JULES DASSIN

Seu verdadeiro nome era Julius Moses Dassin (1911-2008), nascido em Middletown, Connecticut, filho de Berthe Vogel e Samuel Dassin, imigrantes judeus que se instalaram com seus oito filhos no Harlem em Nova York em busca de uma vida melhor. Jules estudou na Morris High Scholl no Bronx. O interesse pelo teatro levou-o a frequentar aulas de arte dramática na Civic Repertory Theatre Company de Eva La Gallienne. Em 1936, ele ingressou na New York Yddish Proletarian Theatre Company, onde atuou como ator e diretor em algumas peças e depois se envolveu com o Federal Theatre Project, iniciativa do “New Deal” do Presidente Roosevelt para dar trabalho a atores, diretores e autores durante a Grande Depressão. Em 1931, quando foi formado o Group Theatre por Lee Strasberg, Harold Clurman e Cheryl Crawford, Dassin participou de suas produções e, depois de ver “Waiting for Lefty” de Clifford Odets, ele se filiou ao Partido Comunista, do qual se desligaria mais tarde por desacordos sobre diferentes questões. Em 1938 começou a escrever para o rádio, fornecendo scripts inclusive para o programa muito popular de Kate Smith na CBS. Após ter dirigido a peça “Medicine Show” de Oscar Saul e H. R. Hays na Broadway com muito sucesso, a RKO lhe ofereceu um contrato de seis meses como aprendiz de direção – uma oferta que ele aceitou.

Jules Dassin

Quando seu contrato terminou, Dassin estava prestes a voltar para Nova York, mas foi chamado para ser diretor na MGM. O primeiro filme na “Marca do Leão”, o curta-metragem A Lenda do Coração / The Tell-Tale Heart / 1941, adaptação do conto de Edgar Allan Poe com Joseph Schildkraut e Roman Bohnen nos papéis principais, revelou seu senso diretorial e lhe garantiu um contrato de sete anos com o estúdio.  Em seguida ele dirigiu: A Sombra do Passado / Nazi Agent / 1942, drama de espionagem; com Conrad Veidt em um papel duplo; Sua Criada, Obrigada / The Affairs of Martha / 1942, comédia romântica com Marsha Hunt e Richard Carlson; Uma Aventura em Paris / Reunion in France / 1942, drama romântico em tempo de guerra na Europa com Joan Crawford e John Wayne; Cuidado Com Mamãe / Young Ideas / 1942, comédia de faculdade com Susan Peters e Richard Carlson; O Fantasma de Canterville / The Canterville Ghost / 1943, adaptação bastante livre do conto cômico-sobrenatural de Oscar Wilde com Charles Laughton, Robert Young e Margaret O’ Brien; Uma Carta Para Eva / A Letter for Evie / 1946 comédia-dramática inspirada em ‘”Cyrano de Bergerac”, passada na frente doméstica durante a guerra com Marsha Hunt, Hume Cronyn e John Carroll; Algemas Para Dois / Two Smart People / 1946, comédia romântica com sublinhamento policial interpretada por Lucille Ball e John Hodiak.

Joseph Schilkraut em A Lenda do Coração

Conrad Veidt em A Sombra do Passado

Joan Crawford e John Wayne em Uma Aventura em Paris

Richard Carlson e Susan Peters em Cidade com Mamãe

Margaret O’Brien e Charles Laughton em O Fantasma de Canterville

John Hodiak e Lucille Ball em Algemas para Dois

Dassin estava descontente na MGM, porque não era ele quem dava a última palavra com relação à montagem de seus filmes, mas sim seus produtores. Ele pediu a Mayer que o libertasse de seu contrato, mas Mayer negou. Como represália, Dassin ficou “de greve” treze meses em casa. Mayer o manteve na folha de pagamento, porque sabia que ele acabaria se entediando e desejando voltar a trabalhar. evoltaria para Quando Dassin retornou, teve um desentendimento tão acalorado com o patrão que este o expulsou do estúdio, mesmo sem que seu contrato ainda não tivesse expirado.

Cena de Brutalidade com Burt Lancaster (segundo à direita)

Don Taylor e Ted De Corsia em Cidade Nua

Prosseguindo na sua rota artística, como não quís mais ficar ligado a um contrato longo, Dassin acertou com o produtor independente Mark Hellinger e a Universal International a produção de seus dois próximos filmes  Brutalidade / Brute Force / 1947 e Cidade Nua / The Naked City / 1948, nos quais pôde confirmar sua versatilidade cinematográfica. O primeiro filme (com um elenco onde se destacam Burt Lancaster, Hume Cronyn, Charles Bickford, Yvonne De Carlo, Ann Blyth, Ella Raines, Sam Levene) é um drama penitenciário com uma severa acusação do sistema penal e da sociedade contemporânea. A prisão é representada como um microcosmo de uma ordem social baseada na repressão e na tirania. É um verdadeiro inferno, do qual não há escapatória. As cenas da morte do delator, ameaçado pelos maçaricos acesos de seus companheiros até ser esmagado pela prensa; a morte do suicida, vendo-se a sombra do enforcado na parede e os óculos caídos; a rebelião no pátio, com a execução do traidor amrrado ao vagão de carregamento de minério e Joe Collins (Burt Lancaster) jogando o Capitão Munsey (Hume Cronyn) do alto da torre são os momentos cinematográficos de maior impacto na direção viril de Dassin. O segundo filme (com um elenco onde se destacam Barry Fitzgerald, Howard Duff, Don Taylor, Ted De Corsia, Dorothy Hart) foi rodado em lugares autênticos, no estilo semidocumentário, é uma autêntica reportagem cinematográfica, descrevendo de maneira concisaa e vigorosa o trabalho da polícia na grande metrópole. O próprio produtor narra os acontecimentos, conversando com os os personagens, lendo seus pensamentos, fazendo comentários e até atuando como nosso substituto, quando diz, por exemplo, ao fugitivo Garzah (Ted De Corsia): “Calma, Garzah. Não corra! Não chame a atenção sobre sua pessoa!”ou “Não perca a cabeça!”, no instante em que o assassino é atacado pelo cão do cego e ele tira a arma do bolso traseiro da calça para matá-lo. O filme demonstra certa consciência social no momento em que o casal do interior chega a Manhattan para identificar o corpo de sua filha assassinada. A mãe lamenta: “Luzes brilhantes, teatro, peles, boates … Bom Deus, por que ela não nasceu feia?” Esta cena triste, passada na margem do East River, enquanto o sol se põe atrás dos arranha-céus, magnificamente fotografadas por William Daniels, tem a força de uma acusação. A fotografia, a montagem e a música, bem coordenadas por Dassin, dão um rimo ideal à narrativa, que transcorre em uma atmosfera humana e realista até o desfecho eletrizante da perseguição do criminosos pelas ruas, culminando no alto da ponte, onde ele é alvejado pelas balas dos policiais. A fotografia e a montagem mereceram um Oscar.

O relacionamento professional entre Dassin e Hellinger terminou quando este faleceu em dezembro de 1947 antes desse ultimo filme ser lançado. Dassin então foi para a Broadway, onde dirigiu duas peças: “Joy of the World”, uma comédia  e  “Magdalena-A Musical Adventure “, baseado na opereta folclórica do nosso Heitor Villa-Lobos.

Millard Mitchell e Richard Conte em Mercado de Ladrões

O próximo filme de Dassin, Mercado de Ladrões / Thieves Highway / 1949 (com um elenco onde se destacam Richard Conte, Valentina Cortese, Lee J. Cobb, Barbara Lawrence, Millard Mitchell, Jack Oakie, Joseph Pevney) foi produzido pela 20thCentury-Fox. É um drama realista de repercussão sical – caminhoneiros que vão buscar frutas às mãos dos produtores e levá-las até o Mercado distante, onde são explorados por intermediários – cuidando particularmente da vingança de um ex-pracinha  (Richard Conte) contra um dos inescrupulosos negociantes. Dassin expõe os fatos cruamente, aproveitando as locações nas estradas e no Mercado de San Francisco para efeitos de realismo – e lhes dá uma conclusão otimista, divergente da obra original (o romance “Thieves Market” de A. J. Bezzerides, autor do roteiro), pois nesta, o protagonista se converte à ganância geral. O detalhe noir está na transformação do veterano de guerra, por força das circunstâncias, em um indivíduo rancoroso, que pretende fazer justiça com as próprias mãos, e no ambiente de cobiça e de traição, no qual ele é obrigado a se envolver. Esta mudança é bem expressa pela fotografia. As cenas passadas no campo são claras e filmadas geralmente com uma câmera normal colocada na altura dos personagnes. À medida que Nick se aproxima da cidade, a iluminação se torna mais escura e os ângulos mais ousados, O espetáculo também tem cenas angustiantes (a descida vertiginosa do caminhão descontrolado de Ed (Millard Mitchell) pela ladeira) e violentas (o acerto de contas no epílogo quando Nick usa o cabo da machadinha para quebrar a mão de Figlia (Lee J. Cobb), ambas realizadas com consciência cinematográfica.

Richard Widmark em Sombras do Mal

No final dos anos 40 Edward Dmytrik prestou depoimento para a House Un American Activities Committee (HUAC), apontando Dassin como comunista (embora ele já tivesse deixado o partido em 1939). Entrando na lista negra, Dassin foi para a Inglaterra, onde fez Sombras do Mal / Night and the City, produzido pela 20thCentury-Fox Limited, subsidiária inglesa da Fox (com um elenco onde se destacam Richard Widmark, Gene Tierney, Googie Withers, Francis L. Sullivan, Hugh Marlowe, Mike Mazurki, Herbert Lom). O espetáculo possui todos os ingredients de um filme noir puro salvo o ambiente urbano americano. Seu personagem central, Harry Fabian (Rochard Widmark) é um heroi dark típico, que circula em um submundo povoado por falsos mendigos e pequenos escroques que lembram o “pátio dos milagres” Hugoniano. Ao lado desses tipos de rua surgem, em um nível mais elevado da escala social, personagnes grostescos ou patéticos (o proprietário da boate, obeso e mal amado, sua esposa frustrada e ambiciosa; o gângster  inescrupuloso e vingativo; o lutador idealista e anacrônico) cujas ações vão influenciar o fim trágico do vigarista. Desde os primeiros momentos da narrativa, fica óbvio que Fabian é um perdedor e sua sorte está selada. Nosseross  (Francis L. Sullivan) lhe diz: “Você  é um homem morto”. Após ter sido perseguido durante toda a noite, ele consegue abrigo no barraco de uma mulher que negocia no mercado negro e se abre pela primeira e única vez, confessando para a velha indiferente: “Passei toda a minha vida correndo: de assistentes sociais, de bandidos, de meu pai …” Finalmente, Fabian pensa: “Eu estava tão perto … Então um acidente, um simples acidente e tudo se desmorronou”. Na realidade, nunca esteve perto de nada, a não ser da morte. O ritmo do filme é vibrante e a composição plástica expressionisticamente barroca. Dassin e seu cinegrafista (Max Greene) exploram muito bem o claro-escuro, as ruelas e as ruínas da Londres do pós-guerra, elevando a filmagem realmente de noite a um nível máximo de criatividade. Empregam o close-up, a lente angular e os ângulos bizarros de maneira admirável, principalmente  quando focalizam o gordo Nssseross como se fosse uma aranha na sua toca ou O Estrangulador (Mike Mazurki) enfrentando Gregorios (Stanislaus Zbyszko) em um choque de gigantes.

Cena de Rififi (Dassin é o último à direita)

Com dificuldade de arranjar trabalho em Hollywood, Dassin partiu para a França  onde dirigiu Rififi / Du Rififi Chez les Hommes / 1955, drama criminal de assalto  baseado no livro de Auguste Le Breton (com um elenco no qual se destacam Jean Servais, Carl Mohner, Robert Manuel e o próprio Dassin, creditado como Perlo Vita).

Tony Stéphanois (Jean Servais), após cumprir cinco anos de cárcere, idealiza o roubo das jóias da Mappin & Webb e o executa com a cumplicidade de dois amigos (Robert Manuel, Carl Mohner) e de Cesar-le-Milanais (Jules Dassin), especialista em arrombar cofres. Este, por uma imprudência, revela a identidade dos assaltantes a uma quadrilha rival, ocasionando uma guerra entre os dois grupos, que só termina com a morte do último bandido. O filme ficou famoso pela sequência da execução do plano audacioso, cêrca de trinta minutos de suspense sem uma só palavra e sem fundo musical, apenas com os ruídos que os assaltantes não podem evitar furando o chão, amordaçando o alarma ou arrombando o cofre – em uma exposição minuciosa do assalto. A humanidade dos personagens também faz com que o espectador fique  preso à intriga o tempo todo e Dassin expõe a narrativa em estilo rigoroso e áspero, construindo outras boas cenas como da morte de Cesar-le-Maltais (que reconhece ter desobedecido o código de ética dos criminosos e aceita  sua punição) e principalmente o final, quando Tony, o derradeiro criminoso sobrevivente, mortalmente ferido na guerra entre quadrilhas, dirige o carro, tendo a seu lado o menino, que brinca, encostando na sua cabeça o revólver de brinquedo, sem consciência da tragédia que estava se encerrando  naquele momento. O filme teve grande sucesso e deu a Dassin o prêmio de Melhor Diretor no Festival de Cannes. Nesta ocasião Dassin conheceu a atriz grega Melina Mercouri e ao mesmo tempo a obra literária de Mikos Kazantzakis.

Pierre Vaneck em Aquele Que Deve Morrer

Em 1957 ele dirigiu Aquele Que Deve Morrer / Celui Qui Doit Mourir baseado no romance de Kazantzakis, “O Cristo Recrucificado”, produção franco-italiana (com um elenco no qual se destacam Jean Servais, Pierre Vaneck, Carl Mohner, Grégoire Aslan, Gert Fröebe, Melina Mercouri, Roger Hanin, Fernand Ledoux, Maurice Ronet).

A ação transcorre em 1920 em uma aldeia grega, estando o país sob domínio turco. É Época de Páscoa e, segundo o costume, encenar-se-á a Paixão de Cristo. Manolios (Pierre Waneck) jovem pastor, humilde e gago, encarnará o Nazareno enquanto que o papel de Maria Madalena será entregue à viúva Katerina (Melina Mercouri). Durante os preparativos para a cerimônia, liderados pelos sacerdote Fotis (Jean Sevais), surgem os retirantes de uma aldeia destruída pelos turcos, O sacerdote local, Grigoris (Fernand Ledoux), aliado às forças dominantes (o capitalismo, representado por um proprietário de terras, e a tropa de ocupação) opõe-se à sua permanência na aldeia. Há uma revolta e, no fim, o povo se une contra a tirania, e Manolios tem a sua própria Paixão, sendo apunhalado por Panagiotaros (Roger Hanin), que devia assumir o papel de Judas.

Esta alegoria religiosa mostra duas concepções da igreja cismática: um sacerdote defende a ordem estabelecida e o poder vigente enquanto que o segundo sacerdote coloca-se ao lado do refugiados e os sustenta ativamente. Os sentimentos humanos são postos em evidência, quer sejam positivos ou negativos: a coragem, a covardia, o amor, o ódio, a indiferença, a compaixão, a hipocrisia, o oportunismo etc. … em suma trata-se de um filme profundamente humano. Magníficos exteriores selvagens e rudes são captados com inspiração plástica pelas câmeras do CinemaScope e as imagens de grupos de pessoas são vistas por enquadramentos inspirados assim como o movimento das massas (os homens em trapos sentados na colina; o combate final entre as duas facções). Todos os atores desincumbem-se de seus papéis com entusiasmo.

Marcello Mastroianni e Gina Lollobrigida em A Lei dos Crápulas

Em 1958 Dassin dirigiu A Lei dos Crápulas / La Legge, baseado no romance de Roger Vailland (com um elenco no qual se destacam Gina Lollobrigida, Marcello Mastroianni, Yves Montand, Pierre Brasseur, Paolo Stoppa, Melina Mercouri),  estudo de costumes tragicômico cujos tipos pitorescos são encarnados com vigor pelos seus intérpretes. No centro da intriga está Marietta (Gina Lollobrigida), a moça mais bonita de Porto Manacore, pequena aldeia de pescadores da Sicília. Todos os homens do lugar a cobiçam. Entre eles: Enrico Tosso (Marcello Mastroiani), jovem agrônomo novo na região; Matteo Brigante (Yves Montand), líder da contravenção; Don Cesare (Pierre Brasseur), velho latifundiário e patriarca da região; o tímido serviçal de Don Cesare, Toni, que é cunhado de Marietta (Paolo Stoppa). Brigante tem um filho, Francesco (Raf Mattiolo), que ama Donna Lucrezia (Melina Mercouri), mulher do juiz. O enredo é tortuoso e complicado, as cenas são muito longas. Dassin apresenta alguns trechos de bom cinema em sequências dispersas: a tentativa de estupro de Marietta por Tonio, os desocupados na praça e a morte de Lucrécia com um excelente corte para o último suspiro de Don Cesare. Deste modo, A Lei dos Crápulas fica no meio têrmo. Não é um mau filme, mas não está à altura das realizações anteriores do cineasta.

Nos anos 60 Dassin realizou:  Nunca os Domingos / Pote tin Kyriaki / 1960; Profanação / Phaedra / 1962; Topkapi/ Topkapi / 1964; Corações Desesperados / 10.30 P. M.  Summer / 1966; O Poder Negro / Up Tight / 1968 e um documentário, Survival Hamichama al Hashalom / 1968, sobre a Guerra dos Seis Dias.

Melina Mercouri e Jules Dassin em Nunca aos Domingos

O primeiro filme é o melhor. Homer Thrace (Jules Dassin) turista americano, apaixonado pela Grécia antiga e seus filósofos, chega a Atenas para descobrir a verdade sobre a queda da civilização grega. Em um bar no porto de Pireu ele conhece Ilya (Melina Mercouri), prostituta muito popular, que “recebe” todos os dias da semana menos no domingo (que reserva para a sua grande paixão: o teatro clássico grego – embora veja nas peças antigas apenas aquilo que ela quer ver). Surpreendido por este interesse Homer, como um novo Pigmalião, decide dar-lhe lições sobre literatura, música clássica e as belas artes e ajudá-la a  ascender socialmente. Porém ele financia seu projeto com o dinheiro do principal proxeneta do Pireu, M. Noface (Alexis Solomos) que vê em Ilya, trabalhadora independente, um mau exemplo e quer se desembaraçar dela. Quando Ilya descobre o acordo secreto que liga Homer à Noface, ela renuncia a mudar de vida e incita a revolta de suas companheiras de lenocínio. Ilya acaba por se reconciliar com Homer, que parte para os Estados Unidos, depois de descobrir o que ele nunca aprendeu nos livros: o prazer de viver. Quanto à Ilya, ela encontra o amor junto de Tonio  (Giorgos Foundas), operário do porto. Com esta história hedonista (da qual ele é também o autor e intérprete), Dassin realiza um filme arrebatador que deve à sua estrela Melina Mercouri grande parte de sua vivacidade e bom humor. Ela recebeu por sua criação o prêmio de interpretação no Festival de Canne e uma indicação para o Oscar de Melhor Atriz. Dassin também foi indicado por sua direção e roteiro e “Ta Paidia tou Peiraia”, com letra e música de Manos Hadjidakis, ganhou o Oscar de Melhor Canção. O filme foi um tremendo sucesso de bilheteria.

 

Melina Mercouri e Anthony Perkins em Profanação

Profanação é uma versão moderna da peça de Eurípedes, apresentando Fedra (Melina Mercouri) como a segunda mulher de Thanos, grande armador grego; Teseu reincarnado como Thanos (Raf Vallone) e Hipólito  (Anthony Perkins), filho de Teseu, revivendo como Alexis, o rapaz que se torna amante de sua enteada. A direção de Dassin de um modo geral é firme e os três intérpretes dão a devida intensidade dramática às paixões exacerbadas de seus personagens. Percebe-se algumas referências clássicas como, por exemplo, o encontro de Fedra com Alexis no British Museum de Londres, onde vemos as esculturas de mármore do Parthenon. A figurinista Denny Vachlioti ganhou uma indicação para o Oscar, destacando-se aquele contraponto que percebemos na cena final do filme, quando Melina Mercouri toda vestida de branco abre caminho através de um grupo de mulheres de luto, lembrando imediatamente a imagem do côro no drama antigo. A melhor sequência em termos cinematográficos, cheia de angústia, é a da morte de Alexis no seu carro-esporte.

Cena de Topkapi

Topkapi é uma comédia policial baseada em um romance de Eric Ambler sobre o roubo de uma adaga com quatro esmeraldas fabulosas (guardada em uma vitrine de vidro inquebrável e hermeticamente fechada com o assoalho cheio de dispositivos de aviso impossíveis de neutralizar) no Palácio Topkapi em Istambul. Os autores intelectuais do assalto, Elizabeth Lipp, também conhecida como Elizavetta Lippmanova (Melina Mercouri) e seu amante Walter Harper, um larápio internacional também conhecido como Walter Haberlee (Maximilian) recrutam como cúmplices Arthur Simon Simpson (Peter Ustinov), guia turístico; Cedric Page (Robert Morley), inventor excêntrico; Gerven (Akim Tamiroff), cozinheiro alcoólatra; Hans Fisher (Jess Hahn), atleta vigoroso; e o acrobata mudo, Giulio (Gilles Segal), formando um bando de amadores, sobre os quais é mais difícil atrair a atenção da polícia. Neste seu primeiro filme em cores Dassin providencia um espetáculo divertido, repetindo a fórmula já usada em Rififi, mas construindo uma sequência de assalto mais longa (cerca de 40 minutos) e com um suspense extra causado pela acrofobia do guia turístico. Peter Ustinov arrebatou o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante.

Cena de Corações Deseperados – Roy Schneider, Peter Finch, Melina Mercouri

Cena de O Poder Negro

Corações Desesperados, melodrama psicológico baseado no romance “Dix heures et demie du soir en été” de Marguerite Duras  (com um elenco no qual se destacam Melina Mercouri, Peter Finch e Romy Schneider) e O Poder Negro, drama racial baseado no romance de “The Informer” de Liam O’Flaherty, mudando o cenário da Irlanda para a América do Norte (com um elenco no qual se destacam Ruby Dee, Raymond St. Jacques, Frank Silvera, Roscoe Lee Browne) desapontaram os críticos.

Cena de Promessa ao Amanhecer

Nos anos 70, Dassin fez: Promessa ao Amanhecer / Promise at Dawn / 1970, drama baseado em um romance autobiográfico de Romain Gary, no qual Melina Mercouri interpreta a mãe do escritor, a atriz Nina Kacew, que cria – com sonhos megalomaníacos – seu filho ilegítimo (interpretado por Assaf Dayan, filho de Moshe Dayan, militar e político israelense) nascido do seu romance com o famoso ator do cinema mudo Ivan Mosjoukine, encarnado por Dassin (mais uma vez sob o pseudônimo de Perlo Vita); The Rehearsal / 1974), recriação em forma de ensaio teatral (no ICinema Studio em Nova York) do massacre em 1973 de estudantes e trabalhadores na Escola Politécnica de Atenas pela Junta Militar, com Melina Mercouri como narradora, atores gregos (Olympia Dukakis, Stathis Giallelis etc.) e a participação de celebridades (Laurence Olivier, Arthur Miller, Maximilian Schell, Lillian Hellmann) lendo poemas ou cartas; A Dream of Passion / 1978, drama no qual em virtude de um golpe de publicidade, Maya (Melina Mercouri), atriz grega que está interpretando o papel principal de Medéia no teatro, é posta em contato com Brenda Collins (Ellen Burstyn), americana presa na Grécia por ter assassinado seus três filhos para se vingar de seu marido infiel. A paixão alucinada de Brenda e o horror de seu crime fascinam Maya, a ponto de que seu desempenho em cena vem a ser consideravelmente influenciado: quanto mais ela reencontra Brenda na prisão  mas ela parece se identificar com a infeliz. Na noite de estréia da peça, enquanto Maya grita sua dor e seu ódio a Jasão, Brenda, na sua cela, repete seus berros como um eco, exprimindo toda a solidão e o desespero de uma mulher atormentada. A  proposta de todos esses filmes era interessante, porém mais uma vez o trabalho de Dassin decepcionou.

Richard Burton e Tatum O’Neal em Círculo de dois Amantes

Nos anos 80 foi lançado o último filme do diretor, Círculo de dois Amantes / Circle of Two, produção canadense sobre o amor impossível entre um pintor famoso sexagenário  (Richard Burton) e uma jovem de 16 anos (Tatum O’Neal) – outro fracasso profissional. E assim terminou melancolicamente a carreira de Jules Dassin, cineasta habilidoso que, na sua melhor fase, realizou filmes importantes nos Estados Unidos e na Europa. Ele se casou duas vêzes: em 1937 com Béatrice Launer, violinista judaico-americana, da qual se divorciou em 1962; em 1966 com Melina Mercouri. Dassin faleceu em 2008 aos 96 anos de idade. Melina havia falecido em 1994. Em 1971 ela abandonou a vida artística, após ter sido eleita para o Parlamento Grego como uma ardente socialista. A ex-atriz tornou-se Ministra da Cultura em 1981 e tentou em vão obter a devolução dos mármores do Partenon, que estão no Museu Britânico, para sua terra natal.

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