa-metragem com Land O´Lizards (western com Frank Borzage, Harvey Clark, Laura Sears), em 1916.

Na década de vinte, Borzage esteve atrás das câmeras em mais 40 filmes (produzidos por várias companhias, notadamente Triangle, Cosmopolitan, Norma Talmadge Prod., MGM e principalmente Fox), destacados em negrito os mais importantes: 1916 – Immediate Lee, western com F. Borzage, Anna Little, Chick Morrisson. 1917 – Amor Difícil / Flying Colors, drama com William Desmond, Golda Madden, Jack Livingston; A Benção do Céu / Until They Get Me, drama com Pauline Starke, Jack Curtis, Joe King. 1918 – A Salteadora / The Gun Woman, western com Texas Guinan, Ed Brady, Francis McDonald; The Curse of Iku, drama com F. Borzage, Tsuru Aoki, Meta Anderson; Missão de um Anjo / The Shoes That Danced, drama com Pauline Starke, Wallace McDonald, Richard Rosson; Progresso de Inocente / Innocent´s Progress, drama com Pauline Starke, Lillian West, Alice Knowland; Dedicação / Society for Sale, drama com William Desmond, Gloria Swanson, Herbert Prior; An Honest Man, comédia dramática com William Desmond, Mary Warren, Ann Kroman; Sejam Felizes! / Who is to Blame?  drama com Jack Abbe, Jack Livingston, Maude Wayne; Alma de Flor / The Ghost Flower, drama com Alma Rubens, Charles West, Francis McDonald. 1919 – Toton, drama com Olive Thomas, Norman Kerry, Francis McDonald; Whom the Gods Would Destroy, drama com Jack Mulhal, Pauline Starke, Kathryn Adams; Prudence on Broadway, comédia com Olive Thomas, Francis McDonald, Harvey Clark; Duque, o Cavaleiro Errante / The Duke of Chimney Butte, western com Fred Stone, Viola Vale, Josie Sedgwick; Os Dois Laços / Billy Jim, western cômico com Fred Stone, Millicent Fisher, George Hernandez. 1920 – Adoração de Mãe / Humoresque. 1921 – Quereis Enriquecer Depressa? / Get-Rich-Quick Wallingford, comédia com Sam Hardy, Norman Kerry, Doris Kenyon; Lágrimas e Sorrisos / Back Pay, drama com Seena Owen, Matt Moore, J. Barney Sherry; Sacrifício de Pai / The Good Provider, drama com Vera Gordon, Dore Davidson, Miriam Battista. 1922 – As Três Vinganças/ The Valley of Silent Men, drama romântico com Alma Rubens, Lew Cody, Joseph King; Viver é Lutar / The Pride of Palomar, drama com Forrest Stanley, Marjorie Daw, Tote du Crow. 1923 – Um Novo Mandamento / The Nth Commandment, drama com Colleen Moore, James Morrison, Eddie Phillips; O Filho do Lodo / Children of Dust, drama romântico e de guerra com Bert Woodruff, Johnnie Walker, Pauline Garon; A Idade dos Desejos / The Age of Desire, drama com Joseph Swickard, William Collier Jr., Frederick Truesdell; Canção de Amor / The Song of Love, drama com Norma Talmadge, Joseph Schildkraut, Arthur Edmund Carewe (iniciado por Borzage, substituído sucessivamente por Chester Franklin e Frances Marion. 1924 -Segredos / Secrets, drama com Norma Talmnadge, Eugene O`Brien, Patterson Dial; A Grande Dama / The Lady, melodrama com Norma Talmadge, Wallace MacDonalds, Brandon Hurst. 1925 – Tribulação / Daddy´s Gone a Hunting, drama com Alice Joyce, Percy Marmont, Virginia Marshall; A Mulher do Outro / The Circle, comédia dramática com Eleanor Boardman, Malcolm McGregor, Alec B. Francis; O Preguiçoso / Lazybones; Esposas em Greve / Wages for Wives, comédia com Jacqueline Logan, Creighotn Hale, Earle Foxe; O Primeiro Ano / The First Year, comédia com Matt Moore, Kathryn Perry, John Patrick. 1926 – Sem Lar e Sem Rumo / The Dixie Merchant, drama com J. Farrell MacDonald, Madge Bellamy, Jack Mulhall; Casar é Bom / Early to Wed, comédia com Matt Moore, Kathryn Perry, Albert Gran; Dolorosa Renúncia / Marriage License? drama com Alma Rubens, Walter McGrail, Richard Walling.  1927 – 7° Céu / Seventh Heaven. 1928 – Anjo das Ruas / Street Angel; O Rio da Vida / The River, drama romântico com Charles Farrell, Mary Duncan, Ivan Linow. 1929 – Estrela Ditosa / Lucky Star; Eles Tinham Que Ver Paris / They Had To See Paris!  comédia com Will Rogers, Irene Rich, Owen Davis Jr.

Amor de Mâe

Adoração de Mãe (Prod: Cosmopolitan), é um melodrama de profunda humanidade. Jogando com saltos no tempo, a narrativa segue o percurso de Leon Kantor (Gaston Glass), menino do ghetto judeu novaiorquino que se torna um violinista virtuoso graças ao empenho e ajuda de sua mãe (Vera Gordon), sua mudança com a família para um bairro mais chique, seu alistamento militar, seu retôrno da guerra incapacitado para exercer sua profissão. Na última parte, surge o tema do amor salvador – na figura de Gina (Alma Rubens) – que marcaria a carreira do cineasta. Por seu excelente trabalho, Borzage obteve a primeira distinção artística do cinema nos EUA, a Photoplay Gold Medal Award para o melhor filme do ano. O filme foi um grande sucesso de bilheteria e propulsionou a carreira do diretor

Buck Jones em O Preguiçoso

O Preguiçoso (Prod: Fox) é uma comédia dramática pungente focalizando um jovem do meio rural, Steve Tuttle (Buck Jones) – apelidado de Preguiçoso (porque é “tão dormente quanto o melaço no inverno”), que assume a responsabilidade de criar uma menina órfã, causando um escândalo na sua pequena cidade. Muitos anos depois, ao retornar da Primeira Guerra Mundial, ele descobre que ama a menina, que agora é uma moça (Madge Bellamy), e pretende se casar com ela; mas a jovem está apaixonada por outro (Leslie Fenton). Borzage traça um retrato primoroso de um amor não correspondido, combinando um senso de humor refinado com um sentimento de melancolia, e dá relevo à natureza e às paisagens fotografadas com esmero por Glenn MacWilliams e George Schneiderman. O astro famoso dos seriados e westerns B tem uma interpretação surpreendente como o rapaz cuja indolência é mostrada em uma imagem antológica: vestido com se fosse um espantalho, nós o vemos relaxando ao sol por tanto tempo que uma teia de aranha se forma em seus sapatos.

Charles Farrell e Janet Gaynor em Sétimo Céu

Janet Gaynor e Charles Farrell em Sétimo Céu

7º Céu é um drama romântico desenrolado na França durante a Primeira Guerra Mundial. Diane (Janet Gaynor), jovem parisiense, é salva das brutalidades de uma irmã mais velha alcoólatra e violenta (Gladys Brockwell) por Chico Robas (Charles Farrell), operário dos esgotos de Paris, cuja modesta ambição na vida é ser promovido a limpador de ruas. Após dizer para as autoridades que ela é sua esposa, Chico a leva para o sétimo andar no topo de um prédio em ruínas onde mora – o sétimo céu do título. Logo se apaixonam e pretendem se casar, mas a guerra irrompe e Chico é convocado. Os amantes prometem que se encontrarão em pensamento todos os dias às onze horas da manhã, não importa o que aconteça. Chico volta da frente de batalha cego, e é precisamente quando está cego, que ele vê claro. Ele, que se achava abandonado por Deus, não está sozinho. Diane está lá e estará sempre lá. Esta história de amor sentimental com uma dimensão mística foi narrada com muita ternura por Borzage e lhe proporcionou o Oscar de Melhor Diretor. O filme foi indicado; Janet Gaynor ganhou a estatueta da Academia por seu trabalho nele, em outro filme de Borzage, Anjo das Ruas, e Aurora / Sunrise de F.W. Murnau; Benjamin Glazer também foi vencedor pelo Melhor Roteiro Adaptado.

 

Janet Gaynor e Charles Farrell em Anjo das Ruas

Anjo das Ruas é um drama romântico com o tema Borzagiano recorrente do amor contra a adversidade, influenciado pela estética do expressionismo alemão, particularmente de Murnau. Angela (Janet Gaynor), filha dos bairros pobres de Nápoles, precisa de vinte liras para cuidar de sua mãe doente. Desesperada, ela tenta se vender na rua e acaba por furtar o dinheiro. Presa e condenada a um ano de prisão, consegue fugir. Perseguida pela polícia, encontra refúgio em uma trupe de um circo, do qual ela se torna uma das vedetes. Em uma turnê, encontra Gino (Charles Farrell), jovem pintor sem um tostão. Apaixonado por Angela, ele se junta à trupe. A jovem, que a príncípio rejeita seu amor, acaba caindo em seus braços, porém leva uma queda e, ferida no tornozelo, não pode mais fazer seu número de equilibrista. Gino a leva então para Nápoles, onde ela ainda está sendo procurada.  Ele consegue uma encomenda para fazer um mural que lhe trará muito dinheiro e os dois resolvem se casar, porém na véspera do casamento, a polícia a encontra. Antes de ser levada presa, ela pede aos guardas uma hora de atraso, pois é preciso que Gino não saiba de seu passado. Angela dissimula de Gino sua partida iminente. Passado algum tempo eles se reencontrarão fortuitamente em um cais brumoso. Aterrorizada pelo rosto de Gino congestionado de ódio, Angela foge, seguida por um travelling lateral longo, e vai se refugiar em uma capela. Ela cai na frente de um altar. Gino tenta estrangulá-la. Ele derruba uma Bíblia, percebe onde se encontra e olha para o tabernáculo. À luz das velas, Gino descobre o seu quadro da pura Angela, retocado por um falsário, como se ela fosse uma Madona. Após alguns momentos dramáticos, eles se reconciliam sob o som de “O Sole Mio”.

Charles Farrell e Mary Duncan em O Rio da Vida

Mary Duncan, Alfred Sabato e Charles Farrell em O Rio da Vida

O Rio da Vida é um drama romântico combinando maravilhosamente erotismo e inocência. No cartão de título vem uma epígrafe que universalisa o tema: “Existe um rio chamado Vida. Sua nascente é uma fonte escondida. Seu objetivo é o mar. Sobre ele navegam as balsas dos destinos humanos”. Allen John Pender (Charles Farrell), jovem inexperiente, está descendo pelo rio em sua balsa quando conhece e se apaixona por Rosalee (Mary Duncan), mundana experiente e bonita, amante de um homem chamado Marsdon (Alfred Sabato) que está preso por assassinato. Ela é atraída pela timidez do rapaz e seu caráter ingênuo, embora tivesse sido obrigada a jurar fidelidade eterna a seu parceiro brutal e ciumento, Rosalee tem como único companheiro um corvo, símbolo de sua dependência do ausente. Quando Allen lhe pede em casamento, Rosalee vê o corvo e o repele. Desesperado, Allen diz que vai libertá-la de Marsden e, lembrando-se de um desafio que ela lhe fizera, grita alucinado: “Vou mostrar que sou um homem melhor do que Marsden. Vou cortar todas as árvores da floresta para te aquecer”. O esforço e o frio lhe fazem perder a consciência. Sam (Ivan LInow), um surdo-mudo hercúleo que tinha contas a acertar com Marsden, descobre o corpo inanimado de Allan e o leva de volta à cabana. Ele e Rosalee tentam reanimá-lo, o que ela finalmente consegue, abraçando-o com o calor de seu corpo. A esta altura chega Marsden, que fugira da prisão, luta com Allen, e o derruba com um pedaço de madeira. Enquanto Rosalee foge pelo bosque, Marsden se defronta com Sam, seu inimigo mortal. Aterrorizada pelo fantasma de seu perseguidor Rosalee sobe na passarela e pula no rio onde o redemoinho a engole. Allen John mergulha no centro do redemoinho e abraça Rosalee sob as águas. Alguns segundos depois, os amantes reaparecem na superfície. Após estrangular Marsden, o justiceiro surdo-mudo lava as mãos no rio “que, como o amor, purifica tudo”. Na Primavera, Allen John e Rosalee partirão juntos na balsa em direção ao mar. Embora hoje só exista somente parte de uma cópia da obra original, ainda podemos nos encantar pela beleza e pelo lirismo desta história audaciosa, sobre o jogo de sedução entre uma mulher ferida pela vida e cansada de amor e um jovem puro que ainda não descobriu a sensualidade e descobre este sentimento. A fotografia de Ernest Palmer e os cenários de Harry Oliver contribuem em grande parte para o triunfo artístico da produção.

Cena de Estrela Ditosa (Charles Farrell, Janet Gaynor)

Janet Gaynor e Charles Farrell em Estrela Ditosa

Janet Gaynor e Charles Farrell em Estrela Ditosa

Janet Gaynor e Charles Farrell em Estrela Ditosa

Estrela Ditosa é um drama romântico, espécie de resumo e culminância do universo muito pessoal de Borzage, onde prevalecem a imaginação poética, o encantamento imagístico e a espiritualidade. Timothy Osborn (Charles Farrell) e Martin Wrenn (Guinn Williams) trabalham como instaladores de telefone para uma companhia em uma área rural. Ambos flertam com Mary Tucker (Janet Gaynor), filha de uma produtora de leite viúva (Hedwig Reicher), que bate nela e a explora. Quando os EUA entram na Primeira Guerra Mundial, ambos se alistam no exército, servindo na mesma unidade, na qual Wrenn é sargento. Ordenado a entregar comida na frente de batalha, Wrenn usa o caminhão de entrega em proveito próprio (“para ver as moças” na retaguarda) e manda Osborne fazer a entrega por meio de uma carroça puxada por cavalos. Nesta operação, Timothy é ferido por fogo de artilharia. Timothy e Wrenn voltam para casa e Timothy agora usa uma cadeira de rodas. Mary fica apegada a Timothy e o visita todos os dias. Wrenn, que foi expulso do exército (mas ainda veste sua farda, para desagrado dos aldeões), usa adulação e falsas promessas de ascenção social para conquistar a mãe de Mary, pressionando-a para que ela faça a filha se casar com ele. Entrementes, Timothy, depois de muito esforço, recupera o controle de suas pernas, consegue chegar até a casa de Mary, começa a lutar contra Wrenn e eis que surgem os aldeões e colocam Wrenn em um trem que parte, expulsando-o da cidade. Mary olha incrédula para Timothy da cabeça aos pés, cai de joelhos e abraça suas pernas. Eles ficam de pé se abraçando diante dos trilhos da via férrea que se perde no horizonte. No auge de sua arte no tempo do cinema silencioso, Borzage cria uma atmosfera de conto de fadas inundada por enquadramentos belíssimos e cenas íntimas entre os dois jovens amantes (magnificamente interpretados por Charles Farrell e Janet Gaynor) diante das quais ninguém poderá deixar de se emocionar. Como não sentir algo dentro de nossos corações ao vermos Timothy lavando o cabelo de Mary com gema de ovo ou obrigando-a a lavar as mãos ou ainda repreendendo-a por ter furtado dinheiro da sua progenitora para comprar um vestido?

Os últimos quatro filmes marcados com traços mais grossos formam um quarteto de obras-primas do diretor na fase silenciosa do cinema, reputadas pela graciosidade e poesia de sua encenação.

CONCEITO DE FILME NOIR

Existem listas de filmes noir tão abrangentes, algumas chegando até ao absurdo. Michael F. Kennedy, no seu livro “Film Noir Guide” (McFarland, 2011), enumera nada menos do que 745 filmes noir possíveis, entre eles, Rebecca, a Mulher Inesquecível / Rebecca / 1940, O Homem que Vendeu sua Alma / The Devil and Daniel Webster / 1941, Casablanca/ Casablanca / 1942, Os Filhos de Hitler / Hitler´s Children / 1942, O Retrato de Dorian Gray / The Picture of Dorian Gray / 1945, Amar foi Minha Ruína / Leave her to Heaven / 1945. Monsieur Verdoux / Monsieur Verdoux / 1947, Crepúsculo dos Deuses; Sunset Boulevard / 1951, O Homem do Oeste / Man of the West / 1958.

Na coletânea editada por Alain Silver e James Ursini, “Film Noir Directors” (Limelight, 2012), variados articulistas nomeiam os filmes noir de cada diretor emergindo entre eles: Carta de uma Desconhecida / Letter from an Unknown Woman / 1948; Atlântida, o Continente Perdido/ Siren of Atlantis / 1949, O Dia em que a Terra Parou / The Day the Earth Stood Still / 1951, Jardim do Pecado / 1958, Intriga Internacional / North by Northwest / 1959.

Raymond Durgnat no seu artigo, Paint it Black: The Family Tree of the Film Noir, publicado em “Film Noir Reader” (Limelight, 1996), aponta como films noirs King Kong / King Kong / 1933, Matar ou Morrer / High Noon / 1952 e 2001, Uma Odisséia no |Espaço / 2001, a Space Odyssey / 1968.

Com a devida vênia, nenhum desses filmes pode ser classificado como noir, simplesmente porque não são dramas criminais. Por exemplo: Crepúsculo dos Deuses e Amar foi Minha Ruína, que vêm sendo designados como noir por vários autores, embora contenham crimes nas suas tramas, são dramas psicológicos respectivamente sobre os distúrbios mentais de uma atriz decadente do cinema mudo e uma mulher possuída por um ciúme doentio do marido.

Nino Frank

Nino Frank, o primeiro crítico a usar o termo, disse cristalinamente no seu artigo pioneiro publicado na revista Écran Français em agosto de 1946: Un Nouveau Genre “Policier”: L´Aventure Criminelle. Ele não empregava a palavra noir no título, mas dizia em um trecho: “Ainsi, ces films ‘noirs’ n´ont pas rien de commun avec les bandes policères du type habituel (Estes filmes ‘noirs’ não têm mais nada em comum com as fitas policiais do tipo habitual). Com base nesta afirmação, deduzí que um filme, para ser considerado noir, tem que ser antes de tudo um drama criminal e como o drama criminal se subdivide em vários tipos (filmes de gângster, filme de assalto, filme de prisão, filme de amantes fugitivos ou fora-da-lei etc.) o filme noir seria cada um destes tipos acrescidos dos ingredientes noir e, tal como eles, um subgênero do drama criminal.

Acompanho também Foster Hirsch (“FIlm Noir: The Dark Side of the Screen (DaCapo, 1981) na sua percepção de que o filme noir tem todas as espécies de convenções fílmicas que normalmente associamos aos gêneros cinematográficos (convenções de estrutura, caracterização, tema e estilo visual) e o uso repetido destas convenções o qualifica como um gênero tão intensamente codificado quanto o western.

Existem autores que consideram o filme noir como um estilo, mas nunca me deparei com uma argumentação sólida sobre tal conceito. O que caracteriza o filme noir não é somente o estilo visual, a iluminação ou a fotografia, mas também o clima de pessimismo, o tom deprimente, a atmosfera de corrupção, morte, angústia, loucura, fatalismo etc.  bem como elementos típicos no que concerne ao tema, personagens e estrutura narrativa.

Pode existir ingredientes noir em filmes de outros gêneros. Entretanto este fato não os transforma em um filme noir como categoria autônoma. Sangue na Lua / Blood on the Moon / 1948 é um western com alguma característica noir na sua forma e conteúdo, mas ele será sempre um western. Capacete de Aço / The Steel Helmet / 1951 é um filme de guerra com estilo visual expressionista e certas convenções temáticas noir, mas será sempre um filme de guerra.

Na minha concepção o filme noir é um desvio ou evolução dentro do vasto campo do gênero drama criminal, que teve seu apogeu durante os anos 40 até meados dos anos 50, e foi uma resposta às condições sociais, históricas e culturais reinantes na América durante a Segunda Guerra Mundial e no imediato pós-guerra. Nele se combinariam, basicamente, as formas de ficção criminal americana produzida por escritores como Dashiel Hammett, Raymond Chandler, James M. Cain, Cornell Woolrich e seus descendentes ou semelhantes literários, com um estilo visual inspirado nos filmes expressionistas alemães dos anos 30. Em O Outro Lado da Noite: Filme Noir (Rocco, 2001) exponho com mais amplitude o tema proposto por este livro e proponho uma filmografia comentada.

Para escrevê-lo, estudei por cinco anos o assunto com muito cuidado, procurando ler todos os livros ou artigos já existentes sobre o mesmo e adquirir (inclusive de colecionadores de países distantes como Islândia) o máximo de dvds de filmes que poderiam ser noir. Recorrí também à New York Public Library (New York), Bibliothéque André Malraux (Paris), Biblioteca do IBEU (Rio de Janeiro), Museu Lasar Segall (São Paulo) porém, mesmo assim, cometí algumas falhas. Indiquei como noir filmes que não eram dramas criminais (v. g. Angústia / The Locket / 1947, Alma em Suplício / Mildred Pearce / 1945, Gilda / Gilda / 1946, O Beco das Almas Perdidas / Nightmare Alley / 1947, Acossado / Cornered/ 1945, Anjo do Mal / Pickup on South Street / 1953, Nuvens de Tempestade / The Woman on Pier 13, No Silêncio da Noite / In a Lonely Place / 19050, O Tempo não Apaga / The Strange Love of Martha Ivers / 1946, Ao Cair da Noite / Moonrise / 1949 mas sim, respectivamente, um melodrama (os quatro primeiros), um drama de guerra (o quinto), um drama político, de espionagem ou de propaganda anticomunista (o sexto e o sétimo), um drama psicológico (o oitavo e o nono) e um drama social (o décimo). A presença de elementos noir em todos estes filmes me confundiu; porém devo dizer que a maioria dos autores continuam considerando-os como filmes noir.

Deixei também de incluir como noir alguns dramas criminais que não tinha visto (v. g. Johnny Angel / Johnny Angel / 1945, The Lady Confesses / 1945, Mulher Dillinger / Decoy / 1949, Prisioneiro do Medo / The Pretender / 1947, Maré Alta / High Tide / 1947, Traição / Race Street / 12948, Desafiando o Perigo ; Red Light / 1950, Na Noite do Crime / Woman on the Run / !950, The Man who Cheated Himself / !950, Cidade Tenebrosa / Crime Wave / 1954, Fúria Assassina / The Naked Alibi / 1954, Pecado e Redenção / Rogue Cop / 1954. Para corrigir as falhas, escreví uma série de artigos neste meu blog (Film Noir I, II, III e IV), publicados sucessivamente em 21 e 27 de março de 2004 e 7,14, e 26 de abril do mesmo ano, como uma espécie de revisão do livro. Agora, alarmado com as listas de filmes noir, a meu ver estafúrdidas, que continuam aparecendo, retomo o assunto, para confirmar meu conceito de filme noir.

Para ser franco, ainda tenho dúvidas sobre se determinados filmes são noir ou não, porque nem sempre é fácil distinguir o gênero de um filme. Sombras do Mal / Night and the City / 1950 tem todos os ingredientes de um filme noir, porém a ação transcorre fora do ambiente ubano americano. E seria drama criminal? ou drama psicológico? Borde e Chjaumeton “Panorama du Film Noir Américan” (Flammarion, 1955) escolheram a foto de Richard Widmark como o seu personagem em Sombras do Mal para a capa do seu livro. Entretanto, no Índice Cronológico das Séries (pois eles consideravam o fenômento noir como uma série (sugerindo não se sabe bem se um ciclo ou um gênero), os dois autores não colocaram o filme de Jules Dassin entre os Films Noirs, mas sim entre os de Psychologie Criminelle ao lado de Amar foi Minha Ruína, como se fosse um drama psicológico, onde ocorre um crime.

Spencer Selby (“Dark City -The Film Noir” (McFarland, 1984) tinha razão ao sugerir que “O filme noir é talvez a mais escorregadia de todas as categorias fílmicas”. Brutalidade / Brute Force / 1947 e Cidade Nua / The Naked City / 1948 possuem alguns aspectos noir mas hoje, pensando melhor, não os colocaria no meu livro.

A CRÍTICA CINEMATOGRÁFICA

Quase todo mundo vê filmes. Vistos em cinemas, na televisão, em aparelhos de dvd ou blu-ray, no avião, no computador e agora até no celular, eles fazem parte da vida contemporânea. Para a maioria dos espectadores, a crítica de filmes é apenas uma expressão de satisfação ou dessatisfação com um filme ora em cartaz. Gostei ou não gostei, diz o espectador médio após a visão de uma obra cinematográfica. Porém existe um outro público com uma idéia diferente sobre filmes e sua apreciação crítica. Este outro grupo de espectadores leva mais a sério a experiência de ver filmes, achando-a tão importante e significativa quanto a arquitetura, pintura, escultura, música, dança, teatro ou literatura, as chamadas belas-artes.

Quanto ao público podemos distinguir dois tipos: 1. O público inadvertido que vai ao cinema para se distrair, ver seus atores prediletos, passar o tempo ou se evadir do cotidiano. 2. o público esclarecido que procura na 7ª Arte algo mais.

Na elaboração de uma cultura cinematográfica o papel da crítica é primordial. A crítica jornalística, que deve ser mais propriamente chamada de resenha, fornece informação para o público cinematográfico de massa. A função principal do resenhista é dar ao leitor inadvertido a informação de que um determinado filme foi lançado e está disponível para ser visto, indicar qual o assunto abordado pelo filme e quem está envolvido diante a atrás das câmeras na sua produção e avaliar o filme, a fim de que os espectadores que simpatizam como o gôsto dos resenhistas, tenham uma idéia se devem ou não gastar seu tempo e dinheiro para assistí-lo. As resenhas são escritas para um prazo quase imediato e não permitem que o resenhista veja o filme mais de uma vez. Além disso, o espaço é limitado. O resenhista, restringido por um prazo e pelo espaço, geralmente pouco pode fazer mais do que uma sinopse do enredo do filme, comentar brevemente sobre a produção e fazer algumas considerações gerais sobre o valor do filme. No Brasil, encontramos a crítica jornalística também em revistas mensais como, por exemplo, A Scena Muda (1921- 1955) e Cinearte (1926-1942).

É importante lembrar que alguns resenhistas conseguem transcender sua função básica, merecendo o título de crítico. Para citar apenas dois nomes, James Agee nos Estados Unidos e Moniz Vianna no Brasil foram exemplos marcantes deste tipo de resenhista. Mas convém esclarecer que, no tempo em que eles escreviam, o espaço para crítica jornalística era maior do que hodiernamente, ela era diária e o seu exercício exigia dedicação integral.

James Agee

James Agee foi considerado por muitas pessoas – tanto dentro e fora de Hollywood -como o crítico de cinema mais brilhante e perceptivo de sua época. Do final de 1941 a meados de 1948 ele era resenhista do Time e do outono de 1942 a 1948 escreveu também uma coluna de cinema para The Nation. Além do mais foi responsável pelo famoso artigo sobre a comédia muda, matéria de capa da revista Life em 3 de setembro de 1949. Suas resenhas e comentários foram reunidos no livro Agee on Film (Beacon Press, 1958). Foi também escritor (ganhou o Prêmio Pulitzer de ficção por seu romance Death in the Family) e roteirista do filme Uma Aventura na África / The African Queen / 1951, dirigido por John Huston.

Agee postulou quatro condições para ser crítico: 1. Defender o Cinema da esnobação dos intelectuais. 2. Julgar o Cinema por seus próprios e difíceis padrões. 3. Ter considerável experiência desde a infância, de assistir aos filmes e pensar e falar sobre eles. 4. Aumentar a capacidade do espectador de “ver” o que está no filme, tanto técnica quanto substantivamente.

Antonio Moniz Vianna

Antonio Moniz Vianna era médico, mas suas principais atividades sempre foram o jornalismo e o cinema. Ele foi o primeiro resenhista brasileiro a abordar todos os aspectos técnicos de uma realização e não hesitou, com independência e coragem, em contraditar os lugares-comuns da crítica (v. g. detestava a Nouvelle Vague e esnobava o chamado “cinema de autor”). Com seu estilo incisivo e polêmico formou várias gerações de cinéfilos. Exerceu seu ofício de cronista cinematográfico no Correio da Manhã (1946-1973); organizou grandes retrospectivas dos cinemas americano, francês, italiano, inglês e russo (1958-1962), dirigiu dois Festivais Internacionais de Cinema no Rio de Janeiro (1965-1967), contribuições substanciais para o aprendizado de Cinema em nosso país. As críticas de Moniz Viana foram reunidas no livro Um Filme Por Dia: Crítica de Choque (Companhia das Letras, 2004), selecionadas por Ruy Castro, que também assina a introdução

Um outro tipo de crítica, mais detalhada e analítica, que não tem nenhum vínculo particular com o jornalismo, tende a aparecer em revistas especializadas (v. g. as americanas Film Quarterly, fundada em 1945 e publicada pela University of California Press e Film Comment, fundada em 1962 e publicada pelo Film at Lincoln Center; as britânicas Sight and Sound, fundada em 1932 e distribuída pelo British Film Institute, Monthly Film Bulletin, fundada em 1934 e depois fundida com a Sight and Sound e Movie, fundada em 1962 por Ian Cameron; as italianas Bianco e Nero, fundada em 1937 por Luigi Chiarini e Cinema Nuovo, fundada em 1952 por Guido Aristarco; a espanhola Objetivo, fundada em 1953 por Luis Garcia Berlanga e Juan Antonio Bardem; as francêsas La Revue du Cinéma, fundada em 1928 por Jean George Auriol, Cahiers du Cinéma, fundada em  1951  por Jacques Doniol Valcroze, André Bazin e Lo Duca, Positif, fundada em 1952 por Bernard Chardère  e Téléciné, publicação de inspiração católica criada em 1947 tendo como redator-chefe Gilbert Salachas; as brasileiras Revista de Cinema, fruto das atividades do Centro de Estudos Cinematográficos de Belo Horizonte, fundada em 1954 por Cyro Siqueira, Jacques  do Prado Brandão,  Guy de Almeida e José Roberto Duque de Novais; Filme Cultura, fundada em 1966 e publicada pela Embrafilme) ou livros publicados pela imprensa universitária.

Podemos apontar duas formas de abordagem processadas por este tipo de crítica cinematográfica: a abordagem do autor e a abordagem de gênero.

A abordagem do autor é a identificação da pessoa mais responsável pela criação do filme, usualmente o diretor, descrevendo e avaliando seu trabalho em termos de singularidade ou consistência de conteúdo, estilo ou excelência de artesanato.  A abordagem de gênero estuda grupos de filmes populares que usam enredos, personagens e cenários semelhantes como, por exemplo, filmes de horror, westerns, filmes de ficção científica.

A teoria do autor foi formulada nos anos 50 por críticos francêses da Cahiers du Cinéma e promovida nos EUA por Andrew Sarris no seu livro The American Cinema (1968). Inicialmente estes críticos discutiam a possibilidade somente de diretores serem considerados como autores; eles eram as pessoas cujo papel articulado no processo de produção parecia envolver o controle mais absoluto sobre todo o filme. Em suma, celebravam o diretor do filme como um autor – um artista cuja personalidade ou visão criativa pessoal podia ser lida, temática e estilisticamente através de sua obra. A finalidade da ‘Política de Autores” era distinguir entre diretores como artistas (auteurs) e diretores como meros técnicos (metteurs-en-scène). Assim, para os críticos autoristas, por exemplo, Alfred Hitchock era auteur e Michael Curtiz, metteur-en-scène. Posteriormente, eles destacaram a força criativa e “autoral” de roteiristas, fotógrafos, atores e montadores. Ocasionalmente, até produtores foram vistos como moldando artística e criativamente o estilo dos filmes: o produtor Irving Thalberg da MGM é um exemplo clássico.

A teoria do autor foi criticada por ignorar frequentemente realizadores cujos filmes individuais não faziam parte de uma obra. Ela omitia também realizadores cujos excelentes filmes individuais pareciam não ter nenhuma conexão estilística entre si.  Por outro lado, o crítico autorista às vezes supervalorizava um determinado realizador por causa de seu estilo consistente e identificável, mesmo quando ele era esteticamente banal ou tematicamente desinteressante.

Tal como o sistema de estúdio e o de astros, o sistema de gêneros ajudou a regularizar a produção de filmes e a minimizar os riscos econômicos inerentes à indústria. Os responsáveis pelos estúdios perceberam que, fazendo vários filmes do mesmo gênero por ano, dentro de determinadas fórmulas, poderiam economizar tempo e dinheiro, pois utilizariam os mesmos cenários e figurinos e geralmente as mesmas equipes, criando-se uma rotina que daria maior rapidez às filmagens. Por outro lado, os espectadores sabiam o que esperar de um filme de determinado gênero, porque já estavam familiarizados com o ambiente e o assunto tratado, de modo que o sucesso de cada novo filme era sempre ensejado pela popularidade dos filmes anteriores. O. público que apreciou o primeiro filme voltaria para ver os similares subseqüentes, os quais, portanto, seria de certo modo vendidos antecipadamente.

O filme de gênero é uma forma de expressão coletiva, um espelho voltado para a sociedade, que incorpora e reflete os problemas em comum e valores dessa sociedade. A crítica de gênero, por exemplo, considera que os musicais dos anos 30 podem ser explicados como uma fantasia escapista da Depressão; que o filme noir nos anos 40 expresssa primeiramente as mudanças sociais e sexuais ocasionadas pela Segunda Guerra Mundial e, depois, a desilusão reinante após o conflito etc. O critíco pode examinar os gêneros e sua relação com a cultura na qual eles foram feitos (v. g.   relação entre um western e o verdadeiro Oeste). Um determinado filme pode sugerir que a chegada da civilização no Oeste trouxe consigo toda corrupção e ganância associada com a vida na cidade – banqueiros, xerifes desonestos – tirando a pureza e inocência associada à vida vivida mais próxima da natureza.

Os ensaios seminais de Robert Warshow sobre o filme de gangster (The Gangster as Tragic Hero) e o western (Movie Chronicle: The Westerner) reunidos no livro The Immediate Experience (Doubleday, 1962) trouxeram uma nova compreensão de filmes há muito ignorados por críticos de cinema mais sofisticados, que não percebiam o seu impacto e as razões de sua popularidade duradoura. Warshow analizou tanto o gênero western como o de gângster como reflexos da sociedade americana e como uma expressão artística sem igual.

Outras formas de abordagem podem ser feitas tais como o estudo das implicações sociais ou psicológicas de um determinado filme ou ciclo de filmes. Por exemplo: ver violência em um filme induz um a pessoa a se tornar violenta? De acordo com a idade, a sensibilidade e demais predisposições cada espectador sofrerá, em diferentes medidas, o impacto daquilo que vê na tela. Naturalmente a receptividade da criança, do adolescente e do imaturo é muito mais aguda.

A percepção de que os filmes produzem efeitos sobre o espectador, sendo capaz de influenciar as massas, fez com que fôsse usado para fins de propaganda política. Embora cineastas como Leni Riefenstahl, Eisenstein e Pudovkin tivessem feito filmes artisticamente importantes, seus filmes eram, antes de tudo, carregados de significado político.

A primeira tentativa de compreender a sociedade descobrindo seus desejos inconscientes reproduzidos na tela foi feita por Sigfried Kracauer no seu estudo From Caligari to Hitler (1957) no qual ele mostra como as forças em ação nos filmes germânicos dos anos 20 e 30 refletem a psique alemã e podem explicar a ascensão de Hitler ao poder. Martha Wolfestein e Nathan Leite em Movies: A Psychological Study (1950) examinaram o filme como representação das fantasias da platéia. Parker Tyler, nos seus livros The Hollywood Hallucination (1944) e Myth and Magic of the Movies, (1967), utilizando a teoria de Freud do subconsciente, analisou o filme como uma corporificação do mito. Hortense Powdermaker em Hollywood, The Dream Factory (1950), abordou o filme do ponto de vista de uma antropologista social.

Os cientistas sociais frequentemente analizam o filme como uma instituição que reflete a estrutura da sociedade na qual foi feito. Eles também tentam descobrir como esta instituição influencia a sociedade em geral, que então, por sua vez, influencia a produção de filmes. Além do livro de Hortense Powdermaker, Film: The Democractic Art (1976) de Garth Jowett mostra o alcance possível deste método.

Existe ainda a abordagem histórica. No seu livro Film History, Theory and Practice (1995, Robert C. Allen e Douglas Gomery identificaram quatro abordagens da história do cinema, que eles denominaram de estética, tecnológica, econômica e social. Kristin Thompson e David Bordwell, no seu Film Art: An Introduction (2003), acrescentam uma quinta categoria – biográfica – àquelas usadas por Allen e Gomery. De fato, não existe uma história do cinema, mas várias histórias possíveis, cada qual adotando uma perspectiva diferente.

A história biográfica é provavelmente a mais popular para o leitor comum. Biografias de astros do cinema, diretores, produtores e chefes de estúdio proliferam, a maioria exaltando-os ou revelando os escândalos nos quais porventura estiveram envolvidos. Mesmo nas biografias mais acadêmicas, há uma tendência para reduzir a história do cinema a histórias de “grandes homens” (v.g. inventores como Thomas Alva Edison e realizadores como D.W. Griffith) aos quais são atribuídos importantes desenvolvimentos tecnológicos ou artísticos no meio, ressaltando a qualidade de “gênio”, que eles supostamente possuem.

A história estética é, simplesmente, a história do filme como uma forma de arte. Os historiadores escolhem os “melhores filmes”, que eles consideram obras de arte, separando-os do resto. Allen e Gomery chamam isto de “a tradição da obra-prima”, que resultou na criação de um cânone de filmes “clássicos” sempre privilegiados nas histórias de cinema, e se tornou evidente na moda das listas dos “maiores” filmes de todos os tempos, propostas em determinadas ocasiões por revistas especializadas na matéria.

A história tecnológica diz respeito à invenção e ao aperfeiçoamento de processos mecânicos necessários para a projeção de imagens em movimento. A maioria das histórias tecnológicas focaliza os momentos-chave no desenvolvimento da tecnologia do cinema (v. g. a introdução do som, cor, tela larga etc.).

A história econômica tem a ver com a organização da indústria cinematográfica como uma prática comercial. Como observaram Allen e Gomery, “deve ser salientado que nenhum filme jamais foi criado fora de um contexto econômico “. Isto é uma verdade tanto para o filme de arte ou de vanguarda como para os recentes blockbusters de Hollywood.  Embora existam muitos exemplos de realizadores para os quais o motivo do lucro não é necessariamente a primeira preocupação, as companhias produtoras e a indústria de cinema como um todo funcionam de acordo com o imperativo comercial de que os filmes são feitos para se ganhar dinheiro.

A história social focaliza o lugar do cinema no âmbito mais vasto da sociedade e da cultura. Ela envolve questões tais como: quem faz os filmes e como eles são feitos (modos de produção); que espécie de filmes são feitos; quem vê os filmes e como eles são avaliados (estudo do público e da crítica); que constrangimentos são impostos ao conteúdo dos filmes (censura); e quais as relações entre a indústria cinematográfica e outras instituições (agências governamentais, grupos de pressão, e assim por diante). Investiga também até que ponto os filmes podem ser vistos como reflexos dos valores, crenças e preocupações das sociedades nas quais são produzidos. E inclui ainda o uso do filme como um instrumento de propaganda e controle social.

Nas últimas décadas, o número de revistas de cinema e os jornais existentes em nosso país foi diminuindo, o espaço reservado às resenhas ou críticas de cinema ficando cada vez menor, e hoje elas só encontram um lugar razoável na internet sob a forma de centenas de blogues, sites ou teses de mestrado. O problema é que a web ensejou a democratização de opiniões, mas também permitiu a manifestação de pessoas sem qualificação suficiente para expor a matéria sobre a qual se expressam ou para produzir um texto claro, preciso e sucinto, sem pedantismo.