Com uma carreira excepcionalmente longa de realizações de 1919 a 1967, Julien Duvivier costuma ser apontado por muitos críticos como um técnico muito versátil e competente, mas sem personalidade. Porém a realidade é mais complexa, mesmo se a sua filmografia contém um bom número de filmes de encomenda.
Nascido no dia 8 de outubro de 1896 em Lille e educado em um colégio jesuita de sua cidade natal, Duvivier foi para Paris, onde arranjou emprego no Thêatre de l’Odeon nas funções de ator e encenador. Interessado pelo cinema, ingressou na Societé Cinématographique des Auteurs et Gens des lettres (SCAGL), na qual colaborou com André Antoine, o fundador do Thêatre Libre. Em 1919, dirigiu seu primeiro filme, Haceldama ou le Prix du sang. Após uma carreira bastante produtiva na cena muda, marcada por dois sucessos artísticos, Poil de Carotte / 1925 (que refilmaria em 1932) e Au Bonheur des Dames / 1930 (parcialmente sonorizado), Duvivier tornou-se posteriormente um dos grandes diretores do cinema francês – ao lado de René Clair, Jean Renoir, Marcel Carné e Jacques Feyder -, e realizou, entre 1930 e 1940, alguns dos melhores filmes da época, por meio dos quais expressava seu pessimismo amargo: Tragédia de um Homem Rico / David Golder / 1930; Pega-Fogo (TV)/ Poil de Carotte / 1932; Maria Chapdelaine / 1934; A Bandeira / La Bandera / 1935; Camaradas / La Belle Equipe / 1936, Um Carnet de Baile / Un Carnet de Bal / 1937; La Fin du Jour / 1939.
Durante a Ocupação, Duvivier, cuja esposa era judia, foi para os Estados Unidos (onde já havia dirigido A Grande Valsa / The Great Waltz em 1938), e alí realizou Lydia / 1940; Seis Destinos / Tales of Manhattan / 1941-42; Os Mistérios da Vida / Flesh and Fantasy / 1943; O Impostor / The Impostor / 1943, todos muito interessantes. Ao retornar à França, ele reatou relações com o clima sombrio dos seus filmes de antes da guerra, focalizando em Pânico / Panique / 1946 o drama da exclusão social e os tormentos de um celibatário marginal, magnificamente vivido por Michel Simon. Juntamernte com Vítimas do Destino / Au Royame des Cieux / 1949, outro drama de uma obscuridade vigorosa, passado em uma casa de correção para moças delinquentes, foi o melhor trabalho do cineasta na segunda metade dos anos 40.
No decênio seguinte, tal como no passado, Duvivier continuou experimentando vários gêneros, abordando diversos estilos, sem encontrar verdadeiramente o seu. Mas, com a sua notável noção de cinema, especialmente no que dizia respeito à criação de uma atmosfera e à imposição de um ritmo fluente nas narrativas, ele realizou, com a sua sensibilidade de artista, duas jóias raras (A Festa do Coração / La Fête a Henriette / 1952; Sedução Fatal / Voici les Temps des Assassins / 1955-56); filmes apreciáveis (Sinfonia de uma Cidade / Sous le Ciel de Paris / 1950; O Caso Maurizius / L’Affaire Maurizius / 1954: A Mulher dos Meus Sonhos / Marianne de ma Jeunesse / 1955; As Mulheres dos Outros / Pot Bouille / 1957; Marie Octobre (na TV) / Marie Octobre / 1959; e um imenso sucesso comercial (O Pequeno Mundo de Don Camilo / Le Petit Monde de Don Camillo / 1951).
Em toda a sua obra esse professional eclético e muito produtivo demonstrou sempre um extremo rigor no plano da construção dramática, uma concepção de arte dinâmica e um técnica extraordinária. A fotografia sempre bem cuidada e seus movimentos de câmera virtuosos combinados com planos longos contribuiram para a mise-en-scène atmosférica das histórias, por cujos roteiros – convém lembrar – muitas vezes ele mesmo se responsabilizou. Julien Duvivier morreu no dia 29 de outubro de 1967 em um acidente de automóvel, após ter sofrido um ataque cardíaco ao volante. Jean Renoir escreveu nas suas memórias: “Se eu fosse arquiteto e devesse construir um monumento do cinema, colocaria uma estátua de Duvivier bem na frente. Esse grande técnico, esse rigorista era um poeta”. Na verdade, Julien Duvivier foi um artesão brilhante que, nos seus filmes maiores, se transformou em um artista.
Neste artigo, presto uma homenagem ao grande cineasta, relembrando alguns de seus melhores filmes.
TRAGÉDIA DE UM HOMEM RICO / DAVID GOLDER / 1930.
David Golder (Harry Baur), judeu polonês imensamente rico, vai se encontrar em Biarritz com sua esposa Gloria (Paule Andral) e sua filha Joyce (Jackie Monnier). David e Gloria se detestam. Ela o trai com um aventureiro, o conde de Hoyos (Gaston Jacquet). David idolatra Joyce, que finge ser uma filha devotada, mas só pensa em explorar o pai. David sofre uma crise de angina e durante uma discussão com Gloria no hospital, esta lhe revela que Joyce é filha de Hoyos. Para se vingar, David abandona seus negócios e vai viver sozinho. Atendendo às súplicas de Joyce, faz uma transação lucrativa na Rússia para ajudá-la e morre solitário a bordo de um navio na viagem de volta.
Essa história, reminiscente de O Pai Goriot, convinha à visão do mundo pessimista que iria se afirmar nos filmes posteriores do diretor. A cena mais contundente do filme – realizado praticamente segundo a técnica do cinema mudo, mas cumprindo inteligentemente as exigências da reprodução do som – é aquela em que Golder, gravemente enferno, se defende das manobras de sua mulher, querendo lhe arrancar um testamento em seu favor. Quando Gloria se inclina sobre seu corpo e lhe diz cruelmente que Joyce não é sua filha, Golder estende o braço e aperta o pescoço da mulher com o seu colar de pérolas. É um momento terrível, no qual o ódio e a maldade se manifestam com uma intensidade impressionante.
PEGA-FOGO (TV) / POIL DE CAROTTE / 1932.
François Lepic (Robert Lynen), um menino de 12 anos de idade e cabelos ruivos, apelidado de Poil de Carotte, é detestado pela mãe (Catherine Fonteney), mulher tirânica que reserva seu carinho para o filho mais velho, Félix (Maxime Fromiot), François sofre profundamente por não ser amado. Seu pai (Harry Baur) parece indiferente, preocupado com as próximas eleições municipais. Após diversas tentativas, François resolve se suicidar, enforcando-se no celeiro. Felizmente, M. Lepic chega a tempo de salvá-lo. Pela primeira vez, o pai tem uma conversa com o filho. A partir de então, Poil de Carrote terá um defensor contra sua mãe.
Obra ao mesmo tempo encantadora e amarga, retratando uma família provinciana tão desprovida de sentimento que o seu membro mais jovem é levado a tentar o suicídio. Apesar de o filme conter no seu conjunto muita crueldade e realismo, surgem momentos de doce ternura, como o casamento infantil de Poil de Carotte e de sua pequena companheira, impregnado de uma poesia bucólica: as duas crianças de pés no chão, a cabeça coroada de flores e de mãos dadas, caminham, seguidas por um pequeno cortejo de animais, em uma paisagem maravilhosa de colina ensolarada. O carinho que o pai revela afinal ao filho na última cena é um momento de grande emoção.
MARIA CHAPDELAINE / 1934.
No Canadá, Maria Chapdelaine (Madeleine Renaud) é cortejada por três homens: um caçador, François Paradis (Jean Gabin), um lenhador, Eutrope Gannon (Alexandre Rignault), e um citadino que vem regularmente comerciar na região, Lorenzo (Jean-Pierre Aunont). Maria prefere François. Ele promete casar-se com ela asssim que retornar do sítio onde passará o inverno. Mas, desejando passar o Natal ao lado de sua amada, François resolve voltar imprudentemente em plena tempestade e morre de frio. Quando perde também sua mãe, Maria diz a Gannon que está disposta a se casar com ele.
A história de amor serve de pretexto para uma crônica da vida difícil dos homens do Quebec no começo do século XX. Esta tem por fundamento o apego à terra, ainda que deserta e selvagem. Os acontecimentos são dosados de maneira a tentar demolir esse espírito atávico por meio da tragédia e da desilusão. É possível sentir a desolação e a tristeza que pesam sobre as personagens e as coisas. A terra é uma terra de neve, branca e silenciosa cpomo a morte. A melhor sequência do filme é a do retorno do trenó que traz o cadaver de François. Ele cruza com outro trenó, no qual estão Maria e seus pais, dirigindo-se alegremente para as festividades do Ano-Novo. A expressão no rosto de Maria, quando ela avista o corpo inerte do seu amado enrolado em um cobertor, ninguém jamais esquece.
A BANDEIRA / LA BANDERA / 1935.
Depois de matar um homem em Montmartre, Pierre Gilieth (Jean Gabin) se alista na Legião Estrangeira espanhola, onde se liga a dois compatriotas, Mulot (Aimos) e Lucas (Robert Le Vigan). Em um café, Gilieth apaixona-se por Aischa (Annabella), uma jovem dançarina berbere, e se casa com ela no meio das prostitutas e dos soldados. Seu companheiro de armas, Lucas, é na realidade um policial, que seguia sua pista desde Paris, visando a uma recompensa. O batalhão é enviado para um posto avançado. O forte é cercado, os legionários came um após o outro. Só resta Lucas, de pé, no meio de seus camaradas mortos.
Desde o início, Gilieth está marcado pelo destino e pela fatalidade, pedras angulares sobre as quais uma faceta essencial do “mito Gabin” vai ser construída. Embora tendo de lidar com certos convecionalismos do gênero aventura colonialista Duvivier cria algumas sequências notáveis: o crime contado por meio de uma elipse – a jovem embriagada e a mancha de sangue que ela descobre no seu vestido; o tumulto no café apanhado por uma câmera oblíqua oscilante; a cusparada no rosto do policial encoberto sob a bandeira da legião; Mulot bebendo a água envenenada debaixo do fogo inimigo e morrendo feliz com a sede aliviada; a chamada geral terminada a luta, a que só um homem responde.
CAMARADAS / LA BELLE EQUIPE / 1936.
Cinco operários desempregados, Jean (Jean Gabin), Charles (Charles Vanel), Raymond (Aimos), Mario (Raphael Medina) e Jacques (Charles Dorat) ganham o grande prêmio da loteria. Eles decidem se associar para construir um restaurante. Huguette (Micheline Cheirel), noiva de Mario, junta-se a eles. Mas diversas ocorrências desagregam a belle équipe: a polícia procura Mario, que é imigrante; Jacques, o mais novo, prefere refazer sua vida no Canadá; Gina (Viviane Romance), ex-esposa de Charles, aparece para reivindicar sua parte no negócio. Jean esforça-se para manter a unidade da equipe. Raymond cai de um telhado e morre. Gina provoca uma rivalidade amorosa entre Charles e Jean.
Duas versões diferentes para o epílogo foram filmadas: na primeira, os dois homens matavam-se um ao outro; na segunda, a amizade de Charles e Jean era salva após uma explicação “entre homens” e o restaurante podia finalmente ser inaugurado. Produzido na época da Frente Popular, o filme expressa, por seu romantismo social, o espírito daquele tempo. A vida dos desempregados, a situação incerta dos refugiados políticos espanhóis, a Loteria Nacional, da qual se esperava um remédio para as dificuldades materiais, a associação em cooperative, tudo isso reflete uma realidade que Spaak e Duvivier usaram como pano de fundo de uma história sobre a amizade e o fim de uma utopia.
UM CARNET DE BAILE / UN CARNET DE BAL / 1937.
Christine Surgère (Marie Bell) acaba de perder seu marido. Ela acha um carnê de seu primeiro baile, quando tinha 16 anos. Nostálgica, vai procurar os pares com quem dançou maquela noite. Madame Audié (Françoise Rosay) enlouqueceu ao saber do suicídio de seu filho André; Pierre (Louis Jouvet) tornou-se gângster; Alain (Harry Baur), um padre; Eric (Pierre Richard-Willm), guia de alpinistas; François (Raimu), prefeito de uma aldeia no Midi; Thierry (Pierre Blanchar), médico que pratica abortos e assassina sua amante Gaby (Sylvie) após a partida de seu antigo amor. É com Fabien (Fernandel), humilde cabelereiro, que Christine entra no salão do seu primeiro baile. Christine adota Jacques (Robert Lynen), filho de seu último admirador, que havia morrido.
Filme em esquetes com um elenco de grandes intérpretes, tendo como personagem central uma mulher que confronta o seu passado romântico com um presente decepcionante. Christine fica surpresa não somente com o que aconteceu com cada um de seus antigos admiradores, mas descobre também o impacto que teve, sem saber, nos sentimentos e no destino deles. E ao rever o salão de seu primeiro baile, ela não encontra o cenário de suas lembranças, de suas ilusões. Os três melhores episódios são os de Jouvet, Raimu e Blanchar. Louis Jouvet recitando melancolicamente os versos de Verlaine. Raimu engraçadíssimo, casando-se a si mesmo, e Blanchar, caolho, epilético, decadente no segmento mais sórdido e inquietante, visto inteiramente em plano inclinado.
LA FIN DU JOUR / 1939.
Em um retiro de artistas, três velhos atores se confrontam: Raphaël Saint- Clair (Louis Jouvet), antigo galã de sucesso, que perdeu sua fortuna no jogo; Gille Marny (Victor Francen), ator estimado pelo seu talento, mas que jamais conheceu o êxito (sua mulher foi seduzida por Saint-Clair e morreu em um acidente de caça, suspeitando-se de suicídio); e Cabrissade (Michel Simon), um fracassado, que só conseguiu ser o eventual substitute de outros atores. Para manter sua reputação de Don Juan, Saint-Clair seduz Jeannette (Madeleine Ozeray), jovem empregada da casa, e quase a conduz ao suicídio; mas ela é salva por Marny. Cabrissade, incapaz de dizer um verso em uma representação em benefício do retiro, sofre um ataque cardíaco. Saint-Clair enlouquece.
Artistas idosos sem as luzes da ribalta, as lembranças que os deprimem, a amargura que atiça as rivalidades de outrora, os rancores e as mesquinharias senis exacerbando-se no ambiente fechado de um pensionato. Com esse assunto, Duvivier construiu um drama cruel e mórbido sobre o egocentrismo feroz dos velhos atores e a dificuldade de envelhecer, que traz a marca do seu pessimismo em relação ao gênero humano. Nesse meio avulta a figura imponente e egosta de Saint-Clair, magnificamente vivido por Louis Jouvet. Uma velha atriz, Mme. Chabert (Gabrielle Dorziat), mostra-lhe o retrato do filho, lhe revela que ele é o pai e que o rapaz morreu. Saint-Clair parece se comover e pergunta: “Quantos anos tinha?”. “Vinte e oito anos”, ela responde. “A idade de um jovem galã”, diz ele secamente e logo se afastando. Porém, o tema fundamental do filme fica bem claro quando Marny faz o elogio fúnebre de Cabrissade: é a paixão pelo teatro, pelo qual todos ali dariam a vida.
PÂNICO / PANIQUE /
Um crime é cometido, e o fotógrafo amador e misantropo Monsieur Hire (Michel Simon), que leva uma vida dupla mantendo um consultório de astrologia sob o nome de doutor Varga, é logo tido como suspeito pela polícia e pelos seus vizinhos. O verdadeiro assassino é Alfred (Paul Bernard), amante de Alice (Viviane Romance), e esta última faz caírem as suspeitas sobre Hire, que está secretamente apaixonado por ela. O infeliz, encurralado pela multidão, refugia-se no telhado de um imóvel, escorrega e morre. Ao lado do cadáver é encontrada sua máquina fotográfica com uma foto que denuncia o verdadeiro culpado.
História trágica de um homem solitário que não molesta ninguém, mas guarda distância de seus semlhantes, e por isso sofre o drama da incompreensão e da baixeza humana, tema que se encaixa perfeitamente no universo pessimista de Duvivier. A reconstituição bastante apurada de um quarteirão de Villejuif ajuda muito a criar a atmosfera social. A composição de Michel Simon é prodigiosa, principalmente quando exprime os tormentos ïnconfessáveis” e a paixão erótica do seu personagem. Na última cena, estritamente visual, Alice e Alfred, abraçados no carrinho de uma pequena montanha-russa de um parque de diversões, onde se refugiam, descem e sobem vertiginosamente no brinquedo, sem saber que serão presos.
VÍTIMAS DO DESTINO / AU ROYAUME DES CIEUX / 1949.
Injustamente recolhida na casa de Correção de Haute-Mère, Maria Lambert ( Suzanne Cloutier) sofre nas mãos da nova diretora, Mlle. Chamblas (Suzy Prim), mulher sádica e autoritária. Pierre Massot (Serge Reggiani) tenta salvar sua noiva desse inferno. As detentas se opõem aos castigos injustos de Mlle. Chamblas, apoiadas por Mlle. Guérande (Monique Mélinande), educadora mais liberal. Auxiliados por todas as moças, Maria e Pierre conseguem fugir durante uma inundação. A polícia sai à procura deles enquanto a revolta cresce inexoravelmente na penitenciária.
O filme vale sobretudo pela atmosfera dramática: a paisagem sombria e úmida com a presence inquietante da águas do rio que se elevam até a inundação e a cólera das detentas, que aumenta no interior do estabelecimento, culminando no motim. As melhores cenas são as da greve de fome, quando a diretora traz um caldeirão fumegante de comida para tentar as detentas e a câmera faz uma série de panorâmicas bruscas em um vaivém entre o caldeirão e o rosto das moças; da ronda macabra, que a diretora obriga as detentas a fazerem torno do corpo da companheira morta e o barulho cada vez mais forte de seus sapatos martelando o solo; do grupo de detentas abatendo-se sobre a diretora como uma nuvem de insetos e depois o olhar extasiado delas vendo a megera ser atacada por um cão feroz.
A FESTA DO CORAÇÃO / LA FÊTE A HENRIETTE / 1952.
Dois roteiristas (Louis Seigner, Henri Crémieux) trabalham em um novo projeto. O primeiro é mais razoável, lógico e realista que seu colega. O segundo, constantemente contraditado pelo primeiro, tem uma imaginação fértil, criando lances de um mau gosto, melodramáticos ou rotineiros. De suas idéias opostas nasce o argumento de um novo filme, com os mesmos episódios vistos duas vezes de maneiras diferentes, envolvendo Henriette (Dany Robin), seu namorado Robert (Michel Roux), um jornalista, e Maurice (Michel Auclair), um ladrão.
Uma idéia bastante original serve de ponto de partida e depois de fio condutor para essa sátira brilhante à profissão de roteirista: a composição de um argumento por dois autores com concepções diametralmente opostas, tendo como pano de fundo Paris na comemoração do 14 de julho. Conforme a história é vista por um ou por outro, o relato será alternadamente um melodrama sórdido ou uma comédia adocidada. Julien Duvivier passa de um aspecto a outro com uma virtuosidade espantosa, usando um estilo rápido, no qual a imagem é servida por diálogos muitos divertidos. A certa altura um dos roteiristas diz para o outro: “Quando eu penso como você, é porque eu não penso em nada”.
SEDUCÃO FATAL / VOICI LE TEMPS DES ASSASINS / 1956.
Proprietário de um renomado restaurant no Halles, André Chatelin (Jean Gabin) recebe a visista de Catherine (Danièle Delorme), filha de Gabrielle (Lucienne Bogaert), sua ex-esposa. Ela anuncia a morte de sua mãe e diz que está sem recursos. Chatelin a acolhe sob seu teto e depois se casa com ela. Catherine seduz Gérard (Gérard Blain), jovem estudante orfão que Chatelin ajuda e considera como um filho. Ela pede a Gérard que mate Chatelin, mas ele se recusa, e é morto por Catherine. Chatelin descobre que Gabrielle ainda vive, é viciada em drogas e armou com a filha um plano para se aproveitar dele.
É o filme mais sórdido e cruel de Julie Duvivier, e também misogino. Difícil imaginar uma mulher mias perversa e feroz do que Catherine: ela seduz, engana, explora, mata com consciência e frieza. Sua mãe, deteriorada por uma existência próxima à prostituição, é um tipo ainda mais repugnante. Sem falar na progenitora de André (Germaine Kerjean), mulher cheia de ódio que mata as galinhas com o chicote, e sua governanta Mme. Jules (Gabrielle Fontan), maledicente e hipócrita. Ao lado delas, para contraste, está André (Jean Gabin compõe seu personagem com muita naturalidade), cuja bondade atinge os limites da cegueira. A cena final é grandiosa no seu horror: o cão de Gérard, enlouquecido pela perda de seu dono, faz justiça, atacando e matando a monstruosa Catherine.
O PEQUENO MUNDO DE DON CAMILO / LE PETIT MONDE DE DON CAMILLO / 1951.
Na aldeia italiana de Bassa, o prefeito Peppone (Gino Cervi), comunista, acaba de triunfar nas eleições e seu sucesso desagrada a Don Camilo (Fernandel), padre simpático que, nas sombras do presbitério, se entende amigavelmente com Nosso Senhor. Entretanto, uma espécie de amizade, fundada em uma estima recíproca, une Peppone e Don Camilo nos casos graves, e eles agem então em comum acordo para o bem da comunidade e da paróquia.
FILMOGRAFIA (Com meus agradecimentos a Sergio Leemann pela revisão de alguns títulos).
1919- Haceldama ou Le Pris du Sang. 1920 – La Réincarnation de Serge Renaudier (o negativo do filme foi destruído antes de seu lançamento. 1922 – Les Roquevillard; L’Ouragan sur la Montagne; Le Logis de l’Horreur. 1923 – Le Reflet de Claude Mercouer; A Tragédia de Lourdes / Crédo ou La Tragédie de Lourdes. 1924 – Coeurs Farouches; La Machine à Refaire la Vie (uma segunda versão deste filme de montagem retraçando a evolução do cinema desde sua invenção até 1924, foi apresentada em 1933); L’Oeuvre Immortelle. 1925 – L’Abbé Constantin; Poil de Carotte. 1926 – Agonia de Jerusalém ou Cristo Redentor / L’Agonie de Jerusalem; Supremo Adeus / L ‘Homme à Hispano. 1927 – Le Mariage de Mademoiselle Beulemans; O Fantasma da Torre Eiffel / Le Mystère de la Tour Eiffel. 1928 – Turbilhão de Paris / Le Tourbillon de Paris. 1929 – La Divine Croisière; La Vie Miraculeuse de Thérèse Martin; Maman Colibri. 1930 – Au Bonheur des Dames; Tragédia de um Homem Rico / David Golder. 1931 – Les Cinq Gentlemen Maudits. 1932 – Allo Berlin … Ici Paris; Pega-Fogo (TV) / Poil de Carotte; A Cabeça de um Homem (TV) / La Tête d’un Homme. 1933 – Le Petit Roi. 1934 – Le Paquebot “Tenacity; Maria Chapdelaine. 1935 – Gólgota, reprisado como O Mártir do Gólgota / Golgotha; A Bandeira / La Bandera. 1936 – Golem, o Monstro de Barro / Le Golem, Camaradas / La Belle Équipe; O Homem do Dia / L’Homme du Jour; O Demônio da Algéria, reprisado como Império do Vício / Pépé-le-Moko. 1937 – Um Carnet de Baile / Un Carnet de Bal. 1938 – Maria Antonieta / Marie Antoinette (sequências adicionais, não creditado); A Grande Valsa / The Great Waltz. 1939 – La Fin du Jour; O Fantasma da Esperança / La Charrette Fantôme. 1940 – França Eterna / Un Tel Père et Fils. 1941 – Lydia / Lydia. 1942 – Seis Destinos / Tales of Manhattan. 1943 – Os Mistérios da Vida / Flesh and Fantasy; O Impostor / The Imposter. 1946 – Pânico / Panique. 1948 – Anna Karenina / Anna Karenina. 1949 – Vítimas do Destino / Au Royaume des Cieux. 1950 – Cavalheiro da Aventura / Black Jack; Sinfonia de uma Cidade / Sous le Ciel de Paris. 1952 – O Pequeno Mundo de Don Camilo / Le Petit Monde de Don Camilo; A Festa no Coração Ver / La Fete à Henriette. 1953 – O Regresso de Don Camilo / Le Retoru de Don Camillo. 1954 – O Caso Maurizius / L’Affaire Maurizius; A Mulher dos Meus Sonhos / Marianne de Ma Jeunesse. 1956 – Sedução Fatal / Voici le Temps des Assassins; Minha Mulher Vem Aí / L’Homme à L’ Impermeable. 1957 – As Mulheres dos Outros / Pot-Bouille. 1958 – A Mulher e o Fantoche / La Femme et le Pantin; Marie Octobre / Marie Octobre. 1960 – La Grande Vie; O Despertar do Vício / Boulevard. 1962 – A Câmara Ardente / La Chambre Ardente; O Diabo e os Dez Mandamentos / Le Diable et les Dix Commandements. 1963 – Noite de Pânico / Chair de Poule. 1967 – Diabolicamente Tua / Diaboliquement Votre.
A obra de Saint-Exupéry, breve e radiante, é toda inteiramente extraída de uma experiência vivida.…
Desde a infância sou fascinado pela Segunda Guerra Mundial e pelo Cinema, porém só recentemente…
Ele realizou, com a cumplicidade do roteirista Jacques Sigurd, quatro filmes que foram os mais…
Ele construiu uma carreira em torno de fugas sensacionais encenadas. Depois de trabalhar por vários…
Marco Polo (1254-1314) partiu de Veneza em 1271 na companhia do pai e de um…
Charles J. Brabin (1883-1957) nascido em Liverpool, Inglaterra chegou aos Estados Unidos ainda muito jovem…