Ele falou: “Preto e branco são cores”, e nenhum outro fotógrafo na História do Cinema explorou mais profundamente o valor dessas cores, ou a natureza do contraste violento entre elas. Alton disse ainda: “Eu podia ver mais no escuro do que em cores. Eu podia ver no escuro”. Seu talento extraordinário consistia na maneira pela qual ele capacitava os espectadores a fazer o mesmo (Todd MacCarthy no seu excelente ensaio Through a Lens Darkly: The Life and Films of John Alton).
John Alton nasceu em 5 de outubro de 1901 em Sopron, aldeia húngara na fronteira com a Austria. O nome de família na ocasião era Altman, embora o sobrenome de seu pai antes de chegar a Viena, vindo da Rússia, certamente fosse outro. O pai de John, Sam Altman, e seu irmão Emile, emigraram para os Estados Unidos em 1880, onde mudaram seus nomes para Alton, e adquiriram cidadania americana, estabelecendo uma conexão americana para John Alton, muito antes do seu nascimento.
Emile ficou na América, mas Sam retornou a Viena, onde retomou o nome Altman, e se tornou fabricante e exportador de conhaque, vinho e champagne. Durante algum tempo, ele trabalhou para a abastada famíla Szecheny e foi no castelo Szecheny, onde os Altman ocupavam quartos, que John (ou Jacob em alemão, ou Janos em húngaro) nasceu.
Desde cedo, John demonstrou inclinação para a arte, aprendendo a revelar suas fotos, e desenhando constantemente. Suficientemente jovem para escapar do serviço militar na Primeira Guerra Mundial, Alton estudou em uma escola de curso superior durante dois anos mas, como não viu nenhum futuro na Hungria, decidiu tentar a chance em Nova York, e alí chegou em um navio cargueiro em 1919. Recebido por seu tio Emile, que a essa altura já era um comerciante próspero, Alton ingressou em uma instituição de ensino, para estudar foto-química, entre outras coisas.
Foi durante esse período que John Alton teve seu primeiro contato com a indústria profissional de cinema. Alton estava em um ônibus quando este passava pelo Cosmopolitan Studios de William Randolph Hearst e decidiu conhecer o local. Quando saltou do ônibus e se encaminhou para o estúdio, o homem que estava no portão disse, “Você é justamente o cara de que estamos precisando”, e ele foi imediatamente contratado como extra. Dentro de poucos dias, foram filmar em locação. Alton tinha que montar em um cavalo e nunca tinha feito isto antes – a não ser em um cavalo de parque de diversões. A filmagem durou 41 dias e o rapaz se apaixonou pelo cinema.
Sua sorte não durou muito, pois seu tio, homem de negócios intransigente, não se impressionava com o interesse intelectual de seu sobrinho pelas belas artes e se recusava a ajudá-lo financeiramente. Finalmente, eles se desentenderam, e Alton saiu de casa.\
Obrigado a sobreviver por conta própria, o jovem arranjou emprego no laboratório dos estúdios Paramount em Long Island City. Depois que ganhou algum dinheiro, Alton comprou um carro e, no inverno de 1923-1924, fez uma viagem de férias pelo país com cinco amigos. Quando chegaram em Los Angeles, Alton assistiu a estréia de O Ladrão de Bagdad / The Thief of Bagdad / 1924 de Douglas Fairbanks no Egyptian Theatre em Hollywood. Havia uma cartomante a disposição de quem comprasse um ingresso. Ela disse para os outros amigos de Alton que voltassem para o lugar de onde tinham vindo. Porém, quando chegou a vez de Alton, a quiromante olhou para a palma da sua mão, e disse: “Você vai fazer sucesso no cinema”. Os amigos voltaram, e ele ficou.
Alton conseguiu um lugar no laboratório da MGM, mas trabalhou também em vários departamentos do estúdio, adquirindo experiência em outras áreas. Transferido para o departamento de câmera, tornou-se um loader (encarregado de colocar o filme no chassi) e depois, primeiro assistente. Na MGM, teve oportunidade de observar Erich von Stroheim durante a produção de A Viúva Alegre / The Merry Widow / 1925 e de trabalhar com W. S. Van Dyke, atuando como assistente do fotógrado Clyde de Vinna em numerosos westerns de Tim McCoy em 1926-1927. Van Dyke ensinou-o a filmar com rapidez e econômicamente, o que seria o seu ganha-pão quinze anos depois.
Sentindo que estava pronto para se tornar primeiro operador de câmera, Alton pediu uma promoção. Mas o rapaz de 26 anos só obteve a incumbência de acompanhar Ernst Lubitsch e outro cameraman, Al Lane, à Europa a fim de filmar cenas de segundo plano para O Príncipe Estudante / The Student Prince / 1927. Segundo o próprio Alton relatou, ele voltou à Europa em 1928, para fazer alguns instantâneos dos Jogos Olímpicos de Inverno na Suiça, tomadas que seriam usadas em um filme programado para Greta Garbo; porém fica difícil confirmar tal fato, porque em nenhum filme de Garbo apareceu esse cenário.
Contou também que descobriu em Paris um jovem chamado Maurice Chevalier, cantor já conhecido na França, mas não nos Estados Unidos. Alton convenceu Irving Thalberg, que estava em Paris em lua-de-mel com Norma Shearer, a deixá-lo fazer um teste com o tal cantor. Obtido o consentimento, fez o teste, tudo saiu bem, ele o enviou para Thalberg, que disse: “Este sujeito não tem nada que se aproveite”. Alton tinha alguns amigos na Paramount, eles viram o teste, contrataram Chevalier, e ganharam uma fortuna. Nos próximos dois anos, Alton chefiou o departamento de câmera da Paramount no seu estúdio em Joinville.
Já casado com uma jornalista local, Rozalia Kiss, Alton transferiu-se depois para a Argentina Sono Film, onde funcionou como diretor de fotografia de vários filmes: Escala en la Ciudad / 1935; Crimen a las Tres / 1935; Compañeros / 1936: Loco Lindo / 1936; Amalia / 1936; Tararira / 1936; Goal / 1936; Um Infeliz Rapaz / El Pobre Pérez / 1937; Cadetes de San Martin / 1937; El Último Encuentro / 1938; Madressilva / Madresselva / 1938; Porta Fechada / La Puerta Cerrada / 1939; Doze Mulheres / Doce Mujeres / 1939; El Matrero / 1939; Romance no Rio / Caminito de Gloria /1939. Entre 1937 e 1938, Alton foi a Hollywood para comprar equipamento para a Argentina Sono Film e teve dez dias para cuidar da fotografia de A Vida Boêmia / La Vida Boehmia com Gilbert Roland e Rosita Diaz, filme americano da Columbia falado em espanhol, dirigido por Joseph Berne.
Antes de fazer outros filmes na Republic, Alton prestou serviço por algum tempo para os produtores William Pine e William C. Thomas em Piloto de Provas / Power Dive / 1941 e Aterrissagem Forçada / Forced Landing / 1941. Os filmes Pine-Thomas eram geralmente feitos em 10 dias por menos de cem mil dólares – mas Alton conseguiu aguentar este tipo de pressão.
Durante esses anos, Alton começou a ser reconhecido no meio profissional como um diretor de fotografia que trabalhava rápido, usando poucas luzes e tinha a capacidade de fazer com que um filme “B” parecesse um filme “A”. Esta qualidade foi notada mais ainda nos quatro excelentes filmes noir que fêz em seguida com Anthony Mann: Moeda Falsa / T-Men / 1947; Entre Dois Fogos / Raw Deal / 1948, Mercado Humano / Border Incident / 1949, Demônio da Noite / He Walked By Night / 1949 (dirigido na sua maior parte por Mann) e no drama histórico A Sombra da Guilhotina / Reign of Terror / 1949, no qual Mann, Alton e William Cameron Menzies suplantaram os recursos extremamente limitados da produção, fazendo sets apertados parecerem deslumbrantes e trinta figurantes parecerem trezentos.
Alton fez também um western com Anthony Mann, O Caminho do Diabo / Devil’s Doorway / 1950, optando pelo estilo visual noir com composições – o funeral do velho chefe em uma gruta iluminada pelo clarãos tochas, os enquadramentos na cena da provocação contra os índios no saloon – cuidadosamente preparadas em uma fotografia contrastada. “Encontrei em Anthony Mann, um director que pensava como eu”. Alton explicou: “Ele não somente aceitava o que eu fazia, ele pedia isso”.
Outros filmes noires de Alton foram: Prisioneiro do Medo / The Pretender / 1947; A Cicatriz / Hollow Triumph / 1948; Afrontando a Morte / The Crooked Way / 1949; A Noite de 23 de Maio / Mystery Street / 1950; A Um Passo do Fim / People Against O’Hara / 1951; Eu, o Júri / I, The Jury / 1953; O Império do Crime / The Big Combo / 1954; O Poder do Ódio / Slightly Scarlet / 1956, destacando-se O Império do Crime com sua fotografia noire, como sempre extraordinária, fortalecendo o tom dark: sombras pesadas, figuras em silhueta contra o nevoeiro, mãos e rostos dificilmente visíveis na escuridão, raios de luz espetando os personagens – como aquele farol que Susan (Jean Wallace) aponta na direção de Brown (Richard Conte), para facilitar seu aprisionamento.
Um Raio de Liberdade / Canon City / 1948 de Crane Wilbur e O Místico / The Spiritualist / 1948 de Bernard Vorhaus (renomeado The Amazing Dr. X), foram outras duas produções modestas, nas quais Alton mostrou como se pode fazer muito com pouco. No primeiro, para filmar as cenas em locação na penitenciária, Alton não levou eletricistas com ele, e usou apenas o circuito elétrico já existente, reforçado com lâmpadas mais potentes. No segundo, nas sessões de clarividência, a luz emana diretamente da bola de cristal do vidente impostor (Turhan Bey).
Em 1949, Alton voltou a trabalhar para a MGM e, apesar de muitas desavenças com seu velho inimigo John Arnold (que não gostava dos filmes B da MGM nem do estilo dark de Alton), conseguiu sobreviver na empresa e se tornar o fotógrafo preferido de dois diretores do primeiro time da Marca do Leão: Vincente Minnelli e Richard Brooks.
Com Minnelli, ele fez O Papai da Noiva / Father of the Bride / 1950; O Netinho do Papai / Father’s Little Dividend / 1951; Chá e Simpatia / Tea and Sympathy / 1956; Teu Nome é Mulher / Designing Woman / 1957 e a sequência do longo balé final de Sinfonia de Paris / An American in Paris / 1951, que lhe proporcionou o Oscar de Melhor Fotografia em cores. Foi a primeira experiência de Alton com o Technicolor, mas, mesmo assim, ele tinha idéias muito precisas de como obter certos efeitos. “O segredo da fotografia do balé”, disse Alton, “foi a tonalidade fumata (esfumaçada), que dava às cores um tom pastel”. Das cerca de sessenta luzes existentes no estúdio, Alton usou três ou quatro, o que poupou muita despesa e trabalho.
Devido ao sucesso de Sinfonia de Paris, Alton foi encarregado de fotografar Cantando na Chuva / Singin’in the Rain / 1952, mas não se entendeu bem com Gene Kelly – Stanley Donen, e após duas semanas foi afastado. Deram-lhe em seguida a tarefa de fotografar um filme B, Estranho Inimigo / Talk About a Stranger /1952, e ele providenciou um clima taciturno para esse pequeno thriller interessante sobre um menino, cuja visão distorcida da realidade chega à histeria.
Quanto a Richard Brooks, Alton colaborou com ele em Campo de Batalha / Battle Circus / 1953; Dá-Me Tua Mão / Take the High Ground / 1953; A Festa de Casamento / The Catered Affair / 1956; Os Irmãos Karamazov / The Brothers Karamazov / 1958 e Entre Deus e o Pecado / Elmer Gantry / 1960. O penúltimo filme é o mais rico visualmente, porém Alton recebeu algumas críticas por ter iluminado várias cenas, particularmente os interiores, de modo totalmente irreal e usado cores estranhas, notadamente a púrpura, o verde e amarelo refletidas nos tetos ou envolvendo os personagens em contraluz. A afeição e o respeito entre diretor e fotógrafo era mútua. “Eu gostava de trabalhar com Richard Brooks”, recordou Alton. “Ele era muito bom”.
Alton havia trabalhado com Allan Dwan em Turbilhão da Vida (1947), mas nos meados dos anos cinquenta, eles se reencontraram sete vêzes na RKO. Sobre Dwan, Alton disse: “Ele era grande nos primórdios da indústria cinematográfica, mas não mudou, não trouxe nada de novo para ela, então foi por isso que entrou em declínio. Mas era um bom diretor”. Os seis primeiros de seus filmes dos anos cinquenta – Homens Indomáveis / Silver Lode; Sob a Lei da Chibata / Passion; Montana, Terra do Ódio / Cattle Queen of Montana; Selvas Indomáveis / Escape to Burma; A Sereia dos Mares do Sul / Pearl of the South Pacific e A Audaçia é Minha Lei / Tennessesse’s Partner – são surpreendentemente sem qualidade visual, tendo em vista que foram fotografados por Alton. O sétimo, O Poder do Ódio / Slightly Scarlet / 1956, filme noir rodado em cor e tela larga (no processo Superscope da RKO), foi uma exceção. Alton transferiu perfeitamente as características da fotografia em preto e branco para a cor. Apesar do Technicolor, ele continuou utilizando extensas sombras e grandes áreas pretas, usando o amarelo como se fosse a luz, acentuando ao mesmo tempo arranjos berrantes com as cores rosa, verde e laranja. Assim, o extraordinário cinegrafista conseguiu alguns efeitos que servem bem não somente às cenas tensas como ao subtema da rivalidade sexual, ciúme e possessividade entre duas irmãs (Dorothy / Arlene Dahl) e June / Rhonda Fleming).
Entre os filmes restantes que Alton fotografou – O Intrépido / Red Stalllion in the Rockies / 1949 (em Cinecolor); Capitão China / Captain China / 1950; Amor Vai, Amor Vem / Grounds for Marriage /1951; No Palco da Vida / It’s a Big Country / 1951; A Indiscreta / Washington Story / 1952; Brado de Perigo / Apache War Smoke / 1952; Medo que Condena / Count the Hours / 1953; Ódio Entre Grades / Duffy of San Quentin / 1954; Testemunha do Crime / Witness to Murder / 1954; Labirinto de Aço / The Steel Cage / 1954; A Casa de Chá do Luar de Agosto / The Tea House of the August Moon / 1956; Por um Pouco de Amor / Lonely Hearts / 1958 e A Invasão da Lua / 12 to the Moon / 1960, e somente em Testemunha do Crime se vislumbra com nitidez o trabalho de câmera altoniano, imprimindo uma atmosfera tenebrosa ao cenário de Los Angeles, onde tem lugar a ação.
Em 7 de novembro de 1960, Alton começou a fotografar O Homem de Alcatraz / The Birdman of Alcatraz / 1962 para o diretor britânico Charles Crichton. Após uma semana de filmagem, Burt Lancaster e o produtor Harold Hecht susbtituiram Crichton por John Frankenheimer, mas retiveram Alton. Entretanto, Frankenheimer percebeu logo no primeiro momento que ele e Alton eram incompatíveis. “Durou apenas um dia ou um-dia-e-meio no máximo, recordou Frankenheimer. Houve um conflito de personalidades desde o primeiro dia. Simplesmente não era o meu tipo de filmagem. Ele estava acostumado a trabalhar com diretores que provavelmente não eram tão específicos como eu, sobre como filmar uma cena, que deixavam ele fazer o que quisesse… Foi uma pena, porque tinha muito respeito por ele e lamento não ter dado certo”.
Com isso, John Alton havia trabalhado como diretor de fotografia no cinema pela última vez, e nada do que ele e Crichton filmaram ficou no filme.
A obra de Saint-Exupéry, breve e radiante, é toda inteiramente extraída de uma experiência vivida.…
Desde a infância sou fascinado pela Segunda Guerra Mundial e pelo Cinema, porém só recentemente…
Ele realizou, com a cumplicidade do roteirista Jacques Sigurd, quatro filmes que foram os mais…
Ele construiu uma carreira em torno de fugas sensacionais encenadas. Depois de trabalhar por vários…
Marco Polo (1254-1314) partiu de Veneza em 1271 na companhia do pai e de um…
Charles J. Brabin (1883-1957) nascido em Liverpool, Inglaterra chegou aos Estados Unidos ainda muito jovem…