FREDRIC MARCH I

Ele foi um dos maiores atores do cinema americano, indicado cinco vezes como Melhor Ator pela Academia de Artes e Ciências de Hollywood, arrebatando o Oscar duas vêzes (em 1932 e 1947). Fez mais de 70 filmes em um período de 44 anos de 1929 a 1973 e marcou sua presença nos palcos da Broadway, atuando em produções aclamadas como “The Skin of Our Teeth”, dirigida por Elia Kazan e ganhando dois Tony Awards (por seu desempenho  em “Years Ago” / 1947 e “Long Day’s Journey into Night “/ 1957). Apesar de sua folha corrida de sucessos, nunca desenvolveu uma personalidade fílmica reconhecível que o acompanhasse de filme para filme, preferindo esconder sua pessoalidade atrás do personagem que estava interpretando. “Gary Cooper, Clark Gable, Cary Grant e até Humphrey Bogart interpretavam a si mesmos. Eu sempre interpretei o personagem”.

Fredric March

Ernest Frederick McIntyre Bickel (1897-1975) nasceu na cidade de Racine, Wisconsin, filho de família abastada. Seu pai, John Bikel, era filho de alemães e sua mãe, Cora, cujo nome de solteira era Marcher, filha de um inglês com uma americana de Nova York.

Desde cedo, Frederick desenvolveu um dom para a mímica e para a imitação, e gostava de dramatizar algumas das histórias que lia. Era um bom aluno e popular entre seus colegas e professores, que sempre o convidavam para recitar, algo que gostava de fazer, porque ficava em evidência sob a luz dos refletores. Aos 14 anos de idade começou a participar de concursos estaduais de oratória, representando sua cidade.

Frederick formou-se na Racine High School e pensou em ingressar na Universidade de Wisconsin em Madison, onde já estudavam seus dois irmãos Harry e Jack; porém o pai sofreu dificuldades fnanceiras, e ele teve que ir trabalhar como escrevente em um banco.

Finalmente, depois de dois anos, seu progenitor pôde enviá-lo para a Universidade e, seguindo o conselho de seu irmão mais velho, dedicou-se a assuntos econômicos. Ele se formou em junho de 1920 e já saiu da Universidade com um emprego garantido na filial de um banco em Nova York, mas a atração pelo teatro, adquirida na Universidade, prevaleceu. Frederick começou a mandar suas fotos e dados pessoais para vários agentes até que conseguiu trabalho como figurante no Astoria Studios da Paramount em Long Island, aparecendo pela primeira vez em A Roda da Fortuna / Paying the Piper / 1921 e continuando como extra em Satanás / The Devil / 1921, The Great Adventure / 1921 e A Educação de Isabel / The Education of Elizabeth/ 1921.

Depois de dar seus primeiros passos em frente das câmeras, Frederick posou como modelo para anúncios comerciais; estreou profissionalmente no palco, intepretando o papel de Victor Hugo na peça  “Debureau”, encenada pelo empresário David Belasco; teve aulas de interpretação com Madame Alberti (famosa professora da American Academy of Dramatic Arts); obteve, com a ajuda de John Cromwell (o futuro diretor de cinema) uma participação em “The Law Breaker”, levada à cena pelo eminente produtor teatral William Brady; e ingressou como membro de uma companhia de repertório em Dayton, Ohio (onde conheceu sua primeira esposa, a atriz Edith Baker de quem se divorciou em 1927), para se aperfeiçoar na arte interpretativa.

Fredric March na peça “Melody Man”.

De retorno a Nova York, Frederick assinou contrato com John Cromwell, mudou seu nome artístico para Fredric March, e apareceu pela primeira vez na Broadway em 1924 na comédia “The Melody Man”. Seguiram-se atuações em outras peças produzidas por Cromwell, e depois ele passou a trabalhar no Elitch’s Garden, o mais antigo e prestigioso teatro que só funciona no verão no país, situado em Denver, Colorado, onde conheceu sua segunda esposa, a atriz Florence Eldridge, companheira até o fim de seus dias. Os dois trabalharam juntos no Elitch’s Garden e depois foram empregados pelo Theater Guild, para liderarem uma excursão pelo país com uma companhia de repertório.

O grande sucesso de March nessa etapa de sua trajetória artística no tablado foi seu desempenho como Anthony Cavendish na peça de Edna Ferber e George S. Kaufman, “The Royal Family”, encenada na Broadway, paródia da família Barrymore, focalizando mais precisamente John e Ethel Barrymore. March fazia uma caricatura de John Barrymore. Quando o espetáculo chegou em Los Angeles, ele sabia que astros, diretores, produtores e agentes de Hollywood estariam na platéia e que esta seria a sua grande chance no mundo do cinema.

Hollywood estava então na fase da transição dos filmes mudos para os sonoros e os estúdios procuravam atores talentosos e bem apessoados, que pudessem falar bem. Barrymore estava lá no dia da estréia e foi cumprimentá-lo no camarim. Ao ouvir  sua voz estrepitosa, March quase caiu da cadeira, pois não sabia ao certo se o grande ator vinha congratulá-lo ou condená-lo. Felizmente March sentiu um alívio, quando Barrymore lhe disse: “Foi a maior e mais engraçada performance que eu jamais ví”. Barrymore não foi o único na assistência que achou que March havia feito uma excelente composição e que tinha talento e carisma para se tornar um astro. Os agentes correram atrás dele, resultando um contrato com a Paramount em dezembro de 1928.

Fredric March e Ruth Chatterton em Assim Falou o Mudo

O primeiro filme de March foi Assim Falou o Mudo / The Dummy / 1929 (Dir: Robert Milton, Louis Gasnier), ao lado de Ruth Chatterton, formando um casal separado, cuja filha é sequestrada. Um jovem (Mickey Bennett) que trabalha para uma agência de detetives, se finge de mudo, a fim de ser deliberadamente levado à força pelos sequestradores e armar uma cilada para eles. Na última cena, a garota é salva, e o casal faz as pazes em um final feliz. Como o personagem mais importante era o jovem detetive, March não foi mencionado nas resenhas do filme no New York Times e Ruth só foi mencionada de passagem, embora fossem nominalmente os artistas principais.

Fredric March e Clara Boa em Garotas na Farra

Ele foi mais notado no seu segundo filme Garotas na Farra / The Wild Party / 1929 (Dir: Dorothy Arzner), porque tinha a seu lado a “It Girl”, Clara Bow, que estava fazendo sua estréia no cinema falado, e os fãs acorreram aos cinemas, para ver se ela passaria no teste de voz. No seu terceiro trabalho, O Crime do Estúdio / The Studio Murder Mystery / 1929 (Dir: Frank Tuttle), March é um ator mulherengo, que  vem a ser assassinado, e Florence Eldridge – no primeiro dos sete filmes que fariam juntos – é sua mulher ciumenta, que tem um bom motivo para ter cometido o crime; porém o papel principal coube a Neil Hamilton.

Fredric March e Florence Eldridge em O Crime do Estúdio

Ainda nos anos 20, March fez: Paris Bound/ 1929 (Dir: Edward H. Griffith para a Pathé Exchange), adaptação da peça de Philip Barry com Ann Harding; Ciúmes/ Jealousy/ 1929 (Dir: Jean de Limur), drama com Jeanne Eagels; Mademoiselle Fifi/ Footlights and Fools/ 1929 (Dir: William A. Seiter, musical todo falado (Vitafone) para a First National), com Colleeen Moore e Orfãos do Divórcio/ The Marriage Playground (Dir: Lothar Mendes), drama com Mary Brian – o primeiro e o último produzidos pela Paramount. March diria mais tarde que foi o diretor de Orfãos do Divórcio que lhe deu o melhor conselho no início de sua carreira  sobre interpetação no cinema. “Ele disse, ‘Freddie, quando eu disser  ‘câmera’ tudo que isto quer dizer é relaxe”.

Prosseguindo nos seus compromissos com a Paramount, March e Ruth Chatterton tiveram mais oportunidade de chamar a atenção dos espectadores em Sarah e Seu Filho / Sarah and Son / 1930 (Dir: Dorothy Arzner), dramalhão sobre o amor maternal, com Ruth no papel de Sarah Storm, imigrante alemã que trabalha como empregada doméstica em Nova York e forma um número de vaudeville com um ex-chofer de caminhão muito grosseiro. Ele a abandona, alista-se na Marinha e, em retaliação às recriminações da esposa, entrega o filho deles, Bobby (Philippe de Lacy) para adoção de um rico casal. Sarah continua representando na companhia de uma ex-cantora de ópera. Algum tempo depois, a dupla está percorrendo hospitais para divertir os soldados e, por uma dessas coincidências típicas do gênero melodramático, quem morre diante de seus olhos é o seu ex- marido. Antes de falecer, ele sussurra o sobrenome do casal a quem entregou o menino – Ashmore. Sarah visita os Ashmores (Doris Lloyd, Gilbert Emery), e pede seu filho de volta, mas eles insistem que a criança não pode ser filho dela e ameaçam interná-la em um hospício. Os anos passam, Sarah vai para a Alemanha, onde estuda para se tornar  cantora de ópera.  Retornando a Nova York, ela usa seu prestígio para encontrar Bobby. March interpreta o papel de Howard Vanning, advogado simpático que se apaixona por Sarah e, em uma outra coincidência melodramática, a irmã e o cunhado de Howard são os pais adotivos de Bobby. Os Ashmore substituem o filho de Sarah pelo filho de uma criada, mas Sarah percebe que ele não é Bobby. No final, Bobby foge da casa dos Ashmore e Sarah e seu filho se reencontram. O filme obteve grande êxito popular e Ruth Chatterton foi indicada para o Oscar.  No Brasil passou também a versão portuguesa, A Canção do Berço, dirigida por Alberto Cavalcanti, com Corina Freire no lugar da artista americana.

Fredric March e Ruth Chatterton em Sarah e Seu Filho

March fez uma aparição como fuzileiro naval em um dos esquetes de Paramount on Parade / 1930, dirigidos por vários diretores (Dorothy Arzner, Edmund Goulding, Ernst Lubitsch, Frank Tuttle, Edward Sutherland, Otto Brower, Rowland V. Lee, Lothat Mendes, Victor Schertzinger, Victor Heerman, Edwin H. Knopf) e interpretados por um um punhado de astros  (Maurice Chevalier, Clara Bow, Nancy Carroll, Ruth Chatterton, Evelyn Brent, William Powell, Kay Francis, Gary Cooper, Jean Arthur, Virginia Bruce, Clive Brook, George Bancroft, Fay Wray, Phillips Holmes,  Charles “Buddy” Rogers etc). O filme teve 11 versões e no Brasil passaram a original e a espanhola (Galas de la Paramount), ambas com o título em português de Paramount em Grande Gala.

Mary Astor e Fredrich March em As Mulheres Amam os Burtos

Em seguida, o jovem ator de Racine, Wisconsin, foi creditado em terceiro lugar, depois de George Bancroft e Mary Astor em As Mulheres Amam os Brutos / Ladies Love Brutes /1930 (Dir: Rowland V. Lee), e a ele coube o papel ingrato do marido traído da ricaça interpretada por Astor, que tem um caso com um imigrante brutal, mas nem pensa em um futuro com ele por causa de suas insuficiências sociais.

A Noiva da Esquadra / True to the Navy / 1930 (Dir: Frank Tuttle) reuniu March  e Clara Bow em uma história sobre uma garçonete de San Diego, que se apaixona por um marujo. Neste filme, Clara encontrou seu futuro marido, Rex Bell, que interpretava outro marujo. March pouco tem a fazer e muita gente achou que ele, apesar de ser um ator competente, não parecia um marinheiro. Clara fora prevista para atuar pela terceira vez ao lado de March em Homicida / Manslaughter / 1930 (Dir: George Abbott), mas sua saúde mental estava se deteriorando, e ela foi substituída por Claudette Colbert, no primeiro dos quatro filmes que faria com ele, No enredo, Claudette é uma mulher corrompida pela riqueza e pelo privilégio atraída por um promotor -interpretado por March- , que também corresponde a essa atração, mas rejeita sua maneira de viver.

Clara Bow e Fredric March em A Noiva da Esquadra

Fredric March e Claudette Colbert em Homicida

O Melhor da Vida / Laughter / 1930 (Dir: Harry D’Abadie D’Arrast), comédia romântica sofisticada precursora na fase sonora dos brilhantes exemplares do gênero, que surgiram entre os meados e o fim da década, impulsionou a carreira de March e de Nancy Carroll. Ela é a corista que se casa com um milionário (Frank Morgan) em busca de luxo e March o compositor que lhe mostra os verdadeiros encantos da vida. O diretor D’Arrast, ex-assistente de Chaplin, era muito apreciado na cena muda pelo seu espírito e inteligência, que se assemelhava ao de Ernst Lubitsch.

Fredric March em The Royal Family of Broadway

March teve oportunidade de recriar seu papel no palco de Anthony Cavendish em The Royal Family of Broadway / 1930, dirigido por George Cukor (assessorado na parte técnica por Cyril Gardner), e foi recompensado com a sua primeira das cinco indicações para o Oscar.

Fredric March e Nancy Carroll em O Anjo da Noite

Ele contracenou novamente com Claudette Colbert em Honra Entre Amantes/ Honor Among Lovers/ 1931 (Dir: Dorothy Arzner) e com Nancy Carroll em O Anjo da Noite/ Night Angel / 1931 (Dir: Edmund Goulding). No primeiro, Claudette é secretária executiva de um industrial milionário (Fredric March), que tem um caso com ela. Ele não quer se casar, mas acaba cedendo. No segundo, March é um promotor que manda prender a dona de um bordel (Allison Skipworth), mas se apaixona por sua filha (Nancy Carroll), mata o rufião que a importunava, e é inocentado pelo testemunho da moça.

Meu Pecado / My Sin / 1931 (Dir: George Abbot) reuniu March com Tallulah Bankhead. A ação se passa no Panamá. Tallulah é uma “recepcionista de boate”, que mata um homem em legítima defesa, e March o advogado alcóolatra, que a defende, ganha a causa, recupera o respeito de seus colegas, e também procura mudar a vida de sua cliente. March se reencontraria com Bankhead, quando atuou com ela e sua esposa Florence Eldridge na produção da Broadway “The Skin of Our Teeth” de Thornton Wilder.

Fredric March, Miriam Hopkins e George Cukor na filmagem de O Médico e o Monstro

Fredric March e Miriam Hopkins em O Médico e o Monstro

No final de 1931, March começou a trabalhar no seu filme mais importante até então, O Médico e o Monstro / Dr. Jekyll and Mr. Hyde / 1932, adaptação do célebre romance de Robert Louis Stevenson, “The Strange Case of Dr. Jeckyll and Mr. Hyde”. O diretor Rouben Mamoulian insistiu em colocar March no personagem e ele ganhou o Oscar de Melhor Ator (empatado com Wallace Beery, apesar de ter tido um voto a mais do que Beery  – porque segundo as regras da Academia, menos de três votos de diferença entre um e outro candidato era considerado empate). Miriam Hopkins também teve excelente desempenho como Ivy, a garota do cabaré aterrorizada por Hyde. Ela pretendia fazer o papel da noiva do Dr. Jeckyll, que coube a Rose Hobart, porém o diretor convenceu-a a mudar de idéia. Realizado antes de a censura endurecer, o filme pôde mostrar sem subterfúgios o desejo canal reprimido do médico e as insinuações sexuais da garçonete, sendo memoráveis a fusão da perna de Miriam, balançando na cama. A inventiva troca de filtros coloridos para revelar diferentes camadas da maquilagem de March na cena da transformação diante de nossos olhos; o uso funcional das cortinas diagonais, da câmera subjetiva e da trilha de som; o brilhante aproveitamento da foto em claro-escuro de Karl Struss, confirmam o gênio criativo de Mamoulian em fase cintilante. O filme rendeu indicações ao Oscar para Struss e para Samuel Hoffenstein pelo Melhor Roteiro Adaptado.

Fredric March e Kay Francis em A Volta do Deserdado

Fredric March e Sylvia Sidney em Quando a Mulher se Opõe

Em 1932, March fez dois filmes  corriqueiros na Paramount – A Volta do DeserdadoStrangers in Love / 1932 (Dir: Lothar Mendes), no qual faz um papel duplo como dois irmãos gêmeos, um tomando o lugar do outro quando um deles morre de um ataque cardíaco e conquistando a jovem (Kay Francis) que não amava o morto, mas passa a amar o vivo; Quando a Mulher Se Opõe / Merrily We Go To Hell (Dir: Dorothy Arzner), no qual ele é um alcoólatra e Sylvia Sidney a mulher que tenta em vão livrá-lo da dipsomania – sem contar um cameo em Quero Ser Estrela / Make Me a Star, e dois filmes com maiores valores de produção: um na MGM, O Amor Que Não Morreu / Smilin Through e outro novamente na  Paramount, O Sinal da Cruz / The Sign of the Cross.

O Amor Que Não Morreu, drama romântico com toques de fantasia em produção cuidada, foi indicado para o prêmio da Academia. O diretor Sidney Franklin havia se responsabilizado pela primeira versão, estrelada por Norma Talmadge. Norma Shearer é a jovem que morre no dia do casamento, alvejada pelo pretendente rejeitado (Fredric March), com a bala endereçada ao noivo (Leslie Howard); este, anos depois, opõe-se ao romance entre a sobrinha da falecida e o filho do criminoso. A fotografia de Lee Garmes é notável.

Fredric March e Claudette Colbert em O Sinal da Cruz

O Sinal da Cruz, superespetáculo realizado por Cecil B. DeMille na sua tradicional fórmula de unir erotismo e religião, distorcendo a História, obteve ótima recompensa nas bilheterias. Por motivo de economia cenários e figurinos froram feitos com muita improvisação por Mitchel Leisen. Também para poupar despesas, o fotógrafo Karl Struss usou uma lente prismática para duplicar o tamanho da multidão e filmou todas as cenas noturnas à luz de tochas. Construiu-se uma Roma em miniatura no rancho da Paramount e 12 câmeras focalizaram o pânico das massas na cena do incêndio ordenado por Nero (Charles Laughton). O banho de Popéia foi feito com leite de verdade e, após dois dias de filmagem, reza a lenda que se transformou em queijo, exalando um odor insuportável. Pola Negri e Norma Talmadge foram cogitadas para o papel da Imperatriz romana que acabou sendo de Claudette Colbert. Fredric March e Elissa Landi formam o par romântico – a bela e virtuosa cristã Mercia e Marcus Superbus, o romano convertido ao cristianismo, que entra com sua amada na arena, para encontrar a morte, e as portas da masmorra se fecham criando a sombra do sinal da cruz. O filme todo foi filmado através de uma gaze vermelha, para dar a impressão de tempo passado.

Em 1933, March fez dois filmes dirigidos por Stuart Walker, em ambos auxiliado por Mitchel Leisen (Esta Noite é Nossa / Tonight is Ours, drama romântico sobre uma princesa de um trono mítico (Claudette Colbert) indecisa entre suas obrigações reais e seu amor por um americano  (Fredric March) que conheceu em um baile a fantasia e Os Dragões da Morte / The Eagle and the Hawk, drama de guerra tendo como foco as atividades de um esquadrão da Royal Air Force, do qual fazem parte os aviadores rivais Fredric March e Cary Grant durante o primeiro conflito mundial) e ainda um filme um dirigido por Ernst Lubitsch:  Sócios no Amor/ Design for Living.

Gary Cooper, Fredrich March e Miriam Hopkins em Sócios no Amor

Ernst Lubitsch, Gary Cooper, Miriam Hopkins e Fredrich March na filmagem de Sócios no Amor

A fim de preservar o severo Código de Produção o ménage-a-troisde dois homens e uma mulher em Sócios do Amor, o adaptador-roteirista Ben Hecht usou toda a sua verve e inteligência para atenuar as inúmeras infrações morais da peça de Noel Coward. No roteiro, a desenhista industrial Gilda Farrell (Miriam Hopkins) encontra-se em um trem com dois promissores artistas, o escritor Tom Chambers  (Fredrich March) e o pintor George Curtis (Gary Cooper). Ambos se apaixonam pela moça, mas como ela não se decide por nenhum deles, combinam viver juntos os três, platonicamente. Cansada das ciumeiras dos dois, Gilda parte para Nova York e se casa com o patrão, Max Plunkett (Edward Everett Horton). Entretanto, transcorrido um ano, Gilda reencontra seus amigos, e resolve voltar a morar com eles.

 

Sylvia Sidney e Fredric March em Em Má Companhia

Apesar de ter tido a chance de atuar em um filme de um grande cineasta como Lubitsch, March estava insatisfeito na Paramount, pois queria mais autonomia em relação à sua carreira e mais tempo de folga para poder viajar e conviver com a família. Sendo assim, resolveu encerrar seu contrato com a empresa, completando os três últimos filmes nele previstos: os rotineiros e mal sucedidos Toda Tua / All of Me / 1934 (Dir: James Flood), com Miriam Hopkins e Em Má Companhia / Good Dame 1934 (Dir: Marius Gering), com Sylvia Sidney, e o excelente Uma Sombra Que Passa / Death Takes a Holiday / 1934 (Dir: Mitchel Leisen).

Em Uma Sombra Que Passa, A Morte vem passear pela Terra, para saber por que todos a temem. Assumindo os traços do misterioso Príncipe Sirki (Fredric March), apaixona-se por Grazia (Eveyn Venable), jovem da aristocracia italiana, que prefere seguí-lo a viver sem amor. Com esse enredo alegórico e poético, fotografia de Charles Lang, direção de arte de Ernst Fegté e Leisen (também ele entendido em cenografia), o filme teve assegurada sua qualidade pictórica e se tornou um clássico do gênero fantástico.

Constance Bennett e Fredric March em As Aventuras de Cellini

Transferindo-se da Paramount para a 20thCentury, March assumiu o papel de Benvenuto Cellini emAs Aventuras de Cellini / The Affairs of Cellini / 1934, tendo a seu lado Constance Bennet e Frank Morgan e depois foi convidado para voltar a trabalhar de novo na MGM com Norma Shearer em A Família Barrett / The Barretts of Wimpole Street / 1934.

Fredrich March e Norma Shearer em A Família Barrett

O primeiro é uma produção luxuosa da companhia de Darryl F. Zanuck, mostrando o artista da Renascença como espadachim às voltas com intrigas palacianas. Porém o filme é sobretudo uma comédia de costumes, dirigida com graça e ironia por Gregory La Cava. De barba e cavanhaque como o famoso ourives e escultor italiano,  March namora Joan Bennett, mulher do Duque de Florença, interpretado de maneira hilariante por Frank Morgan, que foi indicado para o Oscar, juntamente com o fotógrafo Charles Roscher

Graças aos altos valores de produção outorgados pela MGM, à magnitude dos três intérpretes centrais (além de Fredric March e Norma Shearer, Charles Laughton), a adaptação da peça de Rudolf Basier sobre o romance entre a poetisa Elizabeth Barrett e o poeta Robert Browning, bem dirigida por Sidney Franklin, alcançou êxito comercial e foi indicada ao Oscar. Fotografada em belos close ups pela câmera de William Daniels, Norma concorreu ao prêmio de melhor Atriz. Foi por causa desse filme que William Randolph Hearst rompeu com a MGM e transferiu seu dinheiro e a marca Cosmopolitan Pictures para a Warner. Ele queria o papel de Elizabeth para sua protegida Marion Davies e ficou indignado quando soube que Irving Thalberg o reservara … para a dele.

Fredric March e Anna Sten em Tornamos a Viver

Subsequentemente, March fez para a Samuel Goldwyn Company, Tornamos a Viver / We Live Again/ 1934 (Dir: Rouben Mamoulian), transposição feliz para o cinema do romance “Ressurreição” de Tolstoi sobre o nobre russo (Fredric March) que, como membro de um júri, reconhece a pobre criada (Anna Sten), que ele seduzira no passado, causando sua queda na prostituição. Ela está sendo julgada por um crime não praticado, e ele, em busca de redenção, deixa sua posição social e seus haveres, para seguí-la no desterro rumo à Sibéria. A foto esplêndida de Gregg Toland enriquece o espetáculo.

Fredric March em Os Miseráveis

Fredric March em Os Miseráveis

Richard Boleslawski dirige Fredric March em uma cena de Os Miseráveis

Os Miseráveis/ Les Miserables / 1935 (Dir: Richard Boleslawski) foi o segundo filme de March na 20thCentury, e é um dos mais lembrados pelos seus fãs. Produzido por Zanuck, esta versão para a tela do romance imortal de Victor Hugo comprime inteligentemente o volumoso épico, conservando os valores intrínsecos do livro e Boleslawski narra esplendidamente a história. March e Charles Laughton estão admiráveis nos respectivos papéis de Jean Valjean e Javert. Filme, diretor, fotógrafo (Gregg Toland) e montador (Barbara McLean) foram indicados para o Oscar.

Greta Garbo e Fredrich March em Anna Karenina

 

De novo na MGM, March participou de Anna Karenina / Anna Karenina / 1935, versão de obra literária de outro romance de Tolstoi, conduzida de forma brilhante por Clarence Brown. Garbo revive a heroína que já interpretara em Anna Karenina / Love/ 1928 sob a direção de Edmund Goulding e March herda de John Gilbert, o papel do Conde Vronski, seu amante. O diretor criou duas cenas antológicas: a do traveling no início sobre a mesa do banquete e a do suicídio no desenlace, prepararada com o concurso de Val Lewton, então assistente do produtor David O. Selznick. O cinegrafista William Daniels, favorito da “Divina”, foi indicado para o Oscar.

No restante da década de 30, March fez filmes de boa qualidade artística para diversas companhias – Goldwyn (Anjo das Trevas / The Dark Angel / 1935 / Dir: Sidney Franklin), refilmagem do drama romântico O Anjo das Sombras / 1925 com Ronald Colman e Vilma Banky / 1921, agora com March e Merle Oberon); 20thCentury-Fox (Caminho da Glória / The Road to Glory / 1936 / Dir: Howard Hawks, drama de guerra focalizando um regimento francês na Primeira Guerra Mundial com March e Warner Baxter);

Katharine Hepburn e Fredric March em Maria Stuart

Carole Lombard e Fredric March em Nada é Sagrado

Francisca Gaal, Fredric March e Akim Tamiroff em Lafite, o Corsário

Virginia Bruce e Fredric March em Aí Vai Meu Coração

Fredric March e Joan Bennett em Segredos de um Don Juan

RKO (Maria Stuart, Rainha da Escócia / Mary of Scotland / 1936 / Dir: John Ford, aventura histórica com March, Katharine Hepburn e Florence Eldridge); Warner (Adversidade / Anthony Adverse / 1937 / Mervyn LeRoy, drama de época com March, Olivia de Havilland e Claude Rains);  Selznick (Nasce uma Estrela / A Star is Born / 1937  / William Wellman, drama com March e Janet Gaynor); Nada é Sagrado / Nothing Sacred / 1938 / William Wellman, comédia satírica com March e Carole Lombard interpretando com vivacidade o scriptcínico de Ben Hecht); Paramount (Lafite, o Corsário / The Buccaneer / 1938 / Dir: Cecil B. DeMille, aventura histórica com March e Franciska Gaal); Hal Roach (Aí Vai Meu Coração / There Goes My Heart / 1938  / Dir: Norman Z. McLeod, comédia romântica típica sobre herdeira fugitiva descoberta por repórter com March e Virginia Bruce) e Walter Wanger (Os Segredos de um Don Juan / Trade Winds / 1938 / Dir: Tay Garnett, parte comédia romântica parte drama criminal com March e Joan Bennett) – destacando-se Adversidade e Nasce uma Estrela.

Fredric March e Olivia de Havilland em Adversidade

Adversidade foi um dos projetos mais ambiciosos da Warner até então, vigiado pela censura, que extirpou 40 páginas da primeira adaptação do maciço romance de Hervey Allen sobre o amadurecimento de um jovem do século XIX após muitas aventuras em busca de seu legado e de sua identidade. Apesar do enredo cheio de coincidências difíceis de acreditar, o espetáculo, bem guiado por Mervyn LeRoy, teve êxito financeiro e recebeu indicação para o Oscar. Também concorreram ao prêmio da Academia e ganharam: a atriz coadjuvante Gale Sondergaad, o fotógrafo Tony Gaudio, o montador Ralph Dawson e o diretor musical Leo Forbstein, agraciado em vez do compositor Erich Wolfgang Korngold. Forbstein, que funcionava mais como executivo, raramente regia, e não escrevia música, ficou embaraçado e ofereceu a estatueta a Korngold: este gentilmente a recusou. O diretor de arte Anton Grot também competiu, mas não levou o troféu.

Janet Gaynor e Fredric March em Nasce uma Estrela

Famoso ator de Cinema, alcoólatra, descobre jovem talentosa e a transforma em estrela. À medida  que a carreira dela cresce, a dele entra em declínio. O produtor David O. Selznick aproveitou o argumento original de William Welman e Robert Carson (segundo os autores baseado em fatos observados na comunidade hollywoodiana) e usou-o de certa forma para refilmar de maneira diferente Hollywood / What Price Hollywood?, que ele mesmo realizara em 1932. O modelo de Norman Maine foi John Bowers, galã do cinema mudo, que não encontrou mais trabalho e se suicidou por afogamento. O filme foi apontado para o Oscar e houve também indicações nas categorias de Melhor Direção, Roteiro (Dorothy Parker, Alan Campbell, Robert Carson), Ator, Atriz, e História Original. O Oscar foi para a História Original, tendo sido concedido um prêmio especial para W. Howard Green pela fotografia em Technicolor. Antes de Janet Gaynor, Elizabeth Bergner e Margaret Sullavan foram cogitadas para o principal papel feminino e, durante algum tempo, Jack Conway substituiu Wellman, afastado por problemas de saúde; quando retornou aos sets, Wellman refez todas as cenas rodadas pelo colega emprestado pela MGM.

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