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LYNN BARI E SUA BUSCA PELO ESTRELATO

Ela era atriz contratada de estúdio típica durante a época de ouro de Hollywood. Alta (1.70m), bonita, muito talentosa e admirada pelos fãs e colegas de trabalho, parecia destinada a se tornar uma grande estrela. Os admiradores brasileiros – que eram muitos – prognosticavam seu sucesso na tela e suas fotos – sempre elegantemente vestida – eram impressas constantemente na maioria das nossas revistas, notadamente em reportagens tipo “estrelas na intimidade” ou como modelo em anúncios de propaganda.

Lynn Bari

Para conhecer melhor o percurso de sua ascensão profissional, consultei o excelente livro de Jeff Gordon, “Foxy Lady -The Autorized Biography of Lynn Bari” (BearManor, 2010), valorizado pelos extensos depoimentos da própria biografada, entrevistas com dezenas de seus amigos, membros da família e associados profissionais, além de muitas fotos.

Lynn Bary (1919 – 1989), cujo verdadeiro nome era Marjorie Shuyler Fisher (mas seria sempre chamada de Peggy), nasceu em Roanoke, Virginia, filha de Marjorie e John Fisher. Seu irmão, John, era cinco anos mais velho. Os Fishers viveram em Roanoke até 1922, quando se mudaram para Mill Mountain e se instalaram no bairro de classe média de Walnut Hill. Em 1925 a família se transferiu para Lynchburg, onde John montou uma concessionária de automóveis. Marjorie tornou-se alcoólatra e passou a hostilizar o marido, que entrou em depressão e se suicidou, pulando da janela de um hotel. Em 1927 Marjorie foi morar com os filhos na casa de sua irmã Ellen em Melrose; dois anos depois, foi com Peggy para Boston, deixando John com a tia. Marjorie não se deu bem nos empregos que teve como recepcionista em dois escritórios e se tornou membro do Institute of Religious Sciences, onde conheceu e acabou se casando com um de seus líderes locais, o Reverendo Robert L. Bitzer. No início de 1930 o reverendo foi designado para incrementar a Christian Science em Los Angeles e inaugurar uma igreja em Hollywood, onde este movimento religioso estava prosperando.

Lynn Bari

Assim que chegou em Los Angeles, Peggy quis entrar para o cinema. Aos treze anos de idade, era uma bela adolescente e, quando viu o anúncio na página de classificados de um jornal “Procura-se moças para um musical da MGM. Tragam maiô”, com a aprovação entusiástica da mãe, levando o maiô e de sapatos de salto alto, chegou no estúdio, onde três mil mulheres também se apresentaram. No palco bem iluminado onde elas desfilaram estava Sammy Lee, diretor de danças da Fox, na ocasião trabalhando para a MGM por empréstimo. Ele estava á procura de showgirls / modelos (muitas vezes chamadas de coristas, mas que não se confundem elas, porque não eram dançarinas – apenas desfilavam com vestidos bonitos e, de vez em quando, fingiam cantar a letra de uma música pré-gravada).

O primeiro emprego de Peggy (falsificando a idade) no cinema foi como modelo em Amor de Dançarina / Dancing Lady / 1933. No mesmo ano, ainda na MGM, ela pareceu em Viva o Barão! / Meet the Baron, que foi lançado antes de Amor de Dançarina. Marjorie tinha como certo que Peggy iria se tornar uma estrela e ajudou a filha a criar o nome artístico de Lynn Bari (inspirado no prenome da atriz Lynn Fontanne e no sobrenome do escritor James Barrie (mudando a pronúncia de Barrie para Bari). Em 1934 Lynn conseguiu emprego como extra em Eu sou Suzanne! / I am Suzanne! (Fox) e A Conquista da Beleza / Search for Beauty (Paramount) e, no período 1934 – 1937, trabalhou na Fox como showgirl, extra ou em pequenos papéis em aproximadamente vinte filmes da Fox / Twentieth Century-Fox por ano, tendo sido emprestada para a MGM para atuar como showgirl em Ziegfeld, o Criador de Estrelas / The Great Ziegfeld. Quando não estava diante das câmeras, Lynn frequentava as aulas da escola de arte dramática da Fox (dirigida por Lillian Barkley), que lhe serviram também para suprir a falta de uma educação formal, que ela também complementou, frequentando bibliotecas a fim de conhecer as grandes obras literárias. Após quatro anos de muita persistência e dedicação, a jovem atriz saiu do anonimato com três filmes: O Lanceiro Espião / Lancer Spy / 1937, A Baronesa e o Mordomo / The Baroness and the Butler / 1938 e Walking Down Broadway / 1938. No primeiro filme ela fez um pequeno papel (Miss Fenwick, filha do Coronel Fenwick / Lionel Atwill) que, durante uma viagem de avião, ouve do pai, a história de espionagem) e seu nome saiu em último lugar nos créditos finais; no segundo e terceiro filme, era coadjuvante (a camareira Klari; a corista Sandra de Voe que é atropelada por um caminhão ao sair do teatro) com o nome nos créditos iniciais.

Lloyd Nolan e Lynn Bari em Testemunha Ocular

 Preston Foster e Lynn Bari em O Espião Japonês

Claire Trevor, a estrela de Walking Down Broadway, havia sido a principal atriz dos filmes B da Fox nos últimos cinco anos e, quando deixou o estúdio, Lynn herdou esta posição na unidade supervisionada por Sol Wurtzel. Tal como Trevor, Lynn era uma atriz forte e inteligente com um profundo compromisso com o seu ofício e, assim como sua antecessora, possuia uma “qualidade de estrela”, sua simples presença podia animar um filme. Entre 1938 e 1942 Lynn interpretou a heroína em 17 filmes supervisionados por Wurtzel entre eles filmes de séries como Mr. Moto (O Palpite de Mr. Moto / Mr. Moto´s Gamble / 1938); Charlie Chan (Charlie Chan na Cidade das Trevas / Charlie Chan in the City of Darkness / 1939); Big Town Girls (Meet the Girls / 1939, Desculpe Nossa Ousadia / Pardon Our Nerve / 1939); Camera Daredevills (Salvando um Reino / Sharpshooters / 1938,  Cortejando a Morte / Chasing Danger / 1939); Michael Shayne (Testemunha Ocular / Sleepers West  / 1941). Outros filmes sob contrôle de Wurtzel foram: 1938 – Casaremos Amanhã / Battle of Broadway; O Relâmpago da Pista / Speed to Burn. 1939 – Surpresa Noturna / News is Made at Night; Três Capacetes de Aço / Pack Up Your Troubles. 1940 – A Sorte Engana / City of Chance, Loura Perigosa / Free, Blonde and 21, Vingança do Passado / Earthbound, O Segredo da Noiva / Pier 13, Um Drama do Ar / Charter Pilot. 1941 – Vivemos a Pressa / We Go Fast, Minha Esposa Diverte-se / Moon Over Her Shoulder, Precisa-se de um Marido / The Perfect Snob. 1942 – O Espião Japonês  / Secret Agent of Japan.

George Sanders e Lynn Bari em Nas Garras do Falcão

Simultaneamente, salvo em uma ocasião quando, emprestada à RKO, atuou ao lado de George Sanders na série B The Falcon (Nas Garras do Falcão / The Falcon Takes Over / 1942), Lynn serviu como coadjuvante em filmes classe A (1938 – Josette / Josette, Adeus para Sempre / Always Goodbye, Mendigo Milionário / I´ll Give a Million. 1939 – A Volta de Cisco Kid / The Return of Cisco Kid, Hotel para Mulheres / Hotel for Women, Hollywood em Desfile / Hollywood Cavalcade. 1940 – A Bela Lillian Russell / Lillian Russell. 1941 – Sangue e Areia / Blood and Sand, Quero Casar-me Contigo / Sun Valley Serenade. 1942 – The Night Before the Divorce, Serenata Azul / Orchestra Wives), sendo creditada como atriz principal em Kit Carson / Kit Carson / 1941 (produzido por Edward Small) e Assim Vivo Eu / The Magnificent Dope / 1942

Dana Andrews, Lynn  Bari e Jon Hall em Kit Carson

Ao nível do filme B Lynn interpretou papéis de heroína, alegre e simpática. Nos filmes A ocorreu o contrário: Lynn foi quase que exclusivamente mostrada como uma personagem secundária insensível, geralmente como malvada, a mulher fatal da história. Ela queria estrelar filmes A, mas o estúdio estava satisfeito em mantê-la como atração principal na área do filme B, onde seu nome garantia sucesso na bilheteria. Lynn nunca teve um forte apoio publicitário para impulsionar sua ascensão ao estrelato apesar de todo seu esforço e dedicação ao trabalho.

Sonja Henie, John Payne e Lynn Bari em Quero Casar-me Contigo

Em um filme A produzido em 1941, Quero Casar-me Contigo, ela chegou perto de atingir sua meta. Nesta comédia musical dirigida por Bruce Humberstone, Lynn fazia o papel de Vivian Dawn, cantora de blues temperamental que, durante uma gravação, se interessava por Ted Scott (John Payne), pianista da orquestra de Phil Corey (Glenn Miller). Vivian contratava Phil e sua banda para se apresentar com ela em Sun Valley, no Idaho, onde surgia uma refugiada norueguesa, Karen Benson (Sonja Henie), nascendo uma rivalidade entre elas. Glamorosamente fotografada por Edward Cronjager e vestida com elegância por Travis Banton, Lynn recebeu finalmente um “tratamento” completo de estrela. No mesmo ano, sua situação promissora foi reforçada em um filme B, Minha Esposa Diverte-se / Moon Over Her Shoulder, comédia romântica com um pendor feminista dirigida por Alfred L. Werker. Lynn é Susan Rossiter, esposa negligenciada de um psiquiatra, Dr. Phillip Rossiter (John Sutton). Susan sente-se não realizada, desempenhando o modelo de uma dona de casa perfeita, sentimento agravado pela obsessão de seu marido pelo trabalho. Ele sugere que ela retome seu antigo passatempo, a pintura. Um dia ela encontra um iatista Rex Gibson (Dan Dailey) e passam o dia juntos. Ela abraça seu estilo de vida excêntrico, passa por uma renovação pessoal, e finalmente é obrigada a escolher entre o velejador e o analista. Novamente, muito bem vestida e fotografada (desta vez respectivamente por Herschel McCoy e Lucien Andriot), Lynn interpreta um papel importante com muito charme e entusiasmo.

Entre 1943 e 1946 Lynn fez : (1943 – Paixão Oriental / China Girl; Aquilo Sim, Era Vida! / Hello, Frisco, Hello. 1944 – A Ponte de San Luis Rey / The Bridge of San Luis Rey; Tampico / Tampico, Explosão Musical / Sweet and Low-Down. 1945 – O Capitão Eddie / Captain Eddie. 1946 – Choque / Shock; Lar, Doce Tortura / Home Sweet Homicide; Margie / Margie, mas em nenhum deles teve oportunidade de mostrar seu talento, fato aliás lamentado pelos críticos e seus fãs. Durante os anos de guerra a jovem atriz gozou de muita popularidade entre os soldados como pin-up e foi apelidada de “The Woo Woo Girl” e “The Girl with the Million Dollar Figure”.

Lynn Bari e Edward G. Robinson   em Tampico

Bari e Vincent Price em Choque

Lynn Bari como Pin-Up Girl

Em 1947 Lynn foi requisitada pela RKO, onde contracenou com George Raft em um filme noir muito bom, Noturno / Nocturne, dirigido por Edwin L. Marin e produzido por Joan Harrison, assistente de longa data de Alfred Hitchcock. Na trama um compositor donjuanesco é encontrado morto caso sobre o teclado de um piano. As paredes da sala estão cheias de retratos fotográficos de suas muitas conquistas. A única pista da identidade do assassino é a partitura da música, que ele estava tocando quando morreu, dedicada a uma tal de “Dolores”. Porém ele costumava chamar todas as amantes por este nome. O detetive Joe Warne (George |Raft) investiga o caso e Lynn é uma das moças dos retratos e, portanto, uma das suspeitas do crime. Mais uma vez ela recebeu um tratamento fotográfico especial, agora por um especialista do gênero, Harry J. Wild, e uma atenção também por parte da produtora, que acompanhou de perto a escolha de seu vestuário.

Lynn Bari e George Raft em Noturno

Depois deste interlúdio recompensado, Lynn voltou para a Fox, recusou indignada um papel de segunda importância que lhe ofereceram e foi suspensa. Cumpriu sua penitência e, quando retornou ao estúdio, alguns incidentes e mal entendidos provocaram sua saída do estúdio, após tantos anos de serviço. Como disse Jeff Gordon no seu livro, foi-se todo o seu apoio criativo, financeiro e emocional. Pela primeira vez em sua vida a quase-estrela estava realmente sozinha.

Turhan Bey e Lynn Bari em O Místico

Ciente de que suas opções de emprego se tornaram limitadas devido à ira de Darryl F. Zanuck contra ela, Lynn aceitou logo a primeira oferta que teve, vinda da recentemente formada Eagle-Lion, onde fez dois filmes em 1948: Morrerei Onde Nasci / The Man from Texas e O Místico / The Spiritualist ou Amazing Mr. X. Graças  sobretudo aos efeitos fotográficos  especiais proporcionados por John Alton e ao score romântico de Alexander Laszlo, o último filme citado foi o melhor que ela fez na fase final de sua carreira. Neste drama de mistério Lynn faz o papel de uma Christine Faber, herdeira rica e encantadora, que reside em uma mansão ao longo da costa da Califórnia. É na praia que Chris fica pela primeira vez ouve a voz de seu marido Paul (Donald Curtis), supostamente falecido há dois anos em um desastre de automóvel. Paul na verdade está vivo e, com a cumplicidade de um falso vidente chamado Alexis (Turhan Bey), que o ajuda a assombrar sua mulher, está armando um plano para se apossar de sua fortuna. Atuando com naturalidade, Lynn destaca-se do resto do elenco e seus close-ups belíssimos expõem sua formosura.

Lynn Bari e Ray Middleton em Minha Vida Te Pertence 

Os papéis de Lynn nos seus filmes derradeiros produzidos por companhias variadas, assinalaram um final melancólico para a sua carreira cinematográfica: 1949 – Revolta de um Coração / The Kid from Cleveland (Herbet Kline / Republic). 1951- Um Homem e Sua Alma / I´d Climb the Highest Mountain (Fox); Uma Canção e um Beijo / Sunny Side of the Street (Columbia); Abismos do Desejo / On the Loose (Filmakers / RKO). 1952 – Minha Vida Te Pertence / I Dream of Jeannie (Republic); Sinfonia Prateada / Has Anybody Seen My Gal (Universal-International). 1954 – Francis entre as Boas / Francis Joins the Wacs (U-I). 1955 – De Pernas Pro Ar / Abbott and Costello Meet the Keystone Kops (U-I) 1957 – Terror na Ilha das Mulheres / The Women of Pitcairn Island (Regal); 1958 – Damn Citizen (U-I). 1962 – As Nove Vidas de Elfego-Baca / Elfego Baca: Six-Gun Law (Walt Disney / Buena Vista). Sua trajetória no cinema sempre foi acompanhada por apresentações no rádio, e depois no teatro e na televisão, onde ainda manteve algum prestígio, até se aposentar definitivamente da vida artística em 1974.

No âmbito familiar a ascensão de Lynn para o estrelato foi sabotada por problemas não resolvidos com sua mãe dominadora e alcoólatra, três casamentos frustrados (sempre explorada pelos seus sucessivos consortes (Walter Kane, Sid Luft, Nathan Rickles) e, a partir de determinado momento de sua vida, pelo seu próprio alcolismo. Lynn morreu de ataque cardíaco em 1898, deixando um filho, John Luft.

AC

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