Um dos vários aspectos do filme B dizia respeito aos filmes étnicos, que se dirigiam à raça, religião ou nacionalidade específicas que eles retratavam. O maior componente desta espécie, o cinema negro (black cinema) também denominado “cinema de raça” (race cinema), havia começado durante os anos 10 como uma resposta à ultrajante estereotipagem dos negros americanos no cinema corrente da época. Logo no início do século XX, um grupo de realizadores negros independentes – Emmett J. Scott, os irmãos George e Noble Johnson e o legendário Oscar Micheaux – formaram-companhias produtoras para fazer filmes que realçassem os feitos e as ambições da América negra.
Posteriormente, uma quantidade de outras produtoras (algumas de propriedade de negros, outras controladas por brancos) surgiram em locais tão diversos como Jacksonville, St. Louis, Filadélfia, Chicago e Nova York, quase sempre utilizando os estúdios abandonados da Costa Leste ou casas particulares. Seus filmes passavam em qualquer lugar onde pudessem atingir uma platéia negra: cinemas segregados no Sul, salas situadas nos guetos das grandes cidades do Norte e, ocasionalmente, em igrejas, escolas ou reuniões sociais de negros.
Alguns desses filmes trouxeram novos esterótipos: por exemplo: homens negros de ação praticando atos de heroísmo e de honra como ocorria com o caubói vivido por Bill Pickett em filmes como The Bull Dogger / 1922 / Dir: Richard N. Norman); porém outros eram manifestos sobre a natureza da vida dos negros na América ou sobre a dinâmica racial – divisões e tensões dentro da própria comunidade (v. g. The Scar of Shame / 1929 / Dir: Frank Perugini), melodrama lento e melancólico que contava a história de um casamento malogrado entre um jovem pianista negro e uma mulher negra de classe baixa).
De todos os primeiros realizadores negros o mais importante (e um dos poucos que trabalharam tanto no cinema silencioso como no sonoro) foi o infatigável produtor / diretor Oscar Micheaux. Seus filmes refletiam as aspirações da burguesia negra e raramente abordavam a miséria racial: ele criou um mundo ideal onde os negros eram tão afluentes e educados quanto os brancos, e por isto foi muito criticado.
Micheaux escolhia seus elencos com base no tipo. Este produtor moldava seus astros conforme as personalidades brancas de Hollywood e os promovia como versões negras. O bonitão e elegante Lorenzo Tucker foi primeiramente apresentado como o “Valentino negro” e posteriormente, quando veio o cinema falado, ele era o “William Powell de cor”; a sensual e insolente Bee Freeman, uma figura de vamp, era a “Mae West marrom”; “Slick” Chester, um ator que interpretava papéis de gângster, tornou-se o “Cagney de cor”, a graciosa Ethel Moses foi anunciada como a “Harlow negra”.
A principal representante do cinema negro dos anos 30 em diante foi a firma Million Dolar (fundada em 1936 pelo chefe de orquestra e mestre-de-cerimônias Ralph Cooper juntamente com os brancos Harry e Leo Popkin), que tirou a realização de filmes de raça da marginalidade, aumentando sua reputação e capacidade de atrair o público.
Tal como a firma de Cooper, muitas outras companhias (e certamente as mais prolíficas) não eram brancas nem negras, mas integradas, e procuravam imitar o modelo hollywoodiano, realizando black westerns, filmes de gângster e de mistério, comédias românticas, musicais, aventura, horror etc.
Os black westerns (v. g. Harlem Rides the Range / 1939 (Dir: Richard C. Kahn) com o cantor-caubói negro Herbert Jeffreys) transcorriam em um Oeste totalmente negro; não havia brancos nele, nem mesmo como vilões! Não obstante, os intervalos cômicos usavam invariavelmente a espécie de tipos e situações (o cômico companheiro do mocinho assustado por fantasmas, o cozinheiro ladrão de galinhas, os trabalhadores braçais preguiçosos), que os negros compreensivelmente rejeitavam nos filmes corriqueiros de Hollywood.
Quando os grandes estúdios empregavam um artista negro nos seus musicais, estes apareciam em um “interlúdio”, quando os atores brancos iam a alguma boate ou a alguma festa para se divertirem. Assim, em Rapsódia Azul / Rhapsody in Blue / 1945, Hazel Scott surgia repentinamente em um requintado restaurante europeu cantando The Man I Love de George Gershwin em francês e inglês. Ali estava uma cantora negra sofisticada bem à vontade em um ambiente estrangeiro grã-fino, mas nós sentíamos o seu isolamento, completamente alienada de todo o resto do filme.
Porém isolamento e alienação eram as últimas coisas que alguém via nos antigos filmes de raça. Em Beware / 1946 (Dir: Bud Pollard) e Reet, Petite and Gone / 1947 (Dir: William Forest Crouch) , o grande músico de jazz e rhythm-and-blues, Louis Jordan, não somente tinha a oportunidade de improvisar no seu saxofone ou no seu clarinete acompanhado pelo grupo The Tympany Five, como também de ser um astro.
Em 1949, o cinema negro ficou à beira da morte quando Hollywood lançou uma série de filmes sobre problemas sociais Clamor Humano / Home of the Brave (Dir: Mark Robson), O Que a Carne Herda / Pinky (Dir: Elia Kazan), Fronteiras Perdidas / Lost Boundaries (Dir: Alfred L. Werker) e O Mundo Não Perdoa / Intruder in the Dust (Dir: Clarence Brown), que davam uma nova visão do negro e do seu papel na vida americana – pois os antigos filmes de raça jamais poderiam competir com os filmes muito mais bem-feitos nos grandes estúdios.
Além disso, após a Segunda Guerra Mundial, a América negra, consciente de que os soldados negros lutaram pela liberdade dos brancos apenas para encontrar, no seu retorno à pátria, a mesma escravidão econômica, passou a ter uma visão diferente de si própria e ansiou por uma nova espécie de filmes.
Nos anos 50, durante a ascensão do movimento dos direitos civis as platéias negras preferiram ver Sidney Poitier em O Ódio é Cego / No Way Out / 1950 (DIr: Joseph L. Mankiewicz), Um Homem tem Três Metros de Altura / Edge of the City / 1957 (Dir: Martin Ritt) e Acorrentados / The Defiant Ones / 1958 (Dir: Stanley Kramer), que promoviam os então aceitáveis temas de integração racial e assimilação cultural.
Apesar de várias concessões, tais filmes também tocavam nos conflitos entre brancos e negros, algo que os filmes de raça do período clássico raramente fizeram e, por isso, desapareceram.
A realização de filmes ídiches antecedeu a era do som. Nos anos 20, dois realizadores independentes, Sidney M. Goldin, o “pai dos filmes ídiches” e Ivan Abramson, produziram vários filmes com intertítulos em ídiche. Mais tarde, Abramson se uniu a Joseph Seiden, que iria subsequentemente desempenhar um papel importante no desevolvimento do cinema ídiche, para produzir uma série de jornais cinematográficos.
Em 1927, Seiden decidiu experimentar o cinema falado. A Mãe de Israel / My Jewish Mama / Mein Yiddish Mamen / 1930, tal como a maioria dos filmes produzidos e dirigidos por Seiden, era exageradamente sentimental. O traço distintivo do melodrama ídiche sempre foi a sentimentalidade; porém o cinema ídiche costumava temperá-la com comédia e trechos musicais.
Filmes como este eram oriundos de peças que se tornaram muito populares entre o público pouco educado de Nova York na virada do século, apresentadas no vernáculo ídiche misturado com expressões idiomáticas americanas. Entretanto, outros filmes baseavam-se em obras-primas literárias, escritas em uma forma mais pura de ídiche.
Passados em ambiente contemporâneo e confinados exclusivamente em um lar, os filmes de Seiden concentravam-se mais nos conflitos de família, problemas econômicos e relações entre pais e filhos. O dinheiro era a causa determinante da maioria das ações, levando à separação de famílias, crianças adotadas e casamentos sem amor. As narrativas eram basicamente lições de moral levemente disfarçadas e refletiam a realidade da vida judaica na América e na Europa.
As tramas continham muitas coincidências: amantes que se encontravam novamente anos depois, pais que recuperavam seu filho havia muito tempo perdido, personagens dados como mortos que reapareciam após várias décadas etc. Nestas histórias, enraizadas no folclore, tais acontecimentos eram suscitados pela intervenção de Deus ou de outro entre sobrenatural. Outros temas menores encontrados nos filmes ídiche referiam-se a um profundo respeito pelo saber e à noção de que, apesar de tudo, os filhos são sempre abençoados.
Dois realizadores importantes lideraram a produção de filmes ídiches: Joseph Green e Edgar G. Ulmer.
Desejando atrair um público mais amplo do que o alcançado por Seiden e comprometido com maiores valores de produção, Green constituiu uma companhia produtora internacional, abrindo um escritório em Nova York e outro em Varsóvia. Seu procedimento normal era o seguinte: ele levava um pequeno grupo de atores americanos-ídiche para a Polônia para estrelar os seus filmes enquanto os coadjuvantes e a equipe técnica eram recrutados nas fontes locais. Trabalhando em estúdios poloneses de primeira classe, Green conseguia realizar produções bem cuidadas por 40 – 50 mil dólares.
Ulmer obteve um grande sucesso com a produção de Green Fieds / Greene Felder / 1937, que custou 8 mil dólares. Banhado pela luz do sol, o filme era um canto folclórico alegre sobre o despertar de um jovem professor talmúdico para as belezas da existência e da natureza. O cinema ídiche – ou qualquer outro – raramente retratou os judeus de uma maneira tão livre e saudável, alegres na sua disponibilidade para a vida. O público gostou tanto do filme que se recusou as sair do cinema, desejando assistir a uma segunda sessão. O gerente teve de suspender a projeção e chamar a polícia.
Com exceção de Seiden, Green, Ulmer e Henry Lynn (que dirigiu vários filmes para a sua própria companhia produtora), o cinema ídiche era povoado por empresários que lançavam um único filme e nunca mais se ouvia falar deles.
Foi assim que nasceu The Dybuk / 1938 (Dir: Michael Waszynski), talvez o maior filme ídiche, inspirado em um drama clássico de S. Anski sobre judeus na Polônia do século XIX. Embora pudesse ser vista como uma história de amor na tradição de Romeu e Julieta, a obra de Anski levanta questões mais profundas concernentes à Cabala (o livro do misticismo), ao conflito entre as forças espirituais e físicas, e ao significado fundamental da morte. A peça havia recebido várias interpretações, umas pendendo para o expressionismo outras, para o naturalismo. Sob a direção de Waszynski, o filme se tornou uma síntese de ambas as tradições.
O cinema ídiche continuou vivo através dos anos 30, atingindo o seu auge no final da década. Alguns filmes foram produzidos nos anos 40, mas, ao começar a Segunda Guerra Mundial, o movimento tornou-se moribundo, tal como acontecera com o teatro ídiche na década anterior.
O declínio foi o resultado de vários fatores. As primeiras gerações de americanos que falavam ídiche estavam mortas e não foram substituídas por novos imigrantes. A segunda geração de judeus americanos havia se assimilado; muitos nem entendiam mais o ídiche. Alguns jovens judeus tinham vergonha da linguagem baixa e das convenções sentimentais do gênero, que eles associavam às pessoas sem educação. Almejavam um entretenimento mais sofisticado.