Arquivo diários:fevereiro 14, 2010

ADEUS A JEAN SIMMONS

Não vou fazer o obituário de Jean Simmons, porque todos os jornais do mundo, com competência variada, já o fizeram. O melhor para mim foi o de David Thomson no The Guardian.  Você pode encontrá-lo na Internet.

Prefiro recordar alguns filmes dela que me agradaram. Logo no início de sua carreira, Jean teve a sorte de trabalhar com três grandes diretores em filmes magníficos: foi Estella, a menina criada por Miss Havisham para usar seus encantos como um meio de torturar os homens em Grandes EsperançasGreat Expectations / 1946 de David Lean; Kanchi, a nativa exótica e sensual em Narciso NegroBlack Narcisus / 1947 de Michael Powell / Emeric Pressburger; a trágica Ofélia em Hamlet Hamlet / 1948 de Laurence Olivier.

Martita Hunt e Jean Simmons em Grandes Esperanças


Hamlet

Sem dúvida um grande começo respectivamente aos 17, 18 e 19 anos de idade. Aos 20 anos, quando obteve expressivo sucesso comercial em Lago Azul / The Blue Lagoon / 1949 dirigido pela dupla Frank Launder e Sidney Gilliat, ela estava nas capas das revistas Time e Life. Seu desempenho em Hamlet lhe valeu uma indicação para o Oscar. Mas, apesar deste inicio brilhante na tela, Jean raramente encontrou papéis a altura do seu talento.

Blue_Lagoon

A atriz britânica chegou em Hollywood nos anos cinqüenta, porque J. Arthur Rank vendeu seu contrato para Howard Hugues, “como se eu fosse um pedaço de carne”, diria ela em uma entrevista. Por ter resistido aos avanços amorosos de Hugues, este impediu-a de aceitar o convite de William Wyler para  atuar em A Princesa e o Plebeu /Roman Holiday / 1953,  o filme que daria a Audrey Hepburn o prêmio da Academia e faria dela uma estrela.

Robert Mitchum e Jean Simmons em Alma em Pânico

Em um dos compromissos que ela foi obrigada a cumprir para Hughes, Alma em PânicoAngel Face / 1952, filme noir dirigido por Otto Preminger, Jean teve – a meu ver – a sua melhor interpretação como Diane, a jovem com uma obsessiva fixação pelo pai e o ódio patológico da madrasta.

Depois que ficou livre do contrato com Hughes, Jean contracenou com seu marido Stewart Granger, Charles Laughton e Deborah Kerr em A Rainha VirgemYoung Bess / 1953 (Dir: George Sidney). Foi seu primeiro filme nos Estados Unidos com Granger – o bonitão ingles que se tornou o sucessor de Errol Flynn nos filmes de aventuras. Esta produção da MGM se constituiu em um belo espetáculo histórico, no qual ela, como Bess, estava mais linda do que nunca.

Stewart Granger e Jean Simmons em A Rainha Virgem

Ainda na MGM Jean interpretou outro de seus melhores papéis, Ruth Gordon Jones, uma garota entusiasmada pela arte teatral, em Papai não QuerThe Actress / 1953 (Dir: George Cukor) ao lado de Spencer Tracy. Em uma cena Ruth beija seu namorado e diz a ele para não se esquecer de que “este foi o primeiro beijo que você recebeu de uma atriz”.

Depois, eu gostei de vê-la como Varínia, a escrava companheira de Spartacus (Kirk Douglas), sob a direção de Stanley Kubrick em SpartacusSpartacus / 1960 e como a pregadora evangélica Irmã Sarah Falconer subjugada pelos encantos de um demoníaco Burt Lancaster em Entre Deus e o PecadoElmer Gantry / 1960, dirigido pelo seu segundo marido, Richard Brooks. Em 1969, novamente guiada por Brooks, Jean Simmons recebeu mais uma indicação para o Oscar pela sua participação em Tempo para Amar, Tempo para Esquecer / The Happy Ending.

Jean Simmons teve seus méritos como atriz, porém o que ficou mais na minha memória foi o seu lindo rosto quando era uma mocinha, sua voz de menina, sua meiguice.

PARAMOUNT EM PARIS

Ao irromper o cinema sonoro, as principais companhias de Hollywood ficaram com receio de perder o vasto mercado de língua não-inglesa. Daí a idéia de se fazerem produções americanas em vários idiomas. Todos os grandes estúdios fizeram versões estrangeiras de seus filmes (Warner, RKO, MGM, Fox, Universal, Columbia), porém a companhia que mais se empenhou nas produções desse tipo foi a Paramount.

As primeiras versões foram feitas em Hollywood e nos estúdios Astoria em Nova York, explorando o potencial do cantor-ator francês Maurice Chevalier para a produção bilíngüe.

Maurice Chevalier e Frances Dee em O Café do Felisberto

Ele impressionou os parisienses em La Chanson de Paris /1929 – tal como havia feito na versão original, Innocents of Paris – e nos subseqüentes La Parade D’Amour (Alvorada do AmorThe Love Parade / 1929, Le Petite Café (O Café do FelisbertoPlayboy of Paris / 1930, La Grande Mare (Um Romance de VenezaThe Big Pond / 1930).

Face a esse sucesso, Adolph Zukor resolveu abrir uma subsidiária de sua companhia em Paris, a Société Ciné-Studio-Continental, cuja direção foi entregue a Robert T. Kane. Kane alugou e reformou um estúdio na rue des Réservois em Saint-Maurice no limite com Joinville-le-Pont, transformando-o em uma gigantesca fábrica de imagens, apelidada de Babel-sur-Marne, pois alguns filmes chegaram a ter versões em até 14 idiomas, envolvendo atores, atrizes, diretores e técnicos de diversas nacionalidades.

Paramount on Parade / 1930, por exemplo, teve nada menos do que 11 versões (francesa, espanhola, tcheca, holandesa, polonesa, italiana, romena, japonesa, húngara, sueca e dinamarquesa). No Brasil, passaram a original e a espanhola (Galas de la Paramount), ambas com o título em português de Paramount em Grande Gala.

Her Wedding Night /1930 de Frank Tuttle, farsa sobre um compositor popular que se casa “por procuração”, estrelado por Clara Bow, teve versões francesa (Marions-nous), espanhola (Su noche de Bodas), alemã (Ich heirate meinem Mann) e portuguesa (A Minha Noite de Núpcias, tendo na frente do elenco Beatriz Costa e “o príncipe do teatro brasileiro”, Leopoldo Froes).

Carlos Gardel e Mona Maris em O Amor Obriga

Entretanto, a Paramount não fez apenas versões múltiplas de filmes americanos, mas também muitos filmes originais, principalmente franceses e espanhóis. Nos filmes franceses trabalharam inúmeros atores e atrizes, que depois se tornariam grandes cartazes da tela: Arletty, Fernandel, Edwige Feuillière (com o nome de Cora Lynn), Pierre Fresnay, Jean Gabin, Raimu, Fernand Gravey, Louis Jouvet, Viviane Romance, Simone Simon, etc. Nos filmes espanhóis, a Paramount tinha como trunfo o carismático cantor de tangos Carlos Gardel, que empolgou o público em Luzes de Buenos AiresLas Luces de Buenos Aires / 1931.

Após este êxito, o estúdio americano colocou Gardel ao lado da dançarina Império Argentina em duas comédias românticas Espera-me CoraçãoEspéra-me / 1932 e Melodia de Arrabal /Melodia de Arrabal / 1933. Quando a Paramount deixou Paris, mandou Gardel para seus estúdios Astoria, para fazer uma nova série de filmes espanhóis (O Amor ObrigaCuesta Abajo / 1934, O Tango na BroadwayEl Tango en Broadway / 1934, No dia que me QueirasEl Dia que me Quieres / 1935 e Tango BarTango Bar / 1935.

Os executivos da empresa cinematográfica pensaram então em fazer filmes de língua inglesa com Gardel, tal como Maurice Chevalier havia feito. Se o seu inglês fosse aceitável, o popular cantor-ator teria um papel em RumbaRumba / 1935, ao lado de George Raft e Carole Lombard. Mas a trajetória artística de Gardel foi interrompida tragicamente. Ele veio a falecer, juntamente com dez músicos, num acidente de avião.

HOMENAGEM A KEVIN BROWNLOW

Basta o primeiro livro de Kevin Brownlow, The Parade’s Gone By … (1968), contendo muitas entrevistas com atores, diretores e técnicos do cinema mudo e o documentário em 13 capítulos,Hollywood: A Celebration of the American Silent Film (1979), realizado de parceria com David Gill e produzido pela Thames Television, para consagrá-lo como o maior historiador da era silenciosa da 7ª arte.

Brownlow foi também responsável pela magnífica restauração do clássico Napoléon (1927) de Abel Gance e salvou outros filmes para a Photoplay Productions, a companhia que fundou com o objetivo de fazer importantes restaurações: O Águia / The EagleO Fantasma da Ópera / The Phantom of the OperaO Ladrão de Bagdad / The Thief of BagdadEm Busca do Ouro / The Gold Rush, para citar apenas algumas.

Depois da série Hollywood, Brownlow e Gill fizeram: Unknown Chaplin: The Master at Work (1983), Buster Keaton: A Hard Act to Follow (1987), Harold Lloyd: The Third Genius (l989),D.W. Griffith: Father of Film (1993) e Cinema Europe: The Other Hollywood (1996) entre outros.

Kevin Brownlow

Desde a morte de Gill em 1997, Bronlow continuou a produzir documentários entre os quais Lon Chaney, a Thousand Faces (2000), Cecil B. DeMille – American Epic (2004), Garbo (2005), produzido pelo Turner Classic Movies para marcar o centenário de nascimento da atriz e I Am King Kong!: The Exploits of Merian C. Cooper (2005).

A bibliografia de Brownlow inclui outros livros admiráveis como The War, the West and the Wilderness (1979), Hollywood, the Pioneers (1979), Behind the Mask of InnocenceSex, Violence, Crime – Films of Social Conscience in the Silent Era (1992), David Lean (1996), a melhor biografia do renomado cineasta inglês, Mary Pickford Rediscovered (1999) com fotos raras da legendária atriz de Hollywood.

Brownlow realizou, com seu amigo Andrew Mollo, dois filmes: It Happened Here (1966) e Winstanley (1975). Ví apenas o primeiro, uma ficção histórica muito interessante contando o que aconteceria se os alemães tivessem conseguido desembarcar na Inglaterra em 1940. Os alemães lutam contra os resistentes, e a população civil, presa entre dois fogos, sofre sacrifícios sangrentos. A personagem central, uma enfermeira, obrigada a se engajar no serviço de saúde pró-nazi, descobre pouco a pouco o horror nos dois lados.

Cada tomada do filme foi recriada. Não foi usada nenhuma imagem de arquivo. A maioria dos atores não eram profissionais. Uma cena de doutrinamento, interpretada por autênticos nazistas, causou escândalo e foi cortada pelo distribuidor. Brownlow tinha apenas 18 anos quando começou a fazer It Happened Here e Mollo, 16. Após oito anos de muitas contrariedades e perseverança, o filme foi completado em 1964 com a ajuda de Tony Richardson, porém só foi lançado em 1966.