OS HERÓIS FANTASIADOS

Os heróis fantasiados sempre desfrutaram de muito prestígio nas histórias em quadrinhos e nas telas. Talvez os mais populares, apesar (ou…por causa?) da maldade que  inventaram a respeito deles, tenham sido Batman e Robin.

Lançado em maio de 1939 na revista Detective Comics, Batman apareceu no Brasil em 1942 no Globo Juvenil com o nome de Morcego Negro e depois Homem Morcego. Com argumentos de Bill Finger e desenhos de Bob Kane, o personagem foi inspirado no seu antecessor, O Super Homem, mas não possuía superpoderes ou capacidades extraterrestres para ajudá-lo. Entre os requintados equipamentos para enfrentar os malfeitores ele tinha: a Bat-caverna, o Bat-plano, o Bat-móvel, o Bat-corda, etc.

Sua gênese pode ser sintetizada assim: para vingar a morte de seus pais, assassinados por um bandido, o milionário Bruce Wayne torna-se um combatente do crime, conhecido como Batman. Ao sofrer o ataque de um morcego, lhe vem a idéia de adotar uma personalidade secreta por trás de uma máscara inspirada naquele mamífero, para causar medo aos seus inimigos.

No início de suas aventuras nos comics, Batman era um solitário, que fazia justiça pelas próprias mãos. Posteriormente, os editores da história em quadrinhos acharam que o personagem devia ser trazido mais para o lado da lei. No número de abril de 1940 da Detective Comics a “humanização” de Batman foi completada com o acréscimo de seu jovem companheiro, Robin, chamado aquí no Brasil de Robin, o Menino Prodígio, na realidade Dick Grayson, um garoto órfão adotado por Wayne, que trabalhava num circo.

A introdução de Robin serviu para dar aos jovens leitores alguém com o qual eles podiam se identificar. Os outros coadjuvantes nos quadrinhos incluíam o Comissário Gordon, que controlava o Bat-sinal e Alfred, o mordomo fiel da mansão de Bruce Wayne. Porém os mais memoráveis foram os vilões, distinguindo-se entre eles, o Pingüim, a Mulher Gato e o Coringa. Kane declarou numa entrevista que o Coringa foi produto da imaginação de Bill Finger, baseando-se numa fotografia de Conrad Veidt em um filme de 1928, O Homem que Ri / The Man Who Laughs. Finger, na verdade, participou da criação de quase todos os vilões de Batman assim como da maioria de seus equipamentos, do Bat-plano à Bat-caverna. Depois de certo tempo, o assistente de Bob Kane, Jerry Robinson começou a susbtituí-lo e a sua versão logo se tornou a definitiva.

Em 1943, Batman e Robin chegaram ao cinema através de um seriado da Columbia, O Morcego / Batman, dirigido por Lambert Hillyer com Lewis Wilson e Douglas Croft nos papéis centrais; mas quem “roubava” as cenas era J. Carrol Naish como o Dr. Daka, sinistro espião japonês, que se deliciava em alimentar seus crocodilos com carne humana. Infelizmente, no seu conjunto, o espetáculo foi mal concebido e realizado além das dificuldades causadas pelos baixos valores de produção, falta de tempo para corrigir as falhas e  inexpressividade de Wilson e Croft.

Em 1949, a mesma companhia realizou uma continuação, A Volta do Homem- Morcego / Batman and Robin, dirigida por Spencer Bennet com Robert Lowery e John Duncan. Este novo seriado era um pouco melhor do que o anterior, mas feito ainda com falta de imaginação, poucos recursos e impossibilidade de retakes. Foi somente nele que apareceu o personagem do Comissário Gordon (Lyle Talbot), ficando de fora desta vez o fiel mordomo Alfred que, no primeiro seriado era interpretado por William Austin. Eles seriam representados pelos veteranos Neil Hamilton e Alan Napier na série de televisão de 1966, com Adam West e Burt Ward – a melhor versão das aventuras de Batman e Robin por seu espírito de brincadeira, estilização, técnica moderna e o charme dos vilões excêntricos.

Entretanto, além dos seriados citados, existiram vários outros, com heróis que eram apenas homens comuns, vestindo uma fantasia, para lutarem contra as forças do mal. O Fantasma Voador / The Phantom / 1943, por exemplo, produzido também pela Columbia, tinha um bom diretor, B. Reeves Eason e Tom Tyler no papel do misterioso vingador das selvas africanas.

Como conseqüência do sucesso de Mandrake, Lee Falk trouxe outro personagem para as histórias em quadrinhos: O Fantasma / The Phantom. Em fevereiro de 1936, ele apareceu em tiras diárias no Journal American, desenhado por Ray Moore. Entretanto, Moore sofreu um acidente grave em 1942 e foi sendo gradualmente substituído por seu assistente Wilson McCoy. De 1947 a 1961 McCoy assumiu sozinho a responsabilidade pelos desenhos e, após sua morte, Sy Barry ocupou seu lugar.

O Fantasma nasceu assim: há quatrocentos anos, um lorde inglês em viagem de navio para a Índia, é vítima de um ataque pirata nas costas de Bengala. Mais tarde, seu filho, que conseguira escapar, jura dedicar sua vida contra a pirataria ou qualquer forma de crime. Não só ele, como também todas as gerações que o sucederam, cumprem a mesma promessa. O Fantasma torna-se o protetor de uma tribu de pigmeus Bandar e impõe a crença de que é invencível e imortal. O líder Guran é o único que sabe a verdade sobre “o fantasma que anda”. Tal como todas as figuras legendárias, ele tem o seu símbolo – “a marca da caveira” – e conta com a ajuda do seu cão (ou seria um lobo?) Devil, que na versão brasileira dos quadrinhos atendia pelo nome de Capeto.

Vestido com uma malha colante escura, meia máscara, calção com listras em diagonal e um par de pistolas no coldre, o Fantasma vive numa caverna, cuja entrada em forma de caveira abriga uma grande fortuna, que através do tempo seus antecessores acumularam,  ficando com o produto dos roubos dos criminosos. Ele possui também um anel com uma caveira em relevo, que deixa uma marca, quando ele esmurra os bandidos. Uma outra característica desse herói é a sua identidade civil: com um pesado capote, chapéu e óculos escuros, ele é tratado como Mr. Kit Walker e conhecido pelas autoridades como um defensor da floresta. Walker / Fantasma é o eterno noivo de Diana Palmer.

No enredo do seriado, o professor Davidson (Frank Shannon, o Dr. Zarkof de Flash Gordon) e sua filha Diana (Jeanne Bates) procuravam a cidade perdida de Zoloz, onde deveria estar escondido um fabuloso tesouro. Para localizá-la, é preciso manipular sete peças de marfim. Davidson possui três peças, um escroque chamado Singapore Smith (Joe Devlin) tem mais três: mas falta a mais importante. Ao mesmo tempo, o Dr. Bremmer (Kenneth MacDonald) pretende transformar Zoloz em uma base secreta para nações inimigas (presumivelmente os nazistas). O Fantasma entra em cena para ajudar Davidson e Diana a reprimir a ação de Bremmer.

O Fantasma Voador é, a meu ver, o melhor seriado da Columbia, embora o Fantasma da tela não seja exatamente igual ao das histórias em quadrinhos (vg. Guran aquí se chama Moku, o Fantasma não anda a cavalo pelas selvas como fazia nos quadrinhos e Kit Walker recebeu o nome de Godfrey Prescott). Entre os momentos de vibração destacam-se o desafio que a Princesa do Fogo faz ao Fantasma, incitando-o a caminhar no meio das chamas e a luta com o gorila, chamado Brutus, que traz a última peça de marfim pendurada no pescoço.

Anos mais tarde, aproveitando as tomadas de arquivo desse seriado, o estúdio realizaria uma continuação disfarçada, Capitão África, o Aventureiro / The Adventures of Captain África / 1955, dirigida por Spencer Bennet com John Hart que, no futuro, seria o Lone Ranger na televisão durante certo tempo enquanto Clayton Moore estava de greve.

A Columbia fez outro seriado, com Bennet atrás das câmeras, desta vez com um herói fantasiado que não tinha sido oriundo das histórias em quadrinhos: O Código Secreto / The Secret Code / 1942, cujo personagem principal interpretado por Paul Kelly, ficou conhecido como Comando Negro.

Designado para prender uma quadrilha de sabotadores, o tenente Dan Barton (Paul Kelly) forja uma demissão da força policial e se infiltra entre os espiões. Concomitantemente, disfarçado com a indumentária do Comando Negro e com a ajuda da repórter Jean Ashley (Anne Nagel) e de seu colega Pat Flanagan (Clancy Cooper), ele consegue localizar o código secreto dos inimigos e desmascarar o chefe da quadrilha.     Valorizado pela boa história e a simpatia e irreverência de Paul Kelly, o seriado pode ser incluído entre os melhores da Columbia. Uma das cenas mais excitantes é aquela em que o Comando Negro luta com o piloto do avião. A aeronave é alvejada pela artilharia antiaérea e explode. No episódio seguinte, vemos o piloto caindo de pára-quedas, o Comando Negro agarrando-se a ele, os dois se atracando em pleno ar e, finalmente terminando a briga em terra firme.

Todavia, nenhum dos seriados da Columbia conseguiu sobrepujar os da Republic no mesmo gênero. Nesta outra companhia foram feitos O Terror dos Espiões / The Spy Smasher / 1942 e Capitão América / Captain America / 1944, que muitos apontam como os dois melhores seriados de todos os tempos.

No primeiro, com a ajuda de seu irmão gêmeo Jack, o Spy Smasher, na realidade Allan Armstrong (Kane Richmond em papel duplo) combate o Máscara, líder de uma rede de espionagem alemã na América. Eles protegem o almirante Corby (Sam Flint) pai da noiva de Jack, Eve (Marguerite Chapman) e contam com a colaboração de Pierre Durand (Frank Corsaro), combatente da França Livre.

O personagem foi criado em 1940 por Bill Parker com desenhos de C.C. Beck e Pete Costanza e apareceu pela primeira vez na revista Whiz Comics. No Brasil, foi publicado a partir de 1943 no Globo Juvenil Mensal sob o nome de Hércules. Na medida em que a  Segunda Guerra Mundial se aproximava, o Spy Smasher tornou-se um símbolo visível do patriotismo americano. Charles Sultan assumiu a execução dos desenhos durante os anos de 1941 e 1942 e renovou a roupa do herói aviador: ele trocou a vestimenta cáqui por um uniforme verde brilhante com um emblema vermelho em forma de diamante no peito.

O seriado, na minha opinião, é excelente, não só pelos efeitos especiais (Howard Lydecker) e pela ação dos dublês (tendo à frente David Sharpe), mas também porque tem uma trama bem construída, boas caracterizações e uma fotografia até, em certos momentos, artística. A sequência mais espetacular é aquela em que o Spy Smasher e Jack perseguem o carro dos bandidos em uma motocicleta. Eles cortam caminho subindo uma colina, mas a motocicleta derrapa. O Spy Smasher então corre para o alto da colina e salta sobre o carro dos bandidos, que passa lá embaixo em alta velocidade.

Captain América foi outro seriado patriótico, surgido pouco antes dos Estados Unidos entrarem na guerra. A capa do primeiro número da história em quadrinhos publicada pela Marvel Comics, que mostrava o herói irrompendo através de um bando de nazistas para esmurrar Hitler, realizou o sonho de milhões de americanos.

Criado por Joe Simon e desenhado por Jack Kirby, o Capitão América era na realidade Steve Rogers, um jovem franzino que fora considerado incapaz para o serviço militar. Rogers se apresenta como voluntário para testar os efeitos de um super-soro, que pode multiplicar as fôrças do corpo e do cérebro. O soro transforma o rapaz rejeitado para o exército num soldado superior – um “super-agente: o Capitão América.

Usando um meio capuz sobre o rosto, asinhas nas têmporas e um “A” na testa, o personagem traz ainda no peito e no escudo redondo, uma estrela e as listas com as cores da bandeira americana. Uma noite, quando Steve está se vestindo como Capitão América na sua barraca, ele é surprendido por um jovem, Bucky Barnes, o “garoto mascote” do regimento (“De agora em diante nós temos que compartilhar este segredo…quer dizer que você agora é meu companheiro Bucky!”). Segundo o roteirista Simon, Bucky foi acrescentado à história em quadrinhos, para que o Capitão América tivesse alguém com quem falar.

O Capitão América era símbolo perfeito para uma nação ameaçada pela guerra. Steve Rogers, representava os soldados que estavam sendo convocados para se tornar heróis de seu país. A revista em quadrinhos logo estava vendendo milhões de cópias por mês e rivalizou com Batman e Superman em popularidade. Além do apelo patriótico, as ilustrações dinâmicas de Jack Kirby ajudaram a assegurar o êxito da publicação.

No seriado da Republic, o Dr. Maldor, curador do Museu Drummond, chamando-se a si próprio de O Escaravelho (Lionel Atwill), de posse de uma arma de grande poder destrutivo, o Vibrador Dinâmico, procura a outra parte de um mapa, que conduziria ao tesouro dos maias. O Capitão América, que é na realidade o promotor público Grant Gardner (Dick Purcell), intervém e, com o auxílio de sua assistente Gail Richard (Lorna Gray), impede que os objetivos de Maldor se concretizem.

O Capitão América perdeu o escudo, as asinhas na máscara, o parceiro Bucky e até seu nome verdadeiro, Steve Rogers; mas o uniforme continuou vistoso e nacionalista. Particularmente emocionante é aquele lance quando, após uma boa luta contra dois asseclas do Escaravelho e antes que o edifício atingido pelo Vibrador Dinâmico se despedace, o herói salta pela janela para o terraço de um prédio contíguo. O seriado fez muito sucesso graças à direção precisa de John English e Elmer Clifton e sobretudo pela habilidade de uma equipe de dublês de primeira ordem, entre os quais, Dale Vam Sickel (que substituiu Dick Purcell nas cenas arriscadas), Joe Yrigoyen, Fred Graham, Ken Terrell, Duke Green e Tom Steele, cujos golpes e sopapos não tinham nada a ver com violência e realismo, mas com excitação e fantasia.

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