Arquivo diários:abril 13, 2018

DANIELLE DARRIEUX I

Que outra atriz de cinema no mundo inteiro pode se gabar de ter iniciado sua carreira com quatorze anos incompletos para encerrá-la com a idade de noventa e três anos? Entre 1931 e 2010, mantendo-se sempre miraculosamente bela, ela fez cento e três filmes para o cinema, suscitando a admiração do público e dos realizadores com os quais trabalhou.

Danielle Darrieux

Danielle Darrieux (1917-2017), cujo nome verdadeiro era Danielle Yvonne Marie Antoinette Darrieux, nasceu em Bordeaux, filha do oftalmologista Jean Darrieux e Marie-Louise Witkowski de origem polonesa por parte de pai e alsaciana por parte de mãe. Quando tinha dois anos de idade, seus pais mudaram de domícilio para Paris, instalando-se em um apartamento espaçoso na rue de la Pompe, onde recebiam convidados de renome no mundo musical, pois tanto Jean como Marie-Louise eram melômanos: ela sonhava com uma carreira de cantora e ele tocava piano maravilhosamente bem.

Em 1924, Danielle, então com sete anos, perdeu seu pai, vitimado por um ataque cardíaco, e sua mãe passou a dar lições de canto, tanto por paixão como pela necessidade de sustentar a família que, a esta altura contava ainda com Claudette, a filha mais nova, e o menino Olivier. Desde muito cêdo Danielle demonstrou gôsto pela música, aprendendo a tocar piano e violoncelo, além de cantar com uma voz clara, pura, pouco possante, mas promissora.

Pensando no futuro da filha, Marie-Louise fez com que ela prestasse concurso para o Conservatório Nacional de Música de Paris, onde foi aceita imediatamente, apesar de ter apenas treze anos e meio. Certo dia, por intermédio do marido de uma aluna de sua mãe, Marie Serta, Danielle ficou sabendo que dois produtores, Delac e Vandal, estavam procurando uma heroína de quatore ou quinze anos para sua próxima produção, intitulada Le Bal. O argumento, baseado em um romance de Irène Némirovsky, relatava a história da vingança de uma adolescente, Antoinette Kampf (Danielle Darrieux), cujos pais novos-ricos (André Lefaur, Germaine Dermoz), procuram se introduzir na alta sociedade parisiense, organizando um baile suntuoso em sua residência. Sentindo-se abandonada por sua mãe, Antoinette, encarregada de levar os convites ao Correio, joga os envelopes no Sena. Ninguém comparece na festa, porém a harmonia familiar se fortalece.

Danielle Darrieux (usando o nome de Lydie Darrieux) em Le Bal

A versão alemã, Der Ball, já havia sido filmada por Wilhelm Thiele com Lucie Mannheim e Dolly Haas mas, para a versão francêsa, que seria dirigida também por Thiele, parecia impossível encontrar uma jovem atriz, que respondesse aos critérios exigidos. Danielle apresentou-se nos estúdios Épinay, passou nos testes, e assim estreou na tela mocinha, cantando perfeitamente bem duas canções escritas especialmente para ela, “Le Beau Dimanche” e “La Chanson de la Poupée”, demonstrando desembaraço diante das câmeras.

Quando Le Bal foi lançado em 1931, era o nome de Lydie Darrieux que aparecia nos créditos, pseudônimo que Danielle deixou de usar já no seu segundo filme, Coquecigrole / 1931, que ela fez, emprestada por Delac e Vandal ao produtor Jacques Haik. Nesta adaptação de um romance de Alfred Machard, dirigida por André Berthomieu, Danielle é Coquecigrole, orfã dotada de uma voz fora do comum. Ela é recolhida por um garçom, o velho ator cômico Macarol (Max Dearly) que, juntamente com seu colega Tulipe (Raymond Galle), lança a menina nos palcos. Após alguns incidentes, incluindo o sequestro de Coquecigrole pelo seu pai verdadeiro, ela se casa com Tulipe, nascendo uma filha dessa união.

Danielle Darrieux e Gerard Sandoz em Panurge

No seu terceiro filme, Panurge / 1932, produzido pela Écrans de France e dirigido por Michel Bernheim, Danielle é Régine, uma lavadeira que, seduzida por uma vida de luxo, se afasta temporariamente de seu namorado Panurge (Gérard Sandoz), um pobre sapateiro. No seu quarto filme, Le Coffret de Laque / 1932, um policial produzido por Jacques Haik, dirigido por Jean Kemm e baseado em um romance de Agatha Christie, Danielle é Henriette Stenay, filha de um casal (Alice Field, Maurice Varny), que está entre as pessoas investigadas pelo detetive Préval (René Alexandre), suspeitas de tentativa de roubo de uma fórmula de grande valor para o Ministério da Guerra e do envenenamento do químico que a concebera.Em 1933, após umas férias, Danielle voltou ao estúdio convocada por Geza von Bolvary para participar, com Jaque Catelain, de Château de Rêve, dirigido conjuntamente com Henri Georges Clouzot e co-produzido pela UFA. No enredo, um diretor que está realizando um longa-metragem sobre o Mar Adriático, precisando de figurantes, pede ao comandante de um navio (Jaque Catelain) para usar seus marinheiros e lhe oferece o papel de um príncipe no seu filme. Quando a filmagem passa para o ambiente campesino, a equipe encontra uma bela pastora, Béatrix (Danielle Darrieux) e, como em um conto de fadas, o comandante, que é realmente um príncipe, se apaixona por ela, sem saber que, na verdade, a moça é a filha do castelão local.

Jaque Catelain e Danielle Darrieux em Château de Rêve

Com Volga em Chamas / Volga em Flammes / 1934, de Victor Tourjansky, rodado na Tchecoslováquia, Danielle tem pela primeira vez como companheiro Albert Préjean, com o qual vai logo formar uma dupla célebre do cinema francês (seis filmes juntos ao todo). Trata-se de uma grande producão de aventura histórica, adaptada de um romance de Puchkin, sobre um líder de bandidos, Silatchoff (Valéry Inkijinof), que se proclama tsar do povo e executa seus adversários com muita crueldade. Danielle é Macha, jovem apaixonada pelo Tenente Orloff (Albert Préjean), um oficial que se opõe ao tirano.

Danielle Darrieux e Albert Préjean em Volga em Chamas

De volta a Paris, Danielle filma sob o comando de Billy Wilder (em colaboração com Alexandre Esway), Horas do Diabo / Mauvaise Graine / 1934, cuja ação transcorre na sua maior parte em exteriores, algo inusitado na época. Como Jeannette, irmã do chefe de um grupo de desocupados que roubam carros, ela se apaixona pelo jovem Henri (Pierre Mingand), rapaz honesto que, por fraqueza, se envolvera com os delinquentes. A função de Jeannette é seduzir os proprietários de veículos luxuosos, a fim de que o bando tenha tempo de roubá-los.

Pierre Mingand e Danielle Darrieux em Horas do Diabo

O filme seguinte de Danielle, Mon Coeur T’Appelle / 1934, co-produção franco-italiana realizada por Carmine Gallone e Serge Veber, coloca Danielle nos braços de Jan Kiepura. Ele é Mario Delmonti, tenor talentoso, mas ainda desconhecido, que não perde oportunidade de demonstrar seus dons, cantando nos lugares mais incovenientes. A bordo de um navio que o transporta para Mônaco, onde o chefe de sua trupe (Lucien Baroux) conta com um novo compromisso na Ópera de Monte-Carlo, Mario se apaixona por Nicole Nadin (Danielle Darrieux), uma secretária que havia perdido seu emprego. Ao chegarem ao seu destino, o diretor da Ópera, que parece ser amnésico, se recusa a recebê-los. Ajudado por Nicole, Mario usa todo tipo de astúcia para atrair a atenção do diretor e finalmente consegue seu objetivo, cantando a Tosca no átrio da Ópera de Monte Carlo, ao mesmo tempo que os artistas estão em cena. Por curiosidade, quem assumiu o papel de Danielle na versão alemã, Meu Coração Te ChamaMein Herz ruft nach Dir, foi Martha Eggerth. Martha e Kiepura se odiaram durante a filmagem mas, tempos depois. tornaram-se marido e mulher na vida real.

Danielle mal teve tempo de retornar a Paris para rever seus parentes e amigos, porque um outro compromisso a esperava mais uma vez na Alemanha. L ‘Or dans la Rue / 1934 de Kurt Bernhardt, comédia policial construída em torno dela e de Albert Préjean. Ele é Albert Perret, que se mete em uma trapaça que consiste em fabricar ouro sintético para enganar os incautos, mas acaba sendo desmascarado, e não lhe resta senão fugir para a América na companhia de uma jovem operária, Gaby (Danielle Darrieux), por quem se apaixonara.

Danielle Darrieux e Albert Préjean em L’Or Dans la Rue

Pela segunda vez a dupla Darrieux-Préjean entusiasma os espectadores e portanto os dois estão novamente juntos em La Crise est Finie / 1934, desta vez sob a direção Robert Siodmak. O argumento é simples: uma trupe de comédia musical está desempregada por causa da crise econômica. No centro da companhia encontra-se um casal formado pela atriz Nicole (Danielle Darrieux) e pelo pianista Marcel (Albert Préjean). Em um teatro abandonado eles montam uma revista sob o signo do otimismo, praticando pequenos furtos (e até um sequestro), e entoando uma série de canções bem alegres compostas pelo alemão Franz Wachsmann, futuro Waxman quando ele emigrou para os Estados Unidos para fugir do nazismo.

Albert Préjean e Danielle Darrieux em La Crise est Finie

Em 1934, um sentimento xenófobo se expandiu no meio da indústria do entretenimento. A polícia chegou até a ameaçar a produção de interromper a filmagem e a Nero Film foi constrangida a informar que dos quinhentos técnicos, atores e figurantes , somente sete não eram francêses. Um dia, sobre a porta do estúdio, foi colocado um cartaz, com estes dizeres: “Siodmak, volte para casa!” Soube-se depois que o autor do aviso era Henri Chomette, irmão de René Clair e antigo assistente de Siodmak. Após sete semanas de trabalho, mesmo assim, o filme foi completado, e pôde ser lançado, obtendo um grande sucesso popular.

Danielle Darrieux e Albert Préjean em Dédé

Adaptação de uma opereta, DedéDédé /1934, realizada por René Guissart, brinca com o apelido que Danielle Darrieux passou a receber depois de adquirir certa notoriedade: “DD”. O personagem Dédé, interpretado por Claude Dauphin, é um milionário, que compra uma sapataria, pertencente ao marido de Denise (Danielle Darrieux), mulher que ele ama, a fim de poder se encontrar com ela, sem se comprometer. Porém uma linda vendedora, Odette (Mireille Perrey), não o deixa indiferente, e Denise se consola com Robert (Albert Prejean), rapaz, alegre e decidido, cheio de idéias malucas para atrair a clientela. No elenco encontra-se o nome de algumas futuras vedetes do cinema francês: Ginette Leclerc, Viviane Romance, Suzy Delair e, na parte musical, desenvolvem-se bons números como, por exemplo, o dos grevistas “entregues” às Blue Bell Girls.

No ano seguinte, um outro filme interpretado por Danielle Darrieux e Albert Préjean chega às salas de cinema: Cuidado com Ela / Le Contrôleur des Wagons-Lits, produção franco-alemã, dirigida por Richard Eichberg, A história se passa em 1900 e tem início quando Bernard (Albert Préjean), inventor de um carburador capaz de decuplicar a velocidade dos veículos, é confundido com Mr. Bernard (Lucien Baroux), diretor da fábrica de automóveis Júpiter, e se encontra com uma corista do teatro de revista, Annie Bourguet (Danielle Darrieux), que se faz passar por condessa. No decorrer dos acontecimentos, Bernard descobre a verdadeira identidade da moça e ela verifica que ele é apenas o controlador do carro-domitório de um trem, cujo hobby é a mecânica. Com a ajuda de Annie, Albert toma o lugar do verdadeiro diretor, e experimenta o novo carburador em uma corrida automobilística, finalmente ganha pela Júpiter.

Albert Préjean e Danielle Darrieux em Pequena Sapeca

É ainda com Albert Préjean que Danielle divide o cartaz de Pequena Sapeca / Quelle Drôle de Gosse / 1935, comédia maluca dirigida por Léo Joannon. O argumento, escrito por Yves Mirande, é o seguinte: Alfred Gaston (Lucien Baroux), um quinquagenário patrão de uma fábrica, está apaixonado por uma de suas secretárias, Lucie (Danielle Darrieux). A fim de não fazer um matrimônio desigual, ele decide despedir Lucie, para pedí-la em casamento no dia seguinte. Desesperada com a dispensa, Lucie vai se jogar no Sena, quando é salva por Gaston Villaret (Albert Préjean) que, para impedí-la de pular de novo no rio, leva-a para uma recepção em sua casa. Irritada por ter sido contrariada no seu plano de suicídio, e com o auxílio de alguns copos de uísque, Lucie cria uma imensa confusão (completamente embriagada, a moça caminha titubeando sobre o telhado da residência de Gaston, ameaçando se jogar no vazio diante dos pedestres horrorizados; ela esquece de fechar uma torneira e causa uma inundação). Mas Gaston e Lucie se amam e na manhã seguinte, revelarão um para o outro seus sentimentos mútuos.

Com este papel de garota travessa, a atriz transpôs uma etapa na sua carreira: a partir de agora ela estará sempre no centro do filme, será o motor de toda a ação. A crise de nervos de Danielle Darrieux tornou-se uma espécie de passagem obrigatória em  seus filmes cômicos.

Danielle Darrieux e Pierre Mingand em Mademoiselle Mozart

Em 1936, ela faz Mademoiselle Mozart, comédia musical comandada por Yvan Noé, reunindo-se novamente com Pierre Mingand, que esteve ao seu lado em Horas do Diabo. Mingand é Maxime, rapaz rico que, entediado no meio dos seus e de sua noiva, uma provinciana triste e enfadonha, se interessa por Denise (Danielle Darrieux), a bela proprietária de uma loja de instrumentos musicais na Avenida Mozart. Como os negócios não vão muito bem, ele vem em socorro de Denise e, com a maior discreção, se emprega como vendedor. Depois de muitos incidentes e canções, um cai nos braços do outro na sua loja.

Depois de Mademoiselle Mozart, Danielle participou, mais uma vez ao lado de Jan Kiepura, de J’Aime Toutes les Femmes / 1935, versão francêsa de um filme alemão, Ich liebe alle Frauen, dirigido pelo tcheco Carl Lamac (obs. no Brasil só passou a versão alemã com o título de Amo Todas as Mulheres). Ela fez algumas cenas em Berlim, porém o essencial da filmagem teve lugar em Paris sob a direção de Henri Decoin, substituto de Lamac. Kiepura é o tenor, Jean Morena, que quer se livrar de sua glória e, para isso, envia em seu lugar à uma recepção um rapaz empregado de uma mercearia, Eugène (Jan Kiepura), que se parece muito com ele, provocando inúmeros incidentes com suas respectivas noivas, Danièle (Danielle Darrieux) e Camille (Hélène Robert). Enfim tudo se reolve, quando os dois heróis formam um dueto. Nesta ocasião Danielle e Decoin começaram a namorar.

Subsequentemente, Danielle foi contratada por Alexis Granowsky para atuar em um filme de aventura histórica, Tarass Boulba / Taras Boulba / 1936, baseado em um romance de Nicolas Gogol, ao lado de Harry Baur e Jean-Pierre Aumont. Trabalhar com Harry Baur era um sonho de Danielle, que aceitou imediatamente o papel de Marina, a filha do governador de uma província polonêsa, cujo palácio é sitiado pelo chefe cossaco. Infelizmente, quando ela chegou ao palco da filmagem, ficou sabendo que não iria contracenar com o grande Harry Baur, mas somente com Jean-Pierre Aumont, que personificava André, o filho de Tarass Boulba, o rapaz por quem Marina estava apaixonada. Apenas oito dias de trabalho para Danielle, que lhe deixaram a impressão de ter participado de um simples esquete.

Daniel Darrieux em Mulher Mascarada

Danielle Darrieux e Henri Decoin

No final de 1935, Danielle e Decoin se casaram, ela com 18 anos, ele com 45, um mês depois da atriz ser dirigida por seu marido em  Mulher MascaradaLe Domino Vert,  produzido pela UFA e rodado nos estúdios de Neue Babelsberg simultaneamente com a versão alemã, Dominó VerdeDer grüne Domino, dirigida por Herbert Selpin e estrelada por Brigitte Horney. Danielle faz um papel duplo, o de Hélène de Richemond e o de sua mãe, Marianne. Hélene de Richemond, uma rica herdeira, foi criada por seu tio e a tia após a morte de sua mãe Marianne. Na véspera de seu casamento, Hélène recebe de um tabelião amigo da família, Maitre Laurent, uma carta escrita por sua mãe, revelando que seu verdadeiro pai se chama Henri Bruquier (Maurice Escande) e que ainda está vivo, condenado a vinte e cinco anos de prisão. A pedido de Hélène, Maitre Laurent lhe conta a história de Bruquier. Em 1914, ele era um crítico de arte, esposo pouco feliz de Lily (Jany Holt), que o traía com o escultor Nébel (Charles Vanel); mas Lily, pôs um fim neste relacionamento, para não perder seu marido que, por sua vez, havia se apaixonado por Marianne. Quando Lily é encontrada morta, Bruquier, pensando que foi Marianne a autora do assassinato, se acusa do crime. Desesperada após o encarceramento de Bruquier, Marianne, grávida dele, casou-se com o senhor de Rochemond. Ela morreu ao dar à luz à Hélène. No presente, Hélène promove a defesa do pai e consegue libertá-lo.

Charles Boyer e Danielle Darrieux em Mayerling

Danielle Darrieux e Charles Boyer em Mayerling

Lançado no início de 1936, Mayerling / Mayerling, drama histórico sobre o amor impossível de Marie Vetsera (Danielle Darrieux) e do arquiduque Rodolphe de Habsburg (Charles Boyer), dirigido com delicadeza por Anatole Litvak para a Nero Film, marcou o primeiro grande momento de Danielle como atriz, tanto pela importância da produção como pela profundidade de seu papel. Seu triunfo foi internacional e Hollywood começou a ficar de ôlho nela.

Danielle Darrieux em Só Para Mulheres

Depois de Mayerling, Danielle tomou parte de mais três filmes no ano de 1936. O primeiro, Só Para Mulheres / Club de Femmes, dirigido por Jacques Deval, mostra um grupo de moças – Greta (Betty Stockfield), Juliette (Josette Day), Alice (Else Argal) -, que se refugia na pensão de Gabrielle Aubry (Valentine Tessier) e Madame Fargeton (Ève Francis), para ficar ao abrigo das tentações e dos perigos do cotidiano. Na pensão circulam ainda Hèlene (Junie Astor), a telefonista perversa ligada a um rufião e, enfim, Claire (Danielle Darrieux), corista do Folies Bergères, dançarina ambiciosa e obstinada. No decorrer da narrativa, o ambiente do clube se revela o lugar das experiências infelizes de Greta, Juliette, Alice e Hélène e de uma aventura sentimental de Claire, afinal bem sucedida – desprezando as regras do Clube, ela introduz no estabelecimento seu noivo (Raymond Galle) vestido de mulher.

Adolf Wohlbrück e Danielle Darrieux em Port Arthur

O segundo filme, Port Arthur / Port Arthur, dirigido por Nikolas Farkas, tem como pano de fundo a guerra russo-japonesa de 1904. Danielle faz o papel de Youki, filha de pai russo e mãe japonesa, mas casada com um capitão da marinha russa, Boris Ranewsky (Adolf Wohlbrück), que, perseguida pelo comandante Vassidlo (Charles Vanel), é injustamente acusada de espionagem e prefere morrer nos braços de seu marido.

O terceiro filme, Uma Dupla do Barulho / Un Mauvais Garçon, dirigido por Jean Boyer gira em torno de uma jovem advogada, Jacqueline Serval (Danielle Darrieux), cujo pai quer casá-la com o filho de uma família amiga, os Feutrier. Cansada de brigar com seu progenitor, Jacqueline aceita um acordo: se ela não encontrar um cliente dentro de dezoito meses, terá que esposar o rapaz escolhido. Ela acaba defendendo um escroque simpático, Pierre Mesnard (Henri Garat), por quem se apaixona, sem saber que ele é o filho dos Feutrier.

No período 1937-1939, Danielle fez três filmes sob a direção de seu marido Henri Decoin (Senhorita Minha Mãe / Mademoiselle Ma Mère / 1937, Abuso de Confiança / Abus de Confiance / 1937, A Volta ao Lar/ Retour a L’ Aube / 1938); um filme americano dirigido por Henry Koster, Sensação de Paris / The Rage of Paris / 1938; e Katia / Katia / 1938 sob responsabilidade diretorial de Maurice Tourneur.

Em Senhorita Minha Mãe, após romper quatorze noivados para desespêro de seus pais, a linda e frívola Jacqueline Vignolle (Danielle Darrieux) aceita esposar o “primeiro homem que aparecer”. O felizardo é um viúvo quinquagenário, Albert Letournel (André Alerme); porém ela exige um casamento branco. Mr. Letournel tem um filho de vinte e cinco anos, Georges (Pierre Brasseur), que não resiste evidentemente aos encantos de sua madrasta.

Danielle Darrieux em Abuso de Confiança

Pierre Mangand e Danielle Darrieux em Abuso de Confiança

Em Abuso de Confiança, Lydia (Danielle Darrieux), jovem orfã e sem recursos para estudar Direito, se faz passar pela filha natural de Jacques Ferney (Charles Vanel), um escritor célebre. Mme. Fernay (Valentine Tessier) descobre a fraude, mas se cala, para poupar o marido de uma decepção. Quando Lydia, tomada pelo remorso e apaixonada por Pierre (Pierre Mangand), o secretário de Ferney, confessa sua impostura para Mme. Ferney, esta se cala para sempre, deixando a jovem viver feliz ao lado do seu amado.

Danielle Darrieux em A Volta ao Lar

Em A Volta ao Lar, Anita (Danielle Darrieux), jovem provinciana romântica, esposa de Karl Ammer (Pierre Dux) chefe da estação ferroviária de Thaya, um vilarejo sossegado da Hungria, sonha com uma outra vida, vendo os trens passando em direção a Budapeste, onde ela chega um dia, para assistir ao enterro de uma tia e receber parte da herança. Depois de preencher as formalidades, Anita perde o trem de volta, e se deixa levar pelo turbilhão da vida noturna da capital; mas, retorna finalmente para aquele que lhe traz a verdadeira felicidade.

Douglas Fairbanks Jr e Danielle Darrieux em A Sensação de Paris

Cenas de A Sensação de Paris

Em 1937, Danielle assinou um contrato de sete anos com a Universal, conservando a possibilidade de fazer um filme por ano na França. Ela pediu também que Henri Decoin tivesse o direito de opinar sobre os argumentos e a escolha dos seus parceiros. A estada hollywoodiana do casal iria durar oito meses, no curso dos quais Danielle apareceu no seu primeiro filme americano, A Sensação de Paris / The Rage of Paris (intitulado na França, La Coqueluche de Paris), sob a direção de Henry Koster. Daniele é Nicole de Cortillon, jovem francêsa chegada recentemente em Nova York à procura de um emprego de modelo. Ela entra por engano no escritório de um empresário, Jim Trevor (Douglas Fairbanks Jr.) e, pensando que ele é um fotógrafo profissional, começa a se despir, para posar. Desconfiando que ela é uma chantagista, que quer comprometê-lo, Trevor expulsa Nicole. Sem recursos, ela é recolhida por sua amiga Gloria Patterson (Helen Broderick), que decide se ocupar do futuro de Nicole, ao mesmo tempo que o seu. Com a ajuda de seu comparsa, Mike Lavetovitch (Mischa Auer), um mordomo que deseja abrir seu próprio negócio, Gloria arma um plano para casar Nicole com um milionário, fazendo-a passar por uma rica herdeira. O plano funciona muito rapidamente e o riquíssimo Bill Duncan (Louis Hayward) não resiste aos encantos da linda francesinha. No curso de uma noite na ópera, Bill apresenta a Nicole seu melhor amigo, que não é outro senão Jim Trevor. Ele logo reconhece sua suposta chantagista e, para proteger seu amigo, sequestra Nicole no dia de seu noivado com Bill, levando-a para seu chalé na montanha. Após algumas confrontações, os dois se aproximam e se apaixonam.

John Loder e Danielle Darrieux em Katia. 

Em seguida, Danielle fez Katia, a Tzarina sem Coroa, mas adoeceu, e ficou na França apesar de seu compromisso com a Universal. A ruptura de seu contrato lhe valeu algum prejuízo financeiro, mas a atriz francesa persisitiu em seu desejo de permanecer na sua pátria, alegando principamente sua vontade de escapar à padronização hollywoodiana, à qual queriam submetê-la: “Eles queriam modificar meu rosto, mudar meu penteado, eles queriam me dar uma outra alma, e pois bem, eu estava farta. Gosto daquí e não retornarei aos Estados Unidos”.

Com Katia, filme de orçamento vultoso, dirigido por Maurice Tourneur, os produtores quiseram reiterar o grande sucesso de Mayerling, colocando em cena os amores contrariados do tsar Alexandre II (John Loder) e de sua amante, a aristocrata Cartherine Yourevska Dolgouky, cognominada Katia (Danielle Darrieux). É uma evocação romanceada dos fatos históricos, tentando conciliar as duas facetas da persona de Danielle: a “garota travessa” das comédias e a jovem romântica dos dramas, tudo sob o contrôle rígido do reputado diretor do cinema mudo.

.