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PRIMÓRDIOS DO CINEMA PORTUGUÊS

A primeira sessão de cinema em Portugal ocorreu no dia 18 de junho de 1896 no Real Colyseu na Rua da Palma em Lisboa quando, por iniciativa do empresário Antonio Manuel dos Santos Junior, foi apresentado o “Animatógrafo Rousby”, que era na verdade o projetor de filmes Theatographe, inventado pelo pioneiro do cinema britânico Robert William-Paul, do qual Edwin Rousby era representante.

Real Colyseu

Depois de uma temporada no Porto, Rousby voltou a Lisboa, desta vez para apresentar cenas filmadas em Portugal pelo operador Harry Short, que Robert William-Paul mandara para o Sul da Europa a fim de captar imagens destinadas aos seus catálogos. Entre os filmes com motivos portugueses rodados por Short estavam: A boca do inferno em Cascais, a Praia de Algés na ocasião dos Banhos, o mercado do peixe na Ribeira Nova, Na Avenida da Liberdade, Jogo do Pau, Praça de D. Pedro, Fado Batido, O cais das Colunas, A Praça do Município. Como informou o eminente crítico e historiador de cinema Luís de Pina no seu livro História do Cinema Português (Produções Europa-América, 1986), que consultamos para escrever este artigo, outros motivos portugueses foram exibidos nos programas de Rousby, misturados com filmes estrangeiros, sempre com grande afluência de público e destacada notícia na imprensa.

Aurélio Paes dos Reis

Conforme L. de Pina, uma das pessoas que não perdeu uma única sessão no Porto foi o fotógrafo e floricultor Aurélio Paes dos Reis que, após ter tentado em vão obter dos irmãos Lumière um dos seus cinematógrafos, conseguiu filmar (talvez com um aparelho da marca Bedtz, eventualmente adaptado por ele para cumprir as mesmas funções do invento francês), imagens dos mais variados assuntos. Com seus amigos Antonio da Silva Cunha, proprietário da Camisaria Confiança, e o fotógrafo Francisco Magalhães Basto Junior, Aurélio Paes dos Reis organizou, em 12 de novembro de 1896, o primeiro espetáculo de cinema feito por portugueses e o chamou de “Kinetógrapho Português”; porém, por falhas técnicas, não obteve o resultado esperado.

Em janeiro de 1897, Paes dos Reis levou o seu Kinetógrapho ao Brasil, para apresentar um programa selecionado no Teatro Lucinda, situado no centro do Rio de Janeiro; mas não teve êxito e regressou desiludido para Portugal onde, segundo L. de Pina, pouco mais teria filmado. Quatro de seus filmes, Saída do Pessoal Operário da Camisaria Confiança, O Vira, Feira de Gado na Corujeira e O Jardim foram recuperados pela Cinemateca Portuguesa em 1982.

Após investigações do historiador Videira Santos (História do Cinema Português I, 1990) e diversas notícias recolhidas por Antonio J. Ferreira  (A Fotografia Animada em Portugal (1894-1897), ambos os livros publicados pela Cinemateca Portuguêsa, a prioridade de Paz dos Reis como primeiro cineasta português – já suspeitada por Luís de Pina – foi contestada e hoje parece não haver mais dúvidas de que antes dele, em 27 de agosto de 1896, teve lugar no Teatro Príncipe Real do Porto a exibição de algumas vistas promovida pelo empresário Francisco Pinto Moreira. O cartaz do evento anunciava a “Estréia do Animatographo portuguez” com 12 quadros, mas não mencionava quais os títulos destes quadros.  Foi informado apenas que os filmes agradaram bastante, em especial Dança Serpentina, cuja exibição foi bisada a pedido do público.

Manuel da Costa Veiga

Manuel Maria da Costa Veiga, empresário interessado em mecânica e eletricidade, seguiu os passos de Paz dos Reis, iniciando sua atividade como exibidor em Lisboa no Eden Concerto da Praça dos Restauradores e em Cascais na Esplanada D. Luis Filipe, onde fazia projeções ao ar livre. Adquirindo uma máquina de filmar Urban em um leilão em Londres, aproveitou a presença do rei D. Carlos em Cascais no verão de 1899 e filmou o soberano na praia. Com mais algumas imagens do local, ele exibiu seu primeiro filme Aspectos da Praia de Cascais / 1900 e daí em diante filmou eventos cotidianos (v. g. Uma Tourada a Antiga portuguesa / 1901 e principalmente visitas de soberanos estrangeiros (v. g. Chegada a Lisboa de Sua Majestade El-Rei Eduardo VII de Inglaterra / 1903, Visita do Rei Afonso XIII de Espanha / 1903, Visita do Imperador Guilherme II da Alemanha / 1905). Mais tarde Costa Veiga fundou a Portugal Film, primeira empresa cinematográfica portuguesa.

João Freire Correia

Os Crimes de Diogo Alves

Outro pioneiro lisboeta foi o fotógrafo João Freire Correia que em 1909 abriu com Manuel Cardoso Pereira a Portugália Film em Lisboa.  A Portugália produziu Os Crimes de Diogo Alves / 1911, espetáculo de grande sucesso. Segundo L. de Pina, espetáculo, dirigido por João Tavares, interpretado por Alfredo de Sousa (Diogo Alves) e realizado com grande cuidado técnico, rigor de reconstituição histórica e certo entusiasmo nas cenas de ação, tinha o seu ponto alto na famosa sequência em que o criminoso atirava as vítimas do alto do Aqueduto das Águas Livres. Apresentado como “versão falada”, ao filme foi exibido com vozes por trás da tela e acompanhamento musical da orquestra da Guarda Nacional Republicana. João Freira e Manuel Cardoso dedicaram-se também ao filme documentário e de atualidades (v. g. Batalha de Flores, Artilharia Portuguesa, Bombeiros Portugueses, O Terramoto de Benavente). A Portugália fechou em 1912.

Rainha Depois de Morta

Também em 1909 Julio Martins Costa, filho de um comerciante de fazendas, de sociedade com João Almeida, adquiriu o cinema mais antigo de Lisboa, o Salão Ideal, e fundou a Empresa Cinematográfica Ideal – Manufactura Portuguesa de Película, que funcionou como distribuidora, produtora e exibidora (lembrando que até 1910 o austríaco Carlos Stella estava sozinho no ramo da distribuição com a sua Empresa Cinematográfica, Lda). Enquanto não ficava concluído um estúdio, um laboratório e um escritório de distribuição, a empresa empreendeu a realização de atualidades e depois filmes de ficção (v.g. Chantecler Atraiçoado, Rainha Depois de Morta, O Casamento do Zé Gordo, todos de 1910). Rainha Depois de Morta contava o romance de D. Pedro e D. Inêz de Castro e foi dirigido por Carlos Santos, ator respeitado no meio artístico nacional, que interpretou o papel de D. Pedro ao lado de Eduardo Brazão (D. Afonso IV) e Amélia Vieira (Inês de Castro). O filme é também importante por ter marcado a estréia cinematográfica de Antonio Silva, que viria a ser um dos mais populares atores do teatro e do cinema português do século vinte. Em setembro de 1911, um incêndio de grandes proporções ocasionou o fechamento da empresa que, pelo fato de reunir os três ramos fundamentais da atividade cinematográfica, tinha todas as condições de triunfar.

Malmequer

Em 1918 Celestino Soares e Luis Reis Santos constituem a Lusitânia Filmes, que ocupou, após uma remodelação, o estúdio da Portugália Film na Rua de São Bento em Lisboa, e teve uma vida efêmera, terminando logo em 1919. O que sobrou de mais importante na sua atividade foram dois curta-metragens de enredo, Mal de Espanha e Malmequer ambos dirigidos por Leitão de Barros, então um jovem de vinte e um anos.

Ernesto de Albuquerque

Quim e o Manecas na história em quadrinhos

Pratas o Conquistador

Pioneiro lisboeta foi ainda Ernesto de Albuquerque, responsável por uma outra firma denominada Portugália de existência breve na qual foram realizadas atualidades (Cidade de Tomar / 1908, A Cultura de Cacau / 1908, A Festa da Flor / 1912) e alguns filmes de ficção dos quais se destacam Quim e o Manecas / 1916, baseado em uma dupla de heróis de história em quadrinhos;  Uma Conquista de Cardo ou Charlot no Jardim Zoológico de Lisboa /  1916, com um imitador de Chaplin que se intitulava Cardo mas era na realidade o ator espanhol Héctor Quintanilha. Por curiosidade, Cardo esteve no Brasil estreando no Rio de Janeiro no Teatro República e se apresentando posteriormente no Teatro Phoenix. E. de Albuquerque teve participação como fotógrafo em uma farsa produzida pela Pratas Film de Emídio Ribeiro Pratas, intitulada Pratas, O Conquistador / 1917, versando sobre um inveterado conquistador, mas desajeitado e sempre se metendo em encrenca, interpretado pelo próprio Emídio, que foi também o argumentista e diretor do filme.

O Naufrágio do Veronese

A Lusitânia Filmes competia diretamente com a Invicta Film, companhia de produção fundada em 1910 no Porto por Alfredo Nunes de Matos com a denominação de Nunes de Matos & Cia. à qual acrescentou a designação Invicta Film em 1912. Nesta primeira fase de sua existência a Invicta dedicou-se sobretudo à realização de reportagens e atualidades (v. g. Manobras Navais Portuguesas / 1912, O Naufrágio do “Veronese” / 1913).

Georges Pallu

Rosa do Adro

Barbanegra

Os Fidalgos da Casa Mourisca

O Primo Basilio

Depois de uma reestruturação levada a efeito em 1917, quando ela passou a ser designada como Invicta Film, a empresa investiu na construção de estúdios e laboratórios e contratou dois cineastas estrangeiros: o francês Georges Pallu (Frei Bonifácio / 1918, A Rosa do Adro / 1919, O Comissário de Polícia / 1919, O Mais Forte / 1919, Amor Fatal / 1920, Barbanegra / 1920, Os Fidalgos da Casa Mourisca / 1920, Amor de Perdição / 1921, O Primo Basilio / 1923) e Rino Lupo, nascido em Roma mas com carreira construída em outros países europeus (As Mulheres da Beira / 1922) -,  privilegiando os filmes de ficção com temas geralmente baseados em romances clássicos da literatura portuguesa e folhetins. A Invicta Film encerrou suas atividades em 1928 após uma crise financeira.

Rino Lupo

Mulheres da Beira

Roger Lion

A Sereia de Pedra

Os Olhos da Alma

O Fado

Na década de vinte nova companhias cinematográficas são fundadas:  a Caldevilla Film   pelo publicitário Raul de Caldevilla, que contratou o  cineasta francês, Maurice Mariaud (Os Faroleiros / 1922, As Pupilas do Sr. Reitor / 1923); a meteórica  Fortuna Films, com sede em Paris e escritórios em Lisboa, pela escritora Virgínia de Castro e Almeida, que também contratou um realizador francês, Roger Lion (A Sereia de Pedra / 1922, Os Olhos da Alma / 1923 ); a Patria Film por Henrique Alegria, antigo diretor artístico da Invicta Film  onde Mariaud dirigiu O Fado /  1923; Enigma Film pelo antigo operador de câmera Ernesto de Albuquerque que após a realização de dois filmes, O Rei da Força / 1922 e O Suicida da Boca do Inferno / 1923, partiu com sua esposa para o Brasil, onde trabalhou como repórter em várias revistas e ela como modista, logo afamada. Ele morreu no Rio de Janeiro em 1940; Iberia Film formada por Rino Lupo depois de ser despedido da Invicta Film com financiamento do Banco Pinto da Fonseca & Irmão. Nesta empresa, como sócio minoritário e diretor artístico, Lupo realizou Os Lobos / 1923; Lisboa Film, Braga Film na qual Ernesto de Albuquerque e Erico Braga realizaram Morgadinha de Val-Flor / 1923.

Morgadinha do Val-Flor

Manuel Luiz Vieira

O Fauno das Montanhas

Resta mencionar a ECA – Empresa Cinegráfica Atlântida, criada na Ilha da Madeira em 1926 por Manuel Luís Vieira, fotógrafo natural de Funchal, onde realizou seus primeiros documentários (v. g. Festa de São Pedro na Ribeira Brava, Tosquia de Ovelhas no Paul da Serra) e filmes de enredo (v. g. A Calúnia, O Fauno das Montanhas) antes de se fixar em Lisboa em 1928, iniciando uma longa carreira como diretor de fotografia.

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O SABONETE EUCALOL E OS COMIC COLORS DE PAT POWERS

Quem viveu nos anos 30,40 e 50 pode se lembrar do sabonete Eucalol, cujas embalagens vinham acompanhadas de estampas, impressas em cartão formato 6×9, apresentando na frente desenhos com temas variados e no verso um texto explicativo.

O sabonete Eucalol era um dos produtos de higiene pessoal fabricado pela firma Paulo Sterne Cia Ltda, fundada em 1917 pelo imigrante alemão Paulo Stern, para exercer a atividade de venda de essências. Após o fim da Primeira Guerra Mundial seu irmão Ricardo veio para o Brasil e ajudou a dinamizar a sociedade, iniciando as obras de construção de uma fábrica, inaugurada em 1924, onde foi lançado o sabonete cor de eucalipto e mais tarde a pasta de dentes e o talco. Em 1932, um terceiro irmão, Erich, ingressou na sociedade e a razão social passou a ser Perfumaria Myrta S/A.

Inicialmente os irmãos Stern tentaram conquistar o público com um concurso de poemas tendo por tema o sabonete, porém as vendas do produto não aumentaram. Inspirados nas estampas dos produtos Liebig Bilder Caldo e Extrato de Carne, editadas pela tradicional firma alemã entre 1875 e 1940, resolveram lançar as Estampas Eucalol, incentivando os fregueses a colecioná-las. A estratégia obteve grande êxito aumentando as vendas do sabonete e impulsionando o crescimento da empresa.

As estampas tinham temas brasileiros e / ou universais (v. g. A Vida de Santos Dumont, Jogos Olímpicos, Danças Através do Mundo, História do Brasil, Fatos Decisivos da História Mundial, Índios do Brasil, Lendas da Antiguidade, Uniformes do Brasil, Escotismo, Compositores Célebres bem como Celebridades da Tela e Histórias Infantís (v. g. João e Maria, Branca de Neve, Gato de Botas, Chapeuzinho Vermelho, A Bela Adormecida).

Pat Powers

Patrick Anthony “Pat” Powers (1870-1948) nasceu em Buffalo, Nova York. Associado a Joseph A. Schubert, Sr., ele vendeu fonógrafos de 1900 a 1907 e então formou a Buffalo Film Exchange que comprava filmes dos produtores e os alugava para os nickelodeons. Em 1910, Powers foi para a cidade de Nova York, onde fundou a Powers Moving Picture Company, também anunciada e creditada nos seus filmes como “Powers Picture Plays”.

Em 1912 a companhia de Powers fundiu-se com a Independent Moving Pictures Company (IMP) de Carl Laemmle e juntamente com outras companhias (Bison, Rex, Nestor, Champion) foram depois absorvidas pela Universal Film Manufacturing Company, que começou a operar dois estúdios em Los Angeles, um em Edendale e o antigo Nestor Studio no Sunset Boulevard com Gower Street. Mais tarde, em 1916-1917 Powers a produziu nove desenhos animados reunidos em uma série intitulada Fuller Pep.

Ub Iwerks

Em 1927, após ter feito sem êxito uma oferta para a compra da DeForest Phonofilm, Powers contratou um ex-técnico da DeForest, William Garity para produzir uma versão clonada do sistema de som Phonofilm que se tornou o Powers Cinephone. Em 1928 Powers vendeu a Powers Cinephone para Walt Disney para que ele pudesse fazer seus desenhos animados falados tais como Steamboat Willie / 1928 com o Mickey Mouse. Sem conseguir um distribuidor para seus desenhos animados sonoros, Disney distribuiu-os através da companhia de Powers, Celebrity Pictures. Em 1930 os dois se desentenderam por questão de dinheiro e Powers ajudou Ub Iwerks, animador principal de Disney a criar seu próprio estúdio, que realizou os Comi Color Cartoons, os quais foram distribuídos pela Celebrity Pictures. Iwerks dirigiu estes desenhos animados de 1933 a 1936, produzidos em Cinecolor, um processo de duas-cores combinando vermelho e azul. Entre os colaboradores de Iwerks distinguiram-se Shamus Culhane e Al Eugster, os roteiristas Otto Englander, Ben Hardaway, George Manuell e o músico Carl Stalling. O primeiro filme da série, Jack and the Beanstalk estreou em 1933. Em 1934 Iwerks utilizou a sua invenção de maior prestígio, câmera multiplana, mecanismo que permite à câmera se deslocar, passando por diversos “Planos” (folhas de celofane ou camadas de vidro com os desenhos) colocados a várias distâncias da câmera. Fotografando-os à medida em que avança, a câmera multiplana propicia a ilusão de profundidade e perspectiva. Ele inaugurou o seu uso em The Headless Horseman, baseado no conto “The Legend of Sleepy Hollow” de Washington Irving.

A maioria dos exemplares dos Comi Color Cartoons foram baseados em histórias infantís como aquelas representadas nas Estampas Eucalol e, provavelmente por causa disso, os filmes da série exibidos no Brasil receberam o título de Historietas Eucalol.

                                                                     FILMOGRAFIA

1933

João Pé de Feijão / Jack and the Beanstalk. 8 min.

1934

Pequena Galinha Vermelha / The Little Red Hen. 7 min.

The Brave Tin Soldier. 8 min.

O Gato de Botas/ Puss in Boot. 7 min.

The Queen of Hearts.  8 mn.

 

Aladim e a Lâmpada Maravilhosa / Aladdin and the Wonderful Lamp.  8 min.

The Headless Horseman. 9 min.

The Valiant Taylor ou The King´s Taylor. 8 min.

Don Quixote. 8 min.

João Geada / Jack Frost. 9 min.

1935

Sambô, o Negrinho / Little Black Sambo. 8 min.

The Brementown Musicians. 9 min.

A Velhinha e o Cão / Old Mother Rubbard. 8 min.

A Pequena Ovelha de Maria / Mary´s Little Lamb. 8 min.

Tempo de Verão / Summertime. 8 min.

Sinbad, o Marujo / Sinbad, the Sailor. 7 min.

Os Três Ursos / The Three Bears. 8 min.

Balloonland ou The Pincushion Man. 7 min.

Simão Simplório / Simple Simon. 7 min.

Ovos Mágicos / Humpty Dumpty. 7 min.

1936

Ali Baba. 7 min.

O Pequeno Polegar / Tom Thumb. 7 min.

O Gato de Dick Wittington / Dick Wittington´s Cat.  8min.

O Rapazinho de Azul / Little Boy Blue. 7 min.

Dias Felizes / Happy Days. 9 min.

PRIMÓRDIOS DO CINEMA ITALIANO

Em 11 de novembro de 1895, Filoteo Alberini patenteou um aparelho denominado Kinetografo Alberini, mas esta invenção rudimentar foi rapidamente ultrapassada pelo Cinematógrafo dos irmãos Lumière, máquina usada como câmera, projetor e copiadora, portátil, e acionada manualmente, não dependendo de uma fonte de eletricidade.

Filoteo Alberini

 O primeiro representante dos Lumière na Itália foi Vittorio Calcina, treinado pelo chefe dos operadores de câmera da fábrica de Lyon, Jean Alexandre Louis Promio, que viajou por vários países da Europa para divulgar o Cinematógrafo, inclusive na Itália, onde filmou a cidade de Veneza de uma gôndola em movimento. Enquanto Promio continuava suas viagens pela Europa, Vittorio Calcina registrava eventos e visitas reais e ajudava a enriquecer o catálogo dos Lumière.

Em 1896 um imitador dos Lumière, Italo Pacchioni, inventou uma máquina semelhante ao cinematógrafo, com a qual filmou um inevitável Arrivo del treno ala Stazione di Milano, algumas “vistas” cômicas (v. g. La Gabbia dei Matti, Il Finto Storpio, La Bataglia di Neve) e atualidades como I funerali de Umberto I e I funerali di Giuseppe Verdi a Milano.

Ainda em 1896, Leopoldo Fregoli, o famoso transformista (muito popular em nosso país onde se apresentou em 1895 no Teatro Lyrico, em 1915 no Palace-Theatre e em 1925 no Teatro Recreio) encontrou-se com Louis Lumière e obteve alguns filmes deste último para usá-los como parte de seus espetáculos. O sucesso destes encorajou-o a filmar seus próprios números no palco. Ele usou muitos truques e teve ainda a idéia de projetar seus filmes ao contrário. Além disso criou um acompanhamento vocal dos bastidores imitando as vozes dos personagens na tela.

Arturo Ambrosio

Porém o primeiro sinal de uma atividade cinematográfica mais significativa veio de Turim, para onde o fotógrafo Edoardo Di Sambuy trouxe uma câmera que havia comprado na França. Ele a repassou para um revendedor de equipamentos óticos e fotográficos, Arturo Ambrosio, sob cuja égide Roberto Omegna filmou os primeiros cinejornais italianos (v. g. La prima corsa automobilista Susa Moncenisio, Manovre degli alpini Colle Ranzola). Em 1904 a Società Anonima Ambrosio ergueu o primeiro estúdio cinematográfico italiano.

No mesmo ano, Filoteo Alberini abriu o Cinema Moderno em Roma e em 1905 fundou com Dante Santoni o “Primo Stabilimento Italiano di Manufattura Cinematografica Alberini e Santoni”. No final deste ano, Alberini e Santoni construiram na via Appia Nuova um estúdio, que diziam ter o equipamento mais avançado importado da França e da Alemanha, e nele produziram um filme com enredo, La Presa di Roma. Este filme, uma evocação da conquista de Roma pelas tropas italianas em 1870 (com sete cenas, 250 metros) teve a colaboração do renomado ator Carlo Rosaspina e, mais importante ainda, a cooperação do Ministro da Guerra “para uniformes, artilharia e armamento”.

La Presa di Roma

De repente o cinema italiano começou a se tornar uma indústria e, no início de 1906, Alberini e Santoni tornou-se uma sociedade anônima, Società Anonima per Azioni Cines, administrada pelo engenheiro Adolfo Pouchain, tendo como secretário o Barão Alberto Fassini, magnata da indústria têxtil. Santoni deixou a empresa pouco tempo depois e Alberini passou a ocupar o cargo de diretor técnico. No mesmo ano, a Cines contratou um dos melhores técnicos da Pathé, Gaston Velle, que trouxe vários assistentes consigo. Como diretor artístico, Velle realizou filmes de vários gêneros entre eles Viaggio in una Stella, La malia dell’oro, Pierrot innamorato. Em 1907, Mario Caserini, que havia entrado para a Cines como ator, iniciou suas atividades como diretor e Velle retornou para a França. A Cines começou então a se especializar na produção de dramas shakespereanos e filmes históricos.

Inspirado nesses filmes históricos da Cines e com o êxito da Ambrosio Film em Turim com Os Últimos Dias de Pompéia / Gli Ultimi Giorni di Pompei / 1908, os industriais Carlo Rossi e Guglielmo Remmert, o sogro deste, Carlo Sciamengo, e o inventor Lamberto Pineschi, fundaram a Carlo Rossi & C. Oito meses depois, por divergências entre os sócios, a empresa entrou em liquidação. Com a ajuda do então jovem contador, Giovanni Pastrone, Sciamengo reavivou-a e, em setembro de 1908, ela foi transformada em Itala Film, que obteve muitos triunfos com O Conde Ugolino / Il Conte Ugolino / 1908 e Máscara de Ferro / La Mascara de Ferro / 1909 e se saiu muito bem nas comédias de Cretinetti e Tontollini, respectivamente interpretadas pelos cômicos franceses André Deed e Ferdinand Guillaume. Quanto a Rossi, ele foi contratado pelo Barão Fassini para ocupar um cargo de direção na Cines. Em 1913 a Cines absorveu a Celio Film, fundada em 1912 pelo advogado (e depois deputado) Gioacchino Mecheri, o diretor Baldassare Negroni e o marquês Alberto Del Gallo.

O sucesso das primeiras “fábricas de filme” em Turim e Roma logo atraíram a atenção em outros lugares, surgindo várias firmas em 1908, notadamente em Milão onde se distinguiu a Saffi-Comerio (depois Milano Film) presidida por Luca Fortunato Comerio, ex-fotógrafo oficial da Casa Real e do Rei Vittorio Emanuelle III. Em Turim foi fundada a Aquila Film do empresário Camilo Ottolenghi e a Pasquali Film do ex-jornalista e empregado da Ambrosio Film, Ernesto Maria Pasquali. Em Roma, os irmãos Azaglio e Lamberto Pineschi organizaram uma companhia que em 1909 tornou-se a Latium Film. Em Nápoles surgiu a Fratelli Troncone (Partenope Film). Em outras cidades como Veneza, Florença, Velletri, Palermo, companhias mais ou menos efêmeras, filmaram eventos locais. No começo da Primeira Guerra Mundial novas produtoras foram fundadas: Caesar Film, Palatino-Film, Medusa-Film, Tiber Film, Nova-Film em Roma; Lombardo Film em Nápoles; Armenia Film em Milão etc.

Esta grande expansão da indústria de cinema italiana foi marcada por um florescimento precoce do drama de época extraído da literatura ou da história, emergindo diretores importantes: Luigi Maggi (Os Últimos Dias de Pompéia / Gli Ultimi GIorni di Pompei / 1908, La Gioconda / 1911), Giuseppe De Liguoro (Il Conte Ugolino / 1909, O Inferno / L´Inferno / 1909); Giovanni Pastrone (Giordano Br uno / 1908, A Queda de Tróia / La Caduta di Troia / 1910, Cabiria / Cabiria / 1914); Mario Caserini (Romeu e Julieta / Romeo e Giuletta / 1908, Os Três MosqueteirosI Tre Moschettieri / 1909); Enrico Guazzoni (Brutus / Brutus / 1910, Agrippina / 1910, Jerusalem LIbertada / La Gerusalemme LIberata / 1911, Quo Vadis? / Quo Vadis? / 1912, Marco Antonio e Cleópatra / Marcantonio e Cleopatra / 1913, Grandeza e Decadência de Roma ou No Tempo dos Césares / Caius Julius Caesar / 1914; Nino Oxilia (Joana D ´Arc – A Donzela D´Orleans / Giovanna d´Arco / 1913, Com Este Sinal Vencerás / In Hoc Signo Vinces / 1913).

O filme mais famoso foi Cabiria, superprodução dirigida por Giovanni Pastrone com cenografias espetaculares que teriam influenciado David Wark Griffith na realização do seu monumental Intolerência / Intolerance / 1917 e lançado o personagem de Maciste, o gigante de uma força hercúlea e bom coração, visto depois em uma série de filmes de aventura interpretado por Bartolomeo Pagano.

Preocupado com a competição italiana, Charles Pathé decidiu enfrentá-la no seu próprio terreno e fundou uma subsidiária, a F.A.I. (Film d´Arte Italiano), para funcionar nos moldes da Le Film D´Art francêsa (companhia criada para realizar, com o concurso de eminentes escritores e atores e filmes de qualidade artística capazes de interessar a um público mais exigente), nomeando o empresário teatral Adolfo Re Riccardi, como diretor geral e com Gerolamo Lo Savio e Ugo Falena exercendo função administrativa e funcionando também como diretores ou argumentistas. Este triunvirato contratou atores famosos do palco como Ettore Berti, Ermete Novelli, Ruggero Ruggeri, Cesare Dondini, Ferrucio Garavaglia, Vittoria Lepanto etc. e lançou as jovens atrizes Francesca Bertini e Maria Jacobini, que se tornariam duas das mais famosas “divas” do cinema italiano mudo. Entre os filmes incluíam-se Otello / 1909, Carmen / Carmen / 1909, A Dama das Camélias /  La Signora delle Camelie / 1909, Rei Lear / Re Lear / 1910, Lucrécia Borgia / Lucrezia Borgia / 1912 etc. Em 1917, a maioria das ações da F.A.I. foi adquirida por Gioacchino Mecheri, que a afiliou à Tiber Films, companhia cinematográfica romana que ele havia fundado em 1914.

Francesca Bertini

Pina Mennichelli

No período 1909-1916, além do filme histórico-literário e da linha cômica podemos apontar o divismo e a tendência realista. Assim como Cabiria instalou a tradição do super-espetáculo cinematográfico, o divismo italiano precedeu e provocou o estrelismo hollywoodiano. Entre as grandes divas podemos citar os nomes de Francesca Bertini, Lyda Borelli, Maria Jacobini, Lina Cavalieri, Hesperia, Pina Menichelli, Rina de Liguoro Italia Almirante Manzini etc. e, para serví-las, apareceram novos diretores como por exemplo: o roteirista Baldassare Negroni (História de um Pierrot / Histoire d´un Pierrot / 1913 com Francesa Bertini) e os atores Emilio Ghione (Esposa na Morte / Sposa nella morte / 1915 com Lina Cavalieri), Gustavo Serena (Assunta Spina ou Sangue Napolitano / Assunta Spina / 1915 com Francesca Bertini) e Febo Mari. Outra diva, mas do teatro, Eleonora Duse, que estava ausente dos palcos há sete anos, aceitou o convite da Ambrosio Film para atuar em Cinzas / Cenere / 1916 ao lado de Febo e dirigida por ele. Os dois escreveram o roteiro e a grande atriz dramática esperava que esta experiência lhe abrisse uma nova carreira no cinema, porém ficou desapontada tanto com a produção quanto com sua interpretação. Já Perdidos nas Trevas / Sperdutti nel Buio / 1914 e Teresa Raquin / Thérèse Raquin / 1915, realizados pelo jornalista, poeta, autor e produtor teatral Nino Martoglio, representam a corrente realista, geralmente ignorada de uma produção paralela à dos filmes colossais e grandiloquentes e que mais tarde inspiraria o neorealismo.

Eleonora Duse 

Outro gênero, chamado commedia brillante (alta comédia), revelou Lucio D´Ambra, roteirista que se tornou diretor, cuja obra mais estimada parece ter sido a opereta Echec ao Rei ou Cheque Ao Rei! / Il Re, le Torri, gli Alfieri / 1916. As comédias silenciosas de D´Ambra suscitaram comparações com os filmes de seu contemporâneo alemão Ernst Lubitsch e ele foi cognominado “o Goldoni do Cinema Italiano”.

Il Re, le Torri, gli Alfieri

Entre os diretores que fizeram sua estréia antes do ínicio da Primeira Guerra Mundial ainda estavam Gennaro Righelli (vários filmes estrelados por Maria Mauro, sua esposa na época), Carmine Gallone (O Beijo de Cyrano / Il Bacio di Cirano / 1913, A Mulher Nua / La Donna Nuda / 1914) e Augusto Genina (La Moglie di sua eccelenza / 1913, A Palavra que Mata / La Parola qui uccide / 1914) cujas carreiras prosseguiriam com vigor no cinema sonoro. Outro ator, Mario Bonnard, parceiro das divas mais famosas, progrediria para a direção um pouco mais tarde,.

Nos primeiros tempos do cinema as empresas francesas, italianas e dinamarquesas dominavam o mercado internacional sem que existisse uma colisão frontal de interesses. Foi exatamente o oposto que ocorreu com a importação massiva de filmes americanos que tomaram o velho mundo de assalto a partir dos anos 1916-1917. Apesar desta nova situação, o cinema italiano tentou continuar como antes. Em 1916 Guazzoni filmou São Sebastião, O Mártir ou Fabiola / Fabiola, drama edificante da Roma Cristã; Caserini, um Ressureição / Resurrezione, baseado no romance de Tolstoi; Negroni, A Princesa de Bagdad / La Principessa di Bagdad, e Febo Mari, após o realismo de Cenere, rodou um ambicioso Attilla – Flagellum Dei / Attila, flagello di Dio seguido por Judas em 1917. Ainda neste ano, a Tespi Film de Roma, recentemente fundada por Eugenio Sacerdotti, produziu A Vida de São Francisco de Assis / Frate Sole, a vida de São Francisco de Assis em quatro episódios, dirigida por Mario Corsi e Ugo Falena.

Porém o cinema americano havia conquistado o mercado mundial, que pretendia manter.