BETTE DAVIS I
julho 22, 2016Ela construiu uma carreira extraordinária – que lhe deu dois Oscar da Academia e dez indicações como Melhor Atriz – e se tornou uma das maiores estrelas de Hollywood de todos os tempos. Perfecionista notória, entrava frequentemente em conflito com seus diretores, mas era ao mesmo tempo uma profissional que dava tudo de si mesma, seja qual fosse o projeto com o qual estivesse compromissada.
Ruth Elizabeth Davis “Betty” nasceu no dia 5 de abril de 1908 em Lowell Massachussets, filha do advogado Harlow Morrell Davis e Ruth Augusta “Ruthie” (nome de solteira Favor). Em 1915, seus pais se separaram e Betty e sua irmã Barbara Harriett “Bobby”, foram para o colégio interno Crestalban em Lanesborough no Condado de Berkshire. Em 1921, Ruthie transferiu-se com suas filhas para Nova York onde, depois ter estudado fotografia na Clarence White School of Photography, foi trabalhar no estúdio fotográfico de Pierie Macdonald. Ela tinha uma amiga chamada Myrtis Genthner, que estava lendo “La Cuisine Bette” de Balzac, e casualmente sugeriu a Ruth Elizabeth, que mudasse a pronúncia de seu apelido para Bette.
Em 1924, Ruthie teve que deixar seu emprego por motivo de saúde e partiu com as filhas para Boston, onde morava sua irmã, Mildred. Ruthie matriculou as meninas primeiramente no Northfield Seminary for Young Ladies em Newton e depois na Cushing Academy em Ashburnham. Após se formar neste último educandário, Bette matriculou-se na Escola Dramática de John Murray Anderson, aprendendo com a famosa Martha Graham, instrutora de dança na escola, a expressar uma emoção como o corpo todo. “Toda vez que eu subí uma escada nos meus filmes, era Graham passo por passo”, diria Bette mais tarde.
Em 1929, Bette estreou no palco no espetáculo Fora-da-Broadway, The Earth Between, peça cujo tema era o desejo incestuoso de um fazendeiro do Nebraska pela sua filha de 16 anos, Floy, interpretada por Bette. Seguiram-se participações em outras peças da companhia Temple Players (fundada por George Cukor e George Kondolf) até que ela chegou à Broadway em Broken Dishes, dirigida por Marion Gering e, em seguida, em Solid South, dirigida por Rouben Mamoulian.
Em 1930, Bette partiu de trem para Hollywood, a fim de fazer um teste na Universal.
Ela contaria mais tarde sua surpresa ao ver que ninguém estava na estação, aguardando sua chegada; um empregado do estúdio havia esperado por ela, mas foi embora, porque não viu ninguém que “parecesse com uma atriz”.
Bette fracassou no seu teste cinematográfico; porém foi usada em várias provas para outros atores. Ela relatou esta experiência no programa Dick Cavett em 1971 com a seguinte observação: “”Puseram-me em um sofá, e eu testei quinze homens … eles todos deitaram em cima de mim e me deram um beijo apaixonado. Pensei que ia morrer”.
Bette fez um novo teste para A House Divided / 1931, mas o diretor William Wyler, reprovou-a. Entretanto, ela conseguiu entrar no elenco de Garota Rebelde / Bad Sister / 1931 (Dir: Hobart Henley ) como a irmã da atriz principal Sidney Fox. Depois da filmagem, Carl Laemmle Jr. chamou Bette e Humphrey Bogart (que também aparecia no filme em início de carreira), um de cada vez, e lhes disse que não tinham nada para oferecer. “Não era culpa deles. Simplesmente não fotografavam bem”. Ele sugeriu que voltassem para Nova York. O conselho do jovem Laemmle era loucura, obviamente, mas como ele poderia prever a carreira riquíssima que aqueles então pouco experimentados atores iriam criar através dos tempos? Bette ainda ouviu Lammle Jr. comentar: “Ela possui tanto sex appeal quanto Slim Summerville” (o feioso coadjuvante mais conhecido por sua participação em Sem Novidade no Front / All Quiet on the Western Front / 1930).
Carl Laemmle pensou em despedí-la, porém o fotógrafo Karl Freund lhe disse que Bette “tinha uns olhos maravilhosos”, e a Universal renovou seu contrato por mais três meses. A esta altura, ela havia feito seu segundo filme, Filhos / Seed / 1931 (Dir:J.M. Stahl ) que, em vez de dar visibilidade à sua carreira, empurrou-a mais para o segundo plano.
Bette apareceu em um papel minúsculo em A Ponte de Waterloo / Waterloo Bridge / 1931 (Dir: James Whale) antes de ser emprestada para a RKO Radio Pictures, onde fez Way Back Home / 1931 (Dir: William Seiter); para a B.F. Zeidman Productions, onde fez A Casa Infernal / Hell’s House / 1932 (Dir: Howard Higgin); e para a Columbia, onde fez The Menace / 1932 (Dir: Roy William Neill). “Havia algo mais baixo do que o fundo” – Bette escreveria mais tarde em sua autobiografia – e eles me mandaram para lá”. Passados nove meses, e seis filmes que não fizeram successo, Laemmle resolveu dispensar a jovem atriz.
Ela estava se preparando para retornar a Nova York, quando recebeu um telefonema de George Arliss, convidando-a para assumir o principal papel feminino no filme da Warner Bros., O Homem Deus / The Man Who Played God / 1932 (Dir: John G. Adolfi). Segundo Bette, Arliss teria acolhido uma recomendação do ator Murray Kinnel, que trabalhara com ela em The Menace; porém Jack Warner disse que não foi assim: quem a recomendou foi um executivo da Warner chamado Rufus LeMaire. Seja como for, graças a este filme com Arliss, ela assinou contrato com a Warner Bros., onde permaneceria até 1949.
Ainda em 1932, Bette atuou discretamente em Erros do Coração / The Rich Are Always With You (Dir: Alfred E. Green), No Palco da Vida / So Big (Dir: William Wellman) e Surpresas Convencionais / The Dark Horse (Dir: Alfred E. Green); casou-se com o trompetista Harmon “Ham” Nelson, seu ex-colega na Cushing Academy, e finalmente Jack Warner e Darryl Zanuck lhe deram seu primeiro papel importante em Escravos da Terra / Cabin in the Cotton: o da beldade sulista Madge, filha mimada do dono de uma plantação de algodão, que seduz o jovem letrado Marvin (Richard Barthelmess), compromissado com uma jovem (Dorothy Jordan) e filho de um dos arrendatários explorados pelo poderoso proprietário das terras.
O diretor Michael Curtiz tratou Bette com muita grosseria, mas iluminou-a com grande finura, fazendo com que seus cabelos louros irradiassem uma energia quente. No contexto deste calor incandescente, a agressiva Madge, depois de olhar para o seu corpo, de cima para baixo e de baixo para cima, diz para Marvin em uma cena antológica: “Cute! I’d like to kiss you, but I just washed my hair. Bye!”.
No dia seguinte, em que terminou de filmar Escravos da Terra, Bette já estava sob as ordens de Mervyn le Roy em Três … Ainda é Bom / Three on a Match. Nele, três amigas de infância – Vivian, Mary, e Ruth – encontram-se em Nova York após dez anos. Vivian (Ann Dvorak) casou-se bem, Mary (Joan Blondell) tornou-se uma corista depois de ter sido internada em um reformatório, e Ruth (Bette Davis) é uma secretária sem ter muito o que fazer.
O título do filme – inspirado em uma superstição da Primeira Guerra Mundial, segundo a qual o terceiro soldado a acender um cigarro com um único fósforo seria morto, porque a duração da chama permitiria que os soldados germânicos pudessem mirar suas armas com exatidão – siginificava o destino de uma das personagens. Terminada a filmagem, Le Roy fez uma previsão errada, que ele depois lamentaria: “Eu disse para um jornalista que Joan Blondell ia ser uma grande estrela, que Ann Dvorak tinha um valor potencial, mas que eu achava que Bette Davis não chegaria lá”.
O último filme de Bette no ano de 1932, 20.000 Anos em Sing Sing / 20.000 Years in Sing Sing, dirigido com eficiência narrativa por Michael Curtiz, contava a história da redenção de um criminoso (Spencer Tracy), alcançada perversamente, ao ser condenado por um crime que não cometeu. Tracy admirava Bette – que ele havia visto em A Casa Infernal – e disse isso para ela, quando foram apresentados. E foi além, acrescentando que achava que ela era a atriz mais talentosa na cidade. “Você está totalmente certo”, respondeu Bette com bravata.
Os próximos oito filmes de Bette, Em Plenas Nuvens / Parachute Jumper / 1933 (Dir:Alfred E. Green), Amante de meu Marido / Ex-Lady / 1933 (Dir:Robert Florey); Negócios em Família / The Working Man / 1933 (Dir: John G. Adolfi); Os Desaparecidos / Bureau of Missing Persons / 1933 (Dir:Roy Del Ruth);
Drogas Infernais / The Big Shakedown / 1934 (Dir: John Francis Dillon); Modas de 1934 / Fashions of 1934 (Dir:William Dieterle); Bancando o Cavalheiro / Jimmy the Gent / 1934 (Dir: Michael Curtiz); e Névoa do Mistério / Fog Over Frisco / 1934 não acrescentaram nada a sua carreira, embora Negócios em Família e Modas de 1934 fossem bem interessantes. Ela não gostou de nenhum, com exceção de Névoas do Mistério, elogiando a qualidade do roteiro, a direção de William Dieterle e a supervisão do produtor Henri Blanke, que muito admirava.
Enquanto estava filmando 20.000 Anos em Sing Sing, Bette recebeu do roteirista Wilson Mizner o romance de Somerset Maugham, Of Human Bondage (traduzido para o português como Servidão Humana). Ele sugeriu que ela o lesse e vislumbrasse a possibilidade de interpretar Mildred, a anti-heroína abominável. Poucos meses depois, o diretor John Cromwell viu Escravos da Terra e pensou nela para o papel.
Porém o problema é que era a RKO que iria filmar Servidão Humana, e não a Warner Bros. Intuindo que esta seria a sua grande chance de mostrar de uma vez por todas sua capacidade interpretativa, Bette encheu a paciência de Jack Warner, para que ele a emprestasse para a RKO, até que ele, desesperado com sua insistência, sucumbiu ao seu apelo. A performance de Davis como a garçonete vulgar e desbocada que desperta uma obsessão quase masoquista em um estudante de medicina aleijado (Leslie Howard), com seus olhos neuróticos e sua voz nervosa, mereceu elogios da crítica.
Entretanto, logo em seguida, a Warner colocou-a em Dona de Casa / Housewife / 1934 (Dir: Alfred E. Green), mais um programmer (no sistema de estúdio, um filme intermediário entre um filme A e um filme B), que ela detestou. Adicionando insulto sobre insulto, o estúdio imediatamente convocou Bette para um papel secundário em The Case of the Howling Dog. Ela então se rebelou e foi suspensa por não ter honrado seu contrato de trabalho
Graças ao sucesso de Escravos do Desejo / Of Human Bondage / 1934 e ao elogio de sua interpretação pelos comentaristas, Bette saiu da suspensão e recebeu um papel melhor em A Barreira / Bordertown / 1935 (Dir: Archie Mayo), ao lado de Paul Muni; mas logo lhe impuzeram outras produções – Quando o Amor Agarra / The Girl from 10th Avenue / 1935 (Dir: Alfred E. Green), Miss Repórter / The Front Page Woman / 1935 (Dir: Michael Curtiz), Nas Garras da Lei / Special Agent / 1935 (Dir: William Keighley), que não faziam jús ao seu talento.
De início Bette não gostou do script de seu próximo compromisso, Perigosa / Dangerous (anteriormente intitulado Hard Luck Game), dirigido por Alfred E. Green); não obstante, foi ele que lhe possibilitou a conquista do seu primeiro Oscar da Academia. Trata-se de um melodrama sobre uma atriz da Broadway chamada Joyce Heath, que está em declínio e entregue à bebida, mas é reabilitada por um arquiteto aristocrata (Franchot Tone) admirador do seu trabalho. Joyce se apaixona por ele que, sentindo atração por ela, desfaz seu noivado; porém a má sorte do título originário do filme retorna sob a forma de um marido secreto, que não lher quer dar o divórcio. Joyce sai com ele de carro e provoca um acidente. Ambos sobrevivem, e Joyce decide ficar com seu esposo.
O Oscar concedido à atriz tem sido considerado como um prêmio de consolação por não ter sido nem sequer indicada por sua atuação em Escravos do Desejo, mas seu desempenho mais contido em Perigosa, mereceu por si só a tão cobiçada estatueta, fazendo-nos esquecer o final forçado e meloso do espetáculo. Bette recebeu o Oscar da Academia das mãos de David Wark Griffith em 5 de marco de 1936 em um banquete no Biltimore Hotel em Los Angeles.
O filme seguinte de Bette, A Floresta Petrificada / The Petrified Forest / 1936 (Dir: Archie Mayo), adaptação estática da peça de Robert E. Sherwood, marcou a ascensão de Humphrey Bogart como o gângster Duke Mantee, que ele já havia feito no palco. A Warner pensara em Edward G. Robinson para o papel, porém Leslie Howard se recusou a fazer o filme sem Bogart. Bette se impôs mais uma vez como Gabby Maple, a artista “desperdiçada” em um posto de gasolina do deserto do Arizona, que se entende bem com o intelectual desiludido interpretado por Leslie Howard.
Sem ter direito a um descanso, Bette foi convocada para Satan Met a Lady / 1936 (Dir:William Dieterle), segunda versão do romance The Maltese Falcon de Dashiell Hammett enquanto sonhava em ser liberada para fazer Maria Stuart / Mary of Scotland / 1936, que seria rodado na RKO. Entretanto, a Warner não lhe deu permissão, porque (segundo o biógrafo de John Ford, Scott Eyman) “não queria arriscar mais um outro sucesso de Bette em outro estúdio”. Bette porém, pôs a culpa em John Ford, e não em Jack Warner. Ela chegou a se encontrar com Ford e este lhe disse grosseiramente que “ela falava demais e pôs um fim na conversa”.
Então, em vez de interpretar o papel de Elizabeth, Rainha da Inglaterra para um dos maiores diretores do mundo, Bette acabou por se transformar em uma falsa herdeira de uma firma de cosméticos para Alfred E. Green em A Flecha de Ouro / The Golden Arrow/ 1936 (Dir: William Dieterle).
Bette achava que não estava sendo integrada nas melhores produções do estúdio (tendo sido preterida verbis gratia por Olivia de Havilland em Capitão Blood / Captain Blood / 1935 e Adversidade / Anthony Adverse / 1936), ganhava muito pouco e trabalhava sem descanso. Insatisfeita com essa situacão, pediu a Jack Warner um novo contrato que lhe desse, além de aumento de salário, mais direitos como, por exemplo, o de fazer somente quatro filmes por ano; somente ser fotografada, se possível, pelos seus cinegrafistas favoritos Tony Gaudio, Sol Polito e sobretudo Ernest Haller; encerrar seu trabalho as 18hs; ter direito a três meses consecutivos de férias; poder participar de quatro programas radiofônicos de sua escolha e que seu nome fosse o primeiro a ser mencionado nos créditos. Jack não atendeu às suas reivindicações, suspendeu-a mais uma vez, e desistiu de colocá-la em God’s Country and the Woman, o filme que fôra previsto para ela.
Neste momento, entrou em cena o empresário Ludovico Toeplitz, que ofereceu a Bette o papel principal em dois filmes, I’ll Take the Road, a ser filmado nos estúdios da Ealing em Londres e um filme com Maurice Chevalier na França. Bette partiu para Londres e entrou com uma ação na Alta Côrte de Justiça, alegando que na verdade foi a Warner Bros. que infringiu o contrato, descrito por seu advogado, Sir William Jowitt, como “uma sentença de morte”, dando como exemplo das restrições absurdas que sua cliente sofria, a cláusula que concedia ao estúdio o direito exclusivo de fotografá-la: “Isto quer dizer”- disse o jurista – “que ela não podia permitir que seu marido tirasse uma foto dela no jardim” (cf. Ed Sikov, Dark Victory – The Life of Bette Davis, 2007, Henry Holt and Company).
Apesar do esforço do seu defensor, Bette perdeu a causa e ficou proibida de aceitar a proposta de Toeplitz que, aliás, já havia lhe informado, dois meses antes do caso chegar à Alta Côrte, de que fôra aconselhado por seu advogado de que a Justiça não iria permitir que ela assinasse contrato com ele. Humilhada, Bette retomou suas atividades em Burbank, mas o episódio lhe proporcionou uma publicidade vital para a sua carreira. Ao tomar uma atitude beligerante contra a Warner, ela criou uma nova persona para si própria: a de uma mulher de temperamento forte e espírito combativo.
Os publicistas do estúdio então começaram a explorar essa nova faceta da atriz e, a partir daí, ela começou a receber papéis melhores ou pelo menos papéis que não a enfureciam: o de Mary Dwigth ao lado de Humphrey Bogart em Mulheres Marcadas / Marked Women / 1937 (Dir: Lloyd Bacon); o de Fluff ao lado de Edward G. Robinson em Talhado para Campeão / Kid Galhahad / 1937 (Dir: Michael Curtiz); o de Mary Donnel ao lado de Henry Fonda em Cinzas do Passado / That Certain Woman / 1937 (Dir: Edmund Goulding); o de Joyce ao lado de Leslie Howard em Somos do Amor / It’s Love I’m After / 1937. (Dir: Archie Mayo).
Uma das grandes frustrações de Bette foi o de não ter conseguido o papel de Scarlet O’Hara em … E O Vento Levou / Gone With Wind / 1939. A Warner assinou um contrato de opção para adquirir os direitos do romance de Margaret Mitchell pouco antes dele ser publicado em junho de 1936 e Jack Warner lhe ofereceu o papel de Scarlet; porém, em agosto do mesmo ano, foi David O. Selznick que comprou os direitos. Bette teve outra chance de ser Scarlet quando Selznick, antes de se decidir por Vivien Leigh, propôs a Jack que este a emprestasse juntamente com Errol Flynn como um pacote de astros para o filme. Bette gostava de Errol. mas achava que o talento interpretativo dele era limitado: “Pensar em Mr. Flynn como Rhett Butler me assustou. Eu recusei” (cf. Ed Sikov).
Por coincidênca, emprestado pelo produtor Samuel Goldwyn à Warner, William Wyler dirigiu Bette em Jezebel / Jezebel / 1938, drama romântico com uma heroína sulista de caráter semelhante ao de Scarlet O’Hara, e proporcionou à atriz o seu segundo Oscar.
Vestida com belos figurinos de Orry-Kelly e Milo Anderson (não creditado e criador do vestido vermelho) e fotografada por Ernest Haller, seu cameraman favorito, ela teve um desempenho notável, destacando-se, entre outras, a cena do baile (de quinze minutos) quando, desafiando a sociedade, a protagonista surge de vermelho em contraste com os trajes brancos tradicionalmente usados por todas as jovens solteiras da cidade.
A ação do filme transcorre em 1852 na cidade de New Orleans. Julie Marsden (Bette Davis) está noiva do jovem banqueiro Preston Dillard (Henry Fonda). Quando ele prefere ir a uma reunião de negócios em vez de acompanhá-la a uma prova de vestido para o baile no Clube Olympus, Julie resolve tirar desforra usando o vestido vermelho. Entretanto, seu plano fracassa, porque Press, após dançar com ela no salão esvaziado pelos outros pares, rompe o noivado, e parte para o Norte. Julie se arrepende e promete a si mesma que vai pedir perdão ao ex-noivo quando ele voltar. Um ano depois, para surpresa de Julie, Press retorna casado com uma nortista, Amy (Margaret Lindsay). Vingativa como ela é, Julie provoca seu antigo admirador, Buck Cantrell (George Brent) a se bater em um duelo com o irmão de Press (Richard Cromwell). Como resultado, Buck vem a ser morto, deixando seu sangue na consciência de Julie. Quando Press é subitamente infectado pela febre amarela, que está se alastrando pela região, ele é enviado para uma colonia de leprosos, onde provavelmente morrerá. Amy quer ir com ele, mas Julie convence-a de que ela tem mais condições de cuidar de Press. Amy acaba consentindo e Julie vai em seu lugar, para se redimir perante o homem que ama.
O personagem feminino mais simpático é a Tia Belle (Fay Bainter). Ela ama Julie, mas se recusa a aceitar o comportamento da sobrinha (Belle a chama de uma “Jezebel”) e é a única verdadeiramente gentil e hospitaleira em relação a Amy, que é ridicularizada pelos outros por ser uma “Yankee”. Fay Bainter ganhou o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante
Wyler deu poucas instruções para Bette, a não ser a de ordenar que ela ficasse parada quando sua personagem, Julie Marsden, não tivesse razão para se mexer. “Você quer que eu ponha uma corrente no seu pescoço?’”, ele gritou um dia durante a filmagem. “Pare de mexer com a cabeça”, foi outra ordem dada pelo diretor. Wyler dominou Bette com sucesso, de modo que naturalmente, ela se apaixonou por ele. Seu marido, Harmon, estava convenientemente em Nova York. O romance terminou quando o filme ficou pronto (cf. Ed Sikov).
Ainda em 1938, Bette contracenou pela primeira vez com Errol Flynn em As Irmãs / The Sisters (Dir: Anatole Litvak), que conta as experiências de três jovens de uma pequena cidade do Montana (Louise / Bette Davis, Helen / Anita Louise e Grace / Jane Bryan) em seus casamentos. Cada irmã tem um destino diferente. Louise, a mais velha, casa-se com um jornalista esportivo, Frank Medlin (Errol Flynn), rapaz encantador mas irresponsável e com uma tendência para o alcoolismo; Helen, esposa um homem mais velho, que lhe oferece segurança; Grace a mais jovem, é traída pelo marido. A novidade neste filme é que tanto Bette quanto Flynn fazem papéis completamente diferentes dos que estavam acostumados a fazer. Despojado de sua condição costumeira de herói intrépido dos filmes de aventuras, Flynn consegue dar bastante credibilidade ao seu personagem enquanto Bette assume desta vez os traços de uma mulher serena e bondosa, oferecendo-nos uma atuação cheia de nuanças.
Em novembro de 1938, após ter obtido prova de que Bette mantinha uma relação sexual com Howard Hughes, Harmon pediu o divórcio, alegando entre outras coisas, que ela dava mais atenção aos livros do que a ele.
No ano de 1939 Bette, participou de quatro filmes: Vitória Amarga / Dark Victory (Dir: Edmund Goulding); Juarez / Juarez (Dir: William Dieterle); Eu Soube Amar / The Old Maid (Dir: Edmund Goulding); e Meu Reino por um Amor / The Private Lives of Elizabeth and Essex (Dir: Michael Curtiz), que consolidaram sua reputação artística e o seu estrelismo.
O primeiro filme, é um melodrama com roteiro de Casey Robinson, contando uma história cuja pungência é acentuada pela direção sensível de Edmund Goulding e pela música romântica de Max Steiner. Bette faz muita gente chorar como a jovem da sociedade, Judith Traherne, condenada por um tumor no cérebro, que se apaixona pelo seu médico, interpretado por George Brent. O entrosamento entre Goulding e Bette atinge o auge quando, em um dia ensolarado na fazenda de Vermont, Judith e sua amiga Ann (Geraldine Fitzgerald) plantam bulbos de jacinto no jardim. Judith menciona que o sol se escondeu atrás das nuvens, mas ela sente seu calor sobre sua pele. De repente, percebe que está perdendo a visão, e logo morrerá. A cena final da morte da protagonista com ela deitada na cama e seu rosto em close até sair de foco é sublime e antológica. Bette, Steiner e o filme foram indicados para o Oscar. Anos depois, Bette diria que “Judith Traherne foi de todos os papéis que interpretei, o meu papel favorito – e o favorito do público.
O segundo filme, é um drama histórico, sóbrio e majestoso, com a colaboração de John Huston no roteiro e direção de William Dieterle, dando igual importância às figuras do líder revolucionário mexicano e do Imperador Maximiliano. Brian Aherne quase consegue ofuscar Paul Muni (Juarez), personificando com muita propriedade o trágico príncipe austríaco que Napoleão III colocou no trono do México, obtendo indicação para Oscar. O cenógrafo Anton Grot e o fotógrafo Tony Gaudio também contribuem notavelmente para o espetáculo, o último dando um show de iluminação em muitas cenas, entre elas, aquela quando a louca Carlota, interpretada magistralmente por Bette Davis, sente que está próxima a execução do marido.
O terceiro filme, contou novamente com um roteiro de Casey Robinson, (baseado no romance de Edith Wharton), que serviu para Edmund Goulding dirigir Bette em outro melodrama, e o diretor mostrou mais uma vez como sabia lidar com o gênero e com atrizes. Bette é Charlotte Lovell, a jovem que tem uma filha ilegítima e a entrega para ser criada por uma prima, interpretada por Miriam Hopkins. Esta, apesar de ter se casado com outro, ainda amava o ex-noivo, pai da criança. Absorvente do início ao fim, o filme, além das primorosas atuações das duas atrizes, tem ainda uma bela partitura de Max Steiner e apurada fotografia de Tony Gaudio.
O quarto filme é uma adaptação da peça em versos de Maxwell Anderson sobre o relacionamento entre Elizabeth I, Rainha da Inglaterra e Robert Devereaux, o Conde Essex. Bette adorou a idéia de encarnar a Rainha Elizabeth e pediu Laurence Olivier no papel de Essex. O estúdio porém, em vez de Olivier, colocou Errol Flynn e a usual companheira deste nas telas, Olivia de Havilland, como dama de Sua Majestade. O filme tem cenários luxuosos de Anton Grot, boa fotografia em Technicolor por Sol Polito (com a assistência de W. Howard Green) e partitura de Erich Wolfgang Korngold. Entretanto, em virtude de sua origem teatral, o compasso é mais lento do que os habituais filmes do diretor Michael Curtiz. Quanto ao antigo desprezo de Bette pela suposta inépcia de Flynn, ela acabou mudando de opinião. Ele não era Laurence Olivier, mas era Errol Flynn. Após rever o filme anos mais tarde, disse para Olivia de Havilland, “Diabos, ele é bom! Eu estava errada a respeito dele”.
Ao aprovar a filmagem de Tudo Isto e o Céu Também / All This and Heaven Too / 1940, Jack Warner tinha em mente forjar um épico romântico grandioso como … E O Vento Levou / Gone With the Wind / 1939, embora sem o Technicolor e a Guerra Civil; porém o projeto resultou somente em um melodrama com cenários suntuosos e um ritmo por vêzes lento que, no entanto, não faz com que o espectador perca o seu interesse pela trama, sustentada também pela magnífica partitura de Max Steiner. Baseado no romance best seller de Rachel Field, sobrinha neta de um personagem do filme (o jovem pastor Henry Field), o roteiro de Casey Robinson aborda um fato real escandaloso ocorrido durante a Monarquia de Julho na França: o assassinato da Duquesa de Praslin por seu marido.
No enredo, em um colégio para moças nos Estados Unidos, a nova professora, Henriette Deluzy-Desportes (Bette Davis), acaba de ser apresentada as suas alunas. Estas lhe despertam lembranças dramáticas e ela relata seu passado. Ela foi contratada pelo Duque de Paslin (Charles Boyer) para ser a governante de seus filhos. Por sua doçura, Henriette, conquista a afeição do duque, porém o ciúme doentio da Duquesa Francine (Barbara O’Neil) provoca uma tragédia. Depois de muitas cenas desagradáveis, a duquesa despede Henriette e esta pede ao duque uma carta de recomendação, para que possa arranjar outro emprego. No dia seguinte, o duque assassina sua esposa e Henriette é acusada de cumplicidade; porém o duque, antes de se suicidar, deixa uma carta, assumindo a culpa. Henriette é libertada e parte para a América na companhia de um jovem pastor, Henry Field (Jeffrey Lynn), que a ajudará a esquecer o triste episódio.
Bette discutiu muito com o diretor Anatole Litvak, Bette mas se entendeu bem com Boyer enquanto Barbara O’Neill obtinha uma indicação para o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, (também indicados o filme e o fotógrafo Ernest Haller), interpretando com muita compreensão um papel difícil. Litvak queria sua esposa Miriam Hopkins (de quem estava separado) como a duquesa, dizendo: “A Duquesa de Praslin é uma p … cruel e venenosa. Miriam será perfeita”; mas Barbara, que fôra a mãe de Scarlet O’Hara em … E O Vento Levou”, foi a escolhida.
Saudações Mestre AC!
Magnífica reminiscência desta que foi uma das maiores CONSTELAÇÕES do cinema, muito mais que uma estrela.
Acredito que passados quase 30 anos de seu falecimento, Bette Davis ainda é uma atriz atual, pois vivia a frente de seu próprio tempo e seus desempenhos são o legado de uma grande artista amada e admirada pelos fãs da Sétima Arte.
Parabéns pelo tópico. Bette Davis é eterna. Abraços do editor do Blog Filmes Antigos Club – A Nostalgia do Cinema.
Paulo Telles.
Ah sim! Ansioso em ler a Segunda Parte, aguardo!
Abraços cinéfilos!
Paulo Telles.
Olá, Paulo. Tinha que fazer uma homenagem a Bette Davis, minha atriz de cinema predileta do tempo dos grandes estúdios. Hoje, torço por Meryl Streep que, aliás, recebeu o … Bette Davis Life Achievement Award.
Vão ser 3 partes, pois a filmografia ( e a vida) de Bette Davis é muito extensa. Um forte abraço e parabéns pelo seu blog. Não sei se já comentei isso com você: não costumo usar a net com frequência, somente para escrever meus artigos. Mas outro dia descobri (por indicação de um ex-aluno) que existem inúmeros blogs ou sites brasileiros dedicados ao cinema. Dei uma olhada neles: o seu é um dos melhores, podes crer. Um forte abraço.
Agradeço o cumprimento Professor! E vida longa ao “Histórias de Cinema” e as suas instrutivas matérias sobre a Sétima Arte.
Grande abraço!
Paulo Telles