Ainda não perdí o hábito de esmiuçar a Pequena História do Cinema, para tentar encontrar aspectos pouco conhecidos ou totalmente desconhecidos da 7ª Arte. No meu primeiro artigo para este blogue, escrito em 13 de fevereiro de 2012, intitulado “Um Curioso Momento da História do Cinema”, abordei um breve porém fascinante fenômeno que merecia ser melhor conhecido: os chamados Soundies, aqueles filmes de breve duração, exibidos em uma máquina parecida com as juke-boxes, vitrolas de pé muito comuns nos bares e restaurantes na década de 40.
Agora encontrei outra curiosidade: as Cinéphonies. Ancestrais do clipe musical, elas eram curtas-metragens realizados a partir de uma música clássica por alguns cineastas de renome sob orientação de Émile Vuillermoz. As filmagens ocorreram nos estúdios da Paramount em St. Maurice pela Compagnie des Grandes Artistes Internationaux, fundada pelo violinista Jacques Thibaud.
Émile – Jean – Joseph Vuillermoz (1878 – 1960) Nascido em Lyon, era compositor, musicógrafo, crítico de música, literatura, teatro e cinema. Por volta de 1916, foi o principal crítico de cinema na França, usando frequentemente os pseudônimos de Gabriel Darcy e Claude Bonvin. Ele e Louis Delluc são considerados como os verdadeiros fundadores da crítica cinematográfica, também exercida na época por René Jeanne e Léon Moussinac.
Em 1924 Vuillermoz ajudou a organizar a primeira exibição importante de cinema no Museu Galliera, “L Éxposition de l´art dans le cinéma français”. Em 1935 Vuillermoz e Jacques Thibaud iniciaram o projeto das cinéphonies empregando diretores como Max Ophuls, Dimitri Kirsanoff, Marcel L´Herbier, os diretores de fotografia Franz Planner e Boris Kauffman (irmão mais novo de Dziga Vertov) e artistas como Elisabeth Schumann, Alfred Cortot, Alexander Brailowsky, Ninon Vallin, Tasso Janopoulo, Jacques Thibaud e a nossa Magdalena Tagliaferro. Os compositores representados foram Albeniz, Chopin, Debussy, Fauré, Mompou, Schubert e Szymanowski. Em 1936 ele foi membro do júri no Quarto Festival Internacional de Cinema de Veneza e teve, juntamente com René Jeanne, uma participação importante na criação do Festival de Cannes.
Jacques Thibaud (1880 – 1953) nasceu em Bourdeaux e estudou violino com seu pai antes de entrar para o Conservatório de Paris aos treze anos de idade. Em 1896 ele ganhou – juntamente com Pierre Monteux (que depois se tornou maestro famoso) – o prêmio de violino do Conservatório. Thibaud teve que reconstruir sua técnica após ter sido ferido na Primeira Guerra Mundial. Em 1943 ele e Marguerite Long instituiram a Marguerite Long-Jacques Thibaud International Competition para violinistas e pianistas, que tem lugar todos os anos em Paris. A partir de 2011 ela incluiu cantores e agora é conhecida como Long – Thibaud – Crespin Competition, em homenagem à soprano Régine Crespin. Thibaud ficou conhecido não somente pelo seu trabalho como solista, mas também por sua performance como músico de câmera, particularmente com o pianista Alfred Cortot e o violoncelista Pablo Casals. Em 1 de setembro de 1953, Thibaud e outros 41 passageiros morreram em um acidente aéreo do vôo 178 da Air France. Seu violino Stradivarius de 1720 foi destruído no acidente.
As cinéphonies estão preservadas, entre outras instituições, nos Archives Françaises du Film. Suas restaurações, no início dos anos noventa, possibilitaram sua divulgação, muitas vêzes, no Canal Europeu Arte e podem ser vistas no You Tube.
Pude apurar apenas sete cinéphonies:
AVE MARIA DE SCHUBERT – Música de Franz Schubert cantada pela soprana alemã Elizabeth Schumann. Dir: Max Ophuls / 1935.
LES BERCEAUX – Música de Gabriel Fauré cantada pela soprano francêsa Ninon Vallin enquanto a câmera evoca cenas marinhas e bretãs. Dir: Dimitri Kirsanoff / 1935.Fotografia: Boris Kaufman.
LA JEUNE FILLE AU JARDIN – Música de Frederico Mompou executada pela pianista brasileira Magdalena Tagliaferro enquanto a dançarina alemã Clotilde von Derp (esposa do dançarino e coreógrafo russo Alexander Sakharoff), expressa a melodia em um bailado especial. Dir: Dimitri Kirsanoff / 1935.
LA FONTAINE d’ ARÉTHUSE – Música de Karol Szymanowski interpretada pelo violinista Jacques Thibaud e pelo pianista grego Tasso Janoupolo enquanto Sabine Earl e Michel Gevel interpretam, ela au naturel, a lenda da mitologia grega sobre a ninfa Aretusa e o deus do rio Alfeu. Dir: Dimitri Kirsanoff / 1935. Fotografia: Boris Kaufman.
LA VALSE BRILLANTE EM LA BÉMOL – Música de Frédéric Chopin) interpretada pelo pianista Alexander Brailowski. Dir: Max Ophuls / 1936. Fotografia: Franz Planner.
CHILDREN´S CORNER / LE COIN DES ENFANTS – Música de Claude Debussy interpretada pelo pianista Alfred Cortot. Dir: Marcel L’Herbier / 1936. Fotografia: Franz Planner. Premiado na Bienal de Veneza.
MALAGUENA – Música de Isaac Albeniz interpretada pelo violinista Jacques Thibaud. Dir: ignorado / 1940.