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BETTE DAVIS I

Ela construiu uma carreira extraordinária – que lhe deu dois Oscar da Academia e dez indicações como Melhor Atriz – e se tornou uma das maiores estrelas de Hollywood de todos os tempos.  Perfecionista notória, entrava frequentemente em conflito com seus diretores, mas era ao mesmo tempo uma profissional que dava tudo de si mesma, seja qual fosse o projeto com o qual estivesse compromissada.

Bette Davis

Bette Davis

Ruth Elizabeth Davis “Betty” nasceu no dia 5 de abril de 1908 em Lowell Massachussets, filha do advogado Harlow Morrell Davis e Ruth Augusta “Ruthie” (nome de solteira Favor). Em 1915, seus pais se separaram e Betty e sua irmã Barbara Harriett “Bobby”, foram para o colégio interno Crestalban em Lanesborough no Condado de Berkshire. Em 1921, Ruthie transferiu-se com suas filhas para Nova York onde, depois ter estudado fotografia na Clarence White School of Photography, foi trabalhar no estúdio fotográfico de Pierie Macdonald. Ela tinha uma amiga chamada Myrtis Genthner, que estava lendo “La Cuisine Bette” de Balzac, e casualmente sugeriu a Ruth Elizabeth, que mudasse a pronúncia de seu apelido para Bette.

"Ruthie" e suas duas filhas, "Betty" e "Bobby"

“Ruthie” e suas duas filhas, “Betty” e “Bobby”

Em 1924, Ruthie teve que deixar seu emprego por motivo de saúde e partiu com as filhas para Boston, onde morava sua irmã, Mildred. Ruthie matriculou as meninas primeiramente no Northfield Seminary for Young Ladies em Newton e depois na Cushing Academy em Ashburnham. Após se formar neste último educandário, Bette matriculou-se na Escola Dramática de John Murray Anderson, aprendendo com a famosa Martha Graham, instrutora de dança na escola, a expressar uma emoção como o corpo todo. “Toda vez que eu subí uma escada nos meus filmes, era Graham passo por passo”, diria Bette mais tarde.

Bette

Bette

Em 1929, Bette estreou no palco no espetáculo Fora-da-Broadway, The Earth Between, peça cujo tema era o desejo incestuoso de um fazendeiro do Nebraska pela sua filha de 16 anos, Floy, interpretada por Bette. Seguiram-se participações em outras peças da companhia Temple Players (fundada por George Cukor e George Kondolf) até que ela chegou à Broadway em Broken Dishes, dirigida por Marion Gering e, em seguida, em Solid South, dirigida por Rouben Mamoulian.

Em 1930, Bette partiu de trem para Hollywood, a fim de fazer um teste na Universal.

Ela contaria mais tarde sua surpresa ao ver que ninguém estava na estação, aguardando sua chegada; um empregado do estúdio havia esperado por ela, mas foi embora, porque não viu ninguém que “parecesse com uma atriz”.

Bette fracassou no seu teste cinematográfico; porém foi usada em várias provas para outros atores. Ela relatou esta experiência no programa Dick Cavett em 1971 com a seguinte observação: “”Puseram-me em um sofá, e eu testei quinze homens … eles todos deitaram em cima de mim e me deram um beijo apaixonado. Pensei que ia morrer”.

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Bette Davis em Garota Rebelde

Bette Davis em Garota Rebelde

Bette fez um novo teste para A House Divided / 1931, mas o diretor William Wyler, reprovou-a. Entretanto, ela conseguiu entrar no elenco de Garota Rebelde / Bad Sister / 1931 (Dir: Hobart Henley ) como a irmã da atriz principal Sidney Fox. Depois da filmagem, Carl Laemmle Jr. chamou Bette e Humphrey Bogart (que também aparecia no filme em início de carreira), um de cada vez, e lhes disse que não tinham nada para oferecer. “Não era culpa deles. Simplesmente não fotografavam bem”. Ele sugeriu que voltassem para Nova York. O conselho do jovem Laemmle era loucura, obviamente, mas como ele poderia prever a carreira riquíssima que aqueles então pouco experimentados atores iriam criar através dos tempos? Bette ainda ouviu Lammle Jr. comentar: “Ela possui tanto sex appeal quanto Slim Summerville” (o feioso coadjuvante mais conhecido por sua participação em Sem Novidade no Front / All Quiet on the Western Front / 1930).

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Carl Laemmle pensou em despedí-la, porém o fotógrafo Karl Freund lhe disse que Bette “tinha uns olhos maravilhosos”, e a Universal renovou seu contrato por mais três meses. A esta altura, ela havia feito seu segundo filme, Filhos / Seed / 1931 (Dir:J.M. Stahl  ) que, em vez de dar visibilidade à sua carreira, empurrou-a mais para o segundo plano.

Bette Davis e Pat O'Brien em A Casa Infernal

Bette Davis e Pat O’Brien em A Casa Infernal

bertte the menace posterBette apareceu em um papel minúsculo em A Ponte de Waterloo / Waterloo Bridge / 1931 (Dir: James Whale) antes de ser emprestada para a RKO Radio Pictures, onde fez Way Back Home / 1931 (Dir: William Seiter); para a B.F. Zeidman Productions, onde fez A Casa Infernal / Hell’s House / 1932 (Dir: Howard Higgin); e para a Columbia, onde fez The Menace / 1932 (Dir: Roy William Neill).  “Havia algo mais baixo do que o fundo” – Bette escreveria mais tarde em sua autobiografia – e eles me mandaram para lá”. Passados nove meses, e seis filmes que não fizeram successo, Laemmle resolveu dispensar a jovem atriz.

Bette Davis e George Arliss em O Homem Deus

Bette Davis e George Arliss em O Homem Deus

Ela estava se preparando para retornar a Nova York, quando recebeu um telefonema de George Arliss, convidando-a para assumir o principal papel feminino no filme da Warner Bros., O Homem Deus / The Man Who Played God / 1932 (Dir: John G. Adolfi). Segundo Bette, Arliss teria acolhido uma recomendação do ator Murray Kinnel, que trabalhara com ela em The Menace; porém Jack Warner disse que não foi assim: quem a recomendou foi um executivo da Warner chamado Rufus LeMaire. Seja como for, graças a este filme com Arliss, ela assinou contrato com a Warner Bros., onde permaneceria até 1949.

Bette Davis e George Brent em Erros do Coração

Bette Davis e George Brent em Erros do Coração

Hardie Albright e Bette Davis em No Palco da Vida

Hardie Albright e Bette Davis em No Palco da Vida

Warren William e Bette davis em Surpresas Convencionais

Warren William e Bette Davis em Surpresas Convencionais

Ainda em 1932, Bette atuou discretamente em Erros do Coração / The Rich Are Always With You (Dir: Alfred E. Green), No Palco da Vida / So Big (Dir: William Wellman) e Surpresas Convencionais / The Dark Horse (Dir: Alfred E. Green); casou-se com o trompetista Harmon “Ham” Nelson, seu ex-colega na Cushing Academy, e finalmente Jack Warner e Darryl Zanuck lhe deram seu primeiro papel importante em Escravos da Terra / Cabin in the Cotton: o da beldade sulista Madge, filha mimada do dono de uma plantação de algodão, que seduz o jovem letrado Marvin (Richard Barthelmess), compromissado com uma jovem (Dorothy Jordan) e filho de um dos arrendatários explorados pelo poderoso proprietário das terras.

Richard Barthelmess e Bette Davis em Escravos da Terra

Richard Barthelmess e Bette Davis em Escravos da Terra

O diretor Michael Curtiz tratou Bette com muita grosseria, mas iluminou-a com grande finura, fazendo com que seus cabelos louros irradiassem uma energia quente. No contexto deste calor incandescente, a agressiva Madge, depois de olhar para o seu corpo, de cima para baixo e de baixo para cima, diz para Marvin em uma cena antológica:  “Cute! I’d like to kiss you, but I just washed my hair. Bye!”.

Bette Davis, Joan Blondell e Ann Dvorak em Três ... Ainda é Bom

Bette Davis, Joan Blondell e Ann Dvorak em Três … Ainda é Bom

No dia seguinte, em que terminou de filmar Escravos da Terra, Bette já estava sob as ordens de Mervyn le Roy em Três … Ainda é Bom / Three on a Match. Nele, três amigas de infância – Vivian, Mary, e Ruth – encontram-se em Nova York após dez anos. Vivian (Ann Dvorak) casou-se bem, Mary (Joan Blondell) tornou-se uma corista depois de ter sido internada em um reformatório, e Ruth (Bette Davis) é uma secretária sem ter muito o que fazer.

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O título do filme – inspirado em uma superstição da Primeira Guerra Mundial, segundo a qual o terceiro soldado a acender um cigarro com um único fósforo seria morto, porque a duração da chama permitiria que os soldados germânicos pudessem mirar suas armas com exatidão – siginificava o destino de uma das personagens. Terminada a filmagem, Le Roy fez uma previsão errada, que ele depois lamentaria: “Eu disse para um jornalista que Joan Blondell ia ser uma grande estrela, que Ann Dvorak tinha um valor potencial, mas que eu achava que Bette Davis não  chegaria lá”.

Spencer Tracy e Bette Davis em 20.000 Anos em Sing Sing

Spencer Tracy e Bette Davis em 20.000 Anos em Sing Sing

O último filme de Bette no ano de 1932, 20.000 Anos em Sing Sing / 20.000 Years in Sing Sing, dirigido com eficiência narrativa por Michael Curtiz, contava a história da redenção de um criminoso (Spencer Tracy), alcançada perversamente, ao ser condenado por um crime que não cometeu. Tracy admirava Bette  – que ele havia visto em A Casa Infernal – e disse isso para ela, quando foram apresentados. E foi além, acrescentando que achava que ela era a atriz mais talentosa na cidade. “Você está totalmente certo”, respondeu Bette com bravata.

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Gene Raymond, Bette e o diretor Robert Florey na filmagem de Amante do Meu Marido

Gene Raymond, Bette e o diretor Robert Florey na filmagem de Amante do Meu Marido

Bette Davis e George Arliss em Negócios em Família

Bette Davis e George Arliss em Negócios em Família

Bette Davis e Pat O'Brien em Os Desaparecidos

Bette Davis e Pat O’Brien em Os Desaparecidos

Os próximos oito filmes de Bette, Em Plenas Nuvens / Parachute Jumper / 1933 (Dir:Alfred E. Green), Amante de meu Marido / Ex-Lady / 1933 (Dir:Robert Florey); Negócios em Família / The Working Man / 1933 (Dir: John G. Adolfi); Os Desaparecidos / Bureau of Missing Persons / 1933 (Dir:Roy Del Ruth);

Charles Farrell e Bette Davis em Drogas Infernais

Charles Farrell e Bette Davis em Drogas Infernais

Bette Davis e William Powell em Modas de 1934

Bette Davis e William Powell em Modas de 1934

Bette Davis e james Cagney em Bancando o Cavalheiro

Bette Davis e james Cagney em Bancando o Cavalheiro

 e Bette Davis em Névoas do Mistério

Lyle Talbot e Bette Davis em Névoa do Mistério

Drogas Infernais / The Big Shakedown / 1934 (Dir: John Francis Dillon); Modas de 1934 / Fashions of 1934 (Dir:William Dieterle); Bancando o Cavalheiro /  Jimmy the Gent / 1934 (Dir: Michael Curtiz); e Névoa do Mistério / Fog Over Frisco / 1934 não acrescentaram nada a sua carreira, embora Negócios em Família e Modas de 1934 fossem bem interessantes. Ela não gostou de nenhum, com exceção de Névoas do Mistério, elogiando a qualidade do roteiro, a direção de William Dieterle e a supervisão do produtor Henri Blanke, que muito admirava.

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Enquanto estava filmando 20.000 Anos em Sing Sing, Bette recebeu do roteirista Wilson Mizner o romance de Somerset Maugham, Of Human Bondage (traduzido para o português como Servidão Humana). Ele sugeriu que ela o lesse e vislumbrasse a possibilidade de interpretar Mildred, a anti-heroína abominável. Poucos meses depois, o diretor John Cromwell viu Escravos da Terra e pensou nela para o papel.

Bette Davis e Leslie Howard em Escravos do Desejo

Bette Davis e Leslie Howard em Escravos do Desejo

Leslie Howard e Bette Davis em Servidão Humana

Leslie Howard e Bette Davis em Escravos do Desejo

Porém o problema é que era a RKO que iria filmar Servidão Humana, e não a Warner Bros. Intuindo que esta seria a sua grande chance de mostrar de uma vez por todas  sua capacidade interpretativa, Bette encheu a paciência de Jack Warner, para que ele a emprestasse para a RKO, até que ele, desesperado com sua insistência, sucumbiu ao seu apelo. A performance de Davis como a garçonete vulgar e desbocada que desperta uma obsessão quase masoquista em um estudante de medicina aleijado (Leslie Howard), com seus olhos neuróticos e sua voz nervosa, mereceu elogios da crítica.

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Entretanto, logo em seguida, a Warner colocou-a em Dona de Casa / Housewife / 1934 (Dir: Alfred E. Green), mais um programmer (no sistema de estúdio, um filme intermediário entre um filme A e um filme B), que ela detestou. Adicionando insulto sobre insulto, o estúdio imediatamente convocou Bette para um papel secundário em The Case of the Howling Dog. Ela então se rebelou e foi suspensa por não ter honrado seu contrato de trabalho

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Paul Muni e Bette Davis em A Barreira

Paul Muni e Bette Davis em A Barreira

Graças ao sucesso de Escravos do Desejo / Of Human Bondage / 1934 e ao elogio de sua interpretação pelos comentaristas, Bette saiu da suspensão e recebeu um papel melhor em A Barreira / Bordertown / 1935 (Dir: Archie Mayo), ao lado de Paul Muni; mas logo lhe impuzeram outras produções  – Quando o Amor Agarra / The Girl from 10th Avenue / 1935 (Dir: Alfred E. Green), Miss Repórter / The Front Page Woman / 1935 (Dir: Michael Curtiz), Nas Garras da Lei / Special Agent / 1935 (Dir: William Keighley), que não faziam  jús ao seu talento.

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bette special agent posterDe início Bette não gostou do script de seu próximo compromisso, Perigosa / Dangerous (anteriormente intitulado Hard Luck Game),  dirigido por Alfred E. Green); não obstante, foi ele que lhe possibilitou a conquista do seu primeiro Oscar da Academia. Trata-se de um  melodrama sobre uma atriz da Broadway chamada Joyce Heath, que está em declínio e entregue à bebida, mas é reabilitada por um arquiteto aristocrata (Franchot Tone) admirador do seu trabalho.  Joyce se apaixona por ele que, sentindo atração por ela, desfaz seu noivado; porém a má sorte do título originário do filme retorna sob a forma de um marido secreto, que não lher quer dar o divórcio. Joyce  sai com ele de carro e provoca um acidente. Ambos sobrevivem, e Joyce decide ficar com seu esposo.

Franchot Tone e Bette Davis em Perigosa

Franchot Tone e Bette Davis em Perigosa

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Bette e Victor MacLaglen recebem o Oscar de 1936

Bette e Victor MacLaglen recebem o Oscar de 1936

O Oscar concedido à atriz tem sido considerado como um prêmio de consolação por não ter sido nem sequer indicada por sua atuação em Escravos do Desejo, mas seu desempenho mais contido em Perigosa, mereceu por si só a tão cobiçada estatueta, fazendo-nos esquecer o final forçado e meloso do espetáculo. Bette recebeu o Oscar da Academia das mãos de David Wark Griffith em 5 de marco de 1936 em um banquete no Biltimore Hotel em Los Angeles.

Bette Davis e Leslie Howard em A Floresta Petrificada

Bette Davis e Leslie Howard em A Floresta Petrificada

Humphrey Bogart, Leslie Howard e Bette Davis em A Floresta Petrificada

Humphrey Bogart, Leslie Howard e Bette Davis em A Floresta Petrificada

O filme seguinte de Bette, A Floresta Petrificada / The Petrified Forest / 1936 (Dir: Archie Mayo), adaptação estática da peça de Robert E. Sherwood, marcou a ascensão de Humphrey Bogart como o gângster Duke Mantee, que ele já havia feito no palco. A Warner pensara em Edward G. Robinson para o papel, porém Leslie Howard se recusou a fazer o filme sem Bogart. Bette se impôs mais uma vez como Gabby Maple, a artista “desperdiçada” em um posto de gasolina do deserto do Arizona, que se entende bem com o intelectual desiludido interpretado por Leslie Howard.

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 Sem ter direito a um descanso, Bette foi convocada para Satan Met a Lady / 1936 (Dir:William Dieterle), segunda versão do romance The Maltese Falcon de Dashiell Hammett enquanto sonhava em ser liberada para fazer Maria Stuart / Mary of Scotland / 1936, que seria rodado na RKO. Entretanto, a Warner não lhe deu permissão, porque (segundo o biógrafo de John Ford, Scott Eyman) “não queria arriscar mais um outro sucesso de Bette em outro estúdio”. Bette porém, pôs a culpa em John Ford, e não em Jack Warner. Ela chegou a se encontrar com Ford e este lhe disse grosseiramente que “ela falava demais e pôs um fim na conversa”.

Bette Davis e George Brent em A Flecha de Ouro

Bette Davis e George Brent em A Flecha de Ouro

Então, em vez de interpretar o papel de Elizabeth, Rainha da Inglaterra para um dos maiores diretores do mundo, Bette acabou por se transformar em uma falsa herdeira de uma firma de cosméticos para Alfred E. Green em A Flecha de Ouro / The Golden Arrow/ 1936 (Dir: William Dieterle).

Bette achava que não estava sendo integrada nas melhores produções do estúdio  (tendo sido preterida verbis gratia por Olivia de Havilland em Capitão Blood / Captain Blood / 1935 e Adversidade / Anthony Adverse / 1936), ganhava muito pouco e trabalhava sem descanso. Insatisfeita com essa situacão, pediu a Jack Warner um novo contrato que lhe desse, além de aumento de salário, mais direitos como, por exemplo, o de fazer somente quatro filmes por ano; somente ser fotografada, se possível, pelos seus cinegrafistas favoritos Tony Gaudio, Sol Polito e sobretudo Ernest Haller; encerrar seu trabalho as 18hs; ter direito a três meses consecutivos de férias; poder participar de quatro programas radiofônicos de sua escolha e que seu nome fosse o primeiro a ser mencionado nos créditos. Jack não atendeu às suas reivindicações, suspendeu-a mais uma vez, e desistiu de colocá-la em God’s Country and the Woman, o filme que fôra previsto para ela.

Ludovico Toeplitz

Ludovico Toeplitz

Neste momento, entrou em cena o empresário Ludovico Toeplitz, que ofereceu a Bette o papel principal em dois filmes, I’ll Take the Road, a ser filmado nos estúdios da Ealing em Londres e um filme com Maurice Chevalier na França. Bette partiu para Londres e entrou com uma ação na Alta Côrte de Justiça, alegando que na verdade foi a Warner Bros. que infringiu o contrato, descrito por seu advogado, Sir William Jowitt, como “uma sentença de morte”, dando como exemplo das restrições absurdas que sua cliente sofria, a cláusula que concedia ao estúdio o direito exclusivo de fotografá-la: “Isto quer dizer”- disse o jurista – “que ela não podia  permitir que seu marido tirasse uma foto dela no jardim” (cf. Ed Sikov, Dark Victory – The Life of Bette Davis, 2007, Henry Holt and Company).

Apesar do esforço do seu defensor, Bette perdeu a causa e ficou proibida de aceitar a proposta de Toeplitz que, aliás, já havia lhe informado, dois meses antes do caso chegar à Alta Côrte, de que fôra aconselhado por seu advogado de que a Justiça não iria permitir que ela assinasse contrato com ele. Humilhada, Bette retomou suas atividades em Burbank, mas o episódio lhe proporcionou uma publicidade vital para a sua carreira. Ao tomar uma atitude beligerante contra a Warner, ela criou uma nova persona para si própria: a de uma mulher de temperamento forte e espírito combativo.

Bette Davis e Humphrey Bogart em Mulheres marcadas

Bette Davis e Humphrey Bogart em Mulheres Marcadas

Bette Davis e Edward G. Robinson em Talhado para Campeão

Bette Davis e Edward G. Robinson em Talhado para Campeão

Henry Fionda, Bette e o diretor Edmund Goulding na filmagem de Cinzas do Passado

Henry Fonda, Bette e o diretor Edmund Goulding na filmagem de Cinzas do Passado

Leslie Howard, Bette e o diretor Archie Mayo na filmagem de Somos do Amor

Leslie Howard, Bette e o diretor Archie Mayo na filmagem de Somos do Amor

Os publicistas do estúdio então começaram a explorar essa nova faceta da atriz e, a partir daí, ela começou a receber papéis melhores ou pelo menos papéis que não a enfureciam: o de Mary Dwigth ao lado de Humphrey Bogart em Mulheres Marcadas / Marked Women / 1937 (Dir: Lloyd Bacon); o de Fluff ao lado de Edward G. Robinson em Talhado para Campeão / Kid Galhahad / 1937 (Dir: Michael Curtiz); o de Mary Donnel ao lado de Henry Fonda em Cinzas do Passado / That Certain Woman / 1937 (Dir: Edmund Goulding); o de Joyce ao lado de Leslie Howard em Somos do Amor / It’s Love I’m After / 1937. (Dir: Archie Mayo).

Uma das grandes frustrações de Bette foi o de não ter conseguido o papel de Scarlet O’Hara em … E O Vento Levou / Gone With Wind / 1939. A Warner assinou um contrato de opção para adquirir os direitos do romance de Margaret Mitchell pouco  antes dele ser publicado em junho de 1936 e Jack Warner lhe  ofereceu o papel de Scarlet; porém, em agosto do mesmo ano, foi David O. Selznick que comprou os direitos. Bette teve outra chance de ser Scarlet quando Selznick, antes de se decidir por Vivien Leigh, propôs a Jack que este a emprestasse juntamente com Errol Flynn  como um pacote de astros para o filme. Bette gostava de Errol. mas achava que o talento interpretativo dele era limitado: “Pensar em Mr. Flynn como Rhett Butler me assustou. Eu recusei” (cf. Ed Sikov).

Bette Davis e Henry Fonda no baile em Jezebel

Bette Davis e Henry Fonda no baile em Jezebel

Por coincidênca, emprestado pelo produtor Samuel Goldwyn à Warner, William Wyler dirigiu Bette em Jezebel / Jezebel / 1938, drama romântico com uma heroína sulista de caráter semelhante ao de Scarlet O’Hara, e proporcionou à atriz o seu segundo Oscar.

Vestida com belos figurinos de Orry-Kelly e Milo Anderson (não creditado e criador do vestido vermelho) e fotografada por Ernest Haller, seu cameraman favorito, ela teve um desempenho notável, destacando-se, entre outras, a cena do baile (de quinze minutos) quando, desafiando a sociedade, a protagonista surge de vermelho em contraste com os trajes brancos tradicionalmente usados por todas as jovens solteiras da cidade.

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A ação do filme transcorre em 1852 na cidade de New Orleans. Julie Marsden (Bette Davis) está noiva do jovem banqueiro Preston Dillard (Henry Fonda). Quando ele prefere ir a uma reunião de negócios em vez de acompanhá-la a uma prova de vestido para o baile no Clube Olympus, Julie resolve tirar desforra usando o vestido vermelho. Entretanto, seu plano fracassa, porque Press, após dançar com ela no salão esvaziado pelos outros pares, rompe o noivado, e parte para o Norte. Julie se arrepende e promete a si mesma que vai pedir perdão ao ex-noivo quando ele voltar. Um ano depois, para surpresa de Julie, Press retorna casado com uma nortista, Amy (Margaret Lindsay). Vingativa como ela é, Julie provoca seu antigo admirador, Buck Cantrell (George Brent) a se bater em um duelo com o irmão de Press (Richard Cromwell). Como resultado, Buck vem a ser morto, deixando seu sangue na consciência de Julie. Quando Press é subitamente infectado pela febre amarela, que está se alastrando pela região, ele é enviado para uma colonia de leprosos, onde provavelmente morrerá. Amy quer ir com ele, mas Julie convence-a de que ela tem mais condições de cuidar de Press.  Amy acaba consentindo e Julie vai em seu lugar, para se redimir perante o homem que ama.

William Wyler dirige Bette em Jezebel

William Wyler dirige Bette em Jezebel

Wyler dirige Henry Fonda e Bette em jezebel

Wyler dirige Henry Fonda e Bette em jezebel

O personagem feminino mais simpático é a Tia Belle (Fay Bainter). Ela ama Julie, mas se recusa a aceitar o comportamento da sobrinha (Belle a chama de uma “Jezebel”) e é a única verdadeiramente gentil e hospitaleira em relação a Amy, que é ridicularizada pelos outros por ser uma “Yankee”. Fay Bainter ganhou o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante

Bette Davis e William Wylers

Bette Davis e William Wyler

Wyler deu poucas instruções para Bette, a não ser a de ordenar que ela ficasse parada quando sua personagem, Julie Marsden, não tivesse razão para se mexer. “Você quer que eu ponha uma corrente no seu pescoço?’”, ele gritou um dia durante a filmagem. “Pare de mexer com a cabeça”, foi outra ordem dada pelo diretor. Wyler dominou Bette com sucesso, de modo que naturalmente, ela se apaixonou por ele. Seu marido, Harmon, estava convenientemente em Nova York. O romance terminou quando o filme ficou pronto (cf. Ed Sikov).

Bette Davis e Errol Flynn em As Irmãs

Bette Davis e Errol Flynn em As Irmãs

Ainda em 1938, Bette contracenou pela primeira vez com Errol Flynn em As Irmãs / The Sisters (Dir: Anatole Litvak), que conta as experiências de três jovens de uma pequena cidade do Montana (Louise / Bette Davis, Helen / Anita Louise e Grace / Jane Bryan) em seus casamentos. Cada irmã tem um destino diferente. Louise, a mais velha, casa-se com um jornalista esportivo, Frank Medlin (Errol Flynn), rapaz encantador mas irresponsável e com uma tendência para o alcoolismo; Helen, esposa um homem mais velho, que lhe oferece segurança; Grace a mais jovem, é traída pelo marido. A novidade neste filme é que tanto Bette quanto Flynn fazem papéis completamente  diferentes dos que estavam acostumados a fazer. Despojado de sua condição costumeira de herói intrépido dos filmes de aventuras, Flynn consegue dar bastante credibilidade ao seu personagem enquanto Bette assume desta vez os traços de uma mulher serena e bondosa, oferecendo-nos uma atuação cheia de nuanças.

Bette e Howard Hughes

Bette e Howard Hughes

Em novembro de 1938, após ter obtido prova de que Bette mantinha uma relação sexual com Howard Hughes, Harmon pediu o divórcio, alegando entre outras coisas, que  ela dava mais atenção aos livros do que a ele.

No ano de 1939 Bette, participou de quatro filmes: Vitória Amarga / Dark Victory (Dir: Edmund Goulding); Juarez / Juarez (Dir: William Dieterle); Eu Soube Amar / The Old Maid (Dir: Edmund Goulding); e Meu Reino por um Amor / The Private Lives of Elizabeth and Essex (Dir: Michael Curtiz), que consolidaram sua reputação artística e o seu estrelismo.

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Geraldine Fitzgerald e Bette Davis em Vitória Amarga

Geraldine Fitzgerald e Bette Davis em Vitória Amarga

Bette Davis e George Brent em Vitória Amarga

Bette Davis e George Brent em Vitória Amarga

Bette Davis e Ronald Reagan em Vitória Amarga

Bette Davis e Ronald Reagan em Vitória Amarga

O primeiro filme, é um melodrama com roteiro de Casey Robinson, contando uma história cuja pungência é acentuada pela direção sensível de Edmund Goulding e pela música romântica de Max Steiner. Bette faz muita gente chorar como a jovem da sociedade, Judith Traherne, condenada por um tumor no cérebro, que se apaixona pelo seu médico, interpretado por George Brent. O entrosamento entre Goulding e Bette atinge o auge quando, em um dia ensolarado na fazenda de Vermont, Judith e sua amiga Ann (Geraldine Fitzgerald) plantam bulbos de jacinto  no jardim. Judith menciona que o sol se escondeu atrás das nuvens, mas ela sente seu calor sobre sua pele. De repente, percebe que está perdendo a visão, e logo morrerá. A cena final da morte da protagonista com ela deitada na cama e seu rosto em close até sair de foco é sublime e antológica. Bette, Steiner e o filme foram indicados para o Oscar. Anos depois, Bette diria que “Judith Traherne foi de todos os papéis que interpretei, o meu papel favorito – e o favorito do público.

Bette Davis em Juarez

Bette Davis em Juarez

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Cena de Juarez (Donald Crisp, Brian Aherne, Bette e Gilbert Roland)

Cena de Juarez (Donald Crisp, Brian Aherne, Bette e Gilbert Roland)

O segundo filme, é um drama histórico, sóbrio e majestoso, com a colaboração de John Huston no roteiro e direção de William Dieterle, dando igual importância às figuras do líder revolucionário mexicano e do Imperador Maximiliano. Brian Aherne quase consegue ofuscar Paul Muni (Juarez), personificando com muita propriedade o trágico príncipe austríaco que Napoleão III colocou no trono do México, obtendo indicação para Oscar. O cenógrafo Anton Grot e o fotógrafo Tony Gaudio também contribuem notavelmente para o espetáculo, o último dando um show de iluminação em muitas cenas, entre elas, aquela quando a louca Carlota, interpretada magistralmente por Bette Davis, sente que está próxima a execução do marido.

Bette Davis, George Brent e Miriam Hopkins em Eu Soube Amar

Bette Davis, George Brent e Miriam Hopkins em Eu Soube Amar

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Miriam e Bette em Eu Soube Amar

Miriam e Bette em Eu Soube Amar

O diretor Edmund Goulding orienta Bette e Miriam em um intervalo da filmagem de Eu Soube Amar

O diretor Edmund Goulding orienta Bette e Miriam em um intervalo da filmagem de Eu Soube Amar

O terceiro filme, contou novamente com um roteiro de Casey Robinson, (baseado no romance de Edith Wharton), que serviu para Edmund Goulding dirigir Bette em outro melodrama, e o diretor mostrou mais uma vez como sabia lidar com o gênero e com atrizes. Bette é Charlotte Lovell, a jovem que tem uma filha ilegítima e a entrega para ser criada por uma prima, interpretada por Miriam Hopkins. Esta, apesar de ter se casado com outro, ainda amava o ex-noivo, pai da criança. Absorvente do início ao fim, o filme, além das primorosas atuações das duas atrizes, tem ainda uma bela partitura de Max Steiner e apurada fotografia de Tony Gaudio.

Bette Davis e Errol Flynn em Meu Reino Por Um Amor

Bette Davis e Errol Flynn em Meu Reino Por Um Amor

 O quarto filme é uma adaptação da peça em versos de Maxwell Anderson sobre o relacionamento entre Elizabeth I, Rainha da Inglaterra e Robert Devereaux, o Conde Essex. Bette adorou a idéia de encarnar a Rainha Elizabeth e pediu Laurence Olivier no papel de Essex. O estúdio porém, em vez de Olivier, colocou Errol Flynn e a usual companheira deste nas telas, Olivia de Havilland, como dama de Sua Majestade. O filme tem cenários luxuosos de Anton Grot, boa fotografia em Technicolor por Sol Polito (com a assistência de W. Howard Green) e partitura de Erich Wolfgang Korngold. Entretanto, em virtude de sua origem teatral, o compasso é mais lento do que os habituais filmes do diretor Michael Curtiz. Quanto ao antigo desprezo de Bette pela suposta inépcia de Flynn, ela acabou mudando de opinião. Ele não era Laurence Olivier, mas era Errol Flynn. Após rever o filme anos mais tarde, disse para Olivia de Havilland, “Diabos, ele é bom! Eu estava errada a respeito dele”.

Charles Boyer e Bette Davis em Tudo isto E O Céu Também

Charles Boyer e Bette Davis em Tudo isto E O Céu Também

Ao aprovar a filmagem de Tudo Isto e o Céu Também / All This and Heaven Too / 1940, Jack Warner tinha em mente forjar um épico romântico grandioso como … E O Vento Levou / Gone With the Wind / 1939, embora sem o Technicolor e a Guerra Civil; porém o projeto resultou somente em um melodrama com cenários suntuosos e um ritmo por vêzes lento que, no entanto, não faz com que o espectador perca o seu interesse pela trama, sustentada também pela magnífica partitura de Max Steiner. Baseado no romance best seller de Rachel Field, sobrinha neta de um personagem do filme (o jovem pastor Henry Field), o roteiro de Casey Robinson aborda um fato real escandaloso ocorrido durante a Monarquia de Julho na França: o assassinato da Duquesa de Praslin por seu marido.   

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No enredo, em um colégio para moças nos Estados Unidos, a nova professora, Henriette Deluzy-Desportes (Bette Davis), acaba de ser apresentada as suas alunas. Estas lhe despertam lembranças dramáticas e ela relata seu passado. Ela foi contratada pelo Duque de Paslin (Charles Boyer) para ser a governante de seus filhos. Por sua doçura, Henriette, conquista a afeição do duque, porém o ciúme doentio da Duquesa Francine (Barbara O’Neil) provoca uma tragédia. Depois de muitas cenas desagradáveis, a duquesa despede Henriette e esta pede ao duque uma carta de recomendação, para que possa arranjar outro emprego. No dia seguinte, o duque assassina sua esposa e Henriette é acusada de cumplicidade; porém o duque, antes de se suicidar, deixa uma carta, assumindo a culpa. Henriette é libertada e parte para a América na companhia de um jovem pastor, Henry Field (Jeffrey Lynn), que a ajudará a esquecer o triste episódio.

O diretor Anatole Litvak dá instruções para Bette na filmagem de Tudo Isto E O Céu Também

O diretor Anatole Litvak dá instruções para Bette na filmagem de Tudo Isto E O Céu Também

Bette discutiu muito com o diretor Anatole Litvak, Bette mas se entendeu bem com Boyer enquanto Barbara O’Neill obtinha uma indicação para o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, (também indicados o filme e o fotógrafo Ernest Haller), interpretando com muita compreensão um papel difícil. Litvak queria sua esposa Miriam Hopkins (de quem estava separado) como a duquesa, dizendo: “A Duquesa de Praslin é uma  p … cruel e venenosa. Miriam será perfeita”; mas Barbara, que fôra a mãe de Scarlet O’Hara em … E O Vento Levou”, foi a escolhida.

 

 

 

 

 

 

 

CINEMA EM CASA

Aos dezessete anos de idade, Eugene W. Castle (1897-1960), mais conhecido como Gene Castle, era um cinegrafista freelance em San Francisco, Califórnia, filmando eventos locais e tentando ingressar na indústria cinematográfica através do cine-jornal. Assim, o jovem ambicioso visitou o escritório local da Pathé News, onde conheceu o presidente da companhia, Leon E. Franconi, que lhe deu a chance que ele estava procurando. Gene tornou-se um montador muito eficiente e, no início dos anos vinte, ocupava posição de destaque neste setor da Fox News (depois Movietone News), experiência que lhe seria muito valiosa.

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Posteriormente, achando que os filmes tinham potencial fora da sua exibição convencional nos cinemas, Gene tornou-se um distribuidor de filmes educacionais e industriais, colocando-os à disposição de escolas e grupos comunitários, fundando a Castle Films. Prova do seu sucesso foi que, durante a Depressão, sua firma mantinha escritórios e ambas as costas dos Estados Unidos, em Nova York e San Francisco.

O produto institucional da Castle era oferecido no formato profissional de 35mm e também em 16mm, o formato amador introduzido pela Eastman Kodak em 5 de julho de 1923. Quando o equipamento para filme sonoro de 16mm entrou no mercado em 1933, Gene aproveitou-se rapidamente dessa nova tecnologia e prosperou.

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Em agosto de 1933, a Castle Films mudou-se para escritórios mais espaçosos no 12º andar do prédio de 70 andares da RCA no Radio City de Nova York e, dentro de um ano, Gene contratou o vice presidente de uma agência de publicidade de Chicago, Fred Wagner, para dirigir o escritório mais novo da companhia nessa cidade.

A larga experiência de Gene na área do cine-jornal, comercial e publicidade preparou-o para o seu próximo empreendimento. Em 1937, um público afluente cada vez maior estava adquirindo câmeras e projetores de cinema e usufruindo de entretenimento na sua residência. Alguns desses consumidores utilizavam o formato de 16mm enquanto outros preferiam o formato de 8mm, introduzido em 1932, que era mais portável e econômico. Algumas estimativas indicavam que as vendas de equipamentos para cinema doméstico chegavam a dois milhões. Este era um mercado maior do que os filmes industriais jamais tiveram, e Gene se dedicou a ele de corpo e alma.

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Em maio de 1937, a Pathé reavivou a Pathegrams, sua divisão de filme-doméstico, sob a liderança de O. Henry Briggs (que mais tarde chefiaria o estúdio PRC). Os canais de distribuição de Gene já estavam organizados, de modo que foi a Castle Films que cuidou das vendas da nova Pathegrams. Além disso, usando material filmado de suas fontes de cine-jornais, Gene montou tpara a Pathegrams três cine-jornais especiais de um rolo: Hindenburg Explodes!, cobertura dramática do célebre desastre aeronautico; England’s Coronation, relato da coroação de George V; e The Life of Edward – Britain’s Ex-King, biografia sucinta do Duque de Windsor, o monarca que havia abdicado recentemente.

England's Coronation

England’s Coronation

castle hindenburgA Pathegrams e a Castle se separaram em julho de 1937. Ray Hall da Pathé News foi encarregado das vendas da Pathegrams, e a Allied Distributing Company (de Chicago) assumiu a distribuição do quarto lançamento da Pathegrams, A Day with the Dionne Quintuplets.

Desconectado da Pathegrams, Gene Castle fundou a sua própria companhia de filmes para exibição no lar. Em julho de 1937, ele contratou um antigo colega da Fox News, Don Hancock, na capacidade de montador e gerente. Hancock, que havia inaugurado a Fox News, estava atuando como supervisor de produção para Amadee J. Van Beuren, produtor independente que distribuia seus filmes através da RKO Radio Pictures. Hancock deixou Beuren para trabalhar com Gene.

Colhendo material de sua própria filmoteca, cine-jornais e filmes mudos, Gene constituiu uma linha de filmes de um rolo sobre vários tópicos. Ele mesmo montava os filmes, dando ao seu produto um toque pessoal, profissional, e incorporou seu sobrenome ao logo da companhia, a representação de uma torre de castelo.

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A Castle Film oferecia projetores de 16 e 8 mm, em edições sonoras ou silenciosas (nove minutos na velocidade sonora e doze minutos na velocidade silenciosa). Havia ainda edições de três minutos para donos de projetores de brinquedo e clientes econômicos; estas versões condensadas eram chamadas de edicões “headline”, porque incluiam os destaques, ou manchetes, da matéria.

Como a maioria dos projetores para uso doméstico não tinha aparelhamento de som, Gene adicionou subtítulos explicativos às versões silenciosas. Para os indivíduos e instituições que possuiam projetores sonoros, todos os filmes da Castle estavam disponívies em versões “deluxe” em 16mm.

Em 1937, a duração de um rolo parecia apropriada para a maioria dos propósitos. Nas salas de cinema, cine-jornais, filmes esportivos ou travelogues (narrações de viagens), e desenhos animados geralmente não passavam de dez minutos cada um. A Castle Films reproduzia a experiência de ida ao cinema, oferecendo matérias similares de um rolo para serem vistas em casa. O formato de um rolo tornou-se um padrão na indústria, e a Castle Films nunca se desviou dele, exceto para uma experiência brevecom filmes um pouco mais longos em 1950.

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O foco de Gene Castle na audiência domiciliar obteve um grande sucesso.Em dezembro de 1937, Gene tinha uma dúzia de filmes em lançamento: três cine-jornais, e três filmes de antologia na série “See” (imitada da revista Look). Em 1938, Gene acrescentou travelogues à sua linha de produção e acertou com o produtor de desenhos animados Paul Terry o lançamento dos seus Terrytoons recentes no mercado doméstico.

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As vendas de cine-jornais era especialmente boas, e Gene relançou Hindenburg Explodes! e England’s Coronation sob a sua própria marca. Ele vendeu ambos os filmes por um preço 25% mais caro do que os lançamentos normais da Castle. Outro lançamento de cine-jornal tornou-se uma tradição anual: a série “News Parade” condensava as melhores matérias do ano. A Castle expandiu este tema nos anos quarenta; travelogues transformaram-se em “The World Parade”; filmes esportivos em “The Sport Parade”; filmes sobre animais em “The Adventure Parade”, e musicais em “The Band Parade”.

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Em setembro de 1941, Gene celebrou o maior contrato jamais concedido à uma companhia de cinema comercial com o United States Government’s Office of Education, que desejava circular 50 filmes de treinamento educacionais e vocacionais. A Castle satisfez as numerosas estipulações relacionadas no acordo, que demandava a edição, promoção e distribuição de 12 mil a 15 mil cópias em 16mm e, com este ajuste bem sucedido, a companhia continuou a ganhar novos contratos com o governo, tendo co única competidor a Soundies Distributing Corporation of America.

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Depois que presidente Franklin D. Roosevelt declarou a guerra em dezembro de 1941, Gene Castle enfatizou seus lançamentos de cine-jornais e deixou o público ansioso informado. Títulos como Japs Bomb U.S.A.!, Midway and Coral Sea Battles! e Axis Smashed in Africa suscitaram manchetes de jornal e emocões para seus clientes do cinema em casa. Gene lhes prometeu que a Castle Film lançaria regularmente esses episódios da guerra tão regularmente quanto os acontecimentos os justificassem. Anúncios de página inteira alardeavam: “Você pode ter um completo relato da guerra nos Castle Films!” e, com efeito, 37 matérias sobre a guerra foram editadas.

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castle puss in Boots

castle alice in wonderlandA Castle Films continuou a oferecer produtos escapistas para serem exibidos em família. Novos Terrytoons substituiram os velhos, e uma série de “Fun Cartoons in Color” apresentava personagens de livros infantís para as crianças. Seguindo o ditado, “se você não pode vencê-los, junte-se a eles”, a Soundies Distributing Corporation of America assinou contrato com sua rival em 1945. Os soundies eram filmes musicais de três minutos feitos para serem exibidos em juke boxes (vitrolas de pé de uns dois metros aproximadamente (Ver nosso artigo de 13 de fevereiro de 2012). Os soundies haviam sido lançados no mercado domiciliar antes, mas não na mesma escala da Castle. Gene selecionou 101 soundies, organizou as músicas por tema, e reuniu musicais em um rolo para todos os gostos. Esses musicais de um rolo tornaram-se conhecidos como “Castle Music Albums”, apresentados aos clientes pela primeira vez em 1946. Gene também se manteve ocupado na sala de edição e montou pessoalmente os rolos de “Football Parade”em meados dos anos quarenta.

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Em 1945, os magnatas de Hollywood perceberam como era exitoso o campo de exibição domiciliar; o formato portável de 16mm tornara-se uma alternativa viável para o formato em 35mm adotado nos cinemas. Em áreas remotas ou subdesenvolvidas onde não existiam cinemas, um exibidor de 16mm poderia trazer o produto de Hollywood para um público pagante. O mercado institucional de escolas, bibliotecas, igrejas e grupos comunitários também usava filmes de 16mm.

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casrtle films wcfieldsEm 1947, a United World Films, Inc., a divisão da Universal Pictures para aluguel de filmes em 16mm, adquiriu a maioria das ações da Castle Films. Subsequentemente, a Castle tornou-se uma subsidiária da Universal, utilizando o acervo de filmes clássicos da Universal (v.g. de Abbott e Costello, W, C. Fields, Boris Karloff, etc.). A fusão com a Universal também deu acesso aos desenhos de Walter Lantz com o Picapau (Woody Woodpecker), Andy Panda, Oswald the Rabbit e Chily Willy. Quando a Universal foi comprada pela MCA, Inc. em 1962, a Castle ganhou acesso aos filmes sonoros da Paramount anteriores a 1950, lançando sequências dos grandes espetáculos de Cecil B. DeMille, comédias dos Irmãos Marx e outros. Nos anos cinquenta, os excertos da série de westerns de Hopalong Cassidy licenciada por William Boyd e cine-jornais montados com material filmado pela NASA de espaçonaves foram os mais vendidos nos anos sessenta.

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Em 1977, a Castle Films mudou sua denominação para Universal 8, mas a era do video doméstico pôs um fim ao empreendimento da Universal no cinema em casa em 1984. Para se ter uma idéia de como o inventory da Castle Filmes era extenso (mais de 1000 filmes durante 40 anos), recomendo o livro de Scott McGillivray Castle Films: A Hobbyst Guide, iUniverse, 2004, de onde extraímos muitas informações.

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A Castle Films teve uma concorrente, a Office Films, Inc., fundada por Leslie Winik em 1939, para produzir shorts educacionais e de entretenimento. Depois de comprar os filmes de Chaplin na Keystone, a companhia entrou no mercado domiciliar e obteve também muitos desenhos animados Van Beuren. A Official mudou o nome de Cubby Bear para Brownie Bear e os seus personagens humanos Tom e Jerry foram renomeados como Dick e Larry a fim de não serem confundidos com o gato e o ratinho dos cartoons da MGM. Além dos desenhos animados, a Official oferecia filmes esportivos, cine-jornais e specialties (exclusivos) como, por exemplo, um filme de lembranças da New York World’s Fair de 1939.

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Durante os anos quarenta, Robert R. Young adquiriu a Official e obteve os direitos para exibição domiciliar dos westerns e filmes B da PRC produzidos por ele. A Official adquiriu ainda o acervo da Soundies Distributing Corporation of America, lançando numerosos musicais curtos.

No final dos anos quarenta, a companhia utilizou uma quantidade de curtas da Columbia Pictures inclusive Krazy Kat e Scrappy (desenhos), Community Sing (musicais) e comédias curtas estreladas por Buster Keaton, Charley Chase e outros. Os curtas da Columbia ficaram disponiveis durante os anos cinquenta juntamente com comédias curtas da Educational Pictures de E.W. Hammond.

No anos cinquenta, a Official ofereceu as comédias Our Gang de Hal Roach para exibição domicilar; devido aos conflitos envolvendo os nomes Our Gang (Os Peraltas) e The Little (Os Batutinhas), a Offcial rebatizou a série de Hal Roach’s Famous Kid Comedies.

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No Brasil, a organização especializada em filmes de 16 mm mais famosa foi a Corrêa Souza Filmes, fundada em 1932 por João Corrêa de Souza. Sua empresa vendia aparelhos projetores de 16mm, alugava filmes e programas completos – educativos, recreativos e culturais – de longa ou pequena metragem. Os filmes eram exibidos em residências, clubes, fábricas, escolas e jantares assim como nas festas familiares de aniversário. O “Cinema em Casa” da Corrêa Souza Filmes constituia um motivo de grande atração e divertimento para pessoas de todas as idades, pois exibia filmes naturais (como se chamavam na época os documentários), desenhos, shorts musicais, comédias e filmes de longa metragem. Em 1997, a empresa mudou sseu campo de atuação, ganhando cada vez mais espaço no mercado de produção de eventos, sempre aproveitando a experiência adquirida com sua história.

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Havia também, nos anos 50 / 60, filmotecas com um estoque de filmes de 16mm para aluguel ou empréstimo como, por exemplo, as da Mesbla, Citéra Ltda, Cine-Fornecedora, Embaixadas Americana, Canadense, Britânica e Francêsa INCE (Instituto Nacional de Cinema Educativo), Shell e outras.